Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:928/19.4BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:07/27/2020
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:NULIDADE DECISÓRIA;
LEI N.º 64-A/2008, DE 31/12;
TITULARES DE CARGOS DIRIGENTES;
SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS;
SUSPENSÃO DA CONTAGEM DO TEMPO DE SERVIÇO;
PARECER DESFAVORÁVEL DO MINISTRO DAS FINANÇAS;
LEI N.º 114/2017, DE 29/12;
IGUALDADE NA ILEGALIDADE;
OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DOS ENCARGOS DO PROCESSO NO ÂMBITO DA INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS.
Sumário:
I - Só a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade da decisão;
II - Para ocorrer a nulidade da sentença, por oposição entre os fundamentos e decisão, terá de se verificar uma situação grave, patente, que implique uma incongruência absoluta;
III – Nos termos do art.º 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15/01, alterada pela Lei n.º 51/2005, de 30/08 e pela Lei n.º 64-A/2008, de 31/12, os titulares de cargos dirigentes tinham direito à alteração de posicionamento remuneratório na categoria de origem caso exercessem, continuadamente, pelo período de 3 anos, funções dirigentes, sendo que aos dirigentes integrados em carreiras especiais exigia-se, ainda, a verificação de outros requisitos fixados em lei especial;
IV - Entretanto, a Lei n.º 3-B/2010, de 28/04, revogou aquele preceito, mas a situação dos indicados dirigentes ficou salvaguardada pelo art.º 25.º, n.º 3, deste diploma (cf. também n.º 2);
V- Por seu turno, o art.º 24.º, n.º 9, da Lei n.º 55/B/2010, de 31/12 e o 20.º, n.º 5, da Lei n.º 64-B/2011, de 30/12, determinaram a não contagem do tempo de serviço prestado em 2011 e em 2012, para efeitos de mudança de posição remuneratória, quando tal mudança dependesse apenas do decurso de determinado período de prestação de serviço, legalmente estabelecido para tal efeito;
VI - Por força da suspensão na contagem do tempo de serviço, os AA. e Recorrentes não preenchiam o requisito relativo ao período de 3 anos de exercício de funções dirigentes em 28/02/2013 e em 16/01/2023, as datas em que foram proferidos os despachos do Director Nacional do SEF a reconhecer-lhes o direito de alteração do posicionamento remuneratório;
VII - Portanto, não há que condenar o Ministro das Finanças a emitir o despacho prévio favorável previsto no art.º 18.º, n.º 9, da Lei n.º 114/2017 de 29/12;
VIII – O princípio da igualdade não releva na ilegalidade;
IX – Se no âmbito de uma intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias a pretensão dos respectivos AA. ficou totalmente vencida, estes são responsáveis, pelos encargos do processo de recurso, nos termos do art.º 4.º, n.º 2, al. b), e 6 do RCJ.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul



I - RELATÓRIO

G................... e P................... interpõem recurso da sentença do TAC de Lisboa na parte em que julgou improcedente a presente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, na qual os AA. pediam para o Ministério das Finanças (MF) ser condenado a emitir o despacho prévio favorável previsto no art.º 18.º, n.º 9, da Lei n.º 114/2017, de 29/12 e para serem o Ministério da Administração Interna (MAI) e o MF condenados a nomearem os AA. na categoria de inspector coordenador da carreira de investigação e fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fonteiras (SEF) com efeitos a 01/01/2018.

O MAI foi absolvido do pedido e, nessa parte, os AA. não impugnam a decisão recorrida.

Em alegações são formuladas pelos Recorrentes, as seguintes conclusões: ”1. Considerou o Tribunal a quo que a intimação solicitada não deveria ser deferida por entender que a versão que os Recorrentes, agora Apelantes, pretendem ver aplicada não corresponder à aplicável, uma vez que acolheu por inteiro a interpretação da Direção Geral da Administração e do Emprego Publico ou seja, de que n.º 2 do artigo 29.º da Lei 2/04, de 15.1., alterada e republicada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de Agosto, resulta claramente que este regime, em vigor desde 1.1.2009, se aplica expressamente às carreiras especiais ou seja, à Carreira de Investigação e Fiscalização do SEF,
2. Caindo-se no erro de entender-se que esta Carreira teria sido revista, o que não aconteceu, e a própria sentença recorrida refere que o parecer desfavorável do Ministério das Finanças onde tal é referido está coberto de razão (Página 9 da douta sentença recorrida),
3. No entanto, a própria sentença recorrida é ambígua e confusa sem que especifique os fundamentos, de facto e de direito, que justificam a decisão, sendo assim a sentença nula nos termos do artigo 615º n.º 1alíneas b) e c) do C. Processo Civil aplicável por força do disposto no artigo 1º do C. Processo nos Tribunais Administrativos,
4. E, sequer antes de analisar a ambiguidade e confusão da sentença ora recorrida, podemos constatar é que a própria Direção Geral da Administração e do Emprego Publico trata situações em tudo iguais como diferentes, e foi o que aconteceu com uma funcionaria do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, e que só agora chegou ao conhecimento dos aqui Recorrentes,
5. Efetivamente, o artigo 680º n.º 1 do C. Processo Civil refere que se podem juntar documentos nas alegações quando os mesmos são supervenientes e efetivamente só agora os Apelantes tomaram conhecimento que uma outra funcionaria também nomeada para funções dirigentes, viu o seu direito à progressão na carreira reconhecido, (cfr. documentos um e dois ora juntos)
6. E é aqui que encontramos duas versões dentro do mesmo órgão: no caso da Especialista informática A..................., a Direção Geral da Administração Pública e do Emprego entendeu que “Relativamente aos dirigentes integrado sem carreiras de regime especial ainda não revistas e pluricategoriais, manteve-se aplicável o disposto na anterior redação do art. 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de agosto, ..”,
7. No entanto, no caso dos ora Recorrentes tal não é o entendimento, já que consideram que nada resulta da lei que a alteração realizada pela Lei n.º 64-A/2008 de 31 de Dezembro não se aplique as carreiras não revistas,
8. Ora, a Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras no entendimento do Tribunal a quo só foi revista em 2015, pelo Decreto-Lei n.º 198/2015, de 16 de Setembro, e não antes,
9. No entanto, não se consegue perceber se a sentença recorrida considera ou não que a revisão de carreira só aconteceu em 2015 ou antes,
10.Facto que é importante e que teria de ser levado a facto assente.
11.Na medida, em que sendo a Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras não revista, é-lhe aplicável a versão original do artigo 29º n.º 2 da Lei n.º 2/2004 de 15 de Janeiro,
12.Sendo que o Tribunal a quo apenas sabe referir que a versão que entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2009 é aplicável aos Recorrentes, mas sem que do texto da decisão resulte o porquê,
13.Ora, o Recorrente G................... pertencia à categoria de Inspetor Coordenador, nível 2, quando em 10 de Agosto de 2009, por Despacho de 9 de Janeiro de 2009 foi nomeado, em regime de substituição no cargo de Subdiretor Regional do Centro do SEF, nos termos dos artigos 20º e 27º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, com a redação dada pela Lei n.º 51/2005 de 30 de Agosto,
14.Tendo a 27 de Setembro de 2010 progredido para o nível 1 da categoria de Inspetor Coordenador, e exercido funções dirigentes até Agosto de 2012.
15.Assim, contava à data de 30 de Novembro de 2012 de 2 anos, 2 meses e 6 dias na categoria der Inspetor de Nível 1,
16.Por sua vez, o Recorrente P..................., pertencia à categoria de Inspetor Coordenador, nível 1, quando em 25 de Maio de 2009, por Despacho de 25 de Maio de 2009 foi nomeado, em regime de substituição no cargo de Subdiretor Regional de Lisboa, Vale do Tejo e Alentejo do SEF, nos termos dos artigos 20º e 27º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, com a redação dada pela Lei n.º 51/2005 de 30 de Agosto, e exercido funções dirigentes até Maio de 2012.
17.A Lei, mais concretamente, o artigo 29º n.º 2 da Lei n.º 2/2004 de 15 de Janeiro na versão original estabelece:“Quando o tempo de serviço prestado em funções dirigentes corresponda ao módulo de tempo necessário à promoção na carreira, o funcionário tem direito, findo o exercício de funções dirigentes, ao provimento em categoria superior com dispensa de concurso, a atribuir em função do número de anos de exercício continuado naquelas funções.”
18.A Lei n.º 51/2005, de 30 de Agosto manteve a mesma redação e a disposição legal apenas foi alterada com a Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, em que o artigo 29º n.º 1 já dispõe da forma seguinte: “O exercício continuado de cargos dirigentes por períodos de três anos, em, comissão de serviço, em substituição ou em gestão corrente, confere ao respectivo titular o direito à alteração para a ou as posições remuneratórias imediatamente seguintes da respetiva categoria de origem, correspondendo uma alteração a cada período.”
19. No entanto, a denominação alteração de posições remuneratórias aplica-se apenas a carreiras revistas, entendendo-se que relativamente às carreiras não revistas, como é o caso do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, se quer referir à promoção, sendo aplicável a versão anterior,
20.Ora, segundo ainda o disposto no artigo 29º n.º 5 da Lei n.º 2/2004 de 15 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 64-A/2008, o direito é reconhecido “…a requerimento do interessado, por despacho do dirigente máximo do serviço de origem, precedido de confirmação dos respectivos pressupostos pela secretaria-geral ou pelo departamento ministerial competente em matéria de recursos humanos.”, e os Recorrentes nos presentes autos apresentaram requerimento,
21.E nessa medida, por Despacho do Exmo. Senhor Diretor Nacional do Serviço de Fronteiras de 28 de Fevereiro de 2013 foi reconhecido ao Recorrente G................... “…o direito de acesso à categoria de Inspetor Superior da CIF, do SEF, o qual, contudo, apenas poderá ser efetivado findo o exercício de funções dirigentes e quando deixar de se encontrar vedada a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias conforme parecer da Secretaria Geral do MAI.”
22.Como para o Recorrente P................... a 16 de Janeiro de 2013 foi proferido Despacho pelo Exmo. Senhor Diretor Nacional do Serviço de Fronteiras com o mesmo teor:“Reconheço ao Recorrente o direito de acesso à categoria de Inspetor Superior da CIF, do SEF, o qual, contudo, apenas poderá ser efetivado findo o exercício de funções dirigentes e quando deixar de se encontrar vedada a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias conforme parecer da Secretaria Geral do MAI.”
23.Para ambos os pedidos a Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna emitiu o seu parecer no mesmo sentido ou seja, de concordância com o reconhecimento do direito de acesso à categoria de inspetor superior, atualmente Inspetor Coordenador,
24.Assim, foi reconhecido o direito à carreira para os dois Recorrentes, sem que à data desse reconhecimento fosse necessário qualquer despacho prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pela área das finanças e da Administração Pública,
25.Direito esse que apenas se encontrava dependente da cessação das proibições da prática de quaisquer atos que consubstanciassem valorizações remuneratórias e não estava dependente mais nenhum outro fator,
26.No entanto com a cessação a 1 de Janeiro de 2018 com a Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro que aprovou o Orçamento de Estado para 2018, o artigo 18º n.º 9 introduziu esse requisito, “Para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1, as promoções, independentemente da respetiva modalidade, incluindo mudanças de categoria ou posto e as graduações, dependem de despacho prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pela área em que se integra o órgão, serviço ou entidade em causa e pela área das finanças e da Administração Pública, com exceção dos órgãos e serviços das administrações regional e local, em que a emissão daquele despacho compete ao presidente do respetivo órgão executivo das regiões autónomas e das autarquias locais.”
27.Sendo que após essa cessação da suspensão, a 10 de Maio de 2018 foi proferido o seguinte Despacho do Exmo. Senhor Ministro da Administração Interna: "Concordo. Face ao oficio da Direção Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras à informação da Secretaria Geral do MAI, relativas ao direito de acesso à categoria de Inspetor Coordenador Superior dos Inspetores Coordenadores G................... e P..................., entendo estarem reunidos os pressupostos para acesso à categoria. Remeta-se o processo ao Ministério das Finanças."
28.Ora, já existindo o despacho favorável do Ministro da Administração Interna e estando o direito à carreira dos Recorrentes reconhecido por Despachos do Exmo. Senhor Diretor Nacional do SEF de 16 de Janeiro de 2013 e outro de 28 de Fevereiro de 2013,
29.Apenas se encontra em falta, desde pelo menos 10 de Maio de 2018, Despacho do Recorrido, Ministério das Finanças e que apenas é exigido para efeitos de controlo orçamental,
30.Ora, o direito ao trabalho está constitucionalmente consagrado no capítulo dos direitos, liberdades e garantias no artigo 53º e seguintes da Constituição da Republica Portuguesa.
31.Ora, os Recorrentes desde 2013 que viram o seu direito à carreira reconhecido, sendo certo que criaram a legitima expetativa, perfeitamente justificada, que mal cessasse a proibição da prática de quaisquer atos que consubstanciassem valorizações remuneratórias, fossem nomeados como Inspetores Coordenadores Superiores, o que não veio a acontecer até à presente data.
32.Ora, os Recorrentes já têm o seu direito reconhecido e aguardam que seja praticado o ato de nomeação há mais de um ano, sendo que ganharam uma expetativa juridicamente criada e que é protegida num Estado de Direito, e reflete-se no Principio da segurança jurídica e da proteção da confiança
33.Uma expetativa jurídica é uma situação em que se verifica a possibilidade, juridicamente tutelada, de aquisição futura de um direito, estando já parcialmente verificada a situação jurídica (o facto jurídico) complexa,
34.Nessa medida, requerem os Recorrentes, uma vez que já existe Despacho prévio favorável do Ministro da Administração Interna e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que a douta sentença recorrida seja revogada e que a Recorrente Ministério das Finanças seja intimada a emitir o despacho prévio favorável previsto no artigo 18º n.º 9 da Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro, fazendo assim a tão costumada“.

O Recorrido nas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: “1. As comissões de serviço dos Recorrentes iniciaram-se em 25 de maio e 10 de agosto de 2009, enquanto a comissão de serviço da especialista de informática, A..................., trazida à colação, se iniciou em 15 de outubro de 2008.
2. À data da entrada em vigor da nova redação do art.º 29.º do Estatuto do Pessoal Dirigente, (01-1-2009), os Recorrentes ainda não exerciam funções dirigentes, enquanto a especialista de informática referida nas alegações dos Recorrentes, já tinha iniciado funções dirigentes em 15 de outubro de 2008.
3. Donde, não existe a alegada identidade de situações e tratamento diferente invocado pelos Recorrentes; a posição da DGAEP tinha necessariamente de ser diferente, por força do disposto no n.º 3 do art.º 29.º com a redação dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 -12, norma que salvaguardou a aplicabilidade da anterior redação do art.º 29.º apenas aos titulares das comissões de serviço que estivessem em curso em 01-01-2009, que, como se constatou, não é o caso do Recorrentes.
4. A sentença recorrida, ao invés do que alegam os Recorrentes, não é ambígua nem obscura, uma vez que faz uma exaustiva descrição dos factos (fundamentação de facto) e depois o respetivo enquadramento legal, enunciando as normas legais aplicáveis ao caso concreto, pelo que não se verifica a alegada nulidade, devendo em consequência, ser mantida.
5. À data do início da comissão de serviço dos Autores, ora Recorrentes, 25 de maio de 2009 e 10 de agosto de 2009, estava em vigor o art.º 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterada pelas Leis n.º 51/2005, de 30 de agosto e 64-A/2008, de 31 de dezembro, que apenas previa o direito à alteração de posicionamento remuneratório na categoria de origem, aos titulares de cargos dirigentes pelo exercício continuado de funções dirigente pelo período de 3 anos (n.º 1) e no caso de dirigentes integrados em carreiras especiais mediante a verificação de outros requisitos fixados em lei especial (n.º 2)
6. Ora, tendo os Recorrentes sido, nomeados em 2009, e estando impedida legalmente a contagem de tempo a partir de 01-01-2011, por força da Lei n.º 55-B/2010, os Recorrentes não reúnem o pressuposto necessário à alteração da posição remuneratória, (módulo de tempo). conclusão a que o MF chegou após o procedimento lhe ter sido remetido pelo MAI para efeitos de controlo orçamental.
7. Contudo o controlo orçamental pressupõe necessariamente uma gestão eficiente dos dinheiros públicos sustentada na legalidade da despesa pública.
8. E foi no exercício deste controlo orçamental e de aferição da legalidade que, foi solicitada a pronúncia da Senhora Secretária de Estado da Administração e Emprego Publico, consubstanciada no despacho n.º 420/2019/SEAEP, propondo despacho desfavorável à pretensão dos interessados, baseado no entendimento de que os interessados não reúnem os requisitos para poderem beneficiar do pretendido acesso automático a categoria superior e mudança de posicionamento remuneratório.
9. Entendimento que foi acolhido por Sua Exa. o Ministro das Finanças conforme o despacho exarado sobre o despacho SEAEP, e que não merece censura, por se encontrar em conformidade com as normas legais aplicáveis.
10. Assim sendo, bem andou a sentença recorrida ao decidir como decidiu, absolvendo o réu Ministério das Finanças do pedido.”

O DMMP não apresentou a pronúncia.

Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo à conferência.


II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – OS FACTOS
Na 1.ª instância foram fixados os seguintes factos, factualidade não impugnada, que se mantém:
1 - O ora Autores são Inspetores Coordenadores da Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e ambos solicitaram a criação, no mapa de pessoal do SEF de um lugar na categoria de Inspetor Superior da Carreira de Investigação e Fiscalização ao abrigo do Estatuto do Pessoal Dirigente dos Serviços e Organismos da Administração Pública aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, mais concretamente do previsto no seu artigo 29º,
2 – O 1.º A. G................... pertencia à categoria de Inspetor, nível 2, desde 27.9.2007, quando em 10 de Agosto de 2009, por Despacho de 9 de Janeiro de 2009 foi nomeado, em regime de substituição no cargo de Subdiretor Regional do Centro do SEF, nos termos dos artigos 20º e 27º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, com a redação dada pela Lei n.º 51/2005 de 30 de Agosto, cf. Doc. 1 junto à p.i.;
3 – O 1.º A. progrediu para o nível 1 da categoria de Inspetor, no dia 27 de Setembro de 2010;
4 – O 1.º A. exerceu funções dirigentes até Agosto de 2012.
5 – No dia 13.9.2012 deu entrada na DN do SEF requerimento do 1.º A. pedindo a promoção na categoria de Inspetor superior, cf. Doc. 4 junto à p.i.;
6 – O 2.º A. P..................., pertencia à categoria de Inspetor, nível 1, desde 27.8.2003, quando em 25 de Maio de 2009, por Despacho de 25 de Maio de 2009 foi nomeado, em regime de substituição no cargo de Subdiretor Regional de Lisboa, Vale do Tejo e Alentejo do SEF, nos termos dos artigos 20º e 27º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, com a redação dada pela Lei n.º 51/2005 de 30 de Agosto, cf. Doc. 2 junto à p.i.;
7 – O 2.º A. exerceu funções dirigentes até Maio de 2012.
8 - O 2.º A. dirigiu no dia 31.10.2012 ao DN do SEF requerimento pedindo a criação de lugar categoria de Inspetor superior, cf. Doc. 3 junto à p.i.;
9 - Por Despacho do Exmo. Senhor Diretor Nacional do Serviço de Fronteiras de 28 de Fevereiro de 2013 foi reconhecido ao 1.º A. G................... “…o direito de acesso à categoria de Inspetor Superior da CIF, do SEF, o qual, contudo, apenas poderá ser efetivado findo o exercício de funções dirigentes e quando deixar de se encontrar vedada a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias conforme parecer da Secretaria Geraldo MAI.”, cf. Doc. 5 junto à p.i.;
10 - Por Despacho do Exmo. Senhor Diretor Nacional do Serviço de Fronteiras de 16 de Janeiro13 foi reconhecido ao 2.º A. P...................: “Reconheço ao requerente o direito de acesso à categoria de Inspetor Superior da CIF, do SEF, o qual, contudo, apenas poderá ser efetivado findo o exercício de funções dirigentes e quando deixar de se encontrar vedada a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias conforme parecer da Secretaria Geral do MAI.”, cf. Doc. 6 junto à p.i.;
11 - Para ambos os pedidos a Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna emitiu o seu parecer no mesmo sentido ou seja, de concordância com o reconhecimento do direito de acesso à categoria de inspetor superior, sendo que no parecer do 1.º A. Gonçalo Rodrigues é referido que “..a verificar-se a cessação de funções dirigentes ainda durante a vigência das regras de contenção de despesa, o requerente ficara a auferir pela remuneração da categoria atual, inspetor de nível 1, até haver alteração legislativa que permita a efetivação do direito à carreira, autorizando a mudança de categoria.” , cf. Doc.s 7 e 8 juntos à p.i.;
12 - Por Despacho do Exmo. Senhor Ministro da Administração Interna, de 30 de Maio de 2018, exarado na Informação de 21.5.2018 do Gabinete do MAI, foi decidido o seguinte:
"Concordo.
Face ao ofício da Direção Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras à informação da Secretaria Geral do MAI, relativas ao direito de acesso à categoria de Inspetor
Coordenador Superior dos Inspetores Coordenadores G................... e P..................., entendo estarem reunidos os pressupostos para acesso à categoria. Remeta-se o processo ao Ministério das Finanças." Cf. Doc. 9 junto à p.i.;
13 - O referido oficio deu entrada no Gabinete de Sua Exa. o Ministro das Finanças, em 4 de junho de 2018 e foi remetido para o Gabinete da Sua Exa. a Secretária de Estado da Administração e do Emprego Público dando entrada naquele gabinete, em 6 de junho de 2018., cfr. carimbos apostos no rosto do citado oficio (fls.7 do PA);
14 - Em 6 de junho de 2018, a referida entrada foi remetida por e-mail para a Direção Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP), (fls. 6 do PA), para informação e para o Gabinete de Sua Exa o Secretário de Estado do Orçamento, para pronúncia;
15 - Em 28 de novembro de 2018, foi elaborada na DGAEP a informação n.º 1653/DRJE/2018, onde se concluiu que “os interessados não reúnem condições para poder beneficiar do pretendido (acesso automático a categoria superior nem alteração de posicionamento remuneratório)” (fls.3 e 4 do PA);
16 - Essa informação mereceu despacho de concordância da Senhora Diretora Geral da DGAEP e foi remetida em 28 de novembro de 2018 ao Gabinete de Sua Exa. a SEAEP e ao Gabinete de Sua Exa. o Secretário de Estado do Orçamento, (fls. 1 e 2 do PA);
17 - Por Despacho de 3.6.2019 (Despacho interno n.º 254/19/MF), o Senhor Ministro das Finanças emitiu parecer desfavorável à criação dos lugares pedida pelos AA, cf. doc. junto com o requerimento do 2.º R. apresentado em juízo no dia 7.6.2019 que se transcreve:


«imagem no original»




II.2 - O DIREITO
As questões a decidir neste recurso são:
- aferir a nulidade decisória, por omissão, ambiguidade e contrariedade da sentença recorrida;
- aferir do erro decisório porque os AA. e Recorrentes reúnem os pressupostos exigidos pelo art.º 29.º, n.ºs 2 e 5, da Lei n.º 2/2004, de 15/01, na versão anterior à alteração introduzida pela Lei n.º 64-A/2008, de 3/12, e, por isso, o Ministro das Finanças está legalmente obrigado a emitir o despacho prévio favorável, previsto no art.º 18.º, n.º 9, da Lei n.º 114/2017 de 29/12.

É jurisprudência pacífica que só ocorre a nulidade da decisão por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, que são todas as que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras (cf. art.º 608.º, nº 2, do CPC). Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. Mas só a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade da decisão. Também nos termos da al. c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, para ocorrer a nulidade da sentença por oposição entre os fundamentos e decisão, terá de se verificar uma situação grave, patente, que implique uma incongruência absoluta.
Ora, no caso em apreço, o Tribunal ponderou as questões em litígio e decidiu-as. Para tanto, indicou o Tribunal as razões de facto e de Direito que levavam à sua decisão.
Explicou o Tribunal, na decisão recorrida, de forma escorreita e com uma fundamentação completa, o seu raciocínio. A simples leitura atenta da decisão permitiria aos Recorrentes entenderem as razões aduzidas pelo Tribunal e compreender que não existia contradição alguma naquele raciocínio, com o qual podiam, apenas, não concordar.
Da mesma forma, o Tribunal recorrido não foi contraditório nos fundamentos, compreendendo-se que considera que aos AA. e Recorrentes não se aplica o regime legal que invocam, mas, sim, o art.º 29.º da Lei 2/04, de 15/01, alterada e republicada pela Lei n.º 51/2005, de 30/08, na redacção dada pelo n.º 1 do art.º 29.º da Lei 64-A/2008, de 31/12, em vigor desde 01/01/2009.
Ou seja, atendendo às invocações dos Recorrentes, nunca haveria aqui uma incongruência absoluta da decisão, geradora de nulidade, mas tão só poderia ocorrer um erro de Direito.
Os Recorrentes podem discordar da fundamentação adoptada na decisão recorrida, mas a mesma não é reconduzível a uma nulidade da decisão. Evidência de que não existe nulidade alguma na decisão recorrida, pelo que a sua invocação é manifestamente improcedente e impertinente, é os próprios Recorrentes arguirem a nulidade, e em simultâneo, pelas mesmas razões, o erro na decisão recorrida. Esta invocação simultânea é sinal claro de que os próprios Recorrentes reconhecem que a decisão não encerrava nulidade alguma, tendo-a arguido desprovidos das razões que legalmente fundam a invocação da nulidade decisória.
Falece, assim, a alegada nulidade decisória.

Quanto ao erro de direito diga-se, desde já, que o presente recurso improcede.
Como decorre da matéria factual apurada, os AA. e Recorrentes iniciaram funções em comissão de serviço em 25/05/2009 e em 10/08/2009, na vigência do art.º 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15/01, alterada pela Lei n.º 51/2005, de 30/08 e pela Lei n.º 64-A/2008, de 31/12.
Ora, basta esta asserção para fazer claudicar o presente recurso, que se suporta na aplicação aos AA. e Recorrentes da lei anterior que, na verdade, não lhes é aplicável.
Nos termos do citado normativo, os titulares de cargos dirigentes tinham direito à alteração de posicionamento remuneratório na categoria de origem caso exercessem, continuadamente, pelo período de 3 anos, funções dirigentes, sendo que aos dirigentes integrados em carreiras especiais exigia-se, ainda, a verificação de outros requisitos fixados em lei especial – cf. art.º 29.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 2/2004, de 15/01, alterada pela Lei n.º 51/2005, de 30/08 e Lei n.º 64-A/2008, de 31/12
Entretanto, a Lei n.º 3-B/2010, de 28/04, revogou aquele preceito, mas a situação dos Recorrentes ficou salvaguardada pelo art.º 25.º, n.º 3, deste diploma (cf. também n.º 2).
Por seu turno, o art.º 24.º, n.º 9, da Lei n.º 55/B/2010, de 31/12 e o 20.º, n.º 5, da Lei n.º 64-B/2011, de 30/12, determinaram a não contagem do tempo de serviço prestado em 2011 e em 2012, para efeitos de mudança de posição remuneratória, quando tal mudança dependesse apenas do decurso de determinado período de prestação de serviço, legalmente estabelecido para tal efeito.
Consequentemente, por força da suspensão na contagem do tempo de serviço, os AA. e Recorrentes não preenchiam o requisito relativo ao período de 3 anos de exercício de funções dirigentes em 28/02/2013 e em 16/01/2023, as datas em que foram proferidos os despachos do Director Nacional do SEF a reconhecer-lhes o direito de alteração do posicionamento remuneratório.
Portanto, apesar de terem sido proferidos os indicados despachos do Director Nacional do SEF, a verdade é que os AA. e Recorrentes não preenchiam os pressupostos legais necessários à alteração do posicionamento remuneratório.
Logo, estão correctos os fundamentos do parecer desfavorável constante do despacho de 03/06/2019, do Ministro das Finanças, relativamente ao qual os AA. reagem por via desta acção.
Nessa mesma medida, não há que condenar o Ministro das Finanças a emitir o despacho prévio favorável previsto no art.º 18.º, n.º 9, da Lei n.º 114/2017 de 29/12, pois os AA. e Recorrentes não têm direito à invocada alteração remuneratória e, consequentemente, à emissão de um parecer favorável do Ministro das Finanças.
Porque não há igualdade na ilegalidade, irreleva, de todo, a invocação de outras situações, que se dizem idênticas à dos AA. em que a Administração decidiu diferentemente. Mais se note, que a Entidade Demandada advoga que tal situação é diversa dos AA., por se referir a um período temporal dissemelhante.
Em suma, confirma-se integralmente a decisão recorrida, que se subscreve quando decidiu nomeadamente o seguinte: ”Como se pode ver no Mapa I anexo ao Decreto-Lei n.º 290-A/2001 de 17 de Novembro, conjugado com os art.ºs 19.º e 20.º do mesmo decreto lei, a categoria de topo da carreira de investigação e fiscalização é a de inspetor superior, a qual compreende dois níveis, sendo que o acesso ao nível 2 da categoria de inspector superior faz-se de entre inspectores licenciados no mínimo com o nível 1 com, pelo menos, três anos de serviço nesse nível classificados de Muito bom ou cinco anos classificados de Bom, mediante concurso de provas públicas que consistirá na apreciação e discussão: a) Do currículo profissional do candidato; b) De um trabalho versando um tema actual e concreto de interesse para a Administração Pública directamente relacionado com o conteúdo funcional da carreira. E a progressão para o nível 1 da categoria de inspector superior é feita de entre inspectores superiores com o nível 2 com, pelo menos, três anos de serviço nesse nível classificados de Muito bom ou cinco anos classificados de Bom, e nas condições previstas no Regulamento de Progressão da Carreira de Investigação e Fiscalização (CIF), aprovado por portaria do Ministro da Administração Interna, nos termos da lei.
Já a categoria de inspetor – a categoria de ambos os AA- compreende três níveis, sendo que ambos os AA se encontram no nível 1, ou seja, o nível de topo desta categoria que no entanto tem vários níveis remuneratórios (antigos escalões), aplicando-se-lhes o art.º 18.º da Lei 64-B/2008. Com efeito a interpretação feita pelos AA não tem a mínima correspondência na letra da lei. A ser assim, como pretendem os AA, teria o legislador de o ter afirmado expressamente, o que não fez. Importa dizer que desde 17.9.2015, as designações das categorias desta carreira passaram a ter outra designação, de acordo com o disposto no art.º 4.º do Dec.-Lei n.º 198/2015, de 16.9. que se transcreve: “No Decreto -Lei n.º 290 -A/2001, de 17 de novembro, todas as referências legais a «Inspetor superior», a «Inspetor», a «Inspetor -adjunto principal» e a «Inspetor -adjunto», consideram -se feitas respetivamente a «Inspetor coordenador superior», a «Inspetor coordenador», a «Inspetor chefe» e a «Inspetor».” assim se compreendendo a referência feita na p.i. à categoria de inspetor coordenador atualmente detida pelos AA.
(… ) Com efeito, a lei aplicável é o artigo 29.º da Lei 2/04, de 15.1., alterada e republicada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de Agosto, na redação dada pelo n.º 1 do art.º 29.º da Lei 64-A/2008, de 31.12., em vigor desde 1.1.2009, cfr. art.º 174.º, sob a epígrafe, Direito à alteração de posicionamento remuneratório na categoria de origem”…
(…) Como se pode ver, do n.º 2 deste artigo, resulta claramente que este regime, em vigor desde 1.1.2009, se aplica expressamente às carreiras especiais.
(…) A salvaguarda dos direitos dos AA ao reposicionamento indiciário e não o acesso à categoria superior está garantida nos n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 3-B/2010, de 28.4., em vigor desde 29.4.2010…
(…) Como ambas as partes aceitam, após a entrada em vigor da Lei 55-A/2010, de 31.12. (OE2011) ficou proibida a prática de valorizações remuneratórias, cf. dispôs o seu artigo 24.º…
(…) Como ambas as partes aceitam, tal proibição só cessou em 1 de Janeiro de 2018 com a Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro que aprovou o Orçamento de Estado para 2018, artigo 18º n.º 1…
(…) Em face do que antecede, é forçoso concluir que o despacho favorável do Ministro da Administração Interna de concordância com o direito à carreira dos Autores reconhecido por Despachos do Exmo. Senhor Diretor Nacional do SEF de 16 de Janeiro de 2013 e outro de 28 de Fevereiro de 2013, não é exequível, não padecendo de ilegalidade o parecer desfavorável emitido pelo R. na pendência dos autos”.
Em suma, o presente recurso improcede.

III- DISPOSITIVO
Pelo exposto, acordam:
- em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a decisão recorrida
- porque a pretensão dos Recorrentes ficou totalmente vencida, nos termos do art.º 4.º, n.º 2, al. b), e 6 do RCJ, são os Recorrentes responsáveis, em partes iguais, pelos encargos do processo de recurso.

Lisboa, 27 de Julho de 2020.
(Sofia David)

(Dora Lucas Neto)

(Vital Lopes)