Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo: 388/05.7 BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:11/11/2021
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:RETENÇÃO NA FONTE, ATIVIDADE DE PROFISSIONAIS DE ESPETÁCULOS OU DE DESPORTISTAS, NÃO RESIDENTES
Sumário:I. Nos termos conjugados do art 75.º, n.º 1, da alínea f), do CIRC, com o seu n.º 9 (redação vigente no ano de 2000), o IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos rendimentos derivados do exercício em território português da atividade de profissionais de espetáculos ou de desportistas, obtidos por entidades não residentes em território português sempre que o titular dos rendimentos não fizesse prova junto da entidade devedora dos mesmos, antes da sua colocação à disposição, de que não é controlado direta ou indiretamente pelos profissionais de espetáculos ou desportistas;
II. O n.º 9, do art. 75.º do CIRC aquele preceito legal não exigia que a prova de que o titular dos rendimentos não é controlado direta ou indiretamente pelos profissionais de espetáculos ou desportistas, fosse efetuada mediante uma declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade de artistas não residente.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


PROCESSO N.º 388/05.7BELSB


A FAZENDA PÚBLICA vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal TRIBUTÁRIO DE LISBOA que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial da liquidação de IRC de 2000, no valor de 54.202,51€ deduzida pela F. C. G.

A Recorrente apresentou as suas alegações e formulou as seguintes conclusões:

“4.1 - Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou parcialmente procedente, devendo a Administração Tributária (doravante A.T.) anular a liquidação de IRC, relativa ao ano de 2000, nessa parte, bem como condenar a Fazenda Publica ao pagamento de juros indemnizatórios correspondentes à anulação da liquidação na parte correspondente à correcção “pagamentos a sociedades representantes de artistas não residentes”, desde a data do seu pagamento até à respectiva nota de crédito.
4.2 - A fundamentação da sentença recorrida assenta, em síntese, no entendimento de que não decorre da norma sindicada [o nº 9 do artº75 do CIRC (redacção ao tempo)] que a prova a produzir pelas sociedades «representantes» de artistas não residentes, tenha de ser efectuada por declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do estado de residência, dessas sociedades.
4.3 - Destarte, salvo o devido respeito, somos de opinião em que a Douta sentença, procedeu à errónea interpretação dos preceitos legais aplicáveis, nomeadamente o preceito legal supra citado, bem como não analisou a matéria de facto carreada pela AT.
4.4 - Se é verdade que não o nº 9 do artigo supra transcrito não estabelece claramente qual a prova necessária, ou seja, que tipo de documento é necessário para se provar que os artistas não controlam directa ou indirectamente a entidade que obtém o rendimento, de modo a que os rendimentos obtidos não sejam tributados através de retenção na fonte, no entanto a administração fiscal entende que são necessárias provas credíveis e estas tem que ser emitidas por entidades congéneres, ou seja, as Autoridades Fiscais desses Países.
4.5 - O sujeito passivo, ora recorrido, apenas apresentou um conjunto de documento da mais variada proveniência, desde cópias da declaração de registo em IVA a cópias da matricula na conservatória, documentos emitidos pelas próprias sociedades “representantes” de artistas, em que não é feita qualquer referência aos proprietários da sociedade, ou fazendo referência não é possível relacionar o prestador do espectáculo em 2000 com os sócios e a gerência das sociedades nesse mesmo ano, uma vez que se tratam de documentos com datas bem anteriores ao ano 2000.
4.6 - Mais, além da análise aos documentos apresentados verificou-se que para uma parte das sociedades “representadas” de artistas constantes do extracto de conta não foi apresentado qualquer documento.
4.7 – Em suma, a prova feita pela impugnante não foi credível, plena e satisfatória para que se dispensasse tal obrigação, sendo que em alguns casos ela não existiu, facto este que não foi apreciado pelo m. Juiz do tribunal a quo.
4.8 - Decorre do exposto que a decisão recorrida, ao julgar procedente a impugnação no quanto à correcção – pagamentos a sociedades “representantes de artistas não residentes” e consequentemente, ao anular a liquidação de IRC de 2000, nessa parte, e consequente condenação ao pagamento de juros indemnizatórios correspondentes à anulação da liquidação nessa parte, faz uma inadequada interpretação do disposto no nº 9 do art. 75º do CIRC na redacção à data dos factos.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente, quanto à matéria aqui discutida.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO
A COSTUMADA JUSTIÇA”
****

A Recorrida apresentou as suas contra-alegações e formulou as seguintes conclusões:
(…)

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O Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de que o recurso deverá improceder.
****
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
****
As questões invocadas pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objeto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir consiste em aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao ter entendido que o disposto no art. 9.º, do art. 75.º do CIRC (na redação em vigor à época) não exigia que a prova a produzir pelas sociedades “representantes” de artistas não residentes, tenha de ser efetuada por declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do estado de residência dessas sociedades. Invoca ainda que não foi feita prova credível, plena e satisfatória para que se dispensasse tal obrigação legal. Consequentemente pretende que seja também revogada a decisão de condenação ao pagamento de juros indemnizatórios correspondente a essa parte.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto (reorganizamos oficiosamente as letras dos factos provados porquanto, por lapso manifesto, havia uma duplicação na referência à alínea C) que importa retificar):

A) A impugnante é uma Fundação, sujeito passivo de IRC, inscrita no Registo Nacional de Pessoas Colectivas, com o CAE: 91.331- Associações Culturais e Recreativas e inscrita para efeitos de IVA, desde 01.01.1986, no Regime Normal de periodicidade mensal; (cfr. fls. 26 dos autos)

B) Pela ordem de serviço n.º 34.735, emitida em 26.04.2004, a impugnante
foi sujeita a uma acção de inspecção pelos Serviços de Inspecção Tributária de
Lisboa – Equipa 79, referente ao exercício do ano 2000, que teve início com a
assinatura da Nota de Diligências, em 05.07.2004 e a sua conclusão, em 01.09.2004, com a assinatura do Aviso de Recepção das conclusões do relatório
inspectivo; (cfr. fls. 26 e 280 a 283 do PA junto aos autos)

C) Desta acção de inspecção, resultaram correcções meramente aritméticas,
cuja fundamentação das correcções ora impugnadas se encontra vertida nas
conclusões do respectivo relatório com o seguinte teor:
«(…)
4 – Rendimentos de Outras aplicações de Capital
Através da análise dos extractos de conta das entidades inscritas na modelo 130,
referente aos rendimentos de outras aplicações de capital, verificou-se que na verdade se trata de royalties e não de rendimentos de outras aplicações de capital. De acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 75.° do CIRC (ao tempo), os royalties estão sujeitos a IRC, à taxa de 15%, conforme alínea a) do n.º 2 do art.º 69. do CIRC (ao tempo).
Para accionar os mecanismos previstos nas Convenções sobre Dupla Tributação é um formalismo obrigatório a obtenção de certificado de residência fiscal. Quando o titular dos rendimentos não fornece esse certificado, não é possível a comprovação da qualidade de residente, e como tal a abrangência pelas disposições previstas na convenção fica posta em causa, pelo que esta não pode ser aplicável.
Accionada a convenção, poderá não ser feita a retenção na fonte do imposto se o certificado de residência for apresentado antes da colocação à disposição dos rendimentos, sendo este válido para o ano da sua emissão.
Analisando a modelo 130 e comparando as taxas utilizadas com a taxa interna prevista para os royalties, verificamos que o sujeito passivo utilizou em alguns casos taxas reduzidas (anexo 3), mas que no entanto nem sempre foram apresentados os correspondentes certificados de residência fiscal, e como tal nesses casos não se poderá considerar que as convenções respectivas foram accionadas. Em relação aos certificados de residência apresentados verificou –se que a data de emissão dos mesmos é anterior à data dos pagamentos, e como tal a taxa reduzida foi bem aplicada.
Nos casos em que apesar de não ter os certificados de residência fiscal, o sujeito passivo aplicou as taxas reduzidas em vez da taxa interna, haverá lugar às seguintes correcções (…).

B – PAGAMENTOS A SOCIEDADES “REPRESENTANTES” DE ARTISTAS NÃO RESIDENTES

5 – Além dos rendimentos pagos a não residentes inscritos na Modelo 130, verificou-se que o sujeito passivo efectuou pagamentos a sociedades não residentes sem estabelecimentos estável em Território Nacional, referentes a espectáculos efectuados em Portugal por artistas que
são representados por estas mesmas sociedades.
6 – Pelo n.º 2 e alínea d) do n.º 3 do artigo 4.° do CIRC, os rendimentos derivados do exercício em território português da actividade de profissionais de espectáculos, ou seja, os rendimentos obtidos pelas sociedades “representantes” de artistas não residentes sem estabelecimento estável estão sujeitos a IRC, excepto, quando seja feita prova de que os artistas
não controlam directa ou indirectamente a sociedade de artistas.
7 – De acordo com a alínea f) n.º 1 artigo 75.° do CIRC, ao tempo, o IRC é objecto de retenção na fonte a titulo definitivo à taxa de 25 % (n.º 3 e n.º 5 do artigo 75º do CIRC conjugado com o n.º 2 do artigo 69° do CIRC, ao tempo) relativamente aos rendimentos referidos na alínea d) do n.º 3 do artigo 4. do CIRC obtidos por entidades não residentes em território português, quando o devedor dos mesmos seja sujeito passivo de IRC.
8 — Para que não seja efectuada a retenção na fonte referida no ponto anterior, a entidade devedora dos rendimentos, antes da colocação à disposição dos rendimentos deverá ter em seu poder uma declaração, confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade “representante” de artistas não residentes, onde conste que o profissional de espectáculos não controla directa ou indirectamente a entidade que obtém o rendimento. (n.º 9 do artigo 75° do CIRC, ao tempo). Assim sendo, se o artista controlar directa ou indirectamente a sociedade, a qual é efectuado o pagamento do espectáculo, há lugar a retenção na fonte a título definitivo.
9 – Para se aplicar as Convenções para evitar a Dupla Tributação não basta a existência das mesmas é preciso que a entidade devedora tenha em seu poder antes de efectuar o pagamento o certificado de residência emitido pelas autoridades fiscais competentes doestado de
residência da sociedade de artistas não residente. No que se refere aos rendimentos pagos a artistas não residentes, o artigo 17° do Modelo
de Convenção Fiscal da OCDE sobre o Rendimento e o Património, que serve de referência à Celebração das Convenções bilaterais, estabelece que os rendimentos obtidos por um residente de
um Estado contratante na qualidade de artista (quer sejam atribuídos ao próprio artista ou a outra pessoa) podem ser tributados no Estado fonte (da prestação do espectáculo), sem qualquer limitação. Assim sendo, é ao Estado de residência (e não a Portugal) que cabe a obrigação de
eliminar a dupla tributação.
No entanto, porque alguns países formularam reservas a algumas disposições do referidoartigo 17.°, deverá caso a caso consultar-se a respectiva Convenção bilateral celebrada entre Portugal e o pais da residência do artista.
10 – A Fundação não efectuou qualquer retenção na fonte aquando do pagamento às sociedades “representantes” de artistas não residentes, apesar de não ter em sua posse qualquer
declaração, confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do profissional de espectáculos não controla directa ou indirectamente a entidade que obtém o rendimento, nem o Certificado de Residência, de modo a poder aplicar as respectivas Convenções.
11 – No decorrer da fiscalização o sujeito passivo apresentou uma serie de documentos das sociedades “representantes” de artistas, e tendo por base esses documentos não fizeram qualquer retenção na fonte.
Da analise aos diversos documentos constatamos que em grande parte foram emitidos em datas bem anteriores (1985, 1993, 1995, etc…), sendo que alguns são cópias da declaração de registo em IVA, outros da matricula na conservatória, em que não é feita qualquer referência aos proprietários da sociedade, ou fazendo referência não é possível relacionar o prestador do
espectáculo em 2000 com os sócios e a gerência das sociedades nesse mesmo ano, uma vez que tal como foi referido alguns são documentos bem anteriores.
Foram-nos também apresentadas declarações das próprias sociedades em que as mesmas vinham alegar que determinado artista não tinha qualquer relação com a respectiva sociedade.
Com base nos documentos apresentados pela Fundação não é possível verificar o cumprimento do disposto no n.º 9 do artigo 75° do CIRC (ao tempo), ou seja, que os profissionais de espectáculos não controlam directa ou indirectamente a entidade que obtém o rendimento, uma vez que não se trata de uma declaração, confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade de artistas não residente.
Assim sendo, os rendimentos pagos às sociedades “representantes” de artistas serão sujeitos a retenção na fonte a título definitivo à taxa de 25%, nos termos dos artigos anteriormente citados.
12 - A nível contabilístico, o pagamento às sociedades que representam os artistas é contabilizado na conta de custos 622260500 – Agentes de Espectáculos, sendo possível a sua repartição por dois centro de custos, “280… - Musica” e “800… - Centro de Arte Moderna” e no ano 2000 totalizava 2.990.006,48 {.
13 – Analisando cada um dos extractos dos centros de custos, efectuou-se a separação entre as sociedades estrangeiras e nacionais através da conta de contrapartida, isto é, através do código de fornecedor, “21…. – Fornecedor Nacional” e “23…/24…. – Fornecedor Estrangeiro”.
14 – Assim, com base nos extractos dos centros de custos e após a separação entre pagamentos a fornecedores estrangeiros e nacionais efectuou-se o seguinte quadro resumo (…)»
(cfr. fls. 29 a 35 dos autos)

D) Na sequência das correcções, atrás efectuadas pela inspecção tributária
resultou a liquidação adicional n.º 2004 6420003220 de IRC, referente ao ano
2000, no montante de {241.675,56; (cfr. fls. 21 dos autos)

E) Em 15.11.2004, a impugnante efectuou o pagamento do montante de
{295.877,07 incluindo juros indemnizatórios de {54.202,51; (cfr. doc. 3 a fls. 146 dos autos)

III.I – Factos não Provados
Não se provaram outros factos com relevância para a presente decisão.

MOTIVAÇÃO
A matéria de facto, dada como assente nos presentes autos, foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida, segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito e, a formação da convicção do tribunal, para efeitos da fundamentação dos factos, atrás dados como provados, está referida no probatório com remissão para as folhas do processo onde se encontram.
****

Conforme resulta dos autos, o Meritíssimo Juiz do TT de Lisboa julgou parcialmente procedente a impugnação judicial, nomeadamente, na parte referente à correção a “Rendimentos de Outras Aplicações de Capitais – Royalties”. Entendeu, em síntese, que se verifica erro sobre os pressupostos de direito na medida e que a AT fundamentou a correção na exigência de uma determinada prova que não tem respaldo na lei, nomeadamente no art. 75.º, n.º 9, do CIRC, entendendo que, à época, este preceito legal era omisso quanto “ao tipo de prova exigível”.

A Recorrente não se conforma com o decidido nessa parte em que julgou procedente a impugnação judicial, e nessa media invoca que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de direito ao ter entendido que o disposto no art. 9.º, do art. 75.º do CIRC (na redação em vigor à época) não exigia que a prova a produzir pelas sociedades “representantes” de artistas não residentes, tenha de ser efetuada por declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do estado de residência dessas sociedades. Invoca ainda erro de julgamento de facto, porque não foi feita prova credível, plena e satisfatória para que se dispensasse tal obrigação legal. Consequentemente pretende que seja também revogada a decisão de condenação ao pagamento de juros indemnizatórios correspondente a essa parte.

Apreciando.

Antes de mais e porque relevante para a decisão a proferir nos presentes autos cumpre aditar à matéria assente a seguinte alínea com base no relatório de inspeção junto ao processo administrativo a fls. 149 e ss, ao abrigo do art. 662.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT:

E) Após o exercício de direito de audição sobre o projeto de relatório de inspeção a AT tomou a seguinte posição sobre os argumentos da Impugnante: “Se é verdade que o n.º 9 do artigo 75.º do CIRC (ao tempo) não estabelece claramente qual a prova necessária, ou seja, que tipo de documento é necessário para se provar que os artistas não controlam directa ou indirectamente a entidade que obtém o rendimento, de modo a que os rendimentos obtidos não sejam tributados através de retenção na fonte, no entanto a administração fiscal entende que são necessárias provas credíveis e estas tem que ser emitidas por entidades congéneres, ou seja, as Autoridades Fiscais desses países”.

Prosseguindo.

Resulta dos autos que a Impugnante, no ano de 2000, no âmbito da sua atividade, efetuou pagamentos a sociedades “representantes” de artistas não residentes”, relativamente aos quais não efetuou retenção na fonte em sede de IRC.

Na verdade, a regra, vigente à época, era a de que o IRC era objeto de retenção na fonte, relativamente aos rendimentos enumerados no então art. 4.º, n.º 3, do CIRC, de entre os quais, com interesse para a decisão do presente recurso, os rendimentos referidos na alínea d) (rendimentos derivados do exercício em território português da atividade de profissionais de espetáculos ou de desportistas) obtidos por entidades não residentes em território português, para além do mais, quando o devedor dos mesmos seja sujeito passivo de IRC (cf. alínea f) do n.º 1, do art. 75.º do CIRC).

Contudo, o n.º 9, do art. 75.º do CIRC dispunha que a retenção na fonte daqueles rendimentos enunciados na alínea f) terá lugar sempre que o titular dos rendimentos aí mencionados não fizesse prova junto da entidade devedora dos mesmos, antes da sua colocação à disposição, de que não é controlado direta ou indiretamente pelos profissionais de espetáculos ou desportistas.

Ora, in casu, conforme resulta da fundamentação do relatório de inspeção da alínea C) dos factos assentes que a AT entendeu quanto à correção “pagamentos a sociedades “representantes” de artistas não residentes” que para não seja efetuada a retenção na fonte nos termos do n.º 9, do art. 75.º do CIRC, a Impugnante deveria ter em seu poder, antes da colocação à disposição dos rendimentos, uma declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade “representante de artistas não residentes onde conste que o profissional de espetáculos não controla direta ou indiretamente a entidade que obtém o rendimento.

Na verdade, no decorrer da ação de inspeção a Impugnante apresentou uma série de documentos das sociedades “representantes” de artistas, com base nos quais a Impugnante não procedeu à retenção na fonte, ao abrigo do n.º 9, do art. 75.º do CIRC, porém, tal documentação não foi aceite pela AT para efeitos da aplicação deste preceito legal, concluindo-se o seguinte: “Com base nos documentos apresentados pela Fundação não é possível verificar o cumprimento do disposto no n.º 9 do artigo 75° do CIRC (ao tempo), ou seja, que os profissionais de espectáculos não controlam directa ou indirectamente a entidade que obtém o rendimento, uma vez que não se trata de uma declaração, confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade de artistas não residente. Assim sendo, os rendimentos pagos às sociedades “representantes” de artistas serão sujeitos a retenção na fonte a título definitivo à taxa de 25%, nos termos dos artigos anteriormente citados.”.

Portanto, conjugando esta fundamentação do relatório de inspeção, com a que consta na pronúncia sobre o exercício de direito de audição pela Impugnante (cf. alínea F) aditada oficiosamente) resulta claramente que a posição jurídica da AT é a de que apesar de reconhecer que o n.º 9 do art. 75.º do CIRC à época não estabelecia qual o tipo de documento é necessário para se provar que os artistas não controlam direta ou indiretamente a entidade que obtém o rendimento, de modo a que os rendimentos obtidos não sejam tributados através de retenção na fonte, ainda assim, entende que “são necessárias provas credíveis e estas tem que ser emitidas por entidades congéneres, ou seja, as Autoridades Fiscais desses países”.

Ou seja, a AT entendeu que para efeitos do n.º 9, do art. 75.º do CIRC é necessária uma declaração, confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade de artistas não residente, e, portanto, está a limitar o meio de prova do pressuposto legal à existência de tal declaração, o que não se encontra, de modo algum, consagrado na lei.

Efetivamente, não se encontra controvertido nos autos que o n.º 9, do art. 75.º do CIRC não especificada qual o meio de prova que deveria ser apresentado junto da entidade devedora dos rendimentos. Ou seja, aquele preceito legal não exigia que o meio de prova fosse uma declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade de artistas não residente.

Assim sendo, não é minimamente aceitável que a AT sufrague o entendimento de que apenas consubstancia prova credíveis para efeitos do n.º 9, do art. 75.º do CIRC uma declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade de artistas não residente.

Acresce que tal entendimento, não tendo o mínimo respaldo na lei, consubstancia uma restrição ilegal dos meios de prova admissíveis em direito tributário pela AT, em que se admite os meios gerais de prova (cf. art. 115.º do CPPT).

Por outro lado, resulta do relatório de inspeção que a Impugnante dispunha de documentação, que considerou suficiente para a prova exigida por aquele preceito legal, na qual alicerçou a não retenção na fonte de tais rendimentos, meios de prova que foram desconsiderados exatamente por se ter restringindo os meios de prova admissíveis para efeitos do n.º 9, do art. 75.º do CIRC.

Ora, ainda que se entenda como invoca a Recorrente que a AT desconsiderou a documentação apresentada pela Impugnante em sede de ação de inspeção, com base num entendimento de insuficiência probatória, a verdade é que, as razões apontadas no relatório de inspeção, consideradas globalmente, não são suficientemente densificadas, e sobretudo têm de ser conjugadas com a posição jurídica da AT da indispensabilidade de existência das declarações como “prova credíveis”. Ou seja, a desconsideração dos meios de prova foi efetuada num contexto de demonstração de que o meio de prova credível seria apenas a declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade de artistas não residente, é essa a conclusão do relatório de inspeção que conduz a Impugnante a entender que ainda que juntasse outros documentos para a prova do requisito legal, ainda assim, não seria aceite pela AT, porque apenas aceitaria as referidas declarações. E, assim sendo, face à fundamentação das correções consideradas globalmente, e face à prova documental na posse da Impugnante, sempre existiria uma fundada dúvida sobre a existência do facto tributário, a qual reverte a favor do contribuinte nos termos do disposto no art. 100.º, n.º 1, do CPPT.

Deste modo, importa concluir que muito bem andou o Meritíssimo Juiz a quo quando entendeu que a correção em causa enferma de erro sobre os pressupostos de direito, e com esse fundamento anulou a liquidação na parte correspondente.

Pelo exposto, não se verifica o erro de julgamento invocado pela Recorrente Fazenda Pública, e nessa medida, improcedem todas as conclusões de recurso.

Não se verificando erro de julgamento na parte recorrida, consequentemente, é de manter a respetiva decisão na parte referente à condenação da Fazenda Pública ao pagamento dos respetivos juros indemnizatórios, considerando que relativamente a essa condenação não foi invocado qualquer erro de julgamento autónomo que cumpra apreciar.

Pelo exposto, não assiste razão à Recorrente, improcedendo todas as conclusões de recurso.

Em matéria de custas o artigo 527.º do CPC consagra o princípio da causalidade de acordo com o qual paga custas a parte que lhes deu causa. Vencida na presente causa a Recorrente esta deu causa às custas do presente processo (n.º 2), e, portanto, deve ser condenada nas respetivas custas (n.º 1, 1.ª parte).

Considerando que o valor da presente causa é superior a 275.000,00€, e que a questão da dispensa do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no art. 6.º, n.º 7 do RCP é de conhecimento oficioso (cf. Ac. do STA de 07/05/2014, proc. n.º 01953/13), sempre se dirá que se encontram reunidos os pressupostos do n.º 7 do art. 6.º do RCP.

Na verdade, in casu, ponderado o montante da taxa de justiça que será devida, face ao concreto serviço prestado, revela-se adequado e necessário face ao princípio da proporcionalidade, dispensar o remanescente da taxa de justiça, verificando-se os pressupostos do n.º 7 do art. 6.º do RCP, sendo certo que estava em causa nos autos apenas uma questão que se revelou de complexidade inferior à normal face às conclusões sucintas, claras e com pouca complexidade de ambas as partes, e considerando ainda que a conduta processual das partes foi a normal e adequada, verificam-se os pressupostos do art. 6.º, n.º 7 do RCP, para a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo presente recurso.

Sumário

I. Nos termos conjugados do art 75.º, n.º 1, da alínea f), do CIRC, com o seu n.º 9 (redação vigente no ano de 2000), o IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos rendimentos derivados do exercício em território português da atividade de profissionais de espetáculos ou de desportistas, obtidos por entidades não residentes em território português sempre que o titular dos rendimentos não fizesse prova junto da entidade devedora dos mesmos, antes da sua colocação à disposição, de que não é controlado direta ou indiretamente pelos profissionais de espetáculos ou desportistas;
II. O n.º 9, do art. 75.º do CIRC aquele preceito legal não exigia que a prova de que o titular dos rendimentos não é controlado direta ou indiretamente pelos profissionais de espetáculos ou desportistas, fosse efetuada mediante uma declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado de residência da sociedade de artistas não residente.
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DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção, da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
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Custas pela Recorrente.
Dispensa-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça.
D.n.
Lisboa, 11 de novembro de 2021.



Cristina Flora (Relatora)

Patrícia Manuel Pires (1.ª adjunta)

Vital Lopes (2.º adjunto)