Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:447/11.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/25/2020
Relator:ANA PINHOL
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL;
CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO;
CITAÇÃO;
DILAÇÃO;
REVERSÃO.
Sumário:I. O prazo para deduzir oposição previsto no n.º 1 do artigo 203.º do CPPT é um prazo para a prática de um acto no processo de execução fiscal, que tem natureza judicial (artigo 103.º da LGT), motivo por que se lhe aplicam as regras de contagem previstas no CPC, como determina o artigo 20.º, n.º 2, do CPPT.

II. Ao prazo de trinta dias previstos no artigo 203.º, n.º 1, al. a) do CPPT acresce a dilação é de cinco dias quando a citação tenha tido lugar fora da área da comarca em que se situa o serviço da Administração Tributária onde corre o processo de execução.

III.É aplicável ao prazo para dedução de oposição à execução fiscal a dilação prevista no artigo 252.º-A, n.º 1, alínea b), do CPC, nos termos em que aí está prevista, isto é, sempre que o oponente seja citado fora da área da comarca sede do tribunal, mesmo que tal área se inclua na área de jurisdição do tribunal tributário.

IV.À luz do regime da responsabilidade subsidiária prevista no artigo 24.º, n.º 1, da LGT, em qualquer das suas duas alíneas, a possibilidade de reversão não se basta com a gerência de direito, exigindo-se o exercício de facto da gerência.

V.É à Fazenda Pública, enquanto exequente, que compete demonstrar a verificação dos pressupostos da reversão da execução fiscal.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO



I.RELATÓRIO


A FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a oposição que C................. deduziu contra a execução fiscal nº ................. e aps., que, o Serviço de Finanças de Mafra lhe move por reversão de dívidas da sociedade denominada «O................. LDA.» referentes a IVA e IRC, dos anos de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006, no montante global de € 30 286,93.

A recorrente finalizou as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões:

«A.Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença proferida em primeira instância, porquanto a mesma julgou parcialmente procedente a oposição à execução quanto à Oponente C..................

B.O Ilustre Tribunal “a quo” conclui, em suma, que se aplica a dilação de 5 dias ao prazo de defesa prevista no art.245.º n.º1 al.b) do CPC, por a Oponente ter sido citada em Mafra (seu domicilio fiscal) por um funcionário do Serviço de Finanças de Mafra, e não pelo Serviço de Finanças de Odivelas, onde corre a execução fiscal.

C.Contudo, com o devido respeito, que é muito, entendemos que esta interpretação não acolhe o melhor sentido e harmonia jurídica, da conjugação das várias normas do nosso ordenamento jurídico, designadamente o art.2 al. e) e art.20.º do CPPT, o art.245.º n.º 1 al. b) do CPC, e D.L. n.º325/2003, de 29 de Dezembro.

D.Assim, entendemos que a vontade do legislador na aplicação do direito subsidiário foi dar prevalência à resolução de casos omissos dentro da órbitra jurídica do direito tributário, e só depois buscar a resposta, quer no procedimento administrativo, quer no processo civil.

E.Pelo que, havendo a necessidade de aplicação de diversa legislação prevista no art.2.º do CPPT para se determinar a legislação e o entendimento correto, então será seguida a ordem disposta no art.2.º do CPPT, dando-se prioridade à legislação que vem em primeiro lugar.

F.No âmbito do direito tributário, as regras quanto à organização dos tribunais fiscais, encontra-se disposta, em suma, no Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei n.º13/2002, de 19 de fevereiro, com a atual redação pela D.L. n.º 214-G/2015, 02/10, e pelo D.L. n.º325/2003, de 29 de dezembro, que define a sede, a organização e a área de jurisdição dos tribunais administrativos e fiscais, concretizando o respetivo ETAF.

G.Entendemos que aplicação do n.º1. al.b) do art.252-A do CPC, ora 245.º do CPC, têm a sua razão de ser por via da remissão expressa do art.20.º do CPPT, por ser uma questão da contagem de prazos, nomeadamente da dilação de cindo dias na contagem do prazo de defesa.

H.Mas, a circunscrição da aplicação do n.º1. al.b) do art.252-A.º do CPC está no aumento de tempo de contagem de prazo, pelo que os conceitos que compõe a norma já terão que ser devidamente interpretados à luz do direito subsidiário, nos termos do art.2.º do CPPT, e esses conceitos são a expressão comarca e a expressão tribunal.

I.Ora, no CPPT, não encontramos uma referência às áreas de competência de um tribunal, porque no âmbito do direito tributário, as áreas de competência dos tribunais, estão previstas no D.L. n.º325/2003 de 29 de dezembro, sobre a sede, organização e área de jurisdição dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que concretiza o ETAF.

J.Assim, a resposta passa pela procura no direito subsidiário previsto no art.2.º do CPPT, designadamente na al. c), sobre as normas sobre a organização e processo nos tribunais administrativos e tributários, onde se inclui o ETAF, e D.L. 325/2003 de 29 dezembro.

K.Conforme decorre do ETAF, designadamente o art.9.º e 39.º, os tribunais administrativos e fiscais e tributários estão associados às respetivas áreas de jurisdição, e por sua vez, o D.L. n.º 325/2003 de 29 de dezembro, que surge para concretizar o ETAF, no art.3.º, vem prever o local de instalação desses tribunais (n.º1) e a existência de um mapa, anexo a esse diploma e parte integrante, onde se consolida a área de jurisdição desses tribunais.

L.Como tal, o conceito de comarca, empregue no CPC, deve ser interpretado como área de jurisdição, empregue pelo ETAF e no D.L. n.º325/2003, por aplicação do art.2 al. c) do CPPT.

M.Posto isto, da explanação decorre, em suma, que não poderá ser aplicada a dilação de cinco dias prevista no art.252-A do CPC, por estamos dentro da mesma área de jurisdição do tribunal tributário de lisboa, onde se inserem os Seviços de Finanças de Mafra e Odivelas.

N.Portanto, deve-se considerar procedente a exceção de caducidade de ação e absolvição da Fazenda Pública da instância.

O.Sem prescindir, existe erro de julgamento quanto à decisão de parcialmente procedente quanto à Oponente, com respeito pela reversão das dívidas dos anos de 2005 e 2006, referentes aos processos de execução fiscal n.º ................., ................., ................., ................. e ..................

P.As sociedades só deixam de gozar de personalidade jurídica e de existirem como tal, após o registo do encerramento da liquidação, nos termos do art. 160, n.º 2 do CSC, sendo a dissolução uma fase necessária e prévia à liquidação.

Q.Assim, entende-se que até ao registo de encerramento da sociedade, esta contínua com um papel ativo, e subsequentemente os seus órgãos em plena gestão, independentemente da cessação da atividade.

R.Não tem fundamento legal, o entendimento do Douto Tribunal, ao entender que por a sociedade ter apresentado a declaração de cessação de atividade em 07-04-2008, com base na al. a) do n.º1 do art.33.º do CIVA, ou seja, que não exercia há mais de 2 anos, então concluiu que a partir agosto de 2004, a sociedade deixou de exercer a atividade comercial e que a partir dessa data não foram praticados atos de gerência pela Oponente.

S.A Oponente, como gerente da sociedade desde 2002, e não havendo qualquer alteração societária, designadamente a sua renúncia, mantêm-se como gerente de facto para além da declaração de cessação de atividade, até ao respetivo encerramento da sociedade.

T.Considerando que a douta sentença concluiu pela a responsabilidade subsidiária da Oponente pelas dívidas tributárias de 2002 a 2004, com o seu efectivo exercício da gerência de facto, dando por improcedente a oposição nesta parte, então deveria ter concluído que essa responsabilidade subsidiária se estende aos anos de 2005 e 2006.

U.Portanto, existe claro erro de julgamento em considerar que a Oponente não pode ser responsável subsidiária pelas dívidas tributárias de 2005 e 2006, por a sociedade ter comunicado a cessação de atividade em sede de IVA em 07-04-2008 com o motivo de não exercer a atividade há mais de 2 anos, nos termos da al.a) do n.º1 artigo 33.º do CIVA.

V.Nesta conformidade, com o devido respeito, deve-se considerar improcedente a oposição quanto à responsabilidade subsidiária da Oponente pelas dívidas tributárias de 2005 e 2006.

W.Assim sendo, é entendimento da Representação da Fazenda Pública que o Tribunal “a quo”, com a decisão ora em crise, violou o disposto no art.2.º e art.20.º do CPPT, art.252-A (atual art.245,º) do CPC, e sem prescindir, o art.24,º da LGT e o art.5.º e 160.º do Código das Sociedades Comerciais, ao considerar, por erro de julgamento: por um lado, que se verifica a aplicação da dilação de cinco dias prevista no art.252-A do CPC, para efeitos da contagem do prazo de apresentação da oposição da Oponente, e subsequentemente, que não se verifica a exceção perentória de caducidade do direito de ação; por outro lado, considerou que a partir de agosto de 2004, a sociedade devedora originária deixou de exercer a atividade comercial, em virtude de em 07/04/2008 ter cessado atividade com o motivo previsto na al.a) do n.º1 do art.33.º do IVA, concluindo que também a partir de agosto de 2004 não foram praticados atos de gerência pelo Oponente, não sendo responsável subsidiária pelas dívidas tributárias de 2005 e 2006.

X.Com o devido respeito e salvo melhor opinião, o conceito de comarca, empregue no CPC, deve ser interpretado como área de jurisdição, empregue pelo ETAF e no D.L. n.º325/2003, por aplicação do art.2 al.c) do CPPT.

Y.Logo, não poderá ser aplicada a dilação de cinco dias prevista no art.252-A do CPC, por estamos dentro da mesma área de jurisdição do Tribunal Tributário de Lisboa, onde se inserem os Seviços de Finanças de Mafra e Odivelas.

Z.Sem prescindir, a Oponente, como gerente da sociedade desde 2002, e não havendo qualquer alteração societária, designadamente a sua renúncia, mantêm- se como gerente de facto para além da declaração de cessação de atividade até ao respetivo encerramento da sociedade.

AA.Assim, tendo a douta sentença concluído pela a responsabilidade subsidiária da Oponente pelas dívidas tributárias de 2002 a 2004, com o seu efectivo exercício da gerência de facto, dando por improcedente a oposição nesta parte, então deveria ter concluído que essa responsabilidade subsidiária se estende aos anos de 2005 e 2006, devendo-se considerar improcedente a oposição quanto à responsabilidade subsidiária da Oponente pelas dívidas tributárias de 2005 e 2006.

BB.A Fazenda Pública entende que dever-se-á considerar que a solução mais acertada no caso concreto é a verificada exceção perentória de caducidade do direito de ação e, caso assim não se entenda, sempre dever-se-á considerar que a solução de mérito mais acertada no caso concreto é a de concluir que a Oponente, ora recorrida, exerceu a gerência de facto da sociedade executada originária denominada “S................. Lda.” nos anos de 2005 e 2006, sendo a mesma parte legítima nos autos de execução fiscal n.ºs º ................., ................., ................., ................. e ..................

Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e acostumada, JUSTIÇA!»


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Os recorridos ofereceram as suas contra-alegações, tendo formulado as conclusões seguintes:

«A)A Recorrente, Fazenda Pública veio interpor recurso da douta sentença proferida pelo tribunal “a quo” que julgou parcialmente procedente a oposição à execução quanto à oponente, C................., considerando que a, ora aqui, Recorrida não é responsável subsidiária pelas dívidas da sociedade S................., Lda, em causa nos Processos de Execução Fiscal números ................., ................., ................., ................., ..................

B)Vem a Recorrente alegar que com base na matéria de facto dada como provada nas alíneas H), I) e J) deveria ter sido considerado que a Sociedade S................., Lda manteve a actividade até 08/03/2008 e, por essa via, devia ter sido reconhecida a gerência de facto da Oponente desde 2002 a 2006.

C)Salvo o devido respeito, a Recorrente não tem razão, porquanto:

D)As alíneas G), H) I) e J) da matéria de facto dada como provada, vêm corroborar a ausência de actividade comercial por parte da Sociedade S................, Lda a partir de 01/08/2004, o que não é despiciendo em termos gerência de facto, como adiante melhor se comprovará.

E)Nas doutas alegações de recurso vem a Recorrente sustentar que a oposição à execução é intempestiva, pelo que a exceção de caducidade de ação deve ter-se por procedente e, assim, ser absolvida a Recorrente instância.

F)Em síntese, alega a Recorrente que a oposição à execução deveria ter sido instaurada até ao dia 3 de Fevereiro de 2011 e não na data em que o foi.

G)Entende a Recorrente que o conceito de comarca, referido no artigo 252-A do CPC, tem que ser interpretado como área de jurisdição, nos termos do ETAF e do DL. 325/2003, por aplicação do artigo 2º, alínea c) do CPP.

H)Como os Serviços de Finanças de Mafra, onde foi citada a Oponente, e os Serviços de Finanças de Odivelas, onde corre o processo de execução fiscal em causa, estão ambos dentro da mesma área de jurisdição do tribunal tributário de Lisboa, a dilação de cinco dias prevista no artigo 252-A do CPC, não pode ser aplicada no presente caso, pelo que a oposição à execução é extemporânea.

I)Mais uma vez se discorda da argumentação apresentada pela Recorrente.

J)Nos termos do artigo 203º, nº 1, alínea a) do CPPT, o prazo para deduzir oposição à execução fiscal é de 30 dias a contar da citação pessoal.

K)Nos termos do disposto no artigo 103º da LGT, o processo de execução fiscal tem a natureza judicial.

L)De acordo com o estabelecido no artigo 20º, n.º 2 do CPTT: «Os prazos para a prática dos actos no processo judicial contam-se nos termos do Código de Processo Civil».

M)Assim, como o processo de execução fiscal tem natureza judicial, o prazo para dedução de oposição à execução fiscal conta-se nos termos do Código de Processo Civil.

N)Nos termos do disposto no art. 191.º, n.º 3 do CPPT, nos casos de efetivação de responsabilidade subsidiária – como é o caso dos autos, em que a Oponente é executada por reversão fiscal – a citação da oponente tem que ser pessoal.

O)Conforme o art. 192.º do CPTT as citações pessoais são efetuadas nos termos do Código de Processo Civil.

P)O artigo 233º, n.º 2 do CPC refere que a citação pessoal è feita mediante a entrega ao citando de carta registada com aviso de recepção ou mediante contacto pessoal do funcionário judicial, tendo-se neste caso por realizada na data de assinatura na certidão de citação ( artigo 239º n.º 3).

Q)Nos termos do disposto no artigo 252-A, nº 1, alínea b) do CPC (hoje 245º do CPC), na citação há sempre lugar a dilação de 5 dias, quando “o réu tenha sido citado fora da área da comarca sede do Tribunal”.

R)A Recorrente defende no presente recurso jurisdicional que na jurisdição dos tribunais tributários não existem comarcas, mas sim áreas de jurisdição, nos termos do DL n.º 325/2003, de 29 de Dezembro, pelo que a dilação deverá ser aplicada apenas quando o citado resida em área de jurisdição diferente da área do tribunal tributário.

S)No entanto, este entendimento não tem suporte legal.

T)Na verdade, o artigo 252.º-A faz referência a «comarca» e não «área de jurisdição», pelo que, sendo aplicável subsidiariamente o regime do CPC, por força do disposto no art. 2.º, alínea e), do CPC, ele deverá ser aplicado nos termos aí previstos, nos casos em que não se imponha uma adaptação.

U)Os artigos 20º, 191º e 192º do CPPT remetem expressamente para o Código de Processo Civil, quer quanto à realização da citação, quer quanto à contagem dos prazos, pelo que não há necessidade de realizar qualquer adaptação normativa.

V)Assim deve entender-se que o artigo 252-A do CPC é aplicável sempre que a citação ocorra fora da área da comarca sede do tribunal, mesmo que tal área se inclua na área de jurisdição do Tribunal Tributário.

W)Neste sentido vide os acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 8 de Fevereiro de 2012, proferido no processo n.º 1016/11, e de 28 de Março de 2012, proferido no processo n.º 261/12.

X)Face ao acima exposto não merece censura o decidido pelo Tribunal Tributário de Lisboa, na sentença recorrida.

Y)Alega a Recorrente que tendo a douta sentença concluído pela responsabilidade subsidiária da Oponente pelas dívidas tributárias de 2002 a 2004, então deveria ter concluído que essa responsabilidade subsidiária se estende aos anos 2005 e 2006.

Z)Salvo o devido respeito, a gerência de facto não pode ser presumida como o pretende a Recorrente.

AA)Relativamente a esta questão importa recordar as alíneas G) a J) da matéria de facto provada:

BB)Nos termos destas alíneas, ou seja da matéria de facto dado como provada, a partir de Julho de 2004, a sociedade S................, Lda deixou de ter actividade comercial, não realizando quaisquer operações, nem tendo quaisquer rendimentos tributáveis.

CC)Também a Recorrida deixou de exercer qualquer função de gestão na sociedade executada.

DD)A doutrina e a jurisprudência têm entendido que a responsabilidade dos administradores e gerentes, apenas, impende sobre quem, efectivamente, exerceu os correspondentes cargos, isto é os gerentes efectivos.

EE)A fim de preencher este pressuposto essencial de responsabilização da ora Recorrida, o despacho de reversão da execução fiscal vem referir que encontrando-se os ora oponentes nomeados para o exercício do cargo de gerentes, presume-se o exercício efectivo das correspondentes funções ou seja a gerência efectiva.

FF)De acordo com o disposto no artigo 349º do Código Civil, as presunções são ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.

GG)Nos termos do disposto no artigo anterior, as presunções podem ser legais ou naturais/judiciais. Nas presunções legais a inferência é feita pela própria lei, que do facto conhecido presume a existência do facto desconhecido. Nas presunções naturais/judiciais a indução é feita pelo juiz assente nas máximas da experiência ou das regras da vida.

HH)A presunção de que a gerência de facto se infere da gerência de direito, não é uma presunção legal, mas sim uma presunção natural ou judicial, baseada na experiência comum.

II)À presunção natural ou judicial não se aplica a regra inserta no artigo 350, n.º 2 do Código Civil. Tal regra apenas se aplica às presunções legais, implicando que para que uma presunção legal seja destruída tem de ser ilidida mediante prova em contrário.

JJ)Na presunção natural não é necessário fazer a prova do contrário do facto presumido, ou seja não é necessário que a Recorrida faça prova do não exercício da gerência de facto. Neste sentido se pronunciaram os acórdãos do TCA de 16/12/1997 e 3/02/1998 e o acórdão do pleno do STA de 28/02/2007.

KK)Ora salvo o devido respeito, o facto de a Recorrente alegar a nomeação da gerência de direito, não é suficiente para se poder chegar à conclusão do exercício da gerência efectiva.

LL)No caso concreto, na altura em que cessou a actividade da sociedade, a Recorrida deixou de praticar atos de gerência.

MM)Pelo que, não pode ser considerada gerente de facto, uma vez que nenhuma intervenção sua em nome e por conta da sociedade se lhe pode assacar.

NN)Assim e concluindo não merece qualquer reparo a sentença proferida, pelo que a Recorrida não é responsável subsidiária pelas dívidas da sociedade S................., Lda, em causa nos Processos de Execução Fiscal números ................., ................., ................, ................., ..................

OO)Mesmo que assim não se entendesse, confrontando os comprovativos de entrega da declaração de rendimentos de IRC - Modelo 22, relativos aos exercícios de 2005 e 2006, que comprovam que a sociedade executada não teve qualquer actividade, encontrando-se os campos referentes à mesma a 0,00€, com as dívidas de IRC dos anos 2005 e 2006 exigidas pela Administração Fiscal, conclui-se que tais dívidas só podem resultar de pagamentos por contas e/ou de liquidações feitas pela Administração Fiscal.

PP)O artigo 33º da LGT refere que as “entregas pecuniárias antecipadas que sejam efectuadas pelos sujeitos passivos no período de formação do facto tributário constituem pagamento por conta do imposto devido a final.”

QQ)Da definição legal de “pagamento por conta” retira-se uma imbricação inevitável e essencial entre “pagamento por conta” e o “imposto devido a final”

RR)Nos termos da lei, o pagamento por conta é uma entrega pecuniária antecipada feita por conta do imposto devido a final, no período de formação do facto tributário.

SS)Isto significa que o “pagamento por conta” tem de ser aferido com referência à situação contabilística da empresa no fim do período a que se refere o pagamento por conta.

TT)Se nenhuma quantia pecuniária houver de ser antecipadamente entregue por conta do imposto devido a final, no respectivo período de formação do facto tributário, nomeadamente pela inexistência de lucro tributável revelado pela contabilidade, aquele pagamento por conta não tem fundamento.

UU)Concluindo se não houver lucro tributável não há imposto devido, que é o que ocorre no caso em apreço.

VV)A isso obrigam os princípios constitucionais da tributação do lucro real, da justiça e da proporcionalidade.

WW)Este facto acarreta a inexistência do imposto à data dos factos a que respeita a obrigação, nos termos do disposto no artigo 204, n.º 1, alínea a) do CPPT.

Face ao acima exposto não merece qualquer censura a sentença recorrida, donde se julgou parcialmente procedente a oposição à execução quanto à oponente, C................., considerando que a, ora aqui, Recorrida não é responsável subsidiária pelas dívidas da sociedade S................., Lda, em causa nos Processos de Execução Fiscal números ................., ................., ................, ................., ................. com o que se fará a acostumada Justiça.»


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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.


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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil) , sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, a esta luz, as questões a decidir traduzem-se em saber:
- se a sentença incorreu em erro de julgamento ao julgar improcedente a excepção de caducidade do direito de deduzir oposição à execução fiscal;
- se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir que a Oponente não exerceu a gerência de facto da devedora originária e, nessa medida, era parte ilegítima para a execução.

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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS

Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:

«A)Entre 05/06/2003 e 05/08/2008, foram instaurados pelo Serviço de Finanças de Odivelas, contra a sociedade SO................. LDA., pessoa coletiva n.º ................, os processos de execução fiscal n.º ................. e apensos (................, ................, ................, ................, ................., ................., ................., ................. e .................), para cobrança coerciva de dívidas de IVA e IRC, dos anos de 2002 a 2006 – cfr. fls. 2, 65, 66, e 102 a 120 do Apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

B)A liquidação de IVA relativa ao ano de 2002, e ao período de 2002/12T, em causa no PEF ................., teve origem em “pagamentos rejeitados”, e como prazo voluntário de pagamento: 17/02/2003 – cfr. fls.65 e 66, do Apenso;

C)A liquidação de IRC relativa ao exercício de 2002, em causa no PEF ................, teve como prazo voluntário de pagamento 31/12/2003 – cfr. fls.106 e 107 do Apenso;

D)A sociedade S................. LDA., foi constituída em 21/03/2002 – cfr. fls. 38 dos autos e 67 do Apenso;

E)Desde a sua constituição, foram designados gerentes da sociedade S................. LDA, os seus sócios, os ora Oponentes – cfr. fls. 67 e 68 do Apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

F)A sociedade S................. LDA. obrigava-se pela assinatura de um gerente - cfr. fls. 67 e 68 do Apenso;

G)Com data de 31/07/2004 foi emitida pela sociedade S................. LDA. a fatura n.º 131, e do mesmo livro de faturas não foram emitidas as faturas n.º 132, 133 e 150 – cfr. fls. 19 a 23 dos autos;

H)Em 07/04/2008, foram submetidas relativamente à sociedade S................. LDA., as declarações periódicas de substituição Modelo C, de IVA, relativas aos períodos (quatro trimestres) de 2005, 2006, 2007 e 2008/03T, sem valores declarados – cfr. fls. 24 a 36 dos autos;

I)Em 07/04/2008 foi apresentada declaração de cessação de atividade da sociedade S................. LDA., desde 08/03/2008, indicando como motivo “Art 33.º, Nº 1, a)” – cfr. fls. 37 a 40 dos autos;

J)Em 19/12/2008, foram submetidas relativamente à sociedade S................. LDA., as declarações de IRC modelo 22 (1.ª declaração do exercício) relativas aos exercícios de 2005, 2006 e 2007, sem valores declarados – cfr. fls. 41 a 52 dos autos;

K)Em 22/06/2009, foi submetida relativamente à sociedade S................. LDA., a declaração de IRC modelo 22 relativa ao exercício de 2008, sem valores declarados – cfr. fls. 53 a 56 dos autos;

L)Em 28/09/2010, após pesquisa nos sistemas informáticos, constatou o Serviço de Finanças de Odivelas que “em nome do executado não são conhecidos quaisquer bens suscetíveis de penhora” – cfr. fls. 69 e 70 do Apenso;

M)Na mesma data, foi elaborada informação pelo Serviço de Finanças de Odivelas, a fls. 70 do Apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; e foi proferido despacho para audição (reversão) dos ora Oponentes nos PEF referidos em A), ora a fls. 71 do Apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

N)Através dos ofícios n.º 8842 e 8843, ambos de 04/04/2010, foram os ora Oponentes notificados para efeitos de audição prévia da reversão no PEF................. e apensos – cfr. fls. 72 a 76 do apenso;

O)Em 05/11/2010, foi proferido o seguinte despacho de reversão das dívidas em cobrança coerciva no PEF ................. e apensos, contra os ora Oponentes:

«Vem o presente processo em conclusão, com a informação de que a executada não possui bens penhoráveis.

Prova-se nos autos, conforme certidão da Conservatória do Registo Comercial de Odivelas, que nos períodos a que respeitam as dívidas e/ou naqueles em que foram exigíveis, foram gerentes C................., NIF: ................, com domicílio fiscal em Rua ................, n° 9 – 3º B ................ Malveira e G................, NIF: ................, com domicílio fiscal em Rua…………, n° 6 – 2º Dt° Pontinha - ……..Pontinha, ambos desde 2002-02-18.

Os presentes autos foram instaurados para cobrança da divida de IVA e IRC dos anos de 2002 a 2006, sendo o valor em divida nesta data de € 30.289,93 ao qual acrescem juros de mora e custas processuais.

Em 11 e 15 de Outubro de 2010, os sócios acima identificados foram validamente notificados, nos termos do n° 1 do artigo 39.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), para exercer o respetivo direito de audição, não tendo no entanto, até ao termo do prazo, exercido o mesmo, pelo que nenhum novo elemento foi trazido aos autos.

O artigo 24.° da Lei Geral Tributária (LGT) impõe a responsabilidade dos administradores, diretores e gerentes das empresas e sociedades de responsabilidade limitada, disposição esta aplicável ao tempo do nascimento da dívida e também ao tempo da obrigação do pagamento. Tal responsabilidade é uma responsabilidade ex lege cujos pressupostos assentam na gerência de direito e de facto.

A de gerência de direito encontra-se demonstrada, conforme certidão da Conservatória do Registo Comercial da Odivelas junta aos autos.

Quanto à gerência de facto, a mesma é de presumir conforme elementos junto aos autos e por a ausência desta apenas poder advir da inércia ou falta de vontade dos agentes e de uma violação dos seus deveres para com a sociedade, uma vez que, expressando os gerentes a vontade da sociedade (artigos 252.°, 259.° 260.° e 261.° do Código das Sociedades Comerciais) é licito que sejam responsabilizados pelo incumprimento das obrigações públicas da sociedade, pois esta age através deles

Assim sendo, e ao abrigo do que se estabelece nos artigos 22.°, 23.° e 24.° da LGT, artigos 153.° e 160.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e nos precisos termos da alínea b), n.° 1, artigo 24.° da LGT, reverto a execução contra os aludidos gerentes, C................., NIF: ................, com domicilio fiscal em Rua ................, n° 9 - 3o B ................ Malveira e G................, NIF: ................, com domicílio fiscal em Rua…………., n° 6 - 2o Dt° Pontinha - ……….. Pontinha, que passam a responder pelo valor de € 30.289.93 (Trinta mil duzentos e oitenta e nove euros e noventa e três cêntimos, ao qual acrescem juros de mora e custas processuais.

Se os responsáveis pagarem a dívida no prazo para a oposição não lhes serão exigidos juros de mora nem custas da execução, valendo a citação como notificação.

Deveram ficar cientes de que se o pagamento não for efetuado dentro do prazo para a oposição ou decair em oposição deduzida, além das custas a que derem causa, suportaram as que forem devidas pela sociedade originariamente devedora e a execução prosseguirá os termos legais, designadamente para penhora de bens e mais diligências previstas na Lei.

Proceda-se à citação do responsável acima identificado, nos termos do artigo 190.° do CPPT, para, querendo, no prazo de cento e vinte dias a contar da citação deduzirem reclamação ou, no prazo de noventa dias a contar da citação, deduzirem impugnação judicial contra a liquidação, com vista á sua anulação total ou parcial, no caso de a considerarem ilegal, conforme estabelecido na alínea c) do n.º 1 do artigo 102.° do CPPT e artigo 22.°, n.º 4 da LGT, no prazo de trinta dias a contar da citação, requerer pagamento em prestações, nos termos do artigo 196.° do CPPT e/ou dação em pagamento no termos do artigo 201.° do CPPT ou deduzirem oposição judicial, nos termos do artigo 204.° do CPPT.

Os responsáveis subsidiários são solidários entre si pelo pagamento da dívida.

Citem-se pessoalmente os sócios acima identificados (…)» - cfr. fls. 78 e 79 do Apenso;

P)A citação do Oponente G................ foi-lhe remetida através do oficio 10658, de 08/11/2010, por carta registada com aviso de receção – cfr. fls. 87 do processo instrutor apenso;

Q)O aviso de receção referido em O) foi assinado por terceira pessoa em 06/12/2010 – cfr. fls. 91/v do Apenso;

R)Através do oficio 12 222, de 09/12/2010, foi remetida ao Oponente, sob o assunto:

«Concretização da citação Pef: ................. e ................» notificação com o seguinte teor: «Fica V. Exª., por este meio notificado de que se encontra concretizada a citação no processo supra identificado, tendo o AR sido assinado por pessoa diferente, no dia 2010/12/06 conforme fotocópia dos AR que junto, por força do art.º 236º, 238 e 241º do Código do Processo Civil.». – cfr. fls. 92 do Apenso;

S)Através de oficio datado de 22/12/2010, o Serviço de Finanças de Odivelas solicitou ao Serviço de Finanças de Mafra que citasse pessoalmente a Oponente C................. - cfr. fls. 94 do Apenso;

T)A Oponente C................. foi citada pessoalmente nos PEF referidos em A), através de contacto direto por funcionário do Serviço de Finanças de Mafra, em 29/12/2010, na localidade da Malveira – cfr. fls. 94 a 101 do Apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

U)Em 08/02/2011 foi remetida ao Serviço de Finanças de Odivelas, através do correio, a petição da presente Oposição – cfr. fls. 61 dos autos;

V)Em 08/02/2011, foi liquidada e paga taxa de justiça no montante € 612,00 e multa no valor de € 244,80 – cfr. fls. 59 e 60 dos autos.


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2.2 FACTOS NÃO PROVADOS.

Dos factos alegados, com interesse para a decisão, nenhum importa registar como não provado.


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2.3 FUNDAMENTAÇÃO DO JULGAMENTO

A decisão da matéria de facto provada resultou da análise crítica de toda a prova produzida nos autos, nas informações oficiais e documentos constantes dos autos e do processo de execução fiscal, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada alínea do probatório.

Os depoimentos das testemunhas foram genéricos e pouco circunstanciados quanto aos factos relevantes para as questões a decidir.»




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B. DO DIREITO

Na sentença proferida nos presentes autos, decidiu-se julgar improcedente a excepção de caducidade do direito de deduzir oposição à execução fiscal nº ................. e aps., invocada em sede de contestação, relativamente à revertida C................. e conhecendo do mérito considerou-se que a Fazenda Pública não logrou fazer a prova da gerência de facto enquanto pressuposto da reversão.

Desde logo, começa a Fazenda Pública (doravante recorrente) por assinalar a inaplicabilidade da dilação de cinco dias prevista no artigo 252.º A do CPC, por entender que « (…) estamos dentro da mesma área de jurisdição do tribunal tributário de lisboa, onde se inserem os Serviços de Finanças de Mafra e Odivelas.».

A primeira questão que está assim em discussão é a de saber se ocorreu a caducidade do direito de acção, na medida em que a eventual intempestividade a verificar-se obsta ao conhecimento de qualquer outra questão que se prenda com o fundo da causa.

Vejamos, então.

O prazo para deduzir oposição previsto no n.º 1 do artigo 203.º do CPPT é um prazo para a prática de um acto no processo de execução fiscal, que tem natureza judicial (artigo 103.º da LGT), motivo por que se lhe aplicam as regras de contagem previstas no CPC, como determina o artigo 20.º, n.º 2, do CPPT.

No caso, não vem questionado, nem suscita qualquer dúvida, que a Oponente C................., foi citada pessoalmente em 29.12.2010 (artigo 192.º, n.º 1, do CPPT e 239.º, n.º 1, do CPC). Nem sequer vem questionado que naquela data, decorriam as férias judiciais do Natal, (cfr. artigo 12.º da Lei n.º 3/99, de 13/01 e sucessivas alterações), pelo que o prazo para deduzir oposição encontrava-se suspenso, retomando a sua contagem em 04.01.2011.

Pois bem, o Tribunal «a quo» considerando que a Oponente foi citada na Malveira, freguesia do concelho de Mafra, por funcionário do Serviço de Finanças de Mafra « que não é portanto, o serviço de Finanças de Odivelas, onde correm termos dos PEF aos quais deduziu a presente oposição» entendeu que há que aplicar a dilação de 5 dias prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 252.º-A do CPC.

A Fazenda Pública, como já vimos, defende no presente recurso jurisdicional que na jurisdição dos tribunais tributários não existem comarcas, mas sim áreas de jurisdição, nos termos do Decreto – Lei n.º 325/2003, de 29 de Dezembro, pelo que a dilação deverá ser aplicada apenas quando o citado resida em área de jurisdição diferente da área do tribunal tributário.

Conforme jurisprudência uniforme e pacífica do Supremo Tribunal de Administrativo ao prazo de trinta dias previstos no artigo 203.º, n.º 1, al. a) do CPPT acresce a dilação é de cinco dias quando a citação tenha tido lugar fora da área da comarca em que se situa o serviço da administração Tributária onde corre o processo de execução (Acórdãos de 08.02.2012 e 10.4.2017, proferidos respectivamente nos processos n.ºs 01016/11 e 0214/17, disponíveis em texto integral em www.dgsi.pt)

Quanto a este tema, ficou dito no supra citado Acórdão de 08.02.2012: « (…) o referido artigo 252.º-A faz referência a «comarca» e não «área de jurisdição», pelo que, sendo aplicável subsidiariamente o regime do CPC, por força do disposto no art. 2.º, alínea e), do CPC, ele deverá ser aplicado nos termos aí previstos, nos casos em que não se imponha uma adaptação.

No caso em apreço, não há qualquer razão para fazer uma adaptação, pois as razões de distanciamento geográfico em relação à sede do tribunal e presumível maior dificuldade na organização e apresentação de defesa judicial que justificam aquela dilação no processo civil não deixam de valer quando tal defesa deva ser efectuada num tribunal tributário. De resto, a desnecessidade de qualquer adaptação do regime do processo civil aos processos judiciais tributários, quanto a este ponto, é reconhecida explicitamente pelo CPPT que, no n.º 2 do seu art. 20.º, estabelece que «os prazos para a prática de actos no processo judicial contam-se nos termos do Código de Processo Civil».

Sendo o processo de execução fiscal um processo judicial, na sua totalidade (art. 103.º, n.º 2, da LGT), esta regra aplica-se ao prazo para deduzir oposição, que se assume a função processual de uma contestação à pretensão do exequente.».

Assim, porque a citação ocorreu fora da área da comarca sede do serviço de finanças onde pende a execução fiscal (a Oponente foi citada no seu domicilio fiscal, Malveira, freguesia do concelho de Mafra, por funcionário do Serviço de Finanças de Mafra que não é, portanto, o serviço de Finanças de Odivelas, onde correm termos os processos de execução fiscal aos quais deduziu a presente oposição - cfr. alíneas A) e T) do probatório-), deve considerar-se tempestiva a oposição à execução fiscal.

Isto porque tendo a citação tido lugar em 29.12.2010 (cfr. artigos 192.º, n.º 1, do CPPT e 239.º, n.º 1, do CPC) e iniciando-se a contagem do prazo para deduzir oposição imediatamente após o período de férias judiciais (cfr. artigo 144.º do CPC revogado), a que corresponde o dia 04.01.2012. A partir desta data 04/01/2011, há que contar os 5 dias da dilação (08.01.2011) e a partir de 09.01.2011, os trinta dias previstos no artigo 203.º, n.º 1, al. a) do CPPT, os quais se completaram, portanto, em 07.02.2011.

Considerando-se apresentada a presente oposição em 08.01.2011 - data da remessa pelo correio - (cfr. artigo 103.º, n.º 6 do CPPT), e uma vez provado o pagamento de multa, a prática do acto processual (dedução de oposição à execução fiscal) é válida nos termos do artigo 145.º do CPC.

Improcede, portanto, nesta parte, o recurso.

Entendeu-se na sentença recorrida, que por a sociedade devedora originária ter apresentado declaração de cessação de actividade em 07.04.2008, com base na aliena a) do n.º1 do artigo 33.º do CIVA, e nada tendo acrescentado a Fazenda Pública neste ponto, por isso, a partir de Agosto de 2004, não foram praticados actos de gerência pela Oponente.

A responsabilidade dos administradores ou gerentes de sociedades pelas dívidas tributárias, está prevista no artigo 24.º da LGT.

O supra indicado preceito legal estabelece o seguinte: “1- Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:

a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;

b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.».

A responsabilidade subsidiária dos administradores/gerentes, por dívidas da executada originária, tem por pressuposto o exercício efetivo do cargo.

E, por isso, a gerência de facto constitui requisito da responsabilidade subsidiária dos gerentes, não bastando, portanto, a mera titularidade do cargo, a gerência nominal ou de direito. Sabendo-se que a gerência de facto de uma sociedade comercial consiste no efetivo exercício das funções que lhe são próprias e que passam, nomeadamente, pelas relações com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de bancárias e outras entidade, e com os trabalhadores, tudo em nome, e no interesse e em representação dessa sociedade.

Para que se verifique a administração/ gerência de facto é indispensável que o administrador/gerente use, efetivamente, dos respetivos poderes, que seja um órgão atuante da sociedade, tomando as deliberações consentidas pelo facto, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros (Rúben Anjos de Carvalho, Francisco Rodrigues Pardal, Código de Processo das Contribuições e Impostos, anotado e comentado, 2ª Edição, Coimbra, 1969, p. 139).

Como é sabido, incumbe à Administração Tributária, na qualidade de exequente e titular do direito de reversão, o ónus de alegar e provar os pressupostos que lhe permitem reverter a execução fiscal contra o administrador/gerente da devedora originária, designadamente, os factos integradores do efetivo exercício da gerência de facto em conformidade com a regra geral de quem invoca um direito tem que provar os respetivos factos constitutivos (artigo 342.º, nº 1, do CC e artigo 74.º, nº 1, da LGT).

Retornando ao caso dos autos e constatando-se que nenhuma prova foi oferecida por parte da Fazenda Pública tendente à demonstração e validação do pressuposto de facto em que se funda a reversão, concretamente o exercício da gerência de facto pela Recorrida.

É que o facto de a recorrida constar do contrato social como gerente de direito da sociedade originária devedora, por si só, nada permite concluir quanto à prática efectiva de qualquer acto em representação da sociedade.

Ora, como deixámos já dito, não basta a mera invocação da inscrição no registo da Recorrida, como sócia-gerente, no acto de constituição da sociedade para se extrair a ocorrência de actos de gerência praticados em nome da sociedade devedora originária.

Por outras palavras, não pode a Fazenda Pública pretender, ao abrigo da referida presunção judicial fique dispensada de alegar o efectivo exercício de funções de gerência, como requisito para reverter a execução ao abrigo do artigo 24.º da LGT.

Relevaria a prova de actos concretos que corporizassem o mencionado exercício efectivo, o que não se demonstra nos autos.

Por tudo o que deixámos dito, o recurso não merece provimento.

IV.CONCLUSÕES

I. O prazo para deduzir oposição previsto no n.º 1 do artigo 203.º do CPPT é um prazo para a prática de um acto no processo de execução fiscal, que tem natureza judicial (artigo 103.º da LGT), motivo por que se lhe aplicam as regras de contagem previstas no CPC, como determina o artigo 20.º, n.º 2, do CPPT.

II. Ao prazo de trinta dias previstos no artigo 203.º, n.º 1, al. a) do CPPT acresce a dilação é de cinco dias quando a citação tenha tido lugar fora da área da comarca em que se situa o serviço da Administração Tributária onde corre o processo de execução.

III.É aplicável ao prazo para dedução de oposição à execução fiscal a dilação prevista no artigo 252.º-A, n.º 1, alínea b), do CPC, nos termos em que aí está prevista, isto é, sempre que o oponente seja citado fora da área da comarca sede do tribunal, mesmo que tal área se inclua na área de jurisdição do tribunal tributário.

IV.À luz do regime da responsabilidade subsidiária prevista no artigo 24.º, n.º 1, da LGT, em qualquer das suas duas alíneas, a possibilidade de reversão não se basta com a gerência de direito, exigindo-se o exercício de facto da gerência.

V.É à Fazenda Pública, enquanto exequente, que compete demonstrar a verificação dos pressupostos da reversão da execução fiscal.

V.DECISÃO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes que integram a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente.


Lisboa, 25 de Junho de 2020



[Ana Pinhol]

[Isabel Fernandes]

[Jorge Cortês]