Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07780/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:10/16/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO.
PRAZO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. CÔMPUTO.
ACTOS QUE ENFERMEM DE VÍCIO PARA QUE ESTEJA PREVISTA A SANÇÃO DE NULIDADE.
ÓNUS DA PROVA.
NOTIFICAÇÕES AOS INTERESSADOS QUE TENHAM CONSTITUÍDO MANDATÁRIO.
PRAZO DE DEDUÇÃO DA IMPUGNAÇÃO JUDICIAL PREVISTO NO ARTº.102, Nº.2, DO C.P.P.T.
NÃO POSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO EM SUBSTITUIÇÃO.
Sumário:1. O prazo da impugnação judicial é peremptório, de caducidade e de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, dado versar sobre direitos indisponíveis no que diz respeito à Fazenda Pública. É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.576, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido.

2. Para os actos que enfermem de vício para que esteja prevista a sanção de nulidade (cfr.artº.133, do C.P.A.) a impugnação pode ser feita a todo o tempo, como resulta do preceituado no artº.102, nº.3, do C.P.P.T., norma que está em sintonia com o disposto no artº.134, nº.2, do C.P.A., e no artº.58, nº.1, do C.P.T.A. O mesmo sucede se for invocada a inexistência do acto impugnado, pois trata-se de uma forma de invalidade mais grave do que a nulidade e, por isso, por maioria de razão, se tem de aplicar o regime de impugnação a todo o tempo previsto para a nulidade. Nestes casos, o facto de o impugnante invocar a nulidade ou inexistência do acto recorrido obsta a que se possa indeferir liminarmente a petição de impugnação por intempestividade, mas se, posteriormente, se vier a decidir que a qualificação adequada de algum dos vícios é a de anulabilidade, não deverá conhecer-se desses vícios se a sua arguição foi feita para além do prazo legal para impugnação de actos anuláveis.

3. A contagem do prazo para interposição de recurso contencioso de impugnação deve fazer-se nos termos do artº.279, do C. Civil, isto é, de forma contínua e sem qualquer desconto dos dias não úteis (cfr.artº.20, nº.1, do C.P.P.Tributário). No cômputo do prazo em questão, quando o seu termo final ocorra em domingo, dia feriado ou férias judiciais, faz com que o mesmo termo se transfira para o primeiro dia útil seguinte (cfr.artº.279, al.e), do C.Civil).

4. Convém realçar que incumbe à A. Fiscal, em regra, o ónus de demonstrar que a notificação foi efectuada nos termos da lei, ressalvados os casos de presunção de recebimento da mesma notificação, como são os previstos, por exemplo, no artº.39, nºs.5 e 6, do C.P.P.T.

5. As notificações aos interessados que tenham constituído mandatário devem ser efectuadas na pessoa deste e no seu escritório, conforme resulta do artº.40, nº.1, do C.P.P.T. (cfr.artº.253, nº.1, do C.P.Civil), normativo que tem aplicação tanto no âmbito do procedimento gracioso como no processo judicial tributário como se conclui da epígrafe da Secção IV do C.P.P.T., “Dos actos procedimentais e processuais”, em que a norma está inserida. Só assim não acontecerá, devendo igualmente ser notificado o próprio interessado, quando nos encontramos perante acto pessoal, conforme resulta do artº.40, nº.2, do mesmo diploma (v.g.notificação do interessado com vista à participação em diligência). A prática de acto pessoal pelo interessado significa, necessariamente, a comparência do mesmo junto dos serviços da A. Fiscal ou do Tribunal.

6. A falta de notificação, ao mandatário judicial constituído, da decisão da reclamação graciosa tem como consequência não ter ainda ocorrido o termo inicial do prazo (quinze dias) de dedução da impugnação judicial previsto no artº.102, nº.2, do C.P.P.T.

7. Em virtude do provimento do recurso e de acordo com o artº.665, do C. P. Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, haverá que saber se se aplica no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao Tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, tudo ao abrigo do princípio da economia processual. Pensamos que não, desde logo, porque se estaria a violar a regra do duplo grau de jurisdição quanto ao exame e decisão da matéria de facto, assim devendo baixar os autos à 1a Instância para conhecimento do pedido formulado no final do articulado inicial do presente processo, se nenhuma outra excepção ou questão prévia a tal obstar.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
RICARDO ………………. E SOFIA ……………….., com os demais sinais dos autos, deduziram recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferido pela Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.69 a 76 do presente processo, através do qual julgou procedente a excepção de caducidade do direito de acção e absolveu a Fazenda Pública da instância, tudo no âmbito de processo de impugnação que tem como objecto mediato despacho que determinou a cessação de benefício fiscal incidente sobre fracção autónoma de que são proprietários.
X
Os recorrentes terminam as alegações (cfr.fls.97 a 101 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A sentença recorrida julgou procedente a excepção peremptória de caducidade do direito da acção, porque considerou os impugnantes notificados da decisão proferida sobre a reclamação graciosa no passado dia 9 de Maio de 2013, uma vez que foi nessa data que foi assinado o aviso de recepção, razão pela qual se deveria sobrepor o regime do art. 39°, n.° 3 do CPPT ao do n.° 1 do mesmo preceito legal;
2-Porém, os recorrentes entendem que só se devem considerar notificados a 13 de Maio de 2013, pelo que, tendo a acção sido proposta no prazo de 15 dias, nos termos conjugados dos arts. 97, n.° 1, c) e 102, n.° 2, do CPPT, foi tempestiva a sua propositura, divergindo do entendimento adoptado pela sentença por duas ordens de razão;
3-Primeiro, porque a carta de notificação em apreço não está identificada como tendo sido remetida com aviso de recepção, como decorre do seu teor, que não contém qualquer referência a essa situação, sendo certo que o aviso de recepção não está assinado por nenhum dos recorrentes (cfr. última folha do PAT). Idem, no respectivo sobrescrito, que ora se junta (por cautela e para demonstrar a completa boa fé dos recorrentes);
4-Se a Fazenda Pública se queria prevalecer da data do aviso de recepção - em derrogação do regime geral de notificação aos mandatários que consta do art. 40 do CPPT - então, tinha de fazer menção, na carta remetida, de que a sua remessa era feita com aviso de recepção, em vez de uma mera referência a "Registado", que consta daquela carta de notificação. É o que decorre de princípios elementares de boa fé e de lealdade processual;
5-Na verdade, o signatário, advogado da mulher e dele próprio, tendo-lhe sido entregue uma carta registada - não recebida nem por ele nem pela mulher e sem qualquer referência a um aviso de recepção - seguiu o regime de presunção previsto no art. 40 do CPPT, não lhe sendo exigível que tivesse de saber que a carta fora remetida com aviso de recepção, e não podendo ser prejudicado por essa falta, nos termos, de resto, do art. 161, n.° 6 do C.P.C.;
6-Segundo, porque essa carta não foi dirigida para o escritório do mandatário signatário, como exige o art. 40, n.° 1 do CPPT - situado na Rua …………, n.° 2, em ………., como consta do teor da reclamação graciosa apresentada - mas sim para a sua residência pessoal, situada no …………….., n.° 27, 4°, em ………., onde foi recebida por uma empregada, que só mais tarde lha entregou;
7-Neste contexto, tendo a notificação sido dirigida para a sua morada pessoal e não para o seu escritório, quando obrigatoriamente tinha de o ter sido para o seu escritório (cfr. art. 40, n.° 1 do CPPT), deve considerar-se ineficaz a notificação em apreço na data em que foi assinado o aviso de recepção ou em qualquer outra, a não ser naquela a partir da qual o advogado signatário dela se considerou notificado e agiu como tal, ou seja, 13 de Maio de 2013;
8-O entendimento normativo dado ao art. 39, n.° 3 do CPPT, devidamente conjugado com os arts. 39, n.° 1 e 40, n.°s 1 e 3 do CPPT, no sentido de que se deve considerar efectuada, na data da assinatura do aviso de recepção por terceiro, a notificação dirigida a mandatário constituído (advogado) para a sua residência pessoal (e não para o seu escritório) e, ademais, sem que a carta faça qualquer referência a que foi remetida sob registo com aviso de recepção, é inconstitucional, por manifesta violação do direito a um processo equitativo, nos termos do art. 20, n.° 4 da CRP, o que se deixa arguido;
9-Termos em que o recurso merece provimento, com as legais consequências, devendo ser considerada tempestiva a propositura da impugnação judicial, com as legais consequências, seguindo o processo para apreciação do respectivo mérito.
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Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.122 e 123 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.71 e 72 dos autos - numeração nossa):
1-No dia 16 de Outubro de 2012, os impugnantes receberam uma carta, tendo como assunto "Isenção IMI", dirigida a "Ricardo ………………..", de cujo teor se extrai:

"Fica notificado que (...) foi revogado o despacho que concedeu a isenção ao abrigo do artigo 40° (...).
Todavia, nos termos do art. 66.° do CPPT (...), poderá, querendo interpor recurso hierárquico para o Exmo. Senhor Ministro das Finanças, no prazo de 30 dias a contar da data de notificação.
(...)"
(cfr.documento junto a fls.11 a 13 dos presentes autos; documentos juntos a fls.12 e 13 do apenso de reclamação graciosa);
2-No dia 13 de Fevereiro de 2013, os impugnantes apresentaram reclamação graciosa do despacho a que se refere o número anterior (cfr.documentos juntos a fls.2 e 14 do apenso de reclamação graciosa);
3-A reclamação graciosa descrita no número anterior foi subscrita pelo impugnante marido, como advogado em causa própria, e como advogado da impugnante mulher (cfr. documentos juntos a fls.4 e 5 do apenso de reclamação graciosa);
4-No dia 8 de Maio de 2013, foi expedida pelo 3º.Serviço de Finanças de Lisboa, uma carta, tendo como assunto "Reclamação Graciosa ……….. - IMI/2008", dirigida a "Ricardo ………………" e "Sofia ……………….", de cujo teor se extrai:

"(...)
Ficam V. Exas. por este meio notificados que a reclamação acima identificada foi INDEFERIDA, por despacho datado de 2013-04-26, conforme fundamentação que se junta.
Desta decisão podem V. Exas, deduzir impugnação judicial no prazo de 15 (quinze) dias, a contar da presente notificação (...)"
(cfr.documento junto a fls.8 dos presentes autos);

5-No dia 9 de Maio de 2013, foi assinado o aviso de recepção referente à carta descrita no número anterior (cfr.documento junto a fls.39 do apenso de reclamação graciosa);
6-A petição inicial dos presentes autos foi expedida por correio registado, dirigido ao 3º.Serviço de Finanças de Lisboa, no dia 28 de Maio de 2013 (cfr.documento junto a fls.16 dos presentes autos).
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A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do tribunal, no que respeita aos factos provados, assentou na prova documental junta aos autos, conforme indicado junto a cada um…”.
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
7-Na reclamação graciosa identificada nos nºs.2 e 3 do probatório, o impugnante marido indicou como seu domicílio profissional a Rua …………., nº.2, ………….. (cfr.documentos juntos a fls.4 e 5 do apenso de reclamação graciosa);
8-A carta identificada no nº.4 do probatório foi remetida pelo 3º.Serviço de Finanças de Lisboa para o seguinte domicílio: Campo dos Mártires da Pátria, nº.27, 4º., 1150-225 Lisboa (cfr.documento junto a fls.8 dos presentes autos);
9-O a.r. identificado no nº.5 da factualidade provada foi assinado por Maria ……….., não constando do mesmo a anotação do documento de identificação respectivo (cfr. documento junto a fls.39 do apenso de reclamação graciosa).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada uma dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a decisão recorrida decidiu, em síntese, julgar procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de acção e absolver a entidade impugnada da instância.
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Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Aduzem os recorrentes, em sinopse e conforme se relata acima, que a sentença recorrida julgou procedente a excepção peremptória de caducidade do direito da acção, porque considerou os impugnantes notificados da decisão proferida sobre a reclamação graciosa no passado dia 9 de Maio de 2013, uma vez que foi nessa data assinado o aviso de recepção, razão pela qual se deveria sobrepor o regime do artº.39, nº.3, do C.P.P.T., ao do nº.1 do mesmo preceito legal. Porém, os recorrentes entendem que só se devem considerar notificados a 13 de Maio de 2013, pelo que, tendo a acção sido proposta no prazo de 15 dias, nos termos conjugados dos artºs.97, nº.1, al.c), e 102, nº.2, do C.P.P.T., foi tempestiva a sua propositura, divergindo do entendimento adoptado pelo Tribunal "a quo". Que o signatário, advogado da mulher e dele próprio, tendo-lhe sido entregue uma carta registada - não recebida, nem por ele, nem pela mulher, e sem qualquer referência a um aviso de recepção - seguiu o regime de presunção previsto no artº.40, do C.P.P.T., não lhe sendo exigível que tivesse de saber que a carta fora remetida com aviso de recepção, e não podendo ser prejudicado por essa falta, nos termos do artº.161, nº.6, do C.P.C. Que essa carta não foi dirigida para o escritório do mandatário signatário, como exige o artº.40, nº.1, do C.P.P.T., mas sim para a sua residência pessoal, onde foi recebida por uma empregada, que só mais tarde lha entregou. Que tendo a notificação sido dirigida para a sua morada pessoal e não para o seu escritório, quando obrigatoriamente tinha de o ter sido para o seu escritório (cfr.artº.40, nº.1, do C.P.P.T.), deve considerar-se ineficaz a notificação em apreço na data em que foi assinado o aviso de recepção ou em qualquer outra, a não ser naquela a partir da qual o advogado signatário dela se considerou notificado e agiu como tal, ou seja, 13 de Maio de 2013. Que o entendimento seguido pelo Tribunal "a quo" é inconstitucional, por manifesta violação do direito a um processo equitativo, nos termos do artº.20, nº.4, da C.R.P. (cfr.conclusões 1 a 8 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
O prazo da impugnação judicial é peremptório, de caducidade e de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, dado versar sobre direitos indisponíveis no que diz respeito à Fazenda Pública (cfr.artº.333, nº.1, do C.Civil; artº.123, do anterior C.P.Tributário; artº.102, do C.P.P.Tributário; Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código de Procedimento e de Processo Tributário comentado e anotado, Almedina, 2000, pág.241; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, I Volume, Áreas Editora, 2011, pág.272 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/6/95, rec.19056, Ap. D.R., 14/8/97, pág.1725 e seg.).
Por outras palavras, o prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de uma certa pretensão, é um prazo de caducidade. E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do acto tributário) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr.artº.333, do C.Civil). É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.493, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/1/2013, proc. 6038/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2013, proc.6125/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7004/13).
Para os actos que enfermem de vício para que esteja prevista a sanção de nulidade (cfr.artº.133, do C.P.A.) a impugnação pode ser feita a todo o tempo, como resulta do preceituado no artº.102, nº.3, do C.P.P.T., norma que está em sintonia com o disposto no artº.134, nº.2, do C.P.A., e no artº.58, nº.1, do C.P.T.A. O mesmo sucede se for invocada a inexistência do acto impugnado, pois trata-se de uma forma de invalidade mais grave do que a nulidade e, por isso, por maioria de razão, se tem de aplicar o regime de impugnação a todo o tempo previsto para a nulidade. Nestes casos, o facto de o impugnante invocar a nulidade ou inexistência do acto recorrido obsta a que se possa indeferir liminarmente a petição de impugnação por intempestividade, mas se, posteriormente, se vier a decidir que a qualificação adequada de algum dos vícios é a de anulabilidade, não deverá conhecer-se desses vícios se a sua arguição foi feita para além do prazo legal para impugnação de actos anuláveis (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7004/13; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.156).
Por outro lado, recorde-se que a contagem do prazo para interposição de recurso contencioso de impugnação deve fazer-se de acordo com o artº.279, do C. Civil, isto é, de forma contínua e sem qualquer desconto dos dias não úteis (cfr.artº.49, nº.2, do C.P.Tributário; artº.20, nº.1, do C.P.P. Tributário). Mais se deve levar em consideração, no cômputo do prazo em questão, que o seu termo final em domingo, dia feriado ou férias judiciais, faz com que o mesmo termo se transfira para o primeiro dia útil seguinte (cfr.artº.279, al.e), do C.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6767/13; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.145).
No caso “sub judice”, do exame de articulado inicial que originou o presente processo deve concluir-se, antes de mais, que os impugnantes/recorrentes fundamentam o seu petitório em alegados vícios geradores de mera anulabilidade do acto em matéria tributária impugnado, pelo que o prazo para apresentação da p.i. se deve enquadrar e computar de acordo com o artº.102, nº.2, do C.P.P.T., sendo de quinze dias, dado que a presente impugnação tem por objecto imediato o indeferimento de reclamação graciosa.
Assente que a contagem do prazo para dedução da impugnação judicial se faz de acordo com as regras previstas no artº.279, do C. Civil, haverá que apurar qual o “dies ad quem” ou termo final dessa contagem no caso concreto.
Convém realçar que incumbe à A. Fiscal, em regra, o ónus de demonstrar que a notificação foi efectuada nos termos da lei, ressalvados os casos de presunção de recebimento da mesma notificação, como são os previstos no artº.39, nºs.5 e 6, do C.P.P.T. (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 21/2/1990, rec.5281; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/7/1991, rec.13040; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/1/2013, proc.6038/12; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, I Volume, Áreas Editora, 2011, pág.410).
Voltando ao caso concreto, resulta do probatório que os recorrentes constituíram mandatário, ainda durante a fase graciosa do processo, mais estando identificado o domicílio profissional do mesmo (cfr.nºs.3 e 7 da matéria de facto provada).
Ora, as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário devem ser efectuadas na pessoa deste e no seu escritório, conforme resulta do artº.40, nº.1, do C.P.P.T. (cfr.artº.247, nº.1, do C.P.Civil), normativo que tem aplicação tanto no âmbito do procedimento gracioso como no processo judicial tributário como se conclui da epígrafe da Secção IV do C.P.P.T., “Dos actos procedimentais e processuais”, em que a norma está inserida (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, I Volume, Áreas Editora, 2011, pág.394). Só assim não acontecerá, devendo igualmente ser notificado o próprio interessado, quando nos encontramos perante acto pessoal, conforme resulta do artº.40, nº.2, do mesmo diploma (v.g.notificação do interessado com vista à participação em diligência). A prática de acto pessoal pelo interessado significa, necessariamente, a comparência do mesmo junto dos serviços da A. Fiscal ou do Tribunal (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/1/2013, proc.6038/12; Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código de Procedimento e de Processo Tributário comentado e anotado, Almedina, 2000, pág.117).
De resto, a norma em exame tem de ser lida à luz da exigência constitucional de notificação aos interessados de todos os actos administrativos (cfr.artº.268, nº.3, da C.R.Portuguesa).
“In casu”, conforme se retira da factualidade provada (cfr.nºs.7 e 8 do probatório), a notificação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa não foi enviada ao douto mandatário dos recorrentes e para o respectivo domicílio profissional, pelo que não se pode ter por verificada e, igualmente, se não podendo lançar mão da presunção de notificação prevista no artº.248, do C.P.Civil. Mais se dirá, que a notificação do despacho de indeferimento efectuada na pessoa dos recorrentes (cfr.nºs.8 e 9 da matéria de facto provada) não reveste qualquer relevo, atento o facto de terem constituído mandatário que os representava no processo gracioso e contencioso e dado que não nos encontramos perante acto pessoal enquadrável no citado artº.40, nº.2, do C.P.P.T.
Concluindo, a falta de notificação, ao mandatário judicial constituído, da decisão da reclamação graciosa tem como consequência não ter ainda ocorrido o termo inicial do prazo (quinze dias) de dedução da impugnação judicial previsto no aludido artº.102, nº.2, do C.P.P.T. (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 30/1/2002, rec.26609, Ap. D.R., 16/2/2004, pág.302 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/1/2013, proc.6038/12; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, I Volume, Áreas Editora, 2011, pág.400), assim se devendo considerar tempestiva a p.i. que deu origem ao presente processo, contrariamente ao entendido pelo Tribunal “a quo”.
Aqui chegados, em virtude do provimento do recurso e de acordo com o artº.665, do C. P. Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, haverá que saber se se aplica no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao Tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, tudo ao abrigo do princípio da economia processual. Pensamos que não, desde logo, porque se estaria a violar a regra do duplo grau de jurisdição quanto ao exame e decisão da matéria de facto, assim devendo baixar os autos à 1a Instância para conhecimento do pedido formulado no final do articulado inicial do presente processo, se nenhuma outra excepção ou questão prévia a tal obstar (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 13/2/2014, proc.7193/13).
Arrematando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se procedente o presente recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, a qual padece do vício de erro de julgamento de direito que se consubstancia na violação do regime previsto no artº.40, do C.P.P.Tributário, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
1-CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO;
2-REVOGAR A SENTENÇA RECORRIDA E ORDENAR A BAIXA DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE 1ª. INSTÂNCIA, para que conheça dos fundamentos da impugnação.
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Sem custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 16 de Outubro de 2014


(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)

(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)