Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:63/18.2BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:03/25/2021
Relator:ANA CRISTINA CARVALHO
Descritores:COIMA
PORTAGENS
NOTIFICAÇÃO PARA DEFESA
CONSULTA PORTAL
PROVA DO ENVIO DE 2ª NOTIFICAÇÃO
Sumário:i) A notificação do arguido para apresentar defesa deve conter os elementos previstos no n.º 1 do artigo 70.º do RGIT, não dispensando a remissão para a consulta no portal das finanças a notificação de tais elementos;

ii) Caso uma única notificação se revele insuficiente para listar a totalidade das infrações cometidas em determinado período pelo agente, pode a administração tributária disponibilizar a informação relevante no Portal das Finanças, remetendo sempre segunda carta contendo a listagem das infrações cometidas;

iii) O envio da segunda carta referida no número anterior, nas condições ali especificadas, não constitui uma faculdade, constituindo um imperativo que se funda na garantia conferida pelo n.º 10 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa dos direitos de audiência e defesa do arguido em processos de contra-ordenação.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – Relatório

R….., interpôs recurso das decisões do Chefe do Serviço de Finanças de Fornos de Algodres, proferidas nos processos de contra-ordenação que lhe foram instaurados com os nºs ….., ….. e ….., nos quais lhe aplicaram, uma coima em cada processo, totalizando o montante de € 1 978,18.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, por decisão de 31 de Dezembro de 2019, julgou procedente o recurso.

Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«1. Através do presente recurso, a Fazenda Pública insurge-se contra a douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, que julgou procedente o recurso apresentado R….., tendo, em consequência, anulado a decisão recorrida e absolvido a recorrente da prática da infração que lhe foi imputada no âmbito dos processos de contra-ordenação nºs ….., …..e …...

2. Na apreciação da matéria controvertida, o Tribunal “ a quo” refere, de forma expressa, que acompanhou de perto a jurisprudência emanada no douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo nº 0593/09, de 18 de novembro de 2009.

3. Salvo o devido respeito pela interpretação que é efetuada pelo Tribunal “ a quo”, os factos controvertidos que foram objeto de apreciação e decisão naqueles autos, em nada se relacionam com os factos controvertidos que foram submetidos à apreciação e decisão do Tribunal “ a quo”.

4. Com efeito, no âmbito do Acórdão proferido pelo STA, a contraordenação que é imputada à arguida é subsumível ao artigo 114º, nº 2 do RGIT, ou seja, a “falta de entrega da prestação tributária”, cometida a título de negligência, sendo que no âmbito dos autos em recurso, a contraordenação que é imputada à arguida traduz-se na falta de pagamento de portagens (artigo 5º, nº 2 da Lei nº 25/06, de 30/06, punida nos termos do artigo 7º do mesmo diploma legal).

5. Considerando que estamos perante contraordenações de natureza distinta, as exigências de fundamentação da decisão de aplicação da coima, terão necessariamente de ser distintas - embora tenham em comum, a observância dos requisitos a que alude o artigo 79º do RGIT – pelo que, salvo melhor entendimento, o Tribunal “ a quo” ao refugiar-se no douto Acórdão do STA para sustentar a sua decisão, cometeu erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

6. A decisão recorrida fez “tábua rasa” dos elementos probatórios que foram junto aos autos pela Fazenda Pública, facto que impediu a descoberta da verdade material e inquinou a decisão recorrida de erro de julgamento, por errada valoração da prova.

7. No elenco da prova documental que foi junta aos autos pela Fazenda Pública, encontram-se os autos de noticia, que serviram de base à instauração dos processos de contraordenação em causa nos presentes autos – processos de contraordenação nºs ….., …..e …...

8. Nos termos do artigo 9º da Lei 25/2006, de 30 de junho e 69º do RGIT, o auto de notícia reveste uma especial força probatória, com a qual se dispensa a investigação e instrução do processo de contraordenação nos casos em que ele se baseia naquele.

9. Este especial valor probatório traduzir-se – à no facto de o auto de notícia bastar para provar os factos que dele são objeto, não sendo necessário à administração tributária produzir qualquer outra prova para poder dar como assente a factualidade contida no auto.

10. No âmbito dos presentes autos, a arguida não apresentou quaisquer provas que afastassem a veracidade da factualidade constante do auto de noticia, motivo pelo qual, deveria o Tribunal “ a quo” dar como provado a factualidade constante do auto de noticia.

11. Ao não valorar o auto de noticia, enquanto elemento probatório a que a lei confere especial força probatória, o Tribunal “ a quo” incorreu em erro de julgamento, por errónea valoração da prova que foi apresentada pela Fazenda Pública nos presentes autos.

12. Com efeito, do auto de noticia, resulta de forma clara e objetiva que o autor material da infração tipificada no artigo 5º, nº 2 da Lei nº 25/06, de 30/06 é a arguida R….., descrevendo, além do mais, a conduta ilícita que lhe é imputada, o circunstancialismo de tempo, modo e lugar em que a infração foi praticada, os dispositivos legais infringidos e punitivos, a identificação do infrator, a identificação da viatura, a identificação do autuante – vide auto de noticia nº ….., junto aos autos pela Fazenda Pública a fls. 13.

13. Nestes termos, atenta a especial relevância do auto de noticia para a descoberta da verdade material e consequente realização da justiça, requer-se a ampliação da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal “ a quo”, devendo ser levado ao probatório toda a factualidade constante do auto de noticia.

14. Entendeu o Tribunal “ a quo” que “no caso dos autos não se percebe a que título é que a arguida está a ser punida, uma vez que nada consta quanto ao facto de a viatura melhor identificada no probatório supra se encontrar ou não registada em nome da recorrente (…) .

15. Salvo o devido respeito, tal conclusão deriva do facto de o Tribunal “ a quo” não ter efetuado uma análise critica ao conjunto das várias provas que foram juntas aos autos, designadamente, no que concerne à prova documental junta pela Fazenda Pública e de ter efetuada uma errónea interpretação e aplicação do regime jurídico aplicável aos factos controvertidos, designadamente da Lei nº 25/2006, de 30 de junho. 16. Dispõe o nº 3 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho que “Na falta de cumprimento do disposto nos números anteriores, é responsável pelo pagamento das coimas a aplicar, das taxas de portagem e dos custos administrativos em dívida, consoante os casos, o proprietário, o adquirente com reserva de propriedade, o usufrutuário, o locatário em regime de locação financeira ou o detentor do veículo. 17. Por seu turno, o nº 6 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, estabelece que “O direito de ilidir a presunção de responsabilidade prevista no n.º 3, considera-se definitivamente precludido caso não seja exercido no prazo referido no n.º 1.” (nosso bold e itálico)

18. Ora, no caso em apreço, a arguida não ilidiu a presunção de responsabilidade prevista no nº 3 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, motivo pelo qual, a responsabilidade pelo pagamento das coimas a aplicar, das taxas de portagem e dos custos administrativos recaiu sobre a esfera jurídica da mesma, tendo a entidade concessionária procedido ao levantamento do auto de noticia – vide fls. 13 da prova documental junta pela Fazenda Pública aos presentes autos.

19. Contrariamente ao entendimento preconizado pelo Tribunal “ a quo” a qualidade do agente da infração, enquanto proprietário, detentor, usufrutuário, locatário em regime de locação financeira ou adquirente com reserva de propriedade, não integra o elemento objetivo do tipo de ilícito que é imputado à arguida.

20. Resulta do nº 2 do artigo 5º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, que o elemento objetivo do tipo de ilícito consubstancia-se na conduta traduzida pelo não pagamento de taxas de portagem resultante da transposição, numa infraestrutura rodoviária que apenas disponha de um sistema de cobrança eletrónica de portagens, de um local de deteção de veículos sem que o agente proceda ao pagamento da taxa devida nos termos legalmente estabelecidos.

21. Contrariamente ao entendimento preconizado pelo Tribunal “ a quo” o elemento objetivo que integra o tipo de ilícito ali previsto, não exige que o agente que pratica a conduta ilícita revestia uma qualidade especifica, designadamente, proprietário, usufrutuário, detentor, etc.

22. Efetivamente, o que está em causa é um modo de atuação – descrito pelo tipo - que pode ser praticada por um qualquer agente que, no momento da pratica da infração, detenha a condução efetiva do veiculo - cuja matricula, foi identificada no momento da prática da infração - não tendo o agente que pratica a infração de revestir uma qualidade especifica, bastando que se trate do condutor da viatura que foi identificada.

23. A douta decisão recorrida confunde o autor da prática da contraordenação – que surge identificado no nº 2 do artigo 5º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho – com o responsável pelo pagamento das coimas a aplicar, taxas de portagem e custos administrativos a que se reporta o nº 3 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho.

24. Ora, da leitura do nº 2 do artigo 5º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, infere-se que a conduta ilícita que ali se encontra tipificada pode ser praticada por um qualquer agente, sem que o tipo lhe exija uma qualidade especifica, bastando que o mesmo detenha a condução do veiculo cuja matricula é identificada pelos dispositivos existentes no local em que a contraordenação é praticada.

25. Questão diversa da autoria da prática da contraordenação é a responsabilidade pelo pagamento das taxas, das coimas e custos administrativos, que serão suportados em consequência da pratica da contraordenação.

26. E também quanto a esta questão, o legislador foi muito claro quando no nº 3 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, refere que “Na falta de cumprimento do disposto nos números anteriores, é responsável pelo pagamento das coimas a aplicar, das taxas de portagem e dos custos administrativos em dívida, consoante os casos, o proprietário, o adquirente com reserva de propriedade, o usufrutuário, o locatário em regime de locação financeira ou o detentor do veículo” (nosso bold e itálico).

27. Temos assim, que a autoria da pratica da infração e a responsabilidade pelo pagamento das taxas, coimas e custos administrativos, não se confundem, tanto mais, que sempre que o condutor da viatura identificada - entendendo-se este como o titular do documento de identificação do veiculo, conforme decorre do nº 1 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho - agir em conformidade com o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 10º da Lei nº 25/206, de 30 de junho, a responsabilidade pelo pagamento das coimas, taxas e custos administrativos irá incidir sobre a esfera jurídica de terceiros que o nº 3º do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, identifica como sendo, o proprietário, o adquirente com reserva de propriedade, o usufrutuário, o locatário em regime de locação financeira ou o detentor do veículo.

28. Neste contexto, contrariamente ao entendimento preconizado pela douta decisão recorrida, a decisão de aplicação de coima e todo o acervo probatório que lhe serve de sustentação e que foi junto aos autos pela Fazenda Pública – de folhas 1 a folhas 113, que aqui se dão por integralmente reproduzidos – demonstram de forma inequívoca que a arguida é a autora material da infração que lhe é imputada no âmbito dos autos de contraordenação em causa nos presentes autos, sendo também responsável pelo pagamento das coimas, taxas de portagem e custos administrativos, porquanto, não juntou aos autos quaisquer evidencias probatórias que fossem suscetíveis de ilidir a presunção constante do nº 3 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho.

29. O Tribunal “ a quo” ao preconizar o entendimento de que a decisão de aplicação de coima não faz referência à qualidade do arguido que leva à sua configuração como agente da contraordenação: condutor, proprietário, adquirente com reserva de propriedade, usufrutuário, locatário em regime de locação financeira ou detentor do veiculo e que a omissão de tal facto tem como consequência a nulidade da decisão de aplicação de coima, efetuou uma errada interpretação do quadro legal aplicável – designadamente, do disposto no nº 2 do artigo 5º e nºs 1, 2, 3 e 6 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho – inquinando a douta decisão de erro de julgamento que impede a sua continuidade no ordenamento jurídico.

30. Por outro lado, a douta decisão recorrida ao perfilhar o entendimento que a decisão de aplicação de coima é nula por omissão da qualidade da arguida, violou o artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, designadamente, o disposto nos artigos 3º e 6º, porquanto, estando perante uma presunção que não foi ilidida pela arguida, o Tribunal “ a quo” deveria ter respeitado tal presunção e em conjugação com os restantes elementos de prova que foram junto aos autos pela Fazenda Pública, designadamente o auto de noticia - a folhas 13 da prova junta pela Fazenda Pública - deveria ter dado como provado a autoria da prática da infração e a responsabilidade pelo pagamento da taxa de portagem , coimas e custos administrativos.

31. A douta decisão recorrida ao entender que “ no caso dos autos, não se percebe a que título é que a ora arguida está a ser punida, uma vez que nada consta quanto ao facto de a viatura melhor identificada no probatório supra se encontrava ou não registada em nome da recorrente”, para além de ter violado a presunção constante do nº 3 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, violou o principio da descoberta da verdade material e da realização da justiça – princípios estruturantes do processo contraordenacional- porquanto, não cuidou de realizar quaisquer diligências probatórias que lhe permitissem, dissipar qualquer dúvida que pudesse ter, e concluir, com um elevado grau de certeza e segurança, pela propriedade da viatura com a matricula ….., sendo certo, que para tal, bastaria um pedido dirigido à CRC ou à AT que iriam confirmar os factos que a concessionária, em momento prévio à notificação da arguida cuidou de averiguar junto da Conservatória de Registo Comercial.

32. Com efeito, pese embora a observância da presunção constante do nº 3 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho, fosse suficiente para que o Tribunal “ a quo” pudesse aferir da responsabilidade contraordenacional da arguida, a verdade é que nunca o Tribunal “a quo” se poderia “ demitir” do seu dever de procura da verdade material e da realização da justiça, facto que ocorreu no âmbito dos presentes autos, quando o Tribunal “ a quo” optou por referir que não percebia a que título é que a arguida estava a ser punida, uma vez que nada consta quanto ao facto de a viatura melhor identificada no probatório supra se encontrar ou não registada em nome da recorrente.

33. Caso o Tribunal “ a quo” tivesse cumprido o seu dever de procura da verdade material, teria diligenciado pela obtenção da informação relativa à propriedade da viatura e concluído, de forma inequívoca, que à data da prática das contraordenações em causa nos presentes autos, a viatura com a matricula ….., era propriedade da arguida conforme resulta dos documentos que ora se juntam como doc. 1 e doc.2 , sendo certo que tal informação apenas serviria para reforçar tal facto, uma vez que perante a presunção constante do nº 3 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho – que em nenhum momento foi afastada pela arguida – o Tribunal “ a quo” poderia ter concluído pela responsabilidade contraordenacional da arguida e em consequência julgar o recurso improcedente e condenar a arguida no pagamento da coima que lhe foi imputada no âmbito da decisão administrativa de aplicação de coima. 34. Contrariamente ao entendimento preconizado pelo Tribunal “ a quo” afigura-se-nos que a decisão administrativa de aplicação de coima, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, está suficientemente fundamentada, porquanto, contem a identificação do infrator, a descrição, bem mais do que sumária, dos factos e indica as normas que prevêem e punem o ilícito contra-ordenacional , indica os elementos que contribuíram para a fixação da coima, faz referência expressa de que vigora o Principio da Proibição de “Reformatio in Pejus”, e indica as custas que são devidas, respeitando assim as exigências formuladas no art. 79.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), d) e f) respetivamente, do RGIT – vide decisões de aplicação de coimas a fls. 11 a 12, 40 a 45 e 86 a 91 da prova documental junta aos autos pela Fazenda Pública.

35. Nestes termos, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que mantenha no ordenamento jurídico a decisão de aplicação de coima.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências

deve ser dado provimento ao presente recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida.»

Notificada da admissão do recurso jurisdicional, a recorrida, não apresentou contra-alegações.


O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal Central, emitiu douto parecer no sentido do provimento do recurso porquanto a Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho prevê o regime sancionatório aplicável às contraordenações ocorridas em matéria de infra-estruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem.


«A DECISÃO sob recurso consta dos APENSOS de CO tem a descrição em causa hora, data, local, factos ilícitos, com identificação do veículo e do arguido .


Parece não constar de disposição legal a necessidade absoluta de especificar se se trata de condutor, proprietário, adquirente c/ reserva, usufrutuário, locatário ou detentor.»


Os intervenientes processuais foram notificados nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 665.º, n.ºs 2 e 3, do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 4.º do CPP, por remissão sucessiva dos artigos o artigo 41.º , n.º 1 do RGCO e 3.º alínea b) do RGIT, para se pronunciarem sobre o conhecimento em substituição das questões consideradas prejudicadas pelo Tribunal recorrido, nada disseram ou requereram.

Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta primeira Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.

II – Delimitação do objecto do recurso

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta do artigo 412.º n.º 1, do CPP, aplicável “ex vi” do artigo 3.º al. b), do RGIT e do artigo 74.º n.º 4, do RGCO.

No caso sub judice, a recorrente suscita as seguintes questões:

i) saber se a decisão recorrida padece de erro de julgamento, por omissão da matéria de facto;

ii) saber se a decisão incorreu em erro de julgamento na valoração da prova produzida;

iii) se ocorreu errada interpretação e aplicação da lei aos factos controvertidos;

iv) Em caso de procedência das referidas questões, cabe ainda aferir das questões que se deixaram prejudicadas, ou seja, da verificação da existência outras nulidades insupríveis do processo de contra-ordenação, decorrente da falta de notificação do auto de notícia e da omissão da descrição sumária dos factos.



*

III – FUNDAMENTAÇÃO

III. 1 – Fundamentação de facto


A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«1. Em 14 de dezembro de 2017 foi pelo Serviço de Finanças de Fornos de Algodres autuado o processo de contraordenação n.º ….., contra a ora Recorrente, com fundamento no facto de o veículo com a matrícula ….., no dia 20 de dezembro de 2015, ter transposto numa infraestrutura rodoviária, um local de deteção de veículos, que apenas dispunha de um sistema de cobrança eletrónica de portagens, sito na autoestrada “A41 – Ascendi Grande Porto, Auto Estradas do Grande Porto, S.A..”, e não ter efetuado o pagamento das respetivas taxas de portagem – cfr. autuação e auto de notícia, a fls. 11-v e 12 dos autos.

2. Em 07 de janeiro de 2018 foi elaborado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Fornos de Algodres, decisão da fixação de coima, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, no qual a Recorrente foi condenada ao pagamento de uma coima no montante de 37,50€, acrescida de custas no montante de 76,50€ - cfr. decisão de fixação da coima, a fls. 14-v e 15 dos autos.

3. Consta da decisão mencionada na alínea antecedente, a seguinte descrição sumária dos factos:

“ (…)


(…)” – cfr. decisão de fixação de coima, a fls. fls. 14-v e 15 dos autos.

4. Em 14 de dezembro de 2017 foi pelo Serviço de Finanças de Fornos de Algodres autuado o processo de contraordenação n.º ….., contra o ora Recorrente, com fundamento no facto de o veículo com a matrícula ….., nos dias 01, 04, 07, 08, 09, 10, 11, 15, 20, 23 e 28 de dezembro de 2015, ter transposto numa infraestrutura rodoviária, um local de deteção de veículos, que apenas dispunha de um sistema de cobrança eletrónica de portagens, sito na autoestrada “A -25-Ascendi Beiras Litoral e Alta, Auto Estradas das Beiras Litoral e Alta, S.A..”, e não ter efetuado o pagamento das respetivas taxas de portagem – cfr. autuação e auto de notícia, a fls. 18-v e 21-v dos autos.

5. Em 07 de janeiro de 2018 foi elaborado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Fornos de Algodres, decisão da fixação de coima, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, no qual a Recorrente foi condenada ao pagamento de uma coima única no montante de 1.299,37€, acrescida de custas no montante de 76,50€ - cfr. decisão de fixação da coima, a fls. 27-v a 30 dos autos.

6. Consta da decisão mencionada na alínea antecedente, a seguinte descrição sumária dos factos:



(…)” – cfr. decisão de fixação de coima, a fls. fls. 27-v e 30 dos autos.

7. Em 14 de dezembro de 2017 foi pelo Serviço de Finanças de Fornos de Algodres autuado o processo de contraordenação n.º ….., contra o ora Recorrente, com fundamento no facto de o veículo com a matrícula ….., nos dias 01, 10, 16, 17, 19, 20, 24, 25 e 30 de novembro de 2015, ter transposto numa infraestrutura rodoviária, um local de deteção de veículos, que apenas dispunha de um sistema de cobrança eletrónica de portagens, sito na autoestrada “A -25-Ascendi Beiras Litoral e Alta, Auto Estradas das Beiras Litoral e Alta, S.A..”, e não ter efetuado o pagamento das respetivas taxas de portagem – cfr. autuação e auto de notícia, a fls. 34 a 38 dos autos.

8. Em 07 de janeiro de 2018 foi elaborado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Fornos de Algodres, decisão da fixação de coima, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, no qual a Recorrente foi condenada ao pagamento de uma coima única no montante de 1978,18€, acrescida de custas no montante de 76,50€ - cfr. decisão de fixação da coima, a fls. 44 a 46-v dos autos.

9. Consta da decisão mencionada na alínea antecedente, a seguinte descrição sumária dos factos:

“ (…)


(…)” – cfr. decisão de fixação de coima, a fls. fls. 44 a 46-v dos autos.»

Consta ainda da mesma sentença o seguinte:

«Factos não provados

Com interesse para a decisão, não foram alegados nem provados outros factos.

Motivação da decisão

A convicção do Tribunal baseou-se na prova documental junta aos autos, conforme o discriminado no probatório supra


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III - Fundamentação

Antes de mais, para melhor percebermos o alcance do recurso jurisdicional que nos vem dirigido importa ter presente o âmbito da decisão proferida.

A ora recorrida, na qualidade de arguida apresentou um recurso da decisão que lhe aplicou uma coima invocando que o processo de contra-ordenação é nulo por não lhe ter sido notificado o auto de notícia, porquanto a decisão que aplicou a coima não contém a descrição sumária dos factos limitando-se a remeter para o auto de notícia não notificado, invocando por fim, a falta de requisitos da decisão previstos no artigo 79.º do RGIT.

A decisão proferida em 1ª instância julgou o recurso procedente, anulou a decisão recorrida e absolveu a recorrente da prática da infracção que lhe foi imputada.

Para assim decidir considerou a Juíza a quo que «a decisão de fixação de coima não contém todos os elementos do tipo contraordenacional, faltando-lhe a identificação do agente, isto é, da pessoa que adota a conduta aí descrita, devendo este elemento objetivo do tipo ser encontrado no dito artigo 10.º uma vez que, de acordo com o princípio nulla poena sine lege, só há lugar a sanção se o tipo legal descrever o facto típico que é composto pela conduta do agente. à qualidade do Arguido que leva à sua configuração como agente da contraordenação: condutor, proprietário, adquirente com reserva de propriedade, usufrutuário, locatário em regime de locação financeira ou detentor do veículo.

E, bem assim, à falta de pagamento em determinado momento temporal, à transposição numa infraestrutura rodoviária de um local de deteção de veículos que apenas dispunha de um sistema eletrónico de cobrança de portagens, à identificação do veículo e ao modo como foram incumpridas as condições de utilização previstas no contrato de adesão


Do erro de julgamento da matéria de facto

A recorrente invoca que a decisão recorrida padece de erro de julgamento da matéria de facto. Que atenta a especial força probatória do auto de notícia, que dispensa a investigação e instrução do processo de contra-ordenação conforme resulta do artigo 9.º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho e do artigo 69.º do RGIT, a sua relevância para a descoberta da verdade material e consequente realização da justiça, se impõe a ampliação da matéria de facto, devendo ser levado ao probatório toda a factualidade constante do auto de notícia, do qual resulta de forma clara e objectiva que o autor material da infracção tipificada no artigo 5.º, n.º 2 da Lei n.º 25/06 é a arguida R….. (conclusões 7 a 13).

Compulsada a matéria de facto, verificamos que os pontos 1, 4 e 7 reflectem os elementos relevantes constantes dos autos de notícia que deram origem à autuação dos processos de contra-ordenação em causa nos autos, tendo em conta as questões suscitadas e a decidir nos autos pelo que improcedem as referias conclusões de recurso.


Do erro de julgamento na valoração da prova

Alega a recorrente que, na sentença recorrida foi feita errada apreciação da prova produzida. Considera, desde logo, que os factos controvertidos objecto de apreciação no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo n.º 0593/09, de 18 de Novembro de 2009 que foi seguido na sentença, conforme resulta expresso na sua motivação, em nada se relacionam com os factos controvertidos que foram submetidos à apreciação e decisão do Tribunal a quo.

No âmbito do Acórdão proferido pelo STA, a contra-ordenação que é imputada à arguida é subsumível ao artigo 114º, nº 2 do RGIT, ou seja, a «falta de entrega da prestação tributária», cometida a título de negligência, enquanto que no âmbito dos autos em recurso, a contra-ordenação que é imputada à arguida traduz-se na falta de pagamento de portagens (artigo 5.º, n.º 2 da Lei n.º 25/06, de 30/06, punida nos termos do artigo 7.º do mesmo diploma legal).

Considera a recorrente que perante contra-ordenações de natureza distinta, as exigências de fundamentação da decisão de aplicação da coima, terão necessariamente de ser distintas (conclusões 1 a 6) concluindo assim, que ocorreu erro sobre os pressupostos de facto e de direito fazendo tábua rasa dos elementos de prova que foram juntos aos autos.

Vejamos o que se nos oferece dizer sobre esta questão.

Depois de discorrer sobre os requisitos da decisão que aplica a coima, no despacho decisório recorrido, declara a Juíza a quo que o facto típico que preenche a norma é «o não pagamento de taxa de portagem por o veículo ter transposto numa infraestrutura rodoviária, um local de detecção de veículos que apenas dispunham de um sistema electrónico de cobrança de portagens, sem ter procedido ao pagamento da taxa de portagem legalmente devida.»

Prossegue o discurso fundamentador nos seguintes termos: «(…) a contraordenação prevista no artigo 5.º, n.º 2 da Lei 25/06, pode ser imputada a qualquer uma das pessoas referidas no artigo 10.º do mesmo diploma. No caso dos autos, não se percebe a que título é que a ora arguida está a ser punida, uma vez que nada consta quanto ao facto de a viatura melhor identificada no probatório supra se encontrava ou não registada em nome da Recorrente. Resulta do exposto, que a decisão de fixação de coima não contém todos os elementos do tipo contraordenacional, faltando-lhe a identificação do agente, isto é, da pessoa que adota a conduta aí descrita, devendo este elemento objetivo do tipo ser encontrado no dito artigo 10.º uma vez que, de acordo com o princípio nulla poena sine lege, só há lugar a sanção se o tipo legal descrever o facto típico que é composto pela conduta do agente.

Deste modo, para que se cumpra a “descrição sumária dos factos” na decisão de aplicação da coima terá de haver referência, ainda que sumária, à qualidade do Arguido que leva à sua configuração como agente da contraordenação: condutor, proprietário, adquirente com reserva de propriedade, usufrutuário, locatário em regime de locação financeira ou detentor do veículo.

E, bem assim, à falta de pagamento em determinado momento temporal, à transposição numa infraestrutura rodoviária de um local de deteção de veículos que apenas dispunha de um sistema eletrónico de cobrança de portagens, à identificação do veículo e ao modo como foram incumpridas as condições de utilização previstas no contrato de adesão.

A decisão que aplicou a coima apenas refere a “data e hora da infracção”, o “local” (sem referência concreta à utilização de via reservada, mas apenas à “Saída”) e a identificação da viatura (sem menção expressa à inexistência de contrato de adesão) – cfr. pontos 3), 6) e 9) do probatório supra - sendo totalmente omissa quanto à qualidade da Arguida (à concreta imputação da conduta ao agente) que justifica a sua responsabilização contraordenacional para preencher o tipo legal.

Concluindo, a infração imputada à Arguida não se basta com uma pura omissão de um dever de agir (o pagamento da taxa de portagem), contendo na sua descrição típica, para além disso, um elemento adicional (a qualidade do responsável: condutor, proprietário, adquirente com reserva de propriedade, usufrutuário, locatário em regime de locação financeira ou detentor do veículo) que, ao constituir pressuposto da punição por ser um elemento objetivo do tipo, tem de estar suportado em factos descritos na decisão de aplicação da coima – cfr., com as necessárias adaptações, o supra citado acórdão do Supremo Tribunal Administrativo.

Ora, analisada a decisão administrativa de aplicação da coima, nenhuma referência, direta ou indireta, expressa ou por remissão, se encontra em relação a esse facto e era essencial que ele fosse descrito para que a decisão administrativa da coima não se encontrasse ferida de nulidade.

Desta feita, confrontando o conteúdo da decisão recorrida, e perante a insuficiência da descrição apontada, não se logra outrossim atingir o iter lógico e valorativo trilhado pela Administração Fiscal no processo de formação da sua decisão condenatória, motivo pelo qual o processo padece de uma nulidade insuprível, já que, por força do princípio da separação de poderes, não compete ao Tribunal, mas à Administração, imputar à Arguida o preenchimento do tipo, designadamente no que respeita ao elemento objetivo “agente da contraordenação”, no ponto, referindo que entende que a Arguida praticou a contraordenação prevista no artigo 5.º, n.º 2 da Lei n.º 25/06, de 30 Junho, por ser responsável pelo pagamento da taxa de portagem na qualidade de condutor, proprietário, adquirente com reserva de propriedade, usufrutuário, locatário em regime de locação financeira ou detentor do veículo.

Face ao exposto, não pode ter-se como adequadamente cumprido, na decisão de aplicação da coima recorrida, o requisito da descrição sumária dos factos, a que alude a artigo 79.º, n.º 1, alínea b) do RGIT, enfermando a mesma, assim, da nulidade insuprível prevista do artigo 63.º, n.º 1, línea d) do mesmo diploma legal. (…)»

A recorrente insurge-se contra o assim decidido, alegando que não foi tida em conta a prova constante dos autos, concretamente os autos de notícia que, pela sua força probatória, dispensava a investigação e instrução do processo de contra-ordenação, nos termos do artigo 69.º, n.º 2 do RGIT, do qual resulta que o autor material das infracções tipificada no artigo 5.º, n.º 2 da Lei n.º 25/06, de 30/06, é a recorrida, descrevendo, além do mais, a conduta ilícita que lhe é imputada, o circunstancialismo de tempo, modo e lugar em que a infração foi praticada, os dispositivos legais infringidos e punitivos, a identificação do infrator, a identificação da viatura e a identificação do autuante – cf. auto de noticia nº ….., junto aos autos pela Fazenda Pública a fls. 13.

Insurgindo-se ainda contra o entendimento expresso na sentença de que a qualidade do agente constitui elemento do tipo, revelando uma errónea interpretação e aplicação do regime jurídico aplicável aos factos controvertidos (cf. conclusões 14 a 35).

Efectivamente, o discurso fundamentador procede à errada valoração da prova, e, adianta-se desde já, decide em erro de julgamento ao considerar que a decisão é nula por omitir a qualidade do responsável.

Como se explicita no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06/05/2020 proferido no processo n.º 01070/18.0BEALM: «(…) recorde-se que o facto que constitui uma infracção (crime ou contra-ordenação) consiste numa conduta humana, voluntária e culposa, que preencheu um dos modelos ou tipos onde a lei arrolou bens jurídicos a proteger. A mesma infracção é constituída por um facto material (“nullum crime sine actione”), que preencha um tipo descrito na lei (“nullum crimen sine lege”), que tenha sido praticado culposamente (“nullum crimen sine culpa”) e que naquele tipo esteja prevista a aplicação de uma pena (crime) ou uma coima (contra-ordenação).

Por tipicidade entende-se a adequação da conduta ao tipo, ou seja, o enquadramento de um comportamento real à hipótese legal, preenchendo-se tal requisito quando a conduta de alguém encaixa exactamente na abstracção plasmada na lei.

Já a ilicitude se consubstancia na desconformidade com o direito. Diz-se que é ilícita toda a conduta humana que é contrária ao estabelecido na lei. A ilicitude é, pois, a antijuridicidade do comportamento, ou, por outras palavras, antijurídica é uma acção típica que não está justificada.

Por último, refira-se que o núcleo essencial do facto típico e ilícito se reconduz à existência de uma acção ou omissão ilícitas. Quando a norma penal/contra-ordenacional proíbe, a sua infracção tem de consistir numa acção. Já quando a norma penal/contra-ordenacional ordena, a sua infracção terá de consistir numa omissão (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/04/2019, proc.180/18.9BELLE; Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.36 e seg.; Manuel Cavaleiro de Ferreira, Lições de Direito Penal, Parte Geral, I, Editorial Verbo, 1988, pág.70 e seg.).»

Ora, para determinar se uma decisão de aplicação de coima está ferida de nulidade insuprível, por falta do requisito da decisão relativo à descrição sumária dos factos, nos termos conjugados dos artigos 63.º n.º 1 d) e 79.º al. b) do RGIT, importa apreciar se a falta afecta o exercício do direito de defesa pelo arguido, nos termos consagrados no artigo 32.º n.º 10 da Constituição da República Portuguesa.

Importa ainda ter presente que, o que está em causa nestes autos é a imputação à recorrida de factos previstos como infração contra-ordenacionais praticadas no âmbito do sistema de cobrança eletrónica de portagens, no caso dos autos, consubstanciada na omissão ou no não pagamento de taxa de portagem por o veículo ter transposto uma infra-estrutura rodoviária, em local de detecção de veículos.

Ora, estes factos contra-ordenacionais regem-se pelo regime especial previsto na Lei n.º 25/2006 de 30/6.

Com interesse para a apreciação do recurso, dispõe o artigo 5.º da referida Lei n.º 25/2006:

«Contraordenações praticadas no âmbito do sistema de cobrança eletrónica de portagens

1 - Constitui contraordenação, punível com coima, nos termos da presente lei, o não pagamento de taxas de portagem resultante:

a) Da transposição de uma barreira de portagem através de uma via reservada a um sistema eletrónico de cobrança de portagens sem que o veículo em causa se encontre associado, por força de um contrato de adesão, ao respetivo sistema;

b) Da transposição de uma barreira de portagem através de uma via reservada a um sistema eletrónico de cobrança de portagens em incumprimento das condições de utilização previstas no contrato de adesão ao respetivo sistema, designadamente por falta ou deficiente colocação do equipamento no veículo, por falta de validação do equipamento nos termos contratualmente acordados, por falta de associação de meio de pagamento válido ao equipamento ou por falta de saldo bancário que permita a liquidação da taxa de portagem devida.

2 - Constitui, ainda, contraordenação, punível com coima, nos termos da presente lei, o não pagamento de taxas de portagem resultante da transposição, numa infraestrutura rodoviária que apenas disponha de um sistema de cobrança eletrónica de portagens, de um local de deteção de veículos sem que o agente proceda ao pagamento da taxa devida nos termos legalmente estabelecidos.

3 - (Revogado.)

4 - Em todos os casos em que sejam devidos custos administrativos são os mesmos fixados por portaria do membro do Governo responsável pelo setor das infraestruturas rodoviárias

Dispõe o artigo 10.º da referia Lei quanto à responsabilidade pelo pagamento:

«1 - Sempre que não for possível identificar o condutor do veículo no momento da prática da contraordenação, as concessionárias, as subconcessionárias, as entidades de cobrança das taxas de portagem ou as entidades gestoras de sistemas eletrónicos de cobrança de portagens, consoante os casos, notificam o titular do documento de identificação do veículo para que este, no prazo de 30 dias úteis, proceda a essa identificação ou pague voluntariamente o valor da taxa de portagem e os custos administrativos associados.

2 - A identificação referida no número anterior deve, sob pena de não produzir efeitos, indicar, cumulativamente:

a) Nome completo;

b) Residência completa;

c) Número de identificação fiscal, salvo se se tratar de cidadão estrangeiro que o não tenha, caso em que deverá ser indicado o número da carta de condução.

3 - Na falta de cumprimento do disposto nos números anteriores, é responsável pelo pagamento das coimas a aplicar, das taxas de portagem e dos custos administrativos em dívida, consoante os casos, o proprietário, o adquirente com reserva de propriedade, o usufrutuário, o locatário em regime de locação financeira ou o detentor do veículo.

4 - Quando, nos termos do n.º 1, seja identificado o agente da contraordenação, é este notificado para, no prazo de 30 dias úteis, proceder ao pagamento da taxa de portagem e dos custos administrativos associados.

5 - Caso o agente da contraordenação não proceda ao pagamento referido no número anterior, é lavrado auto de notícia, aplicando-se o disposto no artigo 9.º da presente lei e extraída, pelas entidades referidas no n.º 1 do artigo 11.º, a certidão de dívida composta pelas taxas de portagem e custos administrativos associados correspondentes a cada mês, que são remetidos à entidade competente.

6 - O direito de ilidir a presunção de responsabilidade prevista no n.º 3, considera-se definitivamente precludido caso não seja exercido no prazo referido no n.º 1.»

No caso dos autos, a arguida foi acusada e condenada por infracção ao artigo 5.º, n.º 2 da Lei n.º 25/2006, de 30/06. Assim sendo, o facto típico e ilícito que preenche a previsão da referida norma, consiste no não pagamento, no prazo e nos termos legalmente estabelecidos, de taxas de portagem devida pela transposição, numa infraestrutura rodoviária que apenas disponha de um local de deteção de veículos.

O referido regime contém um procedimento especial, prévio à elaboração do auto de notícia, previsto no artigo 10.º da referida Lei, que não integra o elemento objectivo do tipo, nem se confunde com o processo de contra-ordenação.

Com efeito, nos casos em que não é possível identificar o condutor do veículo no momento da prática da contraordenação, tal procedimento tem a finalidade de permitir ao titular do documento de identificação do veículo, no prazo de 30 dias úteis, a identificação do condutor do veículo no momento da prática da contraordenação, ou pagar voluntariamente o valor da taxa de portagem e os custos administrativos associados.

Findo o aludido prazo, é responsável pelo pagamento das coimas a aplicar, das taxas de portagem e dos custos administrativos em dívida, consoante os casos, o proprietário, o adquirente com reserva de propriedade, o usufrutuário, o locatário em regime de locação financeira ou o detentor do veículo, conforme os elementos que constem do registo automóvel, precludindo-se definitivamente o direito conferido ao titular, de ilidir a presunção de responsabilidade prevista no n.º 3.

Este procedimento especial e prévio, constitui uma garantia de que o processo de contra-ordenação não é instaurado e instruído contra quem não é o verdadeiro agente da infracção. Permitindo-se ao titular do documento de identificação do veículo, não sendo ele o condutor do veículo, no momento da infracção, declarar quem o era, fornecendo os elementos previstos no n.º 2 do artigo 10.º.

Trata-se, na verdade, de um procedimento que se destina a determinar o agente da infracção, a título definitivo por ser preclusivo, daí ser prévio à elaboração do auto de notícia. Constitui formalidade essencial, contudo não integra o facto típico e ilícito previsto no artigo 5.º da Lei 25/2006 como contra-ordenação.

Neste sentido, já decidiu o Supremo Tribunal Administrativo de forma reiterada, citando-se a título de exemplo, suja fundamentação aqui se acolhe, o Acórdão proferido no processo n.º 0645/17.0BELLE, datado de 14/10/2020.

«(…) os campos de aplicação e, consequentemente, as imposições emergentes dos artigos 5.º, 7.º e 10.º da Lei n.º 25/2006 são distintos: no artigo 5.º identifica-se o facto típico e ilícito consubstanciador das contra-ordenações em causa; no artigo 7.º estão estabelecidos os mecanismos de determinação da coima aplicável e das custas processuais; no artigo 10.º está previsto o regime jurídico aplicável às situações de impossibilidade de identificação do condutor do veículo no momento da prática da contra-ordenação, como linearmente resulta do n.º 1 desse mesmo normativo.

Em suma, a “qualidade do responsável” a quem é imputada a prática das contra-ordenações consagrada no artigo 10.º, n.º 3 da Lei 25/2006 - condutor, proprietário, adquirente com reserva de propriedade, usufrutuário, locatário em regime de locação financeira ou detentor do veículo -, não constitui elemento objectivo do tipo legal da infracção em causa, tal como este está previsto no artigo 5.º do diploma citado.

(…) a não indicação (…) dessa qualidade nas decisões de aplicação de coima não tem como consequência a nulidade insuprível da decisão, nos termos dos artigos 63, nº.1, al. d) e 79.º nº.1, al. b) do RGIT.»

Como resulta da matéria de facto aditada, a recorrida foi notificada, nos termos do artigo 10.º da Lei n.º 25/2006, e nada disse, presumindo-se que é a infratora para o efeito da elaboração dos autos de notícia e instauração do processo por contra-ordenação, por preclusão do direito a identificar eventual terceiro condutor.

Assim, não constituindo o título a que foi acusada e condenada a arguida elemento do tipo, impõe-se conceder provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida.

Aqui chegados importa apreciar o recurso da arguida, em substituição.

A arguida deduziu recurso contra as decisões de aplicação das coimas apresentando as suas alegações que rematou com as seguintes conclusões:

«1- O processo de Contra-ordenação padece de nulidade insuprível, decorrente da “falta de notificação do Auto de Notícia”, fazendo com que a ora Recorrente não possa ter conhecimento e não possa, consequentemente, analisar todas as razões que serviram de fundamento à aplicação da coima. Não permitindo, desta forma, que se possa aferir do cumprimento de todos os requisitos exigidos pela lei, por parte da Administração Fiscal, nomeadamente os previstos nos artigos 57.º, 59.º e 60.º do Regime Geral das Infrações Tributárias.

2 – O processo de Contra-ordenação fiscal padece de nulidade insuprível, decorrente da “omissão da descrição sumária dos factos relacionados, ou constitutivos, da infração” prevista no artigo 79.º, n.º 1, alínea b) e artigo 63.º, n.º 1, alínea b) do Regime Geral das Infrações Tributárias, uma vez que o Despacho de aplicação da coima se limita a fazer uma mera remissão para o Auto de Notícia, que não foi sequer notificado à ora Recorrente.

3 – A decisão de aplicação de coima proferida no processo de Contra-Ordenação supra revela fundamentada, clara e inequivocamente a condição económica da arguida, a gravidade dos factos ou a culpa do agente.

4 – A situação que origina a falta de requisitos legais da decisão de aplicação de coimas previstas no art.º 79 do RGIT, continua, sendo a al. d) do n.º 1 do artº 63 do mesmo diploma legal nulidade insuprível do processo de contra-ordenação fiscal.»

Na primeira conclusão, a arguida põe em causa o processo de contra-ordenação imputando-lhe a «nulidade insuprível decorrente da falta de notificação do Auto de Notícia, fazendo com que a ora Recorrente não possa ter conhecimento e não possa, consequentemente, analisar todas as razões que serviram de fundamento à aplicação da coima

O direito de defesa em processo contraordenacional constitui um direito fundamental com consagração constitucional expressa no n.º 10 do artigo 32.º que tem por título «garantias de processo criminal» nos seguintes termos: «Nos processos de contra- -ordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa

Ainda que o arguido impute a nulidade insuprível reportando-se à aplicação da coima, está em causa a concretização do direito de defesa, pelo que, a sua apreciação abrange o momento legalmente previsto no processo de contra-ordenação para o seu exercício, o que abrange o momento da notificação para apresentação de defesa previsto no artigo 70.º do RGIT.

Neste sentido se pronunciou o STA no Acórdão proferido no processo n.º 269/18 de 30/05/2018: «I - O direito de defesa em processo contraordenacional é um direito fundamental, imprescritível e que apenas a arguida pode decidir não exercer, não se apagando ou fragilizando com meros ajustes procedimentais.

II - O tribunal perante a invocação de uma situação que possa ter contribuído para impedir ou diminuir o exercício do direito de defesa do arguido, não pode deixar de averiguar como, quando, e, porque forma foi garantido à arguida, de modo efectivo, o exercício do seu direito de defesa, antes de contra ela vir a ser proferida uma decisão condenatória.»

No que se refere à falta de notificação do auto de notícia dispõe o artigo 70.º do RGIT sob a epígrafe notificação do arguido:

«1 - O dirigente do serviço tributário competente notifica o arguido do facto ou factos apurados no processo de contraordenação e da punição em que incorre, comunicando-lhe também que, no prazo de 30 dias, pode apresentar defesa e juntar ao processo os elementos probatórios que entender, bem como utilizar a possibilidade de pagamento antecipado da coima nos termos do artigo 75.º, obter a atenuação especial da coima nos termos do artigo 32.º, solicitar a dispensa da coima nos termos do n.º 2 do artigo 29.º se verificados os respetivos requisitos, ou, até à decisão do processo, utilizar a possibilidade de pagamento voluntário os termos do artigo 78.º

2 - Às notificações no processo de contra-ordenação aplicam-se as disposições correspondentes do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

3 - No caso de processo instaurado com base em auto de notícia, a descrição dos factos a que se refere o n.º 1 deste artigo pode ser substituída pela cópia do auto

Importa ainda ter presente o que em matéria de notificações se prevê no regime previsto na Lei n.º 25/2006, aplicável às infracções ocorridas em matéria de infra-estruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem.

Dispõe o artigo 14.º, n.ºs 5 a 7 da Lei n.º 25/2006:

«(…) 5 - Quando se verifique a existência de várias infrações cometidas pelo mesmo agente ou com a utilização do mesmo veículo pode efetuar-se uma única notificação.

6 - Caso uma única notificação se revele insuficiente para listar a totalidade das infrações cometidas em determinado período pelo agente, pode a administração tributária disponibilizar a informação relevante no Portal das Finanças, remetendo sempre segunda carta contendo a listagem das infrações cometidas.

7 - Nos casos previstos no número anterior, a notificação deve conter:

a) A indicação de que as infrações podem ser consultadas no Portal das Finanças; e

b) A referência de que o agente pode consultar a listagem das infrações cometidas na segunda carta que receber.»

A notificação relevante é a que dá a conhecer ao arguido as infracções que lhe são imputadas e as normas punitivas. Daí que, dos elementos que o auto de notícia deve conter, previstos no n.º 2 do artigo 57.º do RGIT, apenas constituem nulidade insuprível:

a) O levantamento do auto de notícia por funcionário sem competência; e

b) A falta de assinatura do autuante e de menção de algum elemento essencial da infracção» passando a valer não como auto de notícia, mas como participação, impondo-se, nesse caso, a instrução do processo para produção da prova da verificação dos factos (cf. artigo 60.º, n.º 1 e 69.º do RGIT).

Também consta do elenco das nulidades, a falta de notificação do despacho para audição e apresentação de defesa, conforme resulta da alínea c) da referida norma, sendo certo que não se exige que a notificação para defesa remeta o auto de notícia, desde que a informação fornecida permita o exercício da defesa. Ora, decorre do disposto no n.º 1 do artigo 70.º que a notificação ao arguido para defesa deve conter os factos apurados no processo de contra-ordenação e a punição em que incorre, podendo esses elementos ser substituídos pela remessa do auto de notícia (cf. n.º 3).

Resulta assim, da citada norma que o envio do auto de notícia não constitui requisito essencial do direito de defesa, desde que a notificação contenha a descrição dos factos identificados no n.º 1 da norma.

Invoca a Fazenda Pública que a arguida foi notificada das infracções cometidas pela concessionária em momento anterior ao da instauração dos processos.

Contudo, no âmbito de procedimentos sancionatórios, como são os processos de contra-ordenação, a notificação efectuada que contém os elementos depois reproduzidos nos respectivos autos de notícia, destinavam-se à notificação nos termos e para os efeitos do artigo 10.º, em momento anterior ao da instauração dos processos não substituindo nem dispensando o cumprimento da garantia de defesa nos termos do disposto no artigo 70.º do RGIT.

Impunha-se que, após a instauração do processo de contraordenação, tais elementos fossem remetidos novamente para que a arguida pudesse exercer o direito de defesa, que deve ser exercido no momento próprio para o efeito sob pena de se desvirtuar o formalismo de tutela do direito de defesa estabelecido pelo legislador.

Existindo várias infrações cometidas, como sucede nos presentes autos, tem consagração legal, no caso de uma única notificação se revelar insuficiente para listar a totalidade das infrações cometidas em determinado período pelo agente, a disponibilização pela administração tributária da informação relevante no Portal das Finanças. Uma notificação efectuada com remissão para o auto de notícia que serviu de base à instauração dos processos de contra-ordenação, com a indicação dos números dos autos e dos respectivos números de processo de contra-ordenação, informando-se a arguida da possibilidade de aceder aos factos imputados e às normas aplicáveis, através da consulta via internet, no Portal das Finanças no endereço eletrónico http://www.portaldasfinancas.gov.pt., utilizando a senha de acesso, tem respaldo na norma supra citada, desde que cumpridas as formalidades ali prescritas, mais precisamente, desde que seja remetida uma segunda carta prevista no n.º 6 e na alínea b) do n.º 7 do artigo 14.º supra citado, contendo a listagem das infracções.

Esta forma de comunicar os elementos essenciais que caracterizam as infracções não se mostra cumprida no caso dos autos. Não consta do probatório, nem constam dos autos elementos que comprovem o envio da segunda carta conforme disposto no n.º 6 artigo 14.º. O envio de segunda carta contendo a listagem das infrações cometidas, não constitui uma faculdade, nem constitui uma alternativa à acessibilidade da informação através da consulta do portal das finanças. A sua imperatividade decorre do advérbio «sempre». Caso uma única notificação se revele insuficiente para listar a totalidade das infrações cometidas em determinado período pelo agente, pode a administração tributária disponibilizar a informação relevante no Portal das Finanças, remetendo sempre segunda carta contendo a listagem das infrações cometidas. O envio desta segunda carta constitui um imperativo que tem em vista garantir que a informação relativa aos factos apurados e não apenas quanto à punição em que incorre chegam ao conhecimento do arguido, na fase da apresentação da defesa e não antes ou depois, como forma de lhe assegurar os direitos de audiência e defesa, direito que encontra consagração constitucional expressa no n.º 10 do artigo 32º, como já deixámos dito.

Em conclusão, alegando a arguida que não teve conhecimento da descrição dos factos e indicação das normas violadas e punidas, a prova do efectivo cumprimento do direito de defesa do arguido não se basta com o envio pela concessionária da notificação nos termos e para os efeitos do artigo 10.º da Lei n.º 25/06 em momento prévio à instauração do processo de contra-ordenação como defende a Fazenda Pública na contestação (artigos 2.º a 6.º), nem se basta com o envio de uma notificação remetendo para o portal das finanças. Impunha-se o envio da listagem das infracções em segunda notificação.

Não resultando dos autos a prova de ter sido efectuada a segunda notificação a que alude o n.º 6 do artigo 14.º da Lei n.º 25/2006, que constitui uma notificação essencial para o exercício do direito de defesa, impõe-se anular os termos subsequentes à autuação do processo de contra-ordenação, com a consequente devolução dos autos à autoridade administrativa que aplicou a coima, com vista a eventual prática dos actos de notificação para defesa nos termos supra apreciados e termos subsequentes até à decisão de aplicação das coimas, se nada mais a tanto obstar.

Conclusões:

i) A notificação do arguido para apresentar defesa deve conter os elementos previstos no n.º 1 do artigo 70.º do RGIT, não dispensando a remissão para a consulta no portal das finanças a notificação de tais elementos;

ii) Caso uma única notificação se revele insuficiente para listar a totalidade das infrações cometidas em determinado período pelo agente, pode a administração tributária disponibilizar a informação relevante no Portal das Finanças, remetendo sempre segunda carta contendo a listagem das infrações cometidas;

iii) O envio da segunda carta referida no número anterior, nas condições ali especificadas, não constitui uma faculdade, constituindo um imperativo que se funda na garantia conferida pelo n.º 10 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa dos direitos de audiência e defesa do arguido em processos de contra-ordenação.

IV – DECISÃO

Termos em que, acordam em conferência os juízes da 1ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso jurisdicional, revogar a decisão recorrida e conhecendo em substituição conceder provimento ao recurso de aplicação da coima, anulando os termos subsequentes à autuação do processo de contra-ordenação incluindo a decisão, determinando a baixa dos autos à autoridade administrativa competente para os tramites subsequentes.

Sem custas.

Lisboa, 25 de Março de 2021.


A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Senhoras Desembargadoras Ana Pinhol e Isabel Fernandes.


Ana Cristina Carvalho