Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:110/17.5BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:11/14/2019
Relator:VITAL LOPES
Descritores:DECISÃO ARBITRAL;
OMISSÃO DE PRONÚNCIA;
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO;
CONTRADIÇÃO DOS FUNDAMENTOS COM A DECISÃO.
Sumário:1. Os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artº.27, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artº.28, nº.1, do RJAT, correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artº.125, nº.1, do C.P.P.T., com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artº.615, nº.1, do C. P. Civil.
2. Haverá omissão de pronúncia, susceptível de demandar a nulidade de sentença (artsº 125º do Código de Procedimento e Processo Tributário e 615º n.º 1 al. d) do Código de Processo Civil) sempre que o tribunal não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer e que se não mostre prejudicada pelo conhecimento e decisão porventura dado a outras, nomeadamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento.
3. Só a absoluta falta de fundamentação – e não a sua insuficiência, mediocridade ou erroneidade – integra a previsão da al. b) do n.º 1 do art. 615.º do NCPC, cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento. Erro de julgamento que escapa aos poderes de pronúncia do TCA.
4. Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al. c), do C. P. Civil, é nula a sentença (acórdão) quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão.
5. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada. No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL
1 – RELATÓRIO
E....... & C........ em PORTUGAL, vem, ao abrigo do disposto no artigo 27.º e alíneas a), b) e c) do artigo 28.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (doravante RJAT), aprovado pelo D.L.n.º10/2011, de 20 de Janeiro, impugnar o acórdão arbitral proferido no processo n.º573/2016 – TCAAD, pelo Tribunal Arbitral Colectivo constituído junto do Centro de Arbitragem Administrativa (doravante CAAD).

A Impugnante termina as alegações da impugnação formulando as seguintes Conclusões:
«
“(texto integral no original; imagem)”
“(texto integral no original; imagem)”
“(texto integral no original; imagem)”
».

A impugnada, Autoridade Tributária e Aduaneira, apresentou contra-alegações em que expendeu o seguinte quadro Conclusivo:
«
A. Em causa está a decisão arbitral proferida no processo n° 573/2016-T que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), de acordo com o disposto no
Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, aprovado pelo DL n° 10/2011, de 20 de Janeiro, no qual foi julgado improcedente o pedido para apreciação da ilegalidade das liquidações adicionais n.° 2016 8….., 2016 8…… e 2016 8….., que correspondem, respetivamente, aos exercícios de 2012, 2013 e 2014, relativas ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (lRC).

B. Não se conformando com a decisão arbitral proferida, deduziu a Recorrente a presente impugnação, alegadamente com fundamento nas alíneas a), b) e c), do n.° 1, do artigo 28.° do RJAT, pugnando, a final, que a mesma seja declarada nula.

C. Na verdade, a Impugnante não logra demonstrar nas alegações que para o efeito produziu, de que forma é que a douta decisão arbitral padece dos vícios de cariz processual que lhe são imputados.

D. Ao confrontar a decisão arbitral com a Impugnação ora apresentada, não se vislumbra em que medida o douto Acórdão arbitral padece do vício de falta de fundamentação de facto e de direito, assim como de alegada oposição dos fundamentos com a decisão, e, muito menos, em que medida se está perante uma omissão de pronúncia.

E. Ora, o vício apontado de oposição entre os fundamentos e a decisão ocorre, nas palavras utilizadas no douto Acórdão do TCAS, proferido no processo n.°05946/12, em
05-03-2015 «quando os fundamentos invocados na decisão conduzam, num processo lógico, a solução oposta àquela que foi adoptada, e não quando a sentença interpreta os factos, documentos e normas em sentido diverso do propugnado pelo recorrente».

F. Assim como, constitui jurisprudência assente desse TCA Sul (ver, por todos, o Acórdão prolatado no processo 08065/14, em 03-05-2015) que:l/ - A insuficiência, mediocridade ou inadequação dos fundamentos de facto e direito são susceptíveis de colidir com o valor doutrinal da decisão, mas não acarretam a nulidade da sentença por falta de fundamentação dos fundamentos de facto e de direito por esta pressupor a total
ausência daqueles fundamentos. III — A nulidade da sentença por oposição entre os fundamentos e a decisão verificar-se-á sempre que a conclusão extraída pelo julgador for totalmente divergente ou oposta àquela a que necessariamente conduziria o raciocínio que imediatamente a antecedeu. »

G. Esclarece o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Áreas Editora, 6 Edição, Volume II, 2011,
pág. 360: Porém, deverão considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação. Com efeito, a fundamentação destina-se a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão. Por isso, quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação.».

H. Será, também, de trazer à colação o douto acórdão proferido por esse Tribunal no processo n.° 02832109, de 15/05/2014, onde pode ler-se: Nos termos do preceituado no art°.668, n°. 1, al.b), do C.P.Civil (cfr.actual aif'.615, n°1, al.b), do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.arl°.607, n°.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação».

I. Questão diferente da nulidade por falta de fundamentação, da qual não padece a decisão impugnada, é a discordância que a Impugnante manifesta relativamente à decisão de improcedência dos vícios imputados à liquidação, mas as decisões arbitrais apenas admitem recurso quanto à apreciação do mérito da pretensão deduzida isto é,
quanto ao seu conteúdo decisório, para o Supremo Tribunal Administrativo e para o Tribunal Constitucional com os fundamentos expressamente previstos no artigo 25.° do RJAT.

J. Ou seja, os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reação da decisão arbitral para o Tribunal Central Administrativo consistem na impugnação de tal
decisão, nos termos do artigo 27.° do RJAT, com os fundamentos previstos no artigo 28.°, n.° 1, do RJAT, os quais se reportam a situações formais, de competência ou procedimentais que, como se demonstrará, não se verificam na decisão em apreciação.

K. Ora, o Tribunal Arbitral definiu as seguintes questões a decidir (cf. decisão arbitral,
ponto II): "O presente Tribunal apreciará e decidirá do mérito da causa, que consiste em
apreciar se o período de vida útil de 20 anos definido pela Requerida no âmbito das correções aritméticas na base das liquidações de IRC n.°s 2016 8….., 2016 8…… e 2016 8……. para os aerogeradores eólicos do Parque Eólico de Sobrado se considera como razoável, tendo em consideração a regulação aplicável, nos termos do que resultava, à data relevante dos factos, do n.° 2 do artigo 31.° (exercícios de 2012 e 2013) e do n.° 3 do artigo 31.° (exercício de 2014) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) e do n.° 3 do artigo 5.° do Decreto Regulamentar n.° 25/2009, de 14 de setembro. 11. Neste objeto, cabe resolver as questões suscitadas pela Requerente quanto ao erro nos pressupostos de facto e de direito das correções aritméticas determinativas das liquidações impugnadas no que concerne à consideração do período de vida útil esperado dos aerogeradores do Parque Eólico de Sobrado de 20 anos, correspondente a uma taxa de depreciação de 5%, em vez do período de 16 anos adotado pela Requerente, correspondente a uma taxa de depreciação de 6,25%, bem como quanto à violação dos princípios constitucionais da igualdade e da tributação do lucro real"

L. Na douta decisão arbitral foram considerados como não provados os seguintes factos
(cf. ponto 13 da decisão arbitral): "13. Ainda com relevo para a decisão da causa, o Tribuna/julga como não provados os seguintes factos: i) O esforço e desgaste a que os aerogeradores do Parque Eólico do Sobrado estão sujeitos, por força da sua localização na região montanhosa da Serra de Montemum, dado o relevo do terreno, constituído por uma série de encostas íngremes, e as condições climatéricas adversas, com ventos muito fortes, determina um tempo de vida útil dos componentes dos aerogeradores não superior a 16 anos (alegações constantes dos n.°s 133.° e 134.° da P1). i9 Existe um histórico de reparações e manutenções já efetuados no Parque Eólico do Sobrado que patenteia a deterioração dos equipamentos, com problemas de funcionamento antes mesmo de completarem dez anos (alegações constantes dos n.°s 137.° e 138.° da P1). iii) O período de utilidade esperada dos aerogeradores do Parque Eólico do Sobrado, nas particulares condições climatéricas e de relevo do terreno do local onde estão instalados, é inferior a 20 anos (alegação constante dos n.°s 140.° e 141.0 da PI)."

M. Especifica a decisão arbitral, no ponto 14, que: "A conviccão do Tribunal sobre os factos dados como provados resultou do exame dos documentos anexados aos autos, do
reconhecimento de factos efetuado pela Requerente, dos depoimentos das testemunhas indicadas. que revelaram conhecimento direto da matéria reportada no ponto n,° II do probatório, tudo conforme se especifica nos Pontos da matéria de facto acima enunciados." (sublinhado nosso).

N. Discorda-se veementemente do alegado pela aqui Recorrente quando afirma que "(...) o Tribunal Arbitral escusa-se a conhecer de uma matéria que, alegadamente, está
incluída na "discricionariedade técnica" o que consubstancia uma omissão de pronúncia conducente à nulidade da decisão arbitral (...) (cf. artigo 31.0 da Impugnação)

O. Como já foi transcrito, a convicção explanada na decisão Impugnada formou-se com
base na prova documental e testemunhal carreada para os autos, que, por seu turno, conduziu à conclusão que o critério utilizado pela entidade aqui Impugnada se revelava
razoável, dentro dos critérios legalmente definidos.

P. Ora, entendeu o Tribunal arbitral que "(. . .) parece que o legislador veio dar o espaço
necessário à Requerida para definir, dentro de um critério de razoabilidade, o período
de vida útil dos bens para os quais não se encontram fixadas as taxas de depreciação.
43. Em face do exposto, aos olhos do Tribunal terá que se apreciar a questão decidenda, tendo por base essa premissa. (cf. pontos 42 e 43 da decisão arbitral).

Q. Atendendo ao facto de estar legalmente determinado que, perante a contingência de
não se encontrar fixada a taxa de depreciação aplicável às torres eólicas, compete à Autoridade Tributária e Aduaneira, tendo em consideração o período de vida útil esperada do bem, aplicar o critério que for mais razoável.
R. Foi proferida a decisão arbitral com a seguinte fundamentação (cf. decisão arbitral):" 48. Pois bem, no que concerne a este período de utilidade ou de vida útil esperada, a prova produzida, nos termos acima indicados em sede de decisão sobre a matéria de facto (n.°s 13 e 14), não permite concluir pela comprovação de circunstâncias concretas determinativas de um período de vida útil esperado inferior a 20 anos em relação aos específicos equipamentos aerogeradores em causa nos autos, de modo a reputar desrazoável a fixação administrativa da utilidade esperada de 20 anos. 49. Ora, fica claro para o Tribunal que a Lei confere à Requerida a discricionariedade técnica necessária para que esta, dentro dos limites da razoabilidade, fixe um período de vida útil esperada para os elementos para os quais não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização. 50. E, tendo a Requerida o poder (conferido por Lei) para fazê-lo, deverá ser a Requerente, não concordando com a correção da Requerida, a demonstrar que a aludida razoabilidade não foi cumprida, nos termos do n.° 1 do artigo
74° da Lei Geral Tributária ("LGT'). 51. Com efeito, "o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre
quem os invoque" 62. Não se tendo comprovado que o período de vida útil esperado dos aerogeradores do Parque Eólico do Sobrado é inferior a 20 anos não se pode considerar verificado erro nos pressupostos de facto e de direito das correcções aritméticas que estão na base das liquidações impugnadas.

S. Concluiu a douta decisão no seguinte sentido: "65. A Requerida, nos limites da discricionariedade técnica que lhe é conferida, definiu, com base num critério de razoabilidade, um período de vida útil esperado para os aerogeradores da Requerente, o qual provocou uma correção ao resultado fiscal apurado pela última. 66. A Requerente, não satisfeita com essa correção, decidiu impugnar a mesma, cabendo-lhe, assim, o ónus de provar porque é que o critério da Requerida não era razoável, nos termos do artigo 74.° da LGT 67. A Requerente, apesar de ter recorrido a uma taxa de amortização aplicável a um grupo de ativos que em nada se assemelha aos aerogeradores (Grupo 3 Máquinas, Aparelhos, Ferramentas), não demonstrou que a fixação da vida útil esperada dos aerogeradores do Parque Eólico de Sobrado em 20 anos é desrazoável. 68. Não tendo a Requerente demonstrado que o critério utilizado pela Requerida não era razoável, não deverá ser procedente o seu pedido de declaração de ilegalidade das liquidações previamente mencionadas."

T. Ao contrário do alegado pela aqui Impugnante o douto Tribunal Arbitral não se eximiu de decidir escudando-se, alegadamente, na discricionariedade reservada à entidade aqui impugnada.

U. Pelo contrário, competia à Recorrente provar o motivo pelo qual o critério utilizado pela Impugnada não seria razoável, não o tendo logrado fazer, não podia a decisão arbitral, perante os factos provados e a base legal a aplicar, ter sido noutro sentido que não no sentido da improcedência do pedido arbitral.

V. Por outro lado não obstante não ser fundamento de lmpuqnacão a reavaliacão judicial
da prova testemunhal não se pode conceder que a Impugnante pretenda, nesta sede, deturpar a convicção formada pelo Tribunal Arbitral, alicerçada, também, no depoimento do Senhor M....... .
W. Concretamente, para melhor entendimento da asserção anteriormente feita, no que ao depoimento da testemunha M....... diz respeito, decorre da decisão
arbitral:" 15. Quanto aos factos dados como não provados, os documentos juntos aos autos e os depoimentos das testemunhas arroladas pela Requerente, M……
, trabalhador da Requerente há 17 anos com funções na parte técnica do funcionamento de parques eólicos, e que desde 2009 se deslocou por sete ou oito vezes ao Parque Eólico do Sobrado, e A....... , engenheiro eletrotécnico, sócio gerente de empresa prestadora de serviços na área da manutenção elétrica para a Requerente, apenas permitiram concluir pela não demonstração dos factos a que se reportam as alegações acima indicadas no n.° 13, como se passa a explicitar. 16. A testemunha M....... deu indicação de alguns hiatos temporais que na sua opinião, poderiam servir de base à definição de uma vida útil esperada para os aerogeradores, nomeadamente o período do financiamento contraído para a aquisicão dos aerogeradores (18 anos), o período durante o qual a Requerente irá beneficiar de uma tarifa especial para produção de energia a partir de fontes renováveis (15 anos), ou ainda, o período de cobertura de garantia conferido pelos fabricantes de aerogeradores à Requerente (15 anos). Ora, não se pode deixar de salientar que nenhum dos períodos indicativos corresponde à vida útil utilizada pela Requerente. Por outro lado, esta testemunha declarou que os aerogeradores do Sobrado eram do mesmo tipo dos existentes no Norte da Alemanha, mas a localização era completamente diferente, estes situados em região plana a nível do mar, com ventos horizontais, ao passo que no Sobrado estão situados nas montanhas, com ventos que vêm de baixo, com maior humidade e mais fortes. Nesta sequência, declarou que o período estimado de vida útil dos aerogeradores na Alemanha era de 20 anos, que é o homologado, enquanto previa para o Sobrado, em razão do valor de produção ser mais elevado e devido à maior carga sobre as turbinas causada pela turbulência, um período de vida útil menor em cerca de 20%. Porém, questionado sobre se a indicação desse período temporal para o Sobrado constituiria um valor absoluto, de tal modo que os aerogeradores não funcionariam após esse período, reconheceu ser difícil afirmar isso, mas que havia o risco elevado de proximidade do fim de vida útil, em atenção ao maior esforço exigido no Sobrado, muito embora admitisse ser possível substituir componentes, mas que o seu custo poderia ser significativo. Depois, interrogada sobre as razões pelas quais a avaliação do projeto, até por uma questão de rigor e alinhamento de expetativas, não foi reduzida de 20 para 16 anos, a testemunha M....... referiu que a diferença entre os 20 anos de exploração do parque (Previstos na avaliação do Projeto) e a vida útil indicada
ara os aerogeradores (16 anos) era um risco do negócio que a Requerente decidiu assumir. Justamente, o Tribunal não pode deixar de atribuir relevância ao facto, acima dado como provado no n.° IV, de o Estudo Prévio do "Parque Eólico do Sobrado' anexo à Declaração de Impacte Ambiental, considerar um "horizonte de tempo de vida útil do parque eólico, de 20 a 25 anos' sendo sabido que tal espécie de estudos tem em consideração as características ambientais e morfológicas da região em que se localiza o parque eólico. Acresce que, conforme se deu como provado (n.° III), foi escolhido para o Parque Eólico do Sobrado um tipo de aerogerador de Classe 1, que constitui uma classe de aerogeradores que garante níveis mais elevados de robustez e segurança. Note-se, aliás, que no próprio documento n.°5 junto à PI1 faz-se referência ao facto de os modelos de turbinas MM da Senvion GMbH poderem ser ajustados para se adaptarem a todas as classes de vento e condições de localização, assegurando "total flexibilidade e eficiência económica em todas as velocidades de vento e condições de localização" Nesta base o Tribunal não considerou as declarações neste âmbito prestadas pela testemunha M……. suficientemente concludentes para se poder julqar comprovado que, pelas suas concretas características e pelas condições climatéricas e de terreno do local onde estão instalados, os aerogeradores do Parque Eólico do Sobrado possuem um período de vida útil esperado inferior a 20 anos. No que concerne a problemas de manutenção, a testemunha M....... fez referência à "previsão" do 12 anos de serviço para se verificar a necessidade de substituição de componentes principais dos aerogeradores, mas concretamente quanto a intervenções específicas ocorridas aludiu apenas a já terem sido substituídos "alguns rolamentos em algumas turbinas" e que se deteta já alguma deterioração ou desgaste. Como tal, o Tribunal considera que não foi feita prova cabal da ocorrência de um "histórico de reparações e manutenções já efetuados no Parque Eólico do Sobrado 'Y' (sublinhado nosso)

X. Falecem, assim, salvo o devido respeito por opinião distinta, as alegadas contradições entre os fundamentos e a decisão e falta especificação dos fundamentos de direito no douto, assim como o invocado quanto à omissão de pronúncia do Acórdão arbitral em análise.

Y. No entanto, por mera hipótese e sem conceder, cumpre salientar que a AT mantém o
entendimento propugnado na Resposta ao pedido de pronúncia arbitral, devendo, com
os fundamentos de facto e de direito na mesma invocados, improceder o pedido de anulação da liquidação nos termos melhor explicitados na decisão arbitral ora impugnada, a cujo teor se adere na totalidade.

Z. Falecendo integralmente os argumentos esgrimidos pela Impugnante em prol da
ambicionada anulação da decisão arbitral, deve a presente impugnação improceder,
assim se fazendo JUSTIÇA.
Termos em que, e nos doutamente supridos, deverá ser negado provimento à impugnação, por manifestamente infundada, e em consequência manter-se a decisão arbitral sindicada, com o que V. Exas. farão a costumada Justiça!».

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal foi notificada nos termos do disposto no artigo 146.º, n.º1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aplicável “ex vi” artigo 27.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), tendo-se pronunciado no sentido de ser mantida a decisão impugnada.

Colhidos os vistos dos actuais Senhores Juízes-Desembargadores Adjuntos, cumpre decidir.

2 – FUNDAMENTAÇÃO

De facto

Nos termos do art.º 663º, n.º6, do CPC, remete-se para a matéria de facto fixada na decisão impugnada.

De direito

Como se deixou consignado no acórdão desta secção proferido em 18/04/2018, no proc.º121/17.0BCLSB,

«O regime da arbitragem voluntária em direito tributário foi introduzido pelo RJAT, sendo que os Tribunais arbitrais têm competência para apreciar um conjunto vasto de pretensões, as quais vêm taxativamente elencadas na enumeração constante do artº.2, nº.1, do citado diploma. Mais se dirá que o Tribunal arbitral tem a obrigação de decidir em conformidade com o direito constituído e não com recurso à equidade (cfr.artº.2, nº.2, do RJAT).

Os princípios processuais inerentes ao processo arbitral vêm referidos e elencados no artº.16, do RJAT, e, genericamente, são os mesmos princípios que se aplicam a um processo de partes, de que é exemplo o processo civil.

No que toca à possibilidade de recorrer de uma decisão proferida por um Tribunal arbitral pode, desde logo, referir-se que esta é muito limitada.

Assim, quando se tiver em vista controlar o mérito da decisão arbitral, isto é, o seu conteúdo decisório, o meio mais adequado para colocar em crise a decisão arbitral será o recurso.

Com efeito, em conformidade com o que se dispõe no artº.25, nº.1, do RJAT, é possível recorrer directamente para o Tribunal Constitucional da parte da decisão arbitral que ponha termo ao processo e que recuse a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, bem como nos casos em que aplique uma qualquer norma jurídica cuja inconstitucionalidade seja levantada no decurso do processo.

Por outro lado, admite-se ainda a possibilidade de recurso com fundamento em oposição de acórdãos, isto nos termos do que determinam os nºs.2 e 3, do artigo em apreço. Este recurso é endereçado à Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sempre que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida estiver em oposição, relativamente à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido ou pelo Tribunal Central Administrativo ou Supremo Tribunal Administrativo. Neste caso, os trâmites do recurso a observar são os do regime dos recursos para uniformização de jurisprudência, aplicando-se o disposto no artº.152, do C.P.T.A.

Note-se que, em termos práticos, só há uma via de recurso: ou directamente para o Tribunal Constitucional, com fundamento em (in) constitucionalidade, ou directamente para o Supremo Tribunal Administrativo, em caso de oposição de acórdãos.

Pelo contrário, quando se pretenda controlar a decisão arbitral em si, nos seus aspectos de competência, procedimentais e formais, o meio adequado será já a impugnação da decisão arbitral (cfr.artºs.27 e 28, do RJAT).

Nos termos da lei, a regra é que é possível que a decisão do Tribunal arbitral seja anulada pelo Tribunal Central Administrativo competente. Esta impugnação - que em bom rigor se trata de um recurso - deve ser deduzida, sob pena de não admissão por intempestividade, no prazo de quinze dias contados da notificação da decisão arbitral, ou da notificação referida no artº.23.º, do diploma em apreço. Porém, neste último caso, a decisão arbitral terá que ter sido proferida por Tribunal colectivo, cuja constituição tenha sido requerida nos termos do artº.6, nº.2, al. b), do RJAT.

Já no que toca aos fundamentos da impugnação da decisão arbitral, vêm estes elencados no texto do artº.28, nº.1, do RJAT. São eles, taxativamente, os seguintes:
1-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
2-Oposição dos fundamentos com a decisão;
3-Pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia;
4-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artº.16, do diploma.

Ou seja, os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artº.27, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artº.28, nº.1, e atrás elencados, correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artº.125, nº.1, do C.P.P.T., com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artº.615, nº.1, do C. P. Civil.

E se algumas dúvidas pudessem subsistir sobre o que se vem de afirmar, elas dissipar-se-iam por força dos elementos sistemático, teleológico e histórico, considerando, por um lado, o regime jurídico dos vícios em causa, tal como disciplinado pelo C.P.P.T., e, por outro, a intenção do legislador expressamente manifestada na parte preambular do diploma em causa, quando e ao que aqui releva, refere que “(…) A decisão arbitral poderá ainda ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo com fundamento na não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na oposição dos fundamentos com a decisão, na pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia ou na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de partes (…)”. Assim manifestando o legislador, de forma inequívoca, uma enumeração taxativa dos fundamentos de impugnação das decisões arbitrais para os T. C. Administrativos (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/2/2013, proc.5203/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 21/5/2013, proc.5922/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/9/2013, proc.6258/12; Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, pág.234 e seg.)» (fim de cit.).

Como tem sido entendimento deste Tribunal, a decisão arbitral poderá ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo com fundamento na pronúncia indevida. E no conceito de “pronúncia indevida”, para além do excesso de pronúncia, incluem-se as situações em que o tribunal arbitral funcionou de modo irregular ou em que excedeu a sua competência – vd., entre outros, o Acórdão deste TCA Sul, de 06/09/2016, tirado no proc.º09156/15.

Feitos os considerandos julgados pertinentes, são estas as nulidades invocadas pela entidade impugnante: i) omissão de pronúncia; ii) falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito; iii) oposição dos fundamentos com a decisão arbitral.

Ø Omissão de pronúncia

Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al. d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra, os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por um lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).

No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr. Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.7029/13).

No regime de arbitragem voluntária em direito tributário, a nulidade da decisão arbitral derivada do vício de omissão de pronúncia está consagrada no artº.28, nº.1, al. c), do R.J.A.T. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/06/2014, proc.7084/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/03/2016, proc.8981/15).

Pois bem, conforme se alcança das alegações e conclusões da impugnação, o vício de omissão de pronúncia vem imputado ao acórdão arbitral com dois fundamentos; o primeiro, prende-se com a falta de conhecimento do período de vida útil dos aerogeradores, cuja determinação pela AT no domínio da designada discricionariedade técnica, é sindicável pelos tribunais estatais e arbitrais; o segundo, prende-se com a falta de pronúncia da decisão arbitral quanto à invocada inconstitucionalidade material do n.º2 do art.º31.º do Código do IRC por violação do princípio da igualdade e da tributação pelo lucro real.

Não cremos que assista razão à impugnante. Com efeito, para além do mais que se dá por reproduzido, deixou-se consignado na decisão arbitral em sede de aplicação do direito:
«49. Ora, fica claro para o Tribunal que a Lei confere à Requerida a discricionariedade técnica necessária para que esta, dentro dos limites da razoabilidade, fixe um período de vida útil esperada para os elementos para os quais não se encontram fixadas taxas de depreciação ou amortização.
50. E, tendo a Requerida o poder (conferido por Lei) para fazê-lo, deverá ser a Requerente, não concordando com a correcção da Requerida, a demonstrar que a aludida razoabilidade não foi cumprida, nos termos do n.º1 do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (“LGT”)».

E mais adiante:
«52. Aproveita-se também para fazer aqui referência à declaração de voto de vencido proferida no âmbito do processo arbitral n.º593/2015, cuja exposição se aplaude, “(…) na discricionariedade técnica «stricto sensu» cabe, sim, o juízo de valoração assente em conhecimentos e regras próprias da ciência ou da técnica não jurídicas que estejam em causa, sendo certo que não cabe ao tribunal controlar a boa ciência ou a boa técnica empregues pela entidade administrativa, por manifesta falta de competência nas matéria extrajurídicas para tanto necessária.
(…)
Mais especificamente, se a lei confere à Administração o poder de especificar uma valoração não previamente fixada pela própria lei, não pode um Tribunal proceder à reponderação dos juízos efectuados pela Administração nesse âmbito, a não ser que esteja demonstrada a existência de erro grosseiro ou manifesto, nomeadamente, a falta de apoio em informações e estudos técnico-profissionais corroborados por especialistas e reclamados pela densificação dos conceitos extrajurídicos.
(…)
Pode este tribunal, ou qualquer outro, achar que é mais razoável o prazo proposto pela Requerente, ou pode ao invés achar que é mais razoável o proposto pela AT – mas essa avaliação é, tem que ser, irrelevante no caso, porque, insiste-se, o estabelecimento por lei de um poder discricionário, como o que foi exercido, veda qualquer possibilidade de razoabilidades entre períodos de depreciação, como veda qualquer outro juízo de mérito».

Como se vê, o acórdão arbitral não deixou de dar pronúncia sobre o período de vida útil dos aerogeradores, mas para concluir que a sua determinação pela AT no domínio da designada discricionariedade técnica exercida ao abrigo do disposto no n.º2 do art.º31.º do CIRC, não é sindicável pelos tribunais estatais e arbitrais, restando à Requerente, ora impugnante, inconformada com o período fixado, demonstrar que no seu caso concreto o prazo fixado pela AT não se apresenta razoável.

Se esse juízo se mostra errado, tal poderá inquinar a decisão arbitral de erro de julgamento, mas não da sanção mais gravosa da nulidade, porque as razões por que não se conheceu da razoabilidade do período de vida útil dos aerogeradores determinado pela AT resultam explicadas na decisão. Como resultam explicados os termos em que a correcção da AT pode ser eficazmente questionada pela Requerente, i.e., pela demonstração da falta de razoabilidade do prazo determinado, na situação concreta.

Não se verifica, pois, omissão de pronúncia por falta de sindicabilidade da determinação do período de vida útil dos aerogeradores.

Avançando, vem imputada à decisão omissão de pronúncia quanto à inconstitucionalidade material do n.º2 do art.º31.º do Código do IRC por violação do princípio da igualdade e da tributação pelo lucro real.

Porém, como a própria impugnante não deixa de reconhecer, mas em termos que a seu ver resultam redundantes, a decisão não deixa de dar pronúncia sobre a questão.

Com efeito, consta do acórdão em sede de aplicação do direito:
«63. Do mesmo modo, em face da factualidade provada e não provada, não procede, sendo insusceptível de subsunção ao caso sub judice, a alegação da Requerente (cf. n.º169 da PI) de “violação do princípio constitucional da igualdade e da tributação do lucro real, uma vez que a taxa de amortização proposta pela Administração Tributária ao abrigo do n.º2 do artigo 31.º do Código do IRC é claramente inconstitucional, por violadora do princípio da proporcionalidade”.

Como se vê do segmento extractado, a decisão arbitral deu pronúncia sobre a questão de inconstitucionalidade suscitada, mas para a afastar no caso concreto. Se o fez de modo quase redundante, i.e., mediante uma fundamentação pobre ou medíocre, ou se a fundamentação é juridicamente sustentável, isso já contende com o eventual vício de falta de fundamentação ou com o mérito da fundamentação, o que em qualquer caso não é sindicável por este tribunal, ora por não ter sido a nulidade concretamente alegada, ora por este tribunal não poder conhecer do mérito da fundamentação externada.

Em suma, não se vê que a decisão arbitral impugnada tenha omitido pronúncia quanto às duas questões que a impugnante refere.

Ø Falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito

Só se verifica nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito quando ocorra falta absoluta de fundamentação, ou seja, quando existe ausência total de fundamentos de facto e de direito (Este tem sido o entendimento uniforme do STA, entre outros, ver acórdão de 2012.11.07, tirado no proc.º01109/12. Em termos de doutrina ver Alberto dos Reis, “CPC, anotado”, volume V, página 140 e
Jorge Lopes de Sousa, “CPPT, anotado e comentado”, 6ª edição revista II volume, página 357).

Deverá considerar-se que existe falta absoluta de fundamentação quando essa fundamentação seja ininteligível ou não tenha relação perceptível com o julgado, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação (vd. Acórdão do STA, de 1997.03.19, proferido no recurso nº 21.923, disponível no sitio da internet www.dgsi.pt).

Quando a fundamentação não exteriorizar, minimamente, as razões que levaram a decidir naquele sentido e não noutro dever-se-á entender que estamos perante uma nulidade por falta de fundamentação (vd. Acórdão do STA, de 2003-12-17, proferido no recurso nº 1471/03, disponível no sitio da internet www.dgsi.pt).

A fundamentação de direito, por norma, é feita por indicação da norma ou normas legais em que se sustenta, mas poderá, também, ser estruturada por mera indicação dos princípios jurídicos ou doutrina jurídica em que se baseia

Ora, salvo melhor juízo, da decisão arbitral impugnada constam, de forma expressa, os fundamentos de facto e de direito que determinaram a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Na verdade, não só constam de cada ponto de facto julgado provado os concretos meios de prova que suportam a decisão, como se dedica um extenso arrazoado à motivação da decisão, especialmente no que respeita aos factos dados como “não provados”, como, por outro lado, é feita menção expressa ao quadro jurídico aplicável, senão atente-se neste excerto da decisão arbitral:
«17. Dado que a questão jurídica a decidir no presente processo exige que se interpretem os textos legais pertinentes, importa, em primeiro lugar, elencar as normas que compõem o quadro jurídico relevante à data da ocorrência dos factos (2012, 2013 e 2014).
18. Decorre do artigo 5.º, n.º3 do Decreto Regulamentar n.º25/2009, de 14 de Setembro que “relativamente aos elementos para os quais não se encontrem fixadas, nas tabelas referidas no n.º1, taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada”.
19. Já no Código do IRC, designadamente no n.º2 do seu artigo 31.º, à dat relevante dos factos (exercícios de 2012 e 2013) estava previsto o seguinte: “relativamente aos elementos para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada”; Para o exercício de 2014, releva atender ao n.º3 do artigo 31.º do mesmo Código que dispõe: “Relativamente aos elementos para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Autoridade Tributária e Aduaneira sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de vida útil esperada daqueles elementos”.
20. Assim, é com base no presente quadro jurídico que importa apreciar se as correcções efectuadas pela Requerida ao lucro tributável da Requerente, por referência aos períodos de tributação de 2012, 2013 e 2014, enfermam de alguma ilegalidade (nos termos defendidos pela ultima)».

Aliás, basta atentar nas alegações da impugnante, sintetizadas nas conclusões r) a w), para logo ficar evidenciado que a sua discordância é com a insuficiência, mediocridade e erroneidade da fundamentação, não com a sua ausência.

Só que, como se diz no Acórdão do STJ, de 06/02/2016, tirado no proc.º781/11.6TBMTJ.L1.S1, «Só a absoluta falta de fundamentação – e não a sua insuficiência, mediocridade ou erroneidade – integra a previsão da al. b) do n.º 1 do art. 615.º do NCPC, cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento». Erro de julgamento que, reitera-se, escapa aos poderes de pronúncia deste Tribunal.

Não se verifica, pois, a nosso ver, a alegada nulidade da sentença por omissão de especificação dos fundamentos de facto e de direito.

Ø Contradição dos fundamentos com a decisão arbitral

Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al. c), do C.P.Civil, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artº.154, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.141 e 142; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.689 e 690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36 e 37).

No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.361 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 18/2/2010, rec.1158/09; ac.S.T.A-2ª.Secção, 4/5/2011, rec.66/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/3/2012, proc. 1103/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/2/2013, proc.5713/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/8/2013, proc.6883/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/4/2014, proc.7435/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15).

No regime de arbitragem voluntária em direito tributário, a nulidade da decisão arbitral derivada dos fundamentos estarem em oposição com a decisão está consagrada no artº.28, nº.1, al.b), do R.J.A.T. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/6/2013, proc.6121/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 29/6/2016, proc.9420/16).

A nulidade prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 615.º do CPC, segundo a qual a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, sanciona o vício de contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença. Constituindo a sentença um silogismo lógico-jurídico, de tal forma que a decisão seja a conclusão lógica dos factos apurados, aquela nulidade só se verifica quando das premissas de facto e de direito se extrair uma consequência oposta à que logicamente se deveria ter extraído.

No caso sub judice, não vislumbra este Tribunal que a decisão impugnada padeça da nulidade em análise. Concretizando, a decisão arbitral não comporta nenhuma contradição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que, tendo decidido pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral, a fundamentação factual e jurídica de tal peça processual vai no mesmo sentido, chegando o tribunal arbitral à conclusão de que o vício carreado pela Requerente, ora impugnante, para o processo, no pedido, não vinga.

Aliás, basta atentar nas alegações da impugnação, sintetizadas nas conclusões u), x) e y), para ressaltar evidente que a impugnante se não conforma, por um lado, com a decisão relativa à matéria de facto, posto que entende que a prova produzida levaria a que factos dados como “não provados” fossem sido dados como “amplamente provados” e, por outro, com a valoração da globalidade da prova feita pelo tribunal arbitral.

Outrossim, não se conforma a impugnante com o facto de o tribunal arbitral não ter atribuído qualquer relevância à alteração legislativa que viria a ser introduzida pela Lei 82-D/2014, de 31 de Dezembro, que vai no sentido do encurtamento do período de vida útil dos aerogeradores para 12,5 anos, o que “vem dissipar quaisquer dúvidas sobre a razoabilidade do período de vida útil de 16 anos considerado pela impugnante no seu pedido de pronúncia arbitral”.

Sobre este ponto, deixou-se consignado, destacadamente e, entre o mais, na decisão arbitral impugnada:
«57. Á data relevante dos factos, nem a Requerente, nem a Requerida tinham como antecipar que o legislador viria a fixar uma vida útil de 12,5 anos para os aerogeradores.
58. Portanto, em função da vida útil que veio a ser especialmente estabelecida para os aerogeradores, quer o critério seguido pela Requerente, quer o critério seguido pela requerida, parecem pouco razoáveis.
59. E por isso, o presente Tribunal, ao apreciar agora a questão decidenda, deve ignorar esse facto (até porque àquela alteração normativa não foi conferido qualquer cariz interpretativo), cingindo-se a considerar a legislação existente à data, evitando aplicar a lei fiscal de forma retroactiva (procedimento constitucionalmente proibido, nos termos do artigo 103.º, n.º3 da Constituição da República Portuguesa».

Ou seja, todo o discurso fundamentador da decisão arbitral aponta logicamente para a decisão que veio a ser proferida de improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Não ocorre, pois, qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão que integre a nulidade invocada, antes se reconduzindo os vícios apontados a eventuais erros de julgamento – de facto e de direito – que escapam à sindicância deste tribunal no âmbito dos seus poderes limitados de pronúncia permitidos por lei.

Rematando, não se vê que a decisão impugnada padeça de qualquer vício lógico (obscuridade, contradição) na sua estrutura que tenha por consequência a respectiva declaração de nulidade.

Atento tudo o que se vem de referir tem que improceder in totum a impugnação da decisão arbitral.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em julgar improcedente a presente impugnação do acórdão arbitral.

Custas pela Impugnante.

Registe e Notifique.

Lisboa, 14 de Novembro de 2019


Vital Lopes


Anabela Russo


Tânia Meireles da Cunha