Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1203/08.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:03/25/2021
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRC.
ENCARGOS COM CAMPANHAS PUBLICITÁRIAS.
Sumário:Os encargos com campanhas publicitárias, pese embora não corresponderem a imobilizações incorpóreas, atendendo aos efeitos que produzem no aviamento da empresa, devem ser tratados como gastos plurianuais.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão


I- Relatório


G..........., Lda., incorporada, por fusão, na U..........., Lda. deduziu no Tribunal Tributário de Lisboa impugnação judicial contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico interposto contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada sobre a liquidação adicional de IRC nº ..........., emitida em 16.09.2003, respeitante ao ano de 2000, no valor de € 47.635,85, pedindo a sua anulação. O Tribunal Tributário, por sentença proferida a fls. 275 (numeração do SITAF), datada de 11 de setembro de 2020, julgou a acção procedente e anulou a liquidação adicional de IRC e juros compensatórios do ano de 2000 nº ..........., com as legais consequências; bem como julgou procedente o pedido de condenação da Administração Fiscal no pagamento de juros indemnizatórios, a calcular sobre o valor de juros compensatórios indevidamente pago pela Impugnante.

Contra a sentença foram interpostos recurso jurisdicionais, seja por parte da Fazenda Pública, seja por parte da impugnante, conforme requerimentos de fls. 332 e 371 e ss., (numeração do SITAF).
I- Recurso jurisdicional da Fazenda Pública

A Fazenda Pública alega o seguinte:

«(…) // II. Em causa nos autos está a correção levada a cabo pelos Serviços de Inspeção Tributária, no âmbito de uma ação inspetiva, relativamente aos custos incorridos com serviços de publicidade que a Impugnante, ora Recorrida, relevou integralmente no período de tributação de 2000 e que a Inspeção Tributária entendeu que deveriam ser repartidos por três períodos de tributação, de acordo com o disposto no Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12.01, relativo a reintegrações e amortizações.

III. Destaca-se que a Inspeção Tributária não contestou a indispensabilidade de tais encargos para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, mas apenas a não dedutibilidade integral de tais custos num só período de tributação, devendo a dedução ser feita ao longo de três períodos de tributação, com fundamento na norma acabada de citar.

IV. Em consequência da ação inspetiva, foi emitida a liquação de IRC e de juros compensatórios controvertidas.

V. Dão-se aqui por reproduzidos todos os factos provados, enunciados na sentença.

VI. Com efeito, motivou a Meritíssima Juiz a quo a escolha dos factos dados como provados “(...) com base na análise crítica dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo tributário apenso, não impugnados, nas posições assumidas pelas partes nos procedimentos administrativos e no processo judicial, bem como nos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela Impugnante, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório”.

VII. Embora, os factos considerados provados, sejam verdadeiros e reais, não pode a Recorrente concordar que os mesmos revelem a totalidade da verdade material em causa nos presentes autos, por se encontrar a mesma incompleta e insuficiente, o que acarretou numa consequência jurídica injusta e desmedida, a qual, merece censura.

VIII. Pelo que, é firme convicção da ora Recorrente, que a sentença enferma de erro na interpretação dos factos, e consequentemente, na aplicação do Direito aos mesmos, razão pela qual apresenta o presente recurso, com os fundamentos que infra se aduzem.

IX. Apurou a Inspeção Tributária, no âmbito da ação inspetiva supra referida, e no que a esta correção em particular diz respeito, o seguinte [vide ponto 12 da matéria de facto]:

“Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável.

A correcção proposta nos pontos 2.1.1 e 2.1.2, resulta da acção inspectiva interna efectuada à empresa em epígrafe, durante a qual foram solicitados diversos elementos através dos nossos ofícios n. º 2570, 4132 e 6033 datados de 14/02/2003,18/03/2003 e 25/05/2003 respectivamente.

Sobre os referidos elementos obtiveram-se respostas em 20/02/2003, 25/03/2003 e 09/06/2C respectivamente, com os números de entrada 1574, 2701 e 7254 que se juntam ao processo para dele fazerem parte integrante. // 2.1- IRC // 2.1.1- Custos Plurianuais // 2.1.2 Tendo-se analisado a conta 62233 - Publicidade e Propaganda e os documentos enviados verificou-se que os mesmos (vide anexo I), correspondem a despesas e encargos de projecção económica plurianual, devendo por isso ser consideradas como custos em partes iguais em mais que um exercício sendo aquela repartição efectuada por um período mínimo de três anos, de acordo com o artigo 17.ºn.º4 d) do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12/01, como aliás, foi o procedimento seguido pelo contribuinte em anos anteriores, o qual fez reflectir neste exercício custos referentes ao exercício de 1998, de carácter plurianual registados nesta conta através das notas de lançamento n.º 5 e 6 ambas de 3101-2000, pela natureza dos custos em questão o mesmo princípio deverá ser seguido.

No quadro em baixo apresenta-se relação dos custos contabilizados na conta 62233 - Publicidade e Propaganda cujas cópias de anexam (vide anexo I) os quais devem ser repartidos por três anos:





Pelo atrás exposto será de acrescer ao lucro tributável do exercício nesta rubrica o montante de € 117.936,00.

2.1.3- Custos Extraordinários não aceites

2.1.4 [...]

2.1.5- Conclusões

Em resumo temos a efectuar a seguinte correcção ao exercício de 2000:

IRC - Correcções ao Lucro Tributável



(…)

3.3- Correcções

Pelo exposto nos pontos 3.1, 32 as correcções a efectuar ao lucro tributável do exercício passam a ser as seguintes:

IRC - Correcções ao Lucro Tributável





4 - Anexos

Juntam-se 2 anexos no total de 12 (doze) folhas Anexo 1-6 (seis) folhas Anexo II - 6 (seis) folhas

5- IMPRESSOS DE CORRECÇÃO

Para efeitos do processamento das correcções propostas em IRC foram preenchidos os impressos K DC 22 de 2000.

6 - AUTO DE NOTÍCIA/INFORMAÇÃO

Pelas irregularidades descritas no ponto 2 deste relatório, foi levantado o competente auto de notícia.

Lisboa 10 de Julho de 2003 “- cfr. relatório de inspeção tributária de fls. 80 a 107 do volume I do processo instrutor (... ).

X. Em síntese consideraram os SIT que, os custos em causa reportam-se a uma campanha publicitária e os seus efeitos estenderam-se para lá do ano de 2000, tendo-se repercutido também para o ano de 2001, comprovando o carácter plurianual de tais despesas // (Sublinhado nosso).

DOS CUSTOS COM PUBLICIDADE (“CAMPANHA GAMA GALLOPER”)

XI. O conceito de “Campanha Publicitária” engloba um conjunto de medidas e procedimentos desenvolvidos a nível publicitário, no sentido de vender um produto, serviço ou mesmo uma marca.

XII. Essa mesma ideia, se retira dos documentos justificativos da correção levada a cabo pelos Serviços de Inspeção Tributária que constam dos autos, relevados na contabilidade da Recorrida, como custo fiscal, durante o exercício de 2000, que evidenciam que para a “Campanha Gama Galloper”, foram utilizados diversos meios: jornais, revistas, rádio e televisão (conforme referência a “anúncio gravado em CD”).

XIII. Ora, da factualidade provada resulta que no ano de 1998, a Recorrida levou a cabo uma campanha publicitária de relevo, com o objetivo do lançamento do modelo Galloper, cujos custos foram diferidos por três exercícios [cfr. ponto 3 dos factos provados].

XIV. No ano de 1999, a Recorrida levou acabo uma campanha publicitária com carácter de continuidade, com o objetivo de incrementar as vendas no período mais forte, anterior ao verão, cujo custo foi relevado como custo do exercício [cfr. ponto 4 dos factos provados].

XV. No ano de 2000, a Recorrida levou a cabo uma campanha publicitária com carácter de continuidade, com o objetivo de incrementar as vendas no período mais forte, anterior ao Verão, bem como o de escoar as existências, dado que estava ciente de que o contrato de distribuição iria expirar, cujo custo foi relevado integralmente naquele exercício [cfr. ponto 6 dos factos provados].

XVI. Durante o ano de 2000, a Recorrida vendeu 1020 veículos, no valor de total de € 9.782.179,46 [cfr. ponto 7 dos factos provados].

XVII. Durante o ano de 2001, a Recorrida vendeu 125 veículos, no valor de € 551.753,77 [cfr. ponto 8 dos factos provados]. (Realçado nosso).

XVIII. Durante o ano de 2002, a Recorrida registou vendas apenas de peças, no valor de € 776.578 [cfr. ponto 9 dos factos provados].

XIX. O artigo 17.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12.01, respeitante à amortização de imobilizações incorpóreas dispunha à data, o seguinte:

1 - Os elementos do activo imobilizado incorpóreo são amortizáveis quando sujeitos a deperecimento, designadamente por terem uma vigência temporal limitada.

2 - São amortizáveis os seguintes elementos do activo imobilizado incorpóreo:

a) Despesas de instalação;

b) Despesas de investigação e desenvolvimento;

c) Elementos da propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de fabrico, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e cuja utilização exclusiva seja reconhecida por um período limitado de tempo.

3 - Excepto em caso de deperecimento efectivo devidamente comprovado, reconhecido pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, não são amortizáveis os seguintes elementos do activo imobilizado incorpóreo:

a) Trespasses;

b) Elementos mencionados na alínea c) do número anterior quando não se verifiquem as condições aí referidas.

4 - Embora não sendo imobilizações incorpóreas, devem, contudo, ser consideradas como custos, em partes iguais, em mais do que um exercício, as despesas ou encargos de projecção económica plurianual, sendo aquela repartição feita durante um período mínimo de três anos em relação às seguintes:

a) Despesas com a emissão de obrigações;

b) Encargos financeiros com a aquisição ou produção de imobilizado, correspondentes ao período anterior ao da sua entrada em funcionamento, quando não tenha sido utilizada a faculdade prevista no n.º 6 do artigo 2. º;

c) Diferenças de câmbio desfavorável relacionadas com o imobilizado e correspondentes ao período anterior à sua entrada em funcionamento;

d) Encargos com campanhas publicitárias. (…)

XX. Salvo melhor entendimento, da letra da norma anteriormente transcrita, verifica-se que: em primeira análise, que, as despesas ou encargos de projeção económica plurianual, embora não sendo imobilizações incorpóreas, devem ser consideradas como custos, em partes iguais em mais de um exercício económico.

XXI. Assim, entende-se, pelo exposto, que todos os encargos, suportados para a obtenção dos proveitos e manutenção da fonte produtora, em que os seus efeitos se repercutem por mais do que um exercício económico, devem ser repartidos pelos exercícios que o influenciam.

XXII. Em segunda análise, aquela norma define para determinados encargos, na qual se encontra incluído os “encargos com campanhas publicitárias”, um período mínimo de três anos, no qual o respetivo custo se deve repartir.

XXIII. Contrariamente ao entendimento da Meritíssima Juiz a quo, da leitura da referida norma, retira-se que se consideram sempre como de “Projeção económica plurianual”, os encargos com campanhas publicitárias, confirmando o anteriormente estabelecido relativamente ao termo “campanha”.

XXIV. Por fim, retira-se também, que os encargos com campanhas publicitárias, independentemente do número de exercícios, em que projetam os seus efeitos (mesmo quando apenas influenciem dois exercícios), terão obrigatoriamente de ser considerados para efeito de apuramento do resultado fiscal, por um período mínimo de três anos. Deste modo, importa que o custo inerente a esta despesa deve ser também repartido, de modo a imputar, de uma forma correta e adequada, as componentes positivas e negativas do lucro.

XXV. Ora, resultando dos factos provados que durante o ano de 2001, a Recorrida vendeu 125 veículos, no valor de € 551.753,77 [cfr. ponto 8 dos factos provados], tal é demonstrativo que os efeitos da “Campanha Gama Galloper”, não se restringiram somente ao ano de 2000, como considerou a Meríssima Juiz, tendo-se repercutido também para o ano de 2001, comprovando deste modo o carácter plurianual das despesas de publicidade ora em crise.

XXVI. A verdade é que o único motivo que determinou a cessação das vendas em 2001, está relacionado com a extinção do contrato de distribuição exclusivo [cfr. ponto 6 dos factos provados], e não conforme pretende dar a entender a Recorrida, com o “não investimento” em publicidade no ano de 2001, ou 2002.

XXVII. Destarte, salvo o devido respeito, somos de opinião em que a Douta sentença, procedeu à errónea interpretação do preceito legal aplicável.

XXVIII. Efetivamente, a observância do princípio da especialização dos exercícios, bem como da regra citada relativa aos encargos de projeção económica plurianual, determina a impossibilidade da dedução da totalidade do encargo no exercício da sua ocorrência - 2000.

DO DIREITO A JUROS INDEMNIZATÓRIOS // (…)

XXX. Relativamente aos juros indemnizatórios, importa referir que a sentença recorrida violou o estatuído no n.º 1 do artigo 43.º da LGT porquanto não se vislumbra a existência de qualquer erro de direito.

XXXI. É indiscutível que as viaturas de serviço se destinam a venda, ainda que possam temporariamente estar disponíveis para utilização.

XXXII. Assim sendo, não estão preenchidos os pressupostos do artigo 43º, nº 1 da LGT.

XXXIII. Pelo que, nestes termos se impõe a sua revogação e substituição por acórdão que, julgue procedente o presente recurso, e, consequentemente improcedente a presente Impugnação Judicial, nos termos das conclusões que seguem e que V. Exas melhor suprirão, julgando legal a sobredita correção.


X

A recorrida apresentou contra-alegações, conforme segue:

1.a A douta sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a decisão de indeferimento proferida pela Exma. Senhora Diretora de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), em 03.03.2008, que recaiu sobre o recurso hierárquico interposto no âmbito do processo de reclamação graciosa n.º ..........., deduzida contra a liquidação adicional de IRC n.º ..........., de 16.09.2003, relativa ao exercício de 2000, no que à correção materialmente controvertida diz respeito;

2.a O Tribunal a quo julgou provado, com base nos depoimentos das testemunhas arroladas e nos documentos juntos aos autos, vários factos que se revelaram cruciais para a boa decisão da causa, nomeadamente que no ano de 2000, a Impugnante, ora Recorrida, levou a cabo uma campanha publicitária com caráter de continuidade, com o objetivo de incrementar as vendas no período mais forte, anterior ao Verão, bem como o de escoar as existências, considerando que o contrato de distribuição celebrado com a H.......... Company iria brevemente expirar, tendo o custo com essa campanha sido relevado integralmente naquele exercício;

3.a No plano jurídico, entendeu o Tribunal a quo que a aplicação do princípio da especialização dos exercícios deveria ter como contraponto a ordenação do princípio da justiça, sendo que, no caso em apreço, a aplicação da norma constante do artigo 17º, n.º 4, al. d) do Decreto - Regulamentar nº 2/90, de 12 de janeiro ao caso em apreço, tal como defendido pelos serviços da administração tributária, tem de depender da caracterização dos custos como tendo projeção económica plurianual;

4.a O Tribunal a quo entendeu que a caracterização dos encargos suportados com a campanha publicitária como tendo projeção económica plurianual não procedia, na medida em que “Os serviços de publicidade adquiridos pela Impugnante no ano de 2000 tinham, ao contrário dos incorridos em 1998, para lançamento do modelo Galloper, caráter de continuidade, sendo prestados na Primavera para ter reflexo no período mais forte de vendas, antes do Verão, portanto sem projeção para além do próprio ano, sendo os efeitos deste tipo de campanha praticamente nulos ao fim de um período de dois meses - cfr., respetivamente, nº 6, 3 e 11 da matéria de facto assente.” (cf. página 34 da sentença recorrida);

5.a Mais considerou aquele Tribunal que, por ter dado por provado que, no exercício subsequente de 2001, apenas foi efetuada a venda de uma proporção muito pequena de veículos, apenas nos dois primeiros meses do ano e para escoamento total das existências, tais “(...) vendas ocorrem num contexto próprio, de finalização da comercialização dos veículos, na sequência do término do contrato de distribuição, anunciado em 1999 (cfr. nº 5 dos factos provados), não podendo atribuir-se aos efeitos nas vendas da publicidade feita na primavera de 2000, cujos efeitos estariam esgotados se não antes do final do verão, seguramente antes do final do ano - cfr. nº 11 da factualidade dada como provada.” (cf. página 34 da sentença recorrida);

6.a Não se conformando, a Fazenda Pública interpôs recurso assacando à sentença recorrida erro de julgamento de facto e de direito, quanto à interpretação do artigo 17º, nº 4, do Decreto-Regulamentar nº 2/90 e observância do princípio da especialização dos exercícios, pelo que tal deve determinar a dedução da totalidade dos encargos com a campanha publicitária não apenas no exercício de 2000;

7. a Todavia, a Fazenda Pública concretiza um qualquer erro de julgamento da matéria de facto, invocado qualquer erro ou omissão quanto à factualidade dada como provada e não provada e quanto ao julgamento emitido em face da mesma;

8. a Nas alegações de recurso não se identifica uma verdadeira impugnação da matéria de facto em sede de recurso, não se logrando alcançar qual a matéria de facto que deveria ter sido, então, dada por provado por forma a revelar a totalidade da verdade material;

9.a Deste modo, tendo o presente recurso por fundamento exclusivo a matéria de direito, o Tribunal Central Administrativo Sul é incompetente para o seu conhecimento, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 280.º do CPPT;

10. a A Fazenda Pública imputa à sentença recorrida um erro de julgamento considerando que existe uma contradição entre os fundamentos invocados pelo Tribunal a quo para justificar a decisão quanto ao afastamento da dedutibilidade dos custos incorridos com os prémios atribuídos aos angariadores e os fundamentos invocados para afastar a correção referente à incidência de tributação autónoma;

11.a Acresce que a Ilustre Representante da Fazenda Pública não especifica os pontos de facto que considera incorretamente julgados, nem os concretos meios probatórios, constantes do processo, que, em sua opinião, impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, pelo que não cumpriu com o ónus previsto no artigo 640.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT, o que resulta na rejeição do recurso;

12.a O argumento agora invocado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública para reverter o julgado não pode ser atendido considerando que, apesar do facto referente à existência de vendas de viaturas no exercício de 2001 ter sido dado por provado pelo Tribunal a quo, este não constituiu critério ou fundamento da correção encetada pelos serviços da administração tributária;

13.a Constitui entendimento pacífico e consolidado na jurisprudência e doutrina que não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de fundamentação do ato em momento anterior ao litígio, não sendo admitida a apreciação de fundamentação “a posterior” (cf. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 0951/11, datado de 26.02.2014, entre outros e MARCELLO CAETANO, «Manual de Direito Administrativo», volume I, 10.a edição, pág. 479 e volume II, 9.a edição, pág. 1329 e MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, «Direito Administrativo», Volume I, pág. 472);

14.a Cumpre salientar que, ao contrário do que aponta a Ilustre Representante da Fazenda Pública, o Tribunal a quo não deu só por provado que durante o ano de 2001 a Recorrida vendeu 125 veículos, tendo sido dado por provado que “Durante o ano de 2001, a Impugnante vendeu 125 veículos, no valor de € 551.753,77 (110.616.699$00), todos durante os meses de janeiro e de fevereiro operando o escoamento total das existências - cfr. documento nº 8, junto à petição de reclamação graciosa, de fls. 51 a 52 do processo instrutor e depoimento das testemunhas G........ e F........” (cf. ponto 8 dos factos dados por provados, sublinhado nosso);

15.a Tal como debatido no âmbito da impugnação judicial junta aos autos, os efeitos decorrentes da campanha publicitária realizada nos meses de abril e maio do ano de 2000 observaram-se exclusivamente até ao final dos meses de Verão, estando a vendas registadas nos meses de janeiro e fevereiro de 2001 relacionadas com o propósito de escoamento das restantes unidades;

16.a Ao contrário do que sucedeu no ano de 1998, os serviços de publicidade e correspondentes encargos suportados pela Recorrida na Primavera do ano de 2000 tiveram reflexos no período mais forte de vendas, antes do Verão, e por tal sem projeção para além do próprio ano, sendo os efeitos deste tipo de campanha praticamente nulos ao fim de um período de dois meses;

17.a Como ficou provado nos autos, ao contrário do que sucedeu no ano de 1998, os serviços de publicidade e correspondentes encargos suportados pela Recorrida na Primavera do ano de 2000 tiveram reflexos no período mais forte de vendas, antes do Verão, e por tal sem projeção para além do próprio ano, sendo os efeitos deste tipo de campanha praticamente nulos ao fim de um período de dois meses (cf. minutos 00:11:58 a 00:12:12 da gravação do depoimento da testemunha G........ e cf. minutos 00:15:03 a 00:18:14 da gravação do depoimento da testemunha F........);

18.a Neste contexto, e com o devido respeito pelo entendimento da Ilustre Representante da Fazenda Pública, não merece censura a sentença sob recurso porquanto claramente se evidenciou que os encargos em apreço não têm projeção plurianual porquanto serviram um propósito único cujos efeitos se extinguiram no ano de 2000;

19.a O facto de a Recorrida ter vendido veículos no exercício de 2001, tal como dado por provado pelo Tribunal a quo, não é de todo demonstrativo, nem tal evidência pode assim ser interpretada, de que os efeitos da “Campanha Gama Galloper” não se restringiram somente ao ano de 2000, repercutindo-se também para o ano de 2001;

20.a A sentença sob recurso não pode ser censurada uma vez que, ao contrário do entendimento dos serviços da administração tributária, a aplicação do artigo 17.º do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12.01 não pode ser efetuada de forma generalizada, sem atender aos objetivos específicos e às circunstâncias do caso concreto em que as campanhas publicitárias foram realizadas (neste sentido vai o acórdão do TCA Sul proferido no processo de recurso n.º 00750/05, datado de 27.02.2007);

21.a No caso em apreço, a relevação do facto associado ao termo do contrato de distribuição e venda dos veículos da marca Galloper bastaria para compreender que não se está na presença de custos que consubstanciam campanhas publicitárias de carácter plurianual, mas sim de “custos correntes” de publicidade cujos efeitos se esgotam ao fim de 2 ou três meses após a campanha;

22.a É, por isso, evidente que, perante o conhecimento da resolução eminente do contrato de distribuição dos veículos da marca Galloper e considerando a altura do ano mais rentável do negócio, a campanha publicitária iniciada em abril visou incrementar as vendas destes veículos no período de 2000, e em específico nos meses pré-Verão, por forma a aumentar os proveitos finais associados à venda desses veículos num único exercício;

23.a Sem prejuízo do supra exposto, sempre se diga que, ao contrário do apontado pelos serviços de inspeção tributária, no caso vertente estão gastos com publicidade com projeção imediata no exercício de 2000 e a essa conclusão não deve obstar, de modo algum, o facto de nas faturas constar a expressão “Campanha Galloper”;

24.a Por último, não deve ter acolhimento a alegação da Ilustre Representante da Fazenda Pública quando entende que o Tribunal a quo faz uma errónea interpretação do artigo do 17º, nº 4, do Decreto-Regulamentar nº 2/90, assim como no caso em apreço deve ser observado o princípio da especialização dos exercícios

25.a A sentença recorrida não fez uma errónea interpretação do artigo 17.º do Decreto-Regulamentar nem violou o princípio da especialização dos exercícios. Isto porque, o ato tributário em apreço é, manifestamente, ilegal uma vez que a administração tributária desconsidera a dedução ao lucro tributável do exercício da totalidade dos montantes a este imputáveis decorrentes de custos com publicidade num caso em que a Recorrida demonstrou inequivocamente que as despesas com publicidade em causa são indispensáveis para a realização de vendas nesse mesmo ano (de 2000) e que não têm impacto em vendas futuras, tal como determina o disposto no artigo 23.º do Código do IRC;

26.a Em face a todo o exposto, não merece censura a sentença sob recurso, na medida em que aprecia, corretamente, o disposto no artigo 17.º do Decreto-Regulamentar nº 2/90, na redação vigente à data dos factos, concluindo que no caso em apreço os gastos com publicidade incorridos foram devidamente deduzidos apenas no exercício de 2000, não sendo de projeção económica plurianual;

27.a Deve o presente recurso ser julgado improcedente.


X

II- Recurso jurisdicional da impugnante.

A recorrente alega nos termos seguintes:

«1.a Entende a ora Recorrente que, apesar de o Tribunal a quo ter decidido pela procedência da impugnação judicial e ter anulado a liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, e ter julgado procedente o pedido de condenação da administração tributária ao pagamento de juros indemnizatórios sobre os juros compensatórios, o facto é que não julgou procedente o pedido de condenação da administração tributária ao reembolso dos montantes pagos a título de IRC, juros de mora e demais custas processuais cobradas no âmbito do processo de execução fiscal n.º .........., assim como não julgou procedente o pedido de condenação da administração tributária ao pagamento da indemnização por prestação indevida de garantia e o pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios sobre a restante quantia indevidamente paga a título de IRC e acrescidos cobrados no âmbito do aludido processo de execução fiscal;

2.a Considerando que houve decaimento parcial nos pedidos acima identificados, deve o presente recurso ser admitido;

3. a Tendo em conta a reforma do regime dos recursos em processo tributário e uma vez que a disposição transitória consagrada no artigo 13.º da Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, não se afigura isenta de dúvidas, a Recorrente apresenta, desde já, a respetiva alegação de recurso;

4. a A douta sentença recorrida julgou parcialmente procedentes os pedidos constantes da impugnação judicial deduzida contra a decisão de indeferimento proferida pela Exma. Senhora Diretora de Serviços do IRC, em 03.03.2008, que recaiu sobre o recurso hierárquico interposto no âmbito do processo de reclamação graciosa n.º ..........., deduzida contra a liquidação adicional de IRC n.º ..........., de 16.09.2003, relativa ao exercício de 2000;

5. a Atentos os factos dados como provados e não provados, o Tribunal a quo julgou parcialmente procedente os pedidos constantes da impugnação judicial, nos seguintes termos:

a) Enferma de ilegalidade o ato de liquidação do IRC do exercício de 2000, na medida em que a correção encetada pelos serviços de inspeção tributária padece de erro sobre a avaliação e aplicação dos pressupostos quanto à caracterização de certos encargos com publicidade como tendo projeção plurianual (cf. página 35 da sentença recorrida);

b) Considerando os factos dados por provados, foi julgado que tais gastos devem ser relevados integralmente no ano de 2000 (cf. página 35 da sentença recorrida);

c) No que se refere ao pedido de indemnização por prestação indevida de garantia para suspensão do processo de execução fiscal n.º .........., apesar de a ora Recorrente alegar que sofreu prejuízos com a prestação de garantia, não concretiza tais prejuízos nem inclui no pedido uma menção atinente à condenação em indemnização por prestação de garantia (cf. página 40 da sentença recorrida);

d) No que se refere ao pedido de restituição do montante total da dívida tributária pago indevidamente, entende o Tribunal a quo que em virtude da realização, pela Recorrente, de correções simétricas referentes à dedução de 2/3 dos gastos fiscais em cada um dos anos subsequentes de 2001 e 2002, não há lugar a pagamento de imposto em montante superior ao devido, pelo que inexiste obrigação de reembolso dos valores pagos, com a exceção do montante pago a título de juros compensatórios (cf. página 42 da sentença recorrida); e

e) Pelo mesmo motivo, entende o Tribunal a quo que também não há direito ao pagamento de juros indemnizatórios sobre a quantia total da dívida, à exceção dos juros indemnizatórios sobre o montante pago a título de juros compensatórios (cf. página 41 da sentença recorrida).

6.a A Recorrente não pode conformar-se com a sentença recorrida por entender que a mesma é nula por não especificar os fundamentos de facto, bem como por incorrer em erro de julgamento de facto e de direito;

7. a Entende a Recorrente que a sentença incorre em nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto, nos termos do disposto nos artigos 123.º, n.º 2 e 125.º, n.º 1 ambos do CPPT e artigos 607.º, n.º 4 e 615.º, n.º 1, alínea b) ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, na medida em que não procedeu à identificação dos factos dados como não provados;

8.a Como refere JORGE LOPES DE SOUSA “(...) a falta de discriminação da matéria de facto não provada no domínio do contencioso tributário, será equiparável à falta de indicação da matéria de facto provada, para efeitos da nulidade prevista no art. 125.º, n.º 1, do CPPT.” (cf. “Código de Procedimento e Processo Tributário”, Anotado e Comentado, Volume II, 6.a Edição, 2011, Áreas Editora, p. 358; sublinhado nosso), entendimento igualmente seguido pelo Tribunal Central Administrativo Norte nos acórdãos de 08.03.2012 (processo n.º 00329/05.1BEMDL) e de 12.05.2016 (processo n.º 00162/07.6BEPNF);

9.a No caso vertente, a fundamentação aduzida pelo Tribunal a quo não ficou limitada aos factos dados por provados e não provados, tendo aquele Tribunal efetuado um juízo sobre um facto que, afinal, considera não ter sido provado, neste caso sobre o facto de alegadamente a Recorrente não ter evidenciado que incorreu em prejuízos com a garantia bancária prestada para suspensão do processo de execução fiscal;

10.a Entende a Recorrente que a sentença incorre, igualmente, em nulidade por falta de apreciação crítica da prova, nos termos do disposto nos artigos 123.º, n.º 2 e 125.º, ambos do CPPT e dos artigos 154.º e 607.º do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, por não ter apreciado os factos alegados à luz da prova produzida, nomeadamente a prova documental;

11.a Refere JORGE LOPES DE SOUSA, a propósito da nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto ou de direito, que “Relativamente à matéria de facto, esta nulidade abrange não só a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo n.º2 do art. 123.ºdeste Código, como a falta do exame crítico das provas, previsto no n.º3 do art. 659.º do CPC.'’" (cf. “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, Volume I, 2006, p. 906; sublinhado nosso. No mesmo sentido vide Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes in “Dos recursos - regime do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24.08”, 2009, Quid Juris, Sociedade Editora, p. 240; Alberto Ruço, in “Prova e formação da convicção do juiz”, Almedina, 2016, p. 288 e acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 15.04.2009, proferido no âmbito do recurso n.º 1115/08);

12.a Assim, in casu há uma evidente falta de apreciação crítica da prova, porquanto a emissão da garantia bancária (junta como documento n.º 3 à petição inicial) dependeu do pagamento do Imposto de Selo no valor total de € 376,51, pelo que não poderia o Tribunal ter concluído pela falta de evidência de prejuízos causados com a prestação da garantia para suspensão do processo de execução fiscal;

13.a Acresce que existe, ainda, falta de apreciação crítica da prova quanto ao facto de a ora Recorrente não ter incluído no pedido qualquer menção atinente à condenação por indemnização por prestação de garantia indevida, porquanto o mesmo foi incluído nos termos do documento n.º 4 junto à petição inicial;

14.a Mais ainda, não há uma análise crítica ao documento n.º 6 junto à petição inicial, porquanto aquele vem evidenciar que a ora Recorrente não se limitou a efetuar o pagamento do imposto e juros compensatórios, tendo efetuado o pagamento - indevido - dos juros moratórios (no montante de € 4.137,04), das custas devidas no processo de execução fiscal (no valor de € 13,55) e da taxa de justiça acrescida em sede deste processo (no valor de € 169,59);

15.a Sem prejuízo do exposto, e admitindo-se que as nulidades da sentença supra referidas não seriam procedentes, o que apenas por dever de prudente patrocínio se concebe, ainda assim sempre seria de anular a sentença recorrida com fundamento em erro de julgamento de facto;

16.a Efetivamente, face à prova produzida, designadamente à prova documental, outros factos deveriam ter sido dados como provados, pelo que é forçoso concluir que a prova não foi integralmente valorada pelo Tribunal a quo;

17.a Também não se verifica que tenha sido impugnada a autenticidade ou a genuinidade da prova produzida para a demonstração dos factos que a Recorrente pretendia comprovar, pelo que não subsiste motivo, com o devido respeito, para a falta de valoração integral da força probatória da prova produzida;

18.a Por isso, não pode a Recorrente deixar de impugnar os pontos do probatório da sentença recorrida, por manifesta insuficiência, na medida em que, concomitantemente com os factos ali descritos, deveriam ter sido dados como provados os seguintes factos:

a) A ora Recorrente prestou uma garantia bancária, concedida pelo Banco M........., para suspensão do processo de execução fiscal n.º .........., na qual é mencionado expressamente que foi liquidado uma quantia de € 376,51 a título de Imposto do Selo para emissão da mesma (cf. documento n.º 3 junto à petição inicial junta aos autos), tendo sido suportado essa quantia pela Recorrente;

b) No pedido de indemnização apresentado pela ora Recorrente foi incluído uma menção atinente à condenação por indemnização por prestação de garantia indevida, nos termos do qual se requere que “(...) ao abrigo do disposto no Artº 53ºda Lei Geral Tributária e no Artº 171º do Código de Procedimento e Processo Tributário, solicitar que, logo que a Administração Fiscal concorde que lhe assiste razão, lhe sejam reembolsados os prejuízos resultantes da prestação da garantia bancária nº ........., solicitada por essa Direcção de Finanças por oficio datado de 2004/02/11, afim de para suspender o Processo Executivo n.º .........., relativo à referida liquidação.” (cf. documento n.º 4 junto com a petição inicial junta aos autos);

c) No exercício do IRC de 2000, a Recorrente reportou um montante de imposto a recuperar de € 7.271,74 e a administração tributária liquidou adicionalmente um montante de € 47.635,85 decorrente das correções efetuadas pelos serviços de inspeção tributária (cf. demonstração de liquidação junta como documento n.º 6 junto à reclamação graciosa junta aos autos); e

d) A Recorrente efetuou um pagamento voluntário da dívida tributária em valor muito superior ao valor devido no exercício de IRC de 2000, tendo suportado indevidamente um montante adicional de imposto e juros compensatórios (no valor de € 47.635,85), juros moratórios (no montante de € 4.137,04), custas devidas no processo de execução fiscal (no valor de € 13,55) e taxa de justiça acrescida em sede deste processo (no valor de € 169,59) (cf. documento n.º 6 junto à petição inicial junta aos autos).

19.a Para todos os efeitos legais, designadamente para efeitos do disposto no artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, dá-se como impugnada a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, na parte em que não deu como provados os factos acima referidos, pelo que reputando-se os mesmos como essenciais para a decisão da causa, incorre a sentença recorrida também em erro de julgamento da matéria de facto, devendo, assim, ser anulada;

20.a A sentença recorrida padece, ainda, de vício de erro de julgamento da matéria de direito;

21.a Efetivamente, o Tribunal incorre em erro de julgamento ao não se pronunciar pela condenação da administração tributária ao pagamento de uma indemnização por prestação indevida da garantia;

22.a Isto porque, o juízo sobre a existência de um efetivo prejuízo decorrente da prestação indevida de uma garantia bancária apenas deverá ser relevado em momento posterior, em sede do processo referente à ação de execução de julgados, porquanto será nesse processo que o juiz terá de apurar se e qual o montante que a administração tributária deve pagar a título de indemnização;

23.a O Tribunal deve, pois, aferir se o ato tributário é ilegal e se foi prestada uma garantia bancária para suspensão do processo de execução fiscal adjacente à dívida tributária cobrada pelo ato ilegal, sendo certo que só no caso de o impugnante não provar que prestou garantia bancária, conforme é seu ónus, deve o Tribunal julgar improcedente o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida (neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», Volume II, 2006, p. 325);

24.a Resulta do artigo 171.º do CPPT e 53.º da LGT, que o direito indemnizatório adjacente é totalmente evidente nos casos em que existe a prestação de garantia bancária, porquanto se pressupõe que a mesma não é concedida de forma gratuita e sem qualquer oneração (cf. acórdão datado de 09.01.2019, proferido no processo n.º 03025/17.3BEPRT 0585/18 e acórdão proferido no processo n.º 0152/13, datado de 21.01.2015);

25.a Quanto à obrigação e forma de efetuar o pedido de indemnização no âmbito da impugnação judicial, e tal como esclarecido pela jurisprudência, o objeto central do processo de impugnação judicial é a anulação do ato ilegal provocado pela conduta da administração tributária violadora das normas e princípios tributários, e consequentemente a condenação ao pagamento de indemnização, seja a título de juros indemnizatórios ou por garantia indevidamente prestada (cf. acórdão do STA de 21.01.2015, proferido no processo n.º 0152/13);

26.a Assim, outra conclusão não se alcança que não seja a de que, perante a evidência da existência de uma garantia bancária prestada para suspensão de um processo de execução fiscal para cobrança coerciva de uma dívida anulada pelo Tribunal, não poderia este abster-se de condenar a administração tributária a indemnizar a ora Recorrente pela prestação e manutenção de garantia indevida, pelo que a sentença recorrida enferma não só de vício por errónea interpretação da lei ordinária, mas é inconstitucional por violação do artigo 22.º da CRP, o que desde já se invoca para todos os efeitos legais;

27.a A sentença recorrida padece, ainda, de vício de erro de julgamento da matéria de direito quanto à falta de condenação da administração tributária ao reembolso do imposto e acrescidos e ao pagamento de juros indemnizatórios;

28.a A circunstância de a Recorrente ter efetuado, por mera cautela, correções simétricas ao seu lucro tributável nos anos subsequentes de 2011 e 2002, não pode conduzir ao entendimento que a mesma não tem direito ao reembolso de todas as quantias que teve de indevidamente pagar, considerando que a administração tributária está obrigada a proceder à reconstituição da situação hipotética que existiria caso não fosse cometida a ilegalidade, nos termos e para os efeitos do artigo 100.º da LGT;

29.a A situação hipotética no presente caso seria, naturalmente, a não emissão de uma liquidação adicional de imposto - i.e. o pagamento apenas do imposto autoliquidado pela ora Recorrente - que não obrigasse o sujeito passivo ao pagamento de imposto e acrescidos (ou, em primeiro momento, à prestação de uma garantia bancária para suspensão do processo de execução fiscal);

30.a O Tribunal a quo incorre em erro de apreciação do pressuposto legal vertido no artigo 100.º da LGT, porquanto a administração tributária não estará, em caso de trânsito em julgado da decisão judicial, obrigada a refletir as correções simétricas no eventual reporte de prejuízos fiscais, porquanto tal seria, na prática, uma validação da correção efetuada pelos serviços de inspeção tributária ao exercício de 2000;

31.a Assim, a única forma de repor, integralmente, a legalidade e cumprir o artigo 100.º da LGT será proceder à anulação da correção ao lucro tributável efetuada no ano de 2000, assim como as demais correções efetuadas pela ora Recorrente nos anos subsequentes, sendo certo que, anulando-se tais correções, devem, então, ser restituídos todos os montantes de imposto e acrescidos indevidamente pagos pela Recorrente, e não apenas os montantes de juros compensatórios como entende o Tribunal a quo;

32.a Mais ainda, o princípio jurídico-constitucional da igualdade na repartição dos encargos públicos, consagrado no artigo 13.º da CRP, impõe que o administrado não seja prejudicado pela privação de receita em benefício da comunidade, quando em causa está um ato administrativo ilegal e desproporcional que foi anulado (cf. JORGE LOPES DE SOUSA, «Sobre a Responsabilidade Civil da Administração Tributária por actos ilegais - Notas Práticas», Áreas editora, Direito, n.º 3, 2010 páginas 54 e 55);

33.a Ao negar o direito ao reembolso das quantias pagas a título de imposto e acrescidos, com o fundamento no facto de a Recorrente já ter beneficiado do efeito provocado pelas correções simétricas ao lucro tributável dos exercícios subsequentes de 2001 e 2002, o Tribunal a quo incorre não só em violação do artigo 100.º da LGT, mas também a sua interpretação do aludido preceito legal é violadora dos artigos 22.º e 33.º da CRP, porquanto ignora o imperativo legal de reposição da legalidade e a anulação de todos os seus efeitos ex tunc;

34.a O mesmo entendimento vale para o erro de julgamento referente à falta de condenação da administração tributária ao pagamento de juros indemnizatórios sobre a quantia da dívida de imposto e acrescidos, porquanto no caso em apreço estão cumpridos todos os requisitos legalmente impostos pelo artigo 43.º, n.º 1 da LGT;

35. a No que se refere ao último requisito acima identificado, resulta da demonstração de liquidação adicional de IRC do exercício de 2000, que a Recorrente reportou um montante de imposto a recuperar de € 7.271,74 e a administração tributária liquidou adicionalmente um montante de € 47.635,85 decorrente das correções efetuadas pelos serviços de inspeção tributária (cf. demonstração de liquidação junta como documento n.º 6 à reclamação graciosa junta aos autos), o que só poderá conduzir à conclusão que, nesse exercício e em virtude das correções efetuadas pelos serviços, a Recorrente efetuou um pagamento de imposto em montante muito superior ao que era legalmente devido;

36.a Ao contrário do que defende o Tribunal a quo, o facto de terem sido efetuadas, por cautela, correções simétricas ao lucro tributável nos exercícios subsequentes, não pode constituir um fator impeditivo do direito ao pagamento dos juros indemnizatórios sobre a totalidade da dívida tributária indevidamente paga, uma vez que a operação de reconstituição da situação tributária passa pela anulação dessas correções efetuadas e pela restituição da totalidade dos montantes indevidamente pagos, acrescido dos legais e devidos juros indemnizatórios, como forma de ressarcir a Recorrente pelo tempo que se encontrou privada da totalidade da quantia paga (neste sentido acórdão proferido no processo n.º 1770/12.9BELRS; cf. CARLOS ALBERTO CADILHA, «Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais entidades Públicas, Anotado; JOÃO TABORDA DA GAMA, «Erros, serviços, e vícios na atribuição de juros indemnizatórios - comentário ao Ac STA n.º 772/04, de 17-11 (Rel. Baeta de Queiroz)», Fiscalidade - Revista de Direito e Gestão Fiscal, n.º 23, Julho-Setembro 2005, Publicações do Instituto Superior de Gestão., página 23);

37.a Tal equivale a dizer que a sentença recorrida erroneamente interpreta o disposto no artigo 43.º e 100.º da LGT à luz do caso em apreço, assim como a essa interpretação é violadora do direito indemnizatório constitucionalmente consagrado nos termos do artigo 22.º da CRP, o que desde já se invoca para todos os efeitos legais;

38.a Termos em que deve ser a sentença revogada e substituída por outra que condene a administração tributária à restituição das quantias pagas indevidamente a título de imposto e acrescidos, assim como ao pagamento dos juros indemnizatórios sobre a totalidade das quantias indevidamente pagas.

Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida e, nessa medida, emitindo-se uma nova decisão que julgue a impugnação judicial procedente nos termos peticionados (…).

Sendo o valor da ação superior a € 275.000,00, requer-se que, verificando-se os pressupostos, seja o Recorrente dispensado do pagamento da taxa de justiça remanescente, ao abrigo do disposto no n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais.»


X


A recorrida não apresentou contra-alegações.

X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado, tendo emitido parecer no sentido da improcedência do recurso.

X

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

X

II- Fundamentação.

A sentença recorrida assentou na seguinte fundamentação de facto:

«1. A Impugnante foi constituída em 31.12.1997, sendo sócia única a M........, S.A., com o objeto social de "importação, comércio e representação de veículos motorizados, venda de peças e acessórios” - cfr. documento nº 4, junto à petição de reclamação graciosa, de fls. 41 a 45 do processo instrutor;

2. A constituição da Impugnante serviu o propósito de comercializar, sob a marca Galloper, um único modelo, correspondente ao modelo anterior do Mitsubishi Pajero, de produção coreana e de mais baixo custo, o qual foi lançado em 1998 com perspetiva de ficar desatualizado a breve trecho - cfr. depoimento das testemunhas G........ e F........;

3. No ano de 1998, a Impugnante levou a cabo uma campanha publicitária de relevo, com o objetivo do lançamento do modelo Galloper, cujos custos foram diferidos por três exercícios - cfr. depoimento das testemunhas G........ e F........;

4. No ano de 1999, a Impugnante levou a cabo uma campanha publicitária com caráter de continuidade, com o objetivo de incrementar as vendas no período mais forte, anterior ao Verão, cujo custo foi relevado como custo do exercício - cfr. depoimento das testemunhas G........ e F........;

5. Com data de 13.08.1999, a Impugnante recebeu carta da H.......... Company, da qual consta: «Dear Mr. P........,

This is the Termination Notice pursuant to Article 2.02 of the Distributorship Agreement dated on 1st day of December, 1997.

Since HDPIC merged into HMC as of 31 st of July, 1999, it has become inevitable to reorganize the distribution network of H.......... Vehicles and Parts in order to avoid market & customer confusion caused by the existence of two different distributors of H.......... Products in your country. Therefore, we are forwarding this Termination Notice pursuant to Article 2.02 of the above mentioned Distributorship Agreement. Termination of said Distributorship Agreement will become effective two years from the tenth business day from the date of deposit with express courier by us.

We sincerely hope that you understand the situation and cooperate with the reorganization of our distribution network.» - cfr. documento nº 6, junto à petição de reclamação graciosa, de fls. 47 do processo instrutor;

6. No ano de 2000, a Impugnante levou a cabo uma campanha publicitária com carácter de continuidade, com o objetivo de incrementar as vendas no período mais forte, anterior ao Verão, bem como o de escoar as existências, dado que estava ciente de que o contrato de distribuição iria expirar, cujo custo foi relevado integralmente naquele exercício - cfr. depoimento das testemunhas G........ e F........;

7. Durante o ano de 2000, a Impugnante vendeu 1020 veículos, no valor total de € 9.782.179,46 - cfr. documento nº 7, junto à petição de reclamação graciosa, de fls. 48 a 50 do processo instrutor e depoimento das testemunhas G........ e F........;

8. Durante o ano de 2001, a Impugnante vendeu 125 veículos, no valor de € 551.753,77 (110.616.699$00), todos durante os meses de janeiro e de fevereiro operando o escoamento total das existências - cfr. documento nº 8, junto à petição de reclamação graciosa, de fls. 51 a 52 do processo instrutor e depoimento das testemunhas G........ e F........;

9. Durante o ano de 2002, a Impugnante registou vendas apenas de peças, no valor de € 776.579 - cfr. documento nº 9, junto à petição de reclamação graciosa, de fls. 53 do processo instrutor;

10. No meio publicitário, o termo "campanha” é utilizado para designar uma panóplia vasta de realidades, desde a utilização de uma única peça publicitária em apenas um meio de comunicação até à utilização de várias peças em vários meios, bem como para designar publicidade que visa apenas manter comunicação com o cliente ou publicidade mais agressiva, designadamente para

lançamento de novos produtos - depoimento das testemunhas A........ e J........;

11. Os efeitos nas vendas de uma campanha de publicidade de continuidade esgotam-se em períodos curtos, em geral não mais de dois meses, e mesmo campanhas de publicidade mais massivas, como as de lançamento de novos produtos, necessitam de ser complementadas por posteriores campanhas tendentes a manter comunicação com o cliente - depoimento das testemunhas G........ e J........;

12. Sob a ordem de serviço nº 25743, de 12.02.2003, foi efetuada ação inspetiva incidente sobre o exercício de 2000 da aqui Impugnante, da qual resultaram correções ao lucro tributável no valor de € 117.936,00, com os seguintes fundamentos:

"Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável

A correcção proposta nos pontos 2.1.1 e 2.1.2, resulta da acção inspectiva interna efectuada à empresa em epígrafe, durante a qual foram solicitados diversos elementos através dos nossos ofícios n.º 2570, 4132 e 6033 datados de 14/02/2003,18/03/2003 e 25/05/2003 respectivamente.

Sobre os referidos elementos obtiveram-se respostas em 20/02/2003, 25/03/2003 e 09/06/2C respectivamente, com os números de entrada 1574, 2701 e 7254 que se juntam ao processo para dele fazerem parte integrante.

2.1- IRC

2.1.1- Custos Plurianuais

Tendo-se analisado a conta 62233 - Publicidade e Propaganda e os documentos enviados verificou-se que os mesmos (vide anexo I), correspondem a despesas e encargos de projecção económica plurianual, devendo por isso ser consideradas como custos em partes iguais em mais que um exercício sendo aquela repartição efectuada por um período mínimo de três anos, de acordo com o artigo 17.º n.º 4 d) do Decreto Regulamentar n º 2/90 de 12/01, como aliás, foi o procedimento seguido pelo contribuinte em anos anteriores, o qual fez reflectir neste exercício custos referentes ao exercício de 1998, de carácter plurianual registados nesta conta através das notas de lançamento n.º 5 e 6 ambas de 31-01-2000, pela natureza dos custos em questão o mesmo princípio deverá ser seguido.

No quadro em baixo apresenta-se relação dos custos contabilizados na conta 62233 - Publicidade e Propaganda cujas cópias de anexam (vide anexo I) os quais devem ser repartidos por três anos:





Pelo atrás exposto será de acrescer ao lucro tributável do exercício nesta rubrica o montante de € 117.936,00.

2.1.2    - Custos Extraordinários não aceites [...]

2.1.5 - Conclusões

Em resumo temos a efectuar a seguinte correcção ao exercício de 2000:

IRC - Correcções ao Lucro Tributável





3- DIREITO DE AUDIÇÃO

Notificado o sujeito passivo, nos termos do artigo 60º da Lei Geral Tributária e artigo 60º do Regime Complementar da Inspecção Tributária pelo nosso ofício n.º8890, exerceu o Direito de Audição, através carta entregue nos serviços em 02-07-2003, com o registo entrada n.º9398, que se junta ao processo para dele fazer parte integrante, e em resposta à mesma temos a efectuar as seguintes considerações:

3.1 - Custos Plurianuais

Refere o Sujeito Passivo que não concorda com as correcções propostas nesta rubrica, devido ao facto de não se estar perante o lançamento de um novo modelo nem o objectivo foi o de incrementar vendas futuras, considerando que os custos ocorridos em 2000 são de carácter repetitivo e continuado e se esgotam no próprio exercício.

Pelo atrás descrito, informa-se que conforme o disposto no artigo 17.º n.º4 alínea d), do Decreto Regulamentar 2/90 são considerados como custos de projecção plurianual os encargos com Campanhas Publicitárias devendo proceder-se ao seu seu deferimento por um período mínimo de 3 anos.

Os encargos, em causa e cujo o seu deferimento se propõe tratam-se claramente de encargos com campanhas publicitárias como aliás aparece mencionado na maioria dos documentos ("Campanha Galloper - vide anexo I), entende-se assim que os custos incorridos pela sua natureza não são de carácter repetitivo e continuado, conforme argumenta o Sujeito Passivo constatando-se os efeitos pretendidos com a obtenção destes custos, se reflectem nos exercícios seguintes. Pelo exposto anteriormente propõe-se que se mantenham as correcções referidas nesta rubrica, no montante de € 117.936,00.

3.2- Custos Extraordinários não Aceites

Embora tivessem sido solicitados durante o Procedimento Interno de Inspecção os documentos justificativos deste custo, estes nunca foram enviados pelo Sujeito Passivo, facto que em audição vem o mesmo reconhecer o lapso cometido, enviando durante o prazo concedi Direito de Audição os respectivos justificativos para os encargos incorridos.

Desta forma explicou que esses custos derivam basicamente de pequenas diferenças durante as actividades de rotina do Armazém de peças e de diferenças detectadas em contagens físicas globais.

Refere ainda que estes ajustamentos são inevitáveis e decorrem da própria actividade derivando fundamentalmente de trocas de digitação de referências. Considerando-se o custo incorrido nesta rubrica plenamente justificado propõe- se a anulação da correcção referida nesta rubrica.

3.3- Correcções

Pelo exposto nos pontos 3.1, 3.2 as correcções a efectuar ao lucro tributável do exercício passam a ser as seguintes:

IRC - Correcções ao Lucro Tributável





4 - Anexos

Juntam-se 2 anexos no total de 12 (doze) folhas Anexo 1-6 (seis) folhas Anexo II - 6 (seis) folhas

5- IMPRESSOS DE CORRECÇÃO

Para efeitos do processamento das correcções propostas em IRC foram preenchidos os impressos K DC 22 de 2000.

6- AUTO DE NOTÍCIA/INFORMAÇÃO

Pelas irregularidades descritas no ponto 2 deste relatório, foi levantado o competente auto de notícia.

Lisboa 10 de Julho de 2003 “- cfr. relatório de inspeção tributária de fls. 80 a 107 do volume I do processo instrutor;

13. Em consequência da ação inspetiva, foi emitida a liquidação de IRC nº ..........., respeitante ao ano de 2000, e respetivos juros compensatórios, no valor de € 6.239,86, resultante no valor total a pagar de € 47.635,85, com data limite de pagamento em 3.11.2003 - cfr. doc. nº 6, junto aos autos com a petição inicial;

14. Em 17.11.2003, a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação identificada supra, pedindo a sua anulação, com os fundamentos e juntando os documentos constantes de fls. 2 a 53 do volume II do processo instrutor;

15. Para cobrança da liquidação identificada supra, foi instaurado o processo de execução fiscal nº .......... - cfr. doc. nº 4, junto aos autos com a petição inicial e fls. 111 do volume I do processo instrutor;

16. Em 24.03.2004, a ora Impugnante apresentou a garantia bancária nº ........, para suspensão do processo de execução fiscal identificado supra - cfr. doc. nº 3, junto aos autos com a petição inicial;

17. Em 24.03.2004, a ora Impugnante apresentou pedido de indemnização dos prejuízos resultantes da prestação da garantia bancária identificado no número anterior - cfr. doc. nº 4, junto aos autos com a petição inicial;

18. Em 30.11.2005, a Impugnante efetuou o pagamento voluntário da liquidação identificada supra e acrescidos, no valor total de € 51.956,03 - cfr. doc. nº 6, junto aos autos com a petição inicial e fls. 114 do volume I do processo instrutor;

19. A Impugnante solicitou, e foi efetuada, a correção dos custos dedutíveis, com respeito aos anos de 2001 e 2002, para efeitos de apuramento do lucro tributável da Impugnante, de modo a refletir a parte considerada não dedutível no ano de 2000 - admissão por acordo;

20. No âmbito do procedimento de reclamação graciosa, tramitada sob o nº ........, foi elaborada pela Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa informação da qual consta, designadamente, o seguinte:

«- ALEGAÇÕES DA RECLAMANTE

Vem o contribuinte identificado de fls. 2 a 14 dos autos reclamar contra a liquidação adicional nº ..........., datada de 16.09.2003, no valor de € 47.635,85, do IRC do exercício de 2000, através de petição apresentada em 17.11.2003, ao abrigo do art.º 68º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), com os fundamentos constantes da petição e que se dão como integralmente reproduzidos.

II - ANÁLISE DO PEDIDO

A reclamação é tempestiva (art. º 70º e 102º CPPT);

O processo é o meio próprio (art. º 68º CPPT);

E a reclamante tem legitimidade (art. º 9º e 68º CPPT).

Após consulta dos elementos disponíveis cumpre-me informar o seguinte:

1. A reclamante foi objecto de uma acção de inspecção que abrangeu o ano de 2000, relativa ao IRC, da qual resultaram correcções técnicas no valor de € 117.936.00, relativas a 2/3 dos custos não aceites com publicidade e propaganda, um vez que deveriam ser diferidos nos dois exercícios seguintes, 2001 e 2002.

2. Acontece que em 26.01.2004 a reclamante apresentou uma reclamação graciosa (n.º ........) em que não contesta as correcções efectuadas pela AF relativamente ao exercício de 2000, requerendo somente a consideração de 1/3 dos custos com publicidade e propaganda que não foram aceites para 2000, conforme consta da leitura do relatório da fiscalização.

3. Consultado o sistema informático verifica-se que em 01.09.2004 foi elaborado uma declaração de correcção, para 2001, em que se contempla o custo de 1/3, no valor de € 58.968,00.

4. Assim, estando já contemplado este custo, como custo do exercício de 2001, não poderá também ser contemplado como custo do exercício de 2000, sob pena de duplicação de custos.

5. Ainda assim, sempre se dirá que relativamente a estes custos, custos com publicidade e propaganda, nos termos da alínea d) do n.º 4 do D. Regulamentar nº 2/90, os custos com campanhas publicitárias são considerados como custos de projecção plurianual, devendo proceder-se ao seu deferimento por um período mínimo de 3 anos.

6. Nos documentos apresentados pela reclamante, em sede de acção de inspecção, refere-se expressamente "Campanha Galloper", o que confirma o seu enquadramento na referida norma.

7. Aliás, foi este o procedimento da reclamante para os custos referentes ao exercício de 1998.

CONCLUSÃO

Nestes termos, face aos elementos probatórios existentes nos autos e que suportam o pedido, proponho o indeferimento do mesmo, de harmonia com os fundamentos invocados na presente informação.

III - INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR

1. Realizada a instrução do processo, foi elaborado o projecto de decisão de fls. 134 a 137, dos presentes autos, o qual foi notificado à reclamante, por carta registada, através do ofício n.º 35753 de 07.06.2005, a fim de exercer o direito de audição previsto no art.º 60º da Lei Geral Tributária, tendo-lhe sido concedido o prazo de 15 dias nos termos do n.º 5 do mesmo artigo.

2. Decorrido o referido prazo, veio a reclamante exercer esse direito, em 20.06.2005.

3. Através da análise da petição verificamos que o sujeito passivo não acrescenta nada de novo que possa alterar o projecto de decisão, pelo que sou de opinião que deve ser mantida a decisão de indeferimento do pedido, de harmonia com os fundamentos descritos no projecto de decisão.

4. Acresce referir que inicialmente a reclamante foi notificada, por carta registada (ofício n.º 27283 de 06.05.2005 - registo CTT n.º RS ........), do projecto de decisão para a morada "Rua Dr. …………..- nº 38 …… Lisboa", tendo a carta sido devolvida com a indicação de "desconhecido".

5. Nos termos do art. 39º do CPPT, as notificações presumem-se feitas no 3º dia posterior ao do registo ou no 1ºº dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.

6. Assim, tendo em conta o disposto na lei, a reclamante ter-se-ia como notificada em 09.05.2005 e o prazo para o exercício do direito de audição terminaria em 24.05.2005, sem que o tivesse exercido, uma vez que não chegou a receber a carta.

7. Tendo em vista acautelar as garantias dos sujeitos passivos, a AF entendeu voltar a notificar a reclamante, por carta registada (ofício nº 35753 de 07.06.2005), e com a referência de "2g Notificação", sem que para tal esteja obrigada, para a outra morada de que tinha conhecimento e que constava no processo de reclamação graciosa "Povos - 2601 - 997 Vila Franca de Xira".

8. Esta correspondência foi recepcionada e a reclamante exerceu o direito de audição prévia.

9.  Não se entende, pois, a referência à incorrecção da morada, quando a AF só teve intenção de acautelar um direito fundamental dos contribuintes, o direito de participação na tomada de decisão da AF.

10. Relativamente ao IRC de 2001, nomeadamente à correcção efectuada pela AF da qual a reclamante alega que nunca recebeu qualquer valor a título de reembolso, cumpre informar que a declaração de correcção, em que se contemplam os custos de 58.968,00, deu origem à liquidação n.º …….. de 24.01.2005, com um reembolso final apurado de 17.125,68, exactamente como alega a reclamante.

11. O reembolso foi emitido em 17.06.2005, cheque n.º…………., e encontra-se em pagamento.

III - PROPOSTA DE DECISÃO

Analisados os elementos a seguir assinalados:

X Fundamentos invocados na petição da reclamante

X Informação da Inspecção Tributária X Outros elementos carreados para o processo E atendendo à:

X Legitimidade da reclamante X Tempestividade do pedido

E nos termos da presente informação, propõe-se que a reclamação seja:

X Indeferida.» - cfr. fls. 156 a 160 do processo instrutor;

21. Por despacho de 8.08.2005, foi decidido o indeferimento da reclamação graciosa, com os fundamentos das informações e pareceres antecedentes - cfr. fls. 156 do processo instrutor;

22. Em 23.08.2005, foi assinado o aviso de receção do ofício de comunicação do indeferimento da reclamação graciosa - cfr. fls. 161 e 162 do processo instrutor;

23. Em 5.09.2005, a Impugnante presentou recurso hierárquico, dirigido ao Ministro das Finanças, contra o indeferimento da reclamação graciosa identificada supra, com os fundamentos e juntando os documentos de fls. 3 a 20 do processo instrutor;

24. No âmbito do procedimento de recurso hierárquico, tramitado sob o nº 2333/2006 foi elaborada pela Divisão de Administração II da Direção de Serviços do IRC informação da qual consta, designadamente, o seguinte:

«INTRODUÇÃO

Em requerimento dirigido ao Exmo. Senhor Ministro das Finanças, vem o sujeito passivo G..........., Lda., com sede na Trav. ……………Loja 8 ……….TUIAS, com o NIF………, recorrer do despacho de indeferimento proferido no processo de reclamação graciosa n.º ..........., deduzida na sequência da notificação da liquidação adicional de IRC, referente ao exercício de 2000, no valor de € 47.635,85.

2- RECURSO HIERÁRQUICO

2. 1 FUNDAMENTOS DO RECURSO HIERÁRQUICO

A recorrente foi inspeccionada ao exercício de 2000 onde foram feitas correcções no valor de € 117.936,00 correspondentes a 2/3 dos custos que a Administração Fiscal considera de carácter plurianual e a recorrente entende serem de natureza publicitária.

Para a recorrente estes custos não se enquadram no espírito do n.º 4 do Art.º 17.º do Dec. Reg. N.º 2/90 porque só os custos com campanhas de carácter plurianual é que têm de ser diferidos por mais de um exercício.

Que estas despesas com publicidade incorridas em 1999 e 2000, cujo efeito se esgotou completamente nas vendas desses mesmos exercícios, foram consideradas na totalidade como custos de cada um desses exercícios.

Faz a invocação dos princípios de contabilidade geralmente aceites, da certificação das contas referentes ao exercício de 2000, notas do preâmbulo do CIRC e normas fiscais insertas no CIRC como os Art.ºs 17º, 18º, 23º e Artºs 5.º, 11.º e 58º da LGT como forma de demover a Administração Fiscal a aceitar como custo dum só exercício os 2/3 do valor da correcção ao exercício de 2000.

Atenta a errada aplicação da al. d) do nº 4 do art. 17º do Dec. Reg. Nº 2/90, porquanto o referido diploma apenas estabelece a obrigatoriedade de repartir por mais de um exercício, despesas com publicidade com projecção económica plurianual o que não é o caso das despesas corrigidas pela Administração Fiscal, requer a anulação da liquidação de IRC e correspondentes juros compensatórios relativa ao exercício de 2000.

2. 2 ANÁLISE DO RECURSO HIERÁRQUICO

Com este procedimento bem como com o que o precedeu pretende-se confirmar ou corrigir eventuais erros que os serviços cometeram aquando da acção inspectiva levada a efeito junto da recorrente e referente ao exercício de 2000 mas sem entrar em discussões académicas sobre determinados conceitos, porquanto está claramente determinado que em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas a tributação é feita pelo lucro real efectivo, dando-se, deste modo, cumprimento ao imperativo constitucional contido no Art. º 104 n.º 2 da Constituição da República.

Assim, o lucro tributável é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos do Código do IRC. (Art.º 17.º n.º 1).

Como claramente consta deste último parágrafo a contabilidade e as normas que a regulamentam não foram momento algum afastadas. Para o apuramento da situação contributiva dos contribuintes, refere o n.º 1 do Art.º 17 º do CIRC que o lucro tributável é apurado a partir do resultado contabilístico corrigido nos termos previstos no CIRC.

Ou seja, entre a contabilidade e a fiscalidade, como bem se refere no nº 10 do preâmbulo do CIRC, embora já não exista uma separação absoluta, verifica-se também, que não existe uma identificação total e o resultado consiste em fazer reportar, na origem, o lucro tributável ao resultado da contabilidade a que foram introduzidas as correcções previstas no Capítulo III - Determinação da Matéria Colectável do Código do IRC bem assim da legislação complementar, como o Dec. Reg. 2/90, de 12.01, para onde remetem os respectivos artigos do referido capítulo.

Daqui não pode concluir-se que o resultado contabilístico deve coincidir com o resultado fiscal como também não pode ser posta em crise a contabilidade executada segundo as normas que a regulamentam já que as correcções foram feitas extra-contabilisticamente e por imperativo das normas fiscais.

Com a invocação dos Art. º s 18.º e 23.º do CIRC a pretensão da recorrente não é justificada porque as correcções determinadas pela lei fiscal são feitas, como bem se refere na última parte do n.º1 do Art.º 17.º do CIRC, à margem da contabilidade, extra-Contabilisticamente, só para efeitos de avaliação da situação contributiva da recorrente e manter-se-á a necessidade de efectuar esse tipo de correcção enquanto se mantiverem as diferenças, tratamento contabilístico e fiscal relativas a estas matérias.

Sobre a invocação que é feita da norma contida no Art.º 5.º da LGT não descortinam em que medida se encontram violados os princípios da igualdade, da legalidade e justiça material, nele consagrados, na justa medida em que tem sido este o entendimento que a Administração Fiscal tem posto em prática em todas as situações desta natureza.

Sobre a interpretação das normas e descoberta da verdade material, Art.º 11.º e 58.º, o relatório das conclusões da acção é claro. Neste pode ser verificado que foram desenvolvidas as diligências necessárias, junto da recorrente, para que não restassem dúvidas sobre a qualificação do facto tributário como sendo encargos de projecção económica plurianual ficando esta qualificação clarificada com o facto de alguns documentos de suporte desses custos referirem que se trata da Campanha Galloper 2000.

Perante estes factos, foi feita nos termos previstos na al. d) do nº 4 do art. 17º do Dec. Reg. Nº 2/90, de 12.01, a correcção que para o caso se impunha.

No capítulo da fundamentação da decisão teremos que remeter a recorrente para o parecer do Chefe de Equipa e despacho do Sr. Chefe de Divisão para poder verificar que estamos perante uma declaração de concordância com os fundamentos de anterior parecer emitido sobre o relatório de inspecção tributária.

Sobre a avaliação dos resultados das campanhas publicitárias diremos que não é tarefa que não consta do leque de competências da Administração Fiscal. A esta cabe avaliar a situação contributiva dos contribuintes e desencadear os mecanismos conducentes a arrecadação dos tributos de forma a por em prática os princípios fundamentais da justiça, da igualdade, da proporcionalidade e da boa fé, entre outros.

Tendo em conta a natureza da operação, Campanha Galloper 2000, não restam dúvidas de que se trata de encargos incorridos com uma campanha publicitária e como tal enquadráveis na previsão da al. d) do n.º 4 do Art. º 17.º do Dec. Reg. n.º 2/90, de 12.01, pelo que devem ser repartidos por um período mínimo de três anos. Conclui-se, por estas razões, que a actuação da recorrente ao considerar o valor total da campanha como custo do exercício de 2000 não tem acolhimento na moldura legal em vigor ao tempo.

4- DIREITO DE AUDIÇÃO

Tendo em conta que nesta fase a Administração Tributária, apenas, aprecia os factos que lhe foram dados pelo contribuinte, limitando-se na sua decisão a fazer a interpretação das normas legais aplicáveis ao caso e ainda que no procedimento anterior, reclamação qraciosa já lhe foi concedido o direito de audição, propomos que nos termos do disposto no nº 3 do art. 60º da LGT seja dispensada a audição do contribuinte.

5- Conclusões

Em resultado da apreciação supra explanada propõe-se a manutenção do despacho recorrido e em consequência que seja negado provimento ao presente recurso hierárquico.

Propomos, ainda que em relação à parte dos encargos referentes à campanha Galloper que não foram aceites para efeitos fiscais no exercício de 2000 se proceda em conformidade com o determinado no Ofício Circulado n.º 14/93, de 23.11.1993.» - cfr. processo instrutor;

25. Por despacho de 3.03.2008, foi decidido o indeferimento do recurso hierárquico, com os fundamentos antecedentes, e determinado que se procedesse em conformidade com o ofício circulado nº 14/93 - cfr. processo instrutor;

26. Em 24.04.2008, foi assinado o aviso de receção do ofício de comunicação do indeferimento do recurso hierárquico - cfr. processo instrutor;

27. Em 17.07.2008, a petição inicial de impugnação foi remetida a este Tribunal, por correio registado - cfr. vinheta postal de fls. 77 dos autos, em suporte papel.

Matéria de facto não provada:

Inexistem factos com relevância para a decisão da causa que importe destacar como não provados.

Motivação da decisão sobre a matéria de facto:

A convicção do tribunal formou-se com base na análise crítica dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo tributário apenso, não impugnados, nas posições assumidas pelas partes nos procedimentos administrativos e no processo judicial, bem como nos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela Impugnante, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.

As testemunhas G........, F........, A........ e J........, à data dos factos, respetivamente, Diretor de Marketing da Impugnante, auditor interno da empresa mãe, M........, Diretor Financeiro e técnico de contas da Group M, central de compras do grupo empresarial em que se inseria a Impugnante, depuseram de forma clara, segura, e com naturalidade, demostrando conhecimento direto dos factos, nomeadamente sobre o historial e contexto em que foi constituída a Impugnante e dos serviços de publicidade a que recorreu, bem como sobre as características e objetivos subjacentes aos serviços de publicidade a que respeitam os custos em causa nas correções contestadas.

O depoimento da testemunha R......., inspetor tributário que realizou o procedimento inspetivo, solicitado a fazer a identificação dos critérios utilizados para determinar o caráter plurianual dos gastos com publicidade incorridos no exercício de 2000, em causa nos autos, revelou-se hesitante e pouco circunstanciado, referindo elementos não mencionados no relatório de inspeção, como é o caso da relação entre aquele gasto e o volume de negócios, aliás, referenciado em dissonância com os elementos documentais constantes dos autos.»


*

2.2. Direito

2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento em que terá incorrido a sentença recorrida, quanto à apreciação da matéria de facto assente, quanto ao direito aplicável e quanto à correcta qualificação dos encargos com campanhas publicitárias.

2.2.2. A sentença julgou procedente a impugnação, com a consequente anulação da liquidação adicional de IRC de 2000 (e juros compensatórios). Considerou que:

«[o]s serviços de publicidade adquiridos pela Impugnante no ano de 2000 tinham, ao contrário dos incorridos em 1998, para lançamento do modelo Galloper, caráter de continuidade, sendo prestados na Primavera para ter reflexo no período mais forte de vendas, antes do Verão, portanto sem projeção para além do próprio ano, sendo os efeitos deste tipo de campanha praticamente nulos ao fim de um período de dois meses - cfr., respetivamente, n.º 6, 3 e 11 da matéria de facto assente. // Mais se provou que no ano subsequente, de 2001, apenas foi efetuada a venda de uma proporção muitíssimo menor de veículos, apenas nos dois primeiros meses do ano para escoamento total das existências (cfr. nº 7 e 8 dos factos provados). // Estas vendas, portanto, ocorrem num contexto próprio, de finalização da comercialização dos veículos, na sequência do término do contrato de distribuição, anunciado em 1999 (cfr. nº 5 dos factos provados), não podendo atribuir-se aos efeitos nas vendas da publicidade feita na primavera de 2000, cujos efeitos estariam esgotados se não antes do final do verão, seguramente antes do final do ano - cfr. nº 11 da factualidade dada como provada».

2.2.3. Antes de entrarmos na apreciação do mérito do recurso, cumpre referir que o mesmo incide, seja sobre a correcta aplicação do direito, seja sobre a correcta apreciação da matéria de facto, pelo que assiste competência a este TCAS para dirimir o litígio (artigo 280.º/1, do CPPT).

2.2.4. A recorrente invoca a errada interpretação dos factos e insuficiência da matéria de facto. Quanto a este último vício, a mesma não concretiza os termos da sua alegação. Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente imputação.

No que respeita ao alegado erro na apreciação da matéria de facto, cumpre referir o seguinte.

Está em causa a liquidação adicional de IRC de 2000, por a AT entender que os custos com publicidade devem ser relevados como custos com projecção plurianual, nos termos do artigo 17.º/4/d), do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12.01 (diploma que estabelece o regime das reintegrações e amortizações». A norma em apreço estatui que, «[e]mbora não sendo imobilizações incorpóreas, devem, contudo, ser consideradas como custos, em partes iguais, em mais do que um exercício, as despesas ou encargos de projecção económica plurianual, sendo aquela repartição feita durante um período mínimo de três anos em relação às seguintes: (…) // d) Encargos com campanhas publicitárias».

Do probatório resultam os elementos seguintes:
i) No ano de 2000, a Impugnante levou a cabo uma campanha publicitária com carácter de continuidade, com o objetivo de incrementar as vendas no período mais forte, anterior ao Verão, bem como o de escoar as existências, dado que estava ciente de que o contrato de distribuição iria expirar, cujo custo foi relevado integralmente naquele exercício (n.º 6).
ii) Durante o ano de 2000, a Impugnante vendeu 1020 veículos, no valor total de € 9.782.179,46 – (n.º 7).
iii) Durante o ano de 2001, a Impugnante vendeu 125 veículos, no valor de € 551.753,77 (110.616.699$00), todos durante os meses de janeiro e de fevereiro operando o escoamento total das existências – (n.º 8).
iv) Durante o ano de 2002, a Impugnante registou vendas apenas de peças, no valor de € 776.579 (n.º 9).
v) No meio publicitário, o termo "campanha” é utilizado para designar uma panóplia vasta de realidades, desde a utilização de uma única peça publicitária em apenas um meio de comunicação até à utilização de várias peças em vários meios, bem como para designar publicidade que visa apenas manter comunicação com o cliente ou publicidade mais agressiva, designadamente para lançamento de novos produtos (n.º 10).
vi) Os efeitos nas vendas de uma campanha de publicidade de continuidade esgotam-se em períodos curtos, em geral não mais de dois meses, e mesmo campanhas de publicidade mais massivas, como as de lançamento de novos produtos, necessitam de ser complementadas por posteriores campanhas tendentes a manter comunicação com o cliente (n.º 11).

O dissídio entre as partes reside na questão de saber se os gastos em causa consumam a sua eficácia no exercício da sua realização (2000) ou, inversamente, produzem efeitos para além do exercício em que foram contraídos, implicando o protrair no tempo da sua inscrição contabilística.

Antes de mais, cumpre referir que do probatório resultam, também, os elementos seguintes:
i) A Impugnante foi constituída em 31.12.1997, sendo sócia única a M........, S.A., com o objeto social de "importação, comércio e representação de veículos motorizados, venda de peças e acessórios” (n.º 1).
ii) A constituição da Impugnante serviu o propósito de comercializar, sob a marca Galloper, um único modelo, correspondente ao modelo anterior do Mitsubishi Pajero, de produção coreana e de mais baixo custo, o qual foi lançado em 1998 com perspetiva de ficar desatualizado a breve trecho – (n.º 2).
iii) No ano de 1998, a Impugnante levou a cabo uma campanha publicitária de relevo, com o objetivo do lançamento do modelo Galloper, cujos custos foram diferidos por três exercícios – (n.º 3).
iv) No ano de 1999, a Impugnante levou a cabo uma campanha publicitária com caráter de continuidade, com o objetivo de incrementar as vendas no período mais forte, anterior ao Verão, cujo custo foi relevado como custo do exercício (n.º 4).

Dos elementos coligidos nos autos resulta que os custos com campanhas publicitárias, objecto da correcção em apreço incidem sobre o modelo Galloper, comercializado pela recorrida, seja em unidade, seja através da sua assistência. Ou seja, do probatório resulta que tais custos implicam um investimento na marca e no modelo em causa, cuja projecção na geração de proveitos não se esgota no exercício em que tais custos foram incorridos. O que significa que o seu relevamento não pode ser sujeito à regra da especialização dos exercícios, segundo a qual «[o]s proveitos e os custos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios» (artigo 18.º/1, do CIRC). Mesmo a cessação do contrato de distribuição do modelo em causa (Agosto de 1999[1]) não tem o efeito de restringir ao exercício em que são incorridos (2000) os efeitos dos gastos com campanhas publicitárias em causa. É que a ligação da marca/modelo à empresa prevalece para além desse exercício, até porque a comercialização desenvolvida pela recorrida incide sobre cada unidade, bem como sobre as peças necessárias à assistência técnica daquelas. De onde se extrai que a sentença não apreciou corretamente a matéria de facto assente.

Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida incorreu em erro na apreciação da matéria de facto, pelo que deve ser revogada, nesta parte.

Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.

2.2.5. A recorrente sustenta que a sentença incorreu em erro quanto ao direito aplicável, dado que a correcção em apreço aplicou o preceito do artigo 17.º/4/d), do Decreto-Regulamentar n° 2/90, de 12 de Janeiro (que estabelece o regime das reintegrações e amortizações para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas), o qual é aplicável ao caso.

Apreciação. A este propósito, constitui jurisprudência fiscal assente a seguinte:
i) «De acordo com o artigo 17°, n° 4, do Decreto-Regulamentar n° 2/90, de 12 de Janeiro resulta que, não sendo imobilizações incorpóreas, devem, contudo, ser consideradas como custos, em partes iguais, em mais do que um exercício, as despesas ou encargos de projecção económica plurianual, sendo aquela repartição feita durante um período mínimo de três anos. // Assim, tratando-se de custos suportados com campanhas publicitárias, dado assumirem características estruturais que por vezes as fazem prolongar por mais que um exercício, por estarem ligadas, normalmente, ao lançamento de novos produtos, deverão ser equiparadas a imobilizações incorpóreas e amortizáveis (para efeitos fiscais) de acordo com as regras definidas na alínea d) do n° 4 do artigo 17.° acima referido, que estabelece o respectivo regime.»[2].
ii) «O valor incorporado na empresa com a realização de campanha publicitária é passível de incorporação no activo imobilizado do impugnante/recorrido, como activo intangível. //As características do activo intangível são as seguintes: identificabilidade; controlo por parte da empresa e obtenção de benefícios económicos futuros. // Os custos incorridos com a aquisição de activo intangível, como sucede com os encargos com campanhas publicitárias, são susceptíveis de amortização, no prazo de três anos»[3].

Em face dos dados coligidos nos autos, forçoso se torna concluir no sentido do carácter plurianual dos gastos em presença. Trata-se de despesas com campanha publicitária que se repercute nas vendas dos exercícios posteriores, dado que estão associadas a um modelo e marca comercializado pela impugnante. Servem o objectivo da implantação da mesma no mercado nacional. Incorporam o próprio valor da empresa que comercializa a marca em referência, pelo que os gastos em presença projectam-se, não apenas na geração de proveitos do exercício em que foram incorridos, mas também nos exercícios posteriores, como o probatório documenta. De onde resultam efeitos até no plano do goodwilll da empresa[4]. Não assumem relevância apenas no exercício em que foram efectuadas as acções publicitárias (2000), mas também nos exercícios posteriores, pelo que o seu custo deve ser relevado nos exercícios futuros, como se referiu na correcção em exame, a qual deve ser mantida na ordem jurídica, dado que não enferma de qualquer erro ou vício.

Ao julgar em sentido discrepante, a sentença sob recurso deve ser revogada e substituída por decisão que não julgue procedente a presente impugnação.

Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.

2.2.6. A recorrente censura também o segmento decisório relativo à sua condenação no pagamento de juros indemnizatórios.

Apreciação. «São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» (artigo 43.º/1, da LGT).

No caso em exame, a liquidação impugnada não enferma do erro de direito que lhe foi apontado, pelo que falta a demonstração do pressuposto relativo ao erro imputável aos serviços, o qual condiciona o arbitramento de juros indemnizatórios. Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida incorreu em erro, pelo que deve ser revogada e substituída por decisão que julgue improcedente o pedido em apreço.

Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.

2.2.7. No que respeita ao recurso jurisdicional interposto pela impugnante, atendendo a que o mesmo versa sobre o reembolso do imposto pago, bem como sobre o pedido de condenação da Administração tributária no pagamento da indemnização por prestação indevida de garantia, verifica-se que tal recurso incide sobre pedidos que são dependentes do pedido principal, de impugnação da liquidação. Deste modo, a improcedência deste último determina a improcedência dos primeiros. Pelo que se impõe julgar prejudicado o conhecimento do recurso jurisdicional em apreço.

2.2.8. No que respeita ao pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça. A este propósito, cumpre referir o seguinte.

Nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, «[n]as causas de valor superior a €275000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento». Como decorre da Tabela I do RCP, quando o valor da causa seja superior a €275.000,00, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada €25.000 ou fracção, três unidades de conta, no caso da coluna A, uma e meia unidade de conta no caso da coluna B e quatro e meia unidades de conta no caso da coluna C. «É esse remanescente, ou seja, o valor da taxa de justiça correspondente à diferença entre €275.00,00 e o efectivo superior valor da causa para efeito da determinação daquela taxa, que deve ser considerado na conta final, se o juiz não dispensar o seu pagamento»[5]. «A referência à complexidade da causa significa, em concreto, a sua menor complexidade ou simplicidade e a positiva atitude de cooperação das partes»[6].

Nos termos do artigo 527.º, n.º 1, do CPC, «[a] decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito». Nos termos do n.º 2 do preceito, «[e]ntende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for».

No caso em exame, o valor da causa corresponde a €47.635,85, o mesmo é inferior a €275.00,00, pelo que a norma do 6.º, n.º 7, do RCP, não é aplicável ao caso.

Motivo porque se impõe rejeitar o pedido em apreço.


DISPOSITIVO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso da Fazenda Pública, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a impugnação, e não conhecer do recurso interposto pela impugnante.

Custas pela recorrida no recurso da Fazenda Pública e pela impugnante, no recurso por si interposto.

Registe.

Notifique.

O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Desembargadoras Lurdes Toscano e Maria Cardoso.


(Jorge Cortês - Relator)

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[1] N.º 5, do probatório.
[2] Acórdão do TCAS, 27-02-2007, P. 00750/05.

[3] Acórdão do TCAS, 11-05-2017, P. 1253/10.1BELRS.

[4] «O valor do goodwill de uma empresa estará sempre relacionado com a capacidade de criação de lucros dessa empresa, a qual pode derivar de diversos vectores (v.g. superior capacidade de gestão; marketing e publicidade eficaz; localização estratégica). Em termos contabilísticos o goodwill é caracterizado como um activo intangível que somente é reconhecido quando se verifica uma transacção de compra de uma empresa, através da diferença verificável entre o preço pago e o justo valor dos respectivos activos líquidos» (V. Acórdão do TCAS, de 14-04-2016, P. 05631/12).
[5] Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, anotado, 4.ª ed., p. 236.
[6] Salvador da Costa, Regulamento das Custas…, cit., p. 236.