Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 01949/07 |
Secção: | CT - 2.º JUÍZO |
Data do Acordão: | 01/15/2013 |
Relator: | BENJAMIM BARBOSA |
Descritores: | IVA - MÉTODO DE DEDUÇÃO - SGPS |
Sumário: | I) No regime instituído pelo Decreto-Lei n.° 495/88, de 30 de Dezembro, as Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS) são consideradas sociedades cujo objecto é a detenção estável de participações sociais de outras sociedades, que lhe são juridicamente independentes, tendo por único objecto contratual a gestão dessas participações como forma indirecta de exercício de actividades económicas, podendo, no entanto, prestar serviços técnicos de administração e de gestão a todas ou a algumas das sociedades em que detenham participações de, pelo menos, 10% do capital, com direito de voto, ou, excepcionalmente, às sociedades nas quais detenham uma participação de, pelo menos, 10%, com direito de voto, ou com as quais tenham celebrado «contratos de subordinação. II) Essa prestação tem de ser reduzida a escrito. III) Uma SGPS que adquire serviços de consultadoria a entidades não residentes, pelo quais incorre em IVA, e que de seguida os redebita na totalidade, com liquidação de IVA, às suas participadas, não pode deduzir o IVA incorrido nessas aquisições por aplicação do método de dedução da afectação real, a menos que demonstre que tais serviços foram utilizados pelas segundas nas suas próprias actividades. IV) Na situação anteriormente referida, não tendo sido feita essa demonstração, designadamente por não existir contrato escrito entre a SGPS e as participadas relativo a tais prestações de serviços, a dedução do IVA só poderá ser feita por aplicação do método pro rata. |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:
1 - Relatório a) - As partes e o objecto do recurso * b) - Questões a decidir ¾ Apurar se a actividade da recorrente pode ser considerada uma actividade económica na acepção da Sexta Directiva ¾ Determinar o método de dedução de IVA aplicável à situação concreta. * 2 – Fundamentação a) - De facto * Desenhemos, antes de mais, os contornos essenciais do litígio: No ano 2000, a Portugal A... (PT) adquiriu serviços técnicos de administração e gestão a terceiros, tendo pago o respectivo preço acrescido de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) à taxa fixada no momento pela lei portuguesa (19%), Posteriormente, a PT redebitou os mesmos serviços às suas participadas, pelo valor de aquisição acrescido de IVA à de 19%. Ou seja, entre a operação de aquisição dos serviços e o seu redébito às participadas a PT não realizou qualquer encaixe em dinheiro. Na sequência da acção inspectiva a Administração Tributária (AT) considerou que a Portugal A... tinha exercido indevidamente o direito à dedução do IVA pelo método da afectação real, na medida em que deveria ter utilizado o método pro rata, argumentando que a actividade prestação de serviços técnicos de gestão e administração é necessariamente acessória da actividade principal, consistente na gestão de participações sociais. A PT contrapõe que não se trata de uma holding pura, já que não se limita a gerir essas participações, também presta serviços técnicos de administração e gestão às participadas, sendo que os recursos adquiridos correspondem directamente a prestações de serviços técnicos de administração e gestão às mesmas. E acrescenta que neste caso, a adopção do método do pro rata em função da natureza do sujeito passivo introduz um elemento subjectivo nos pressupostos do direito à dedução que não é acolhido no plano jurídico comunitário. A primeira questão que importa fechar é a de saber qual a natureza da actividade económica desenvolvida pela impugnante, que conforme resulta do número 1 do probatório é uma sociedade gestora de participações sociais (SGPS). As Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS) são sociedades cujo objecto é a detenção estável de participações sociais de outras sociedades, que lhe são juridicamente independentes. As SGPS enquadram-se na figura geral das sociedades holding, sendo sociedades constituídas com o objectivo de intervir na gestão das suas participadas, controlando a sua actividade e exercendo os direitos sociais inerentes às respectivas participações sociais. Têm como fim essencial participar nos lucros ou receber dividendos, e bem assim colher os rendimentos resultantes de eventuais alienações dessas participações sociais. Com efeito, nos termos do art.º 1.° do Decreto-Lei n.° 495/88, de 30 de Dezembro, vigente à data dos factos, as SGPS têm por único objecto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indirecta de exercício de actividades económicas (negrito nosso). Essa participação indirecta terá de ter carácter permanente e ser igual ou superior a 10%, directa ou indirectamente através de outras sociedades em que a SGPS seja dominante, do capital com direito de voto da sociedade participada (art.º 1.º, n.º 2, do mesmo diploma). Contudo, nos termos do art.º 4.°, n.° 1, do referido Decreto-Lei, é permitido às SGPS a prestação de serviços técnicos de administração e de gestão a todas ou a algumas das sociedades em que detenham participações de, pelo menos, 10% do capital, com direito de voto, ou, excepcionalmente, às sociedades nas quais detenham uma participação de, pelo menos, 10%, com direito de voto, ou com as quais tenham celebrado «contratos de subordinação», sendo que nos termos do n.º 2 essa prestação de serviços terá de ser reduzida a escrito, convencionando-se a correspondente remuneração que não pode exceder o respectivo valor de mercado. Pode dizer-se, pois, que a lei permite às SGPS desenvolver operações económico-financeiras no âmbito da gestão da carteira de participações sociais que possuam e, obviamente, encaixar as receitas correspondentes e, para além disso, gerar proveitos através da prestação de serviços técnicos de gestão e administração prestados às sociedades participadas, os quais devem ser objecto de contrato escrito e o seu valor não deve ultrapassar o valor normal de mercado. No caso em concreto a impugnante não exerce apenas a actividade de gestão de participações sociais mas também um outra, paralela, de prestação de serviços técnicos de administração e gestão às sociedades participadas. E a segunda é complementar ou acessória da primeira ou pode assumir a natureza de actividade “autónoma”? O art.º 2.º do Código Comercial (CCom) fornece uma definição de acto de comércio, que abrange qualquer efeito jurídico produzido na actividade mercantil, abrangendo todos os factos, unilaterais ou bilaterais, isolados ou em cadeia, sejam eles naturais, involuntários ou voluntários, lícitos ou ilícitos. Todavia o art.º 230.º deste diploma reduz a abrangência para efeitos de qualificação de uma sociedade como comercial, pois considera que se haverão “comerciais as empresas individuais ou colectivas” que se propuserem exercer uma das actividades que enumera, nas quais não se conta a actividade de gestão de participações sociais. Todavia, não só esta norma não pode ser encarada (sobretudo hoje) como uma exemplificação taxativa, como também o art.º 463.º, n.º 5, do mesmo diploma considera como actos de comércio a compra e venda de partes sociais ou acções. Portanto, não podem restar dúvidas que a actividade de gestão de participações sociais tem natureza comercial. Mas significará isso que essa actividade poderá ser havida como actividade económica na acepção do art.º 4.º, n.º 2, da Directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de Maio de 1977 (Sexta Directiva)(1), no sentido que usualmente é acolhido pela jurisprudência do TJUE(2)? A resposta terá de ser negativa. O conceito jurídico de acto de comércio plasmado no art.º 2.º do CCom é um conceito restritivo quando comparado com a noção de actividade económica contida no art.º 9.º, n.º 1, da Directiva citada, que por sua vez é também menos ampla que a noção de actividade económica das ciências económicas, que a definem como sendo aquela que é desenvolvida por agente económicos, designando o conjunto de tarefas e relacionamentos que desenvolvem, nomeadamente de produção, de distribuição, de consumo, etc., com vista à obtenção dos bens necessários à satisfação das suas necessidades através da utilização racional e eficiente dos recursos produtivos disponíveis. A esta luz a actividade principal da impugnante não pode ser tida como económica; e por isso é que o citado art.º 1.º do Decreto-Lei n.° 495/88 a qualifica como “forma indirecta de exercício de actividades económicas”. Quer dizer: a gestão das participações sociais em si mesma considerada não é uma actividade económica no sentido normal do conceito(3); o que o é são (eventualmente) as actividades desenvolvidas pelas participadas. Donde se poder concluir que as actividades de apoio à gestão da carteira de participações, e portanto, no exclusivo interesse da SGPS, seguem o regime da actividade apoiada e, por consequência, também não podem ser consideradas actividades económicas. Se porém, a SGPS presta serviços de técnicos de administração e de gestão às suas participadas ao abrigo do art.º 4.°, n.° 1, do referido Decreto-Lei, então está a exercer uma actividade económica, já que está a intervir no mercado em regime de concorrência e paridade com outros sujeitos económicos que possam prestar o mesmo tipo de serviço(4). Temos, portanto, que a prestação de serviços de técnicos de administração e de gestão às participadas, embora não seja uma actividade que possa ser dissociada da actividade principal, na medida em que é exercida no interesse directa das segundas mas também por conveniência da primeira, obviamente empenhada em retirar dessa actividade vantagens indirectas, é uma actividade económica para efeitos do imposto sobre o volume de negócios. Debrucemo-nos agora sobre o quadro jurídico a ter em consideração, tendo em conta que as questões de liquidação de IVA se situam no exercício do ano de 2000: A Sexta Directiva dispõe: Art.º 2.°, n.° 1: «Estão sujeitas [ao IVA]: 1. As entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade; 2. As importações de bens.» O artigo 4.°, n.° 1, da Sexta Directiva prevê: «1. Por “sujeito passivo” entende-se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, em qualquer lugar, uma das actividades económicas referidas no n.° 2, independentemente do fim ou do resultado dessa actividade. 2. As actividades económicas referidas no n.° 1 são todas as actividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. A exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência é igualmente considerada uma actividade económica.» O artigo 11.° da Sexta Directiva determina o valor tributável, nos seguintes termos: «A. No território do país 1. A matéria colectável é constituída: a) No caso de entregas de bens e de prestações de serviços que não sejam as referidas nas alíneas b), c) e d), por tudo o que constitui a contrapartida que o fornecedor ou o prestador recebeu ou deve receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções directamente relacionadas com o preço de tais operações; [...]» O artigo 17.° da Sexta Directiva estabelece normas sobre a constituição e a possibilidade do direito à dedução e prevê, designadamente: «1. O direito à dedução surge no momento em que o imposto dedutível se torna exigível. 2. Desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis, o sujeito passivo está autorizado a deduzir do imposto de que é devedor: a) O [IVA] devido ou pago em relação a bens que lhe tenham sido fornecidos ou que lhe devam ser fornecidos e a serviços que lhe tenham sido prestados ou que lhe devam ser prestados por outro sujeito passivo; (…) 5. No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo, não só para operações com direito à dedução, previstas nos n. os 2 e 3, como para operações sem direito à dedução, a dedução só é relativamente à parte do [IVA] proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações. Este pro rata é determinado nos termos do artigo 19.°, para o conjunto das operações efectuadas pelo sujeito passivo. Todavia, os Estados-Membros podem: a) Autorizar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada sector da respectiva actividade, se possuir contabilidades distintas para cada um desses sectores; b) Obrigar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada sector da respectiva actividade e a manter contabilidades distintas para cada um desses sectores; c) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na utilização da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços; d) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução, em conformidade com a regra estabelecida no primeiro parágrafo deste número, relativamente aos bens e serviços utilizados nas operações aí referidas; e) Estabelecer que não se tome em consideração o [IVA] que não pode ser deduzido pelo sujeito passivo, quando o montante respectivo for insignificante. (...)» O artigo 19.° da Sexta Directiva estabelece as regras aplicáveis ao cálculo do pro rata de dedução, do seguinte modo: «1. O pro rata de dedução, previsto no n.° 5, primeiro parágrafo, do artigo 17.°, resultará de uma fracção que inclui: – no numerador, o montante total do volume de negócios anual, líquido do [IVA], relativo às operações que conferem direito à dedução nos termos dos n.os 2 e 3 do artigo 17.°; – no denominador, o montante total do volume de negócios anual, líquido do [IVA], relativo às operações incluídas no numerador e às operações que não conferem direito à dedução. Os Estados-Membros podem incluir, igualmente, no denominador o montante das subvenções que não sejam as referidas em A, 1, a), do artigo 11.° O pro rata é determinado numa base anual e fixado em percentagem arredondada para a unidade imediatamente superior.» (…) 3. O pro rata aplicável provisoriamente a determinado ano é calculado com base nas operações do ano anterior. Na falta de tal referência ou quando esta não seja significativa, o pro rata é estimado provisoriamente, sob fiscalização administrativa pelo sujeito passivo, de acordo com as suas previsões. Todavia, os Estados-Membros podem manter a sua regulamentação actual. A fixação do pro rata definitivo, que é determinado para cada ano durante o ano seguinte, implica o ajustamento das deduções operadas com base no pro rata aplicado a título provisório.» Quanto ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA): O artigo 1.° do CIVA estabelece a base de incidência do IVA e os seus art.os 3.° e 6.° os casos de não incidência. O artigo 9.° do CIVA prevê que estão isentas do IVA, designadamente: (…) As operações bancárias e financeiras seguintes: (…) f) As operações e serviços, incluindo a negociação, mas com exclusão da simples guarda e administração ou gestão, relativos a acções, outras participações em sociedades ou associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias; (…) O artigo 23.° do CIVA, na versão em vigor para o ano 2000, dispunha: «1. Quando o sujeito passivo, no exercício da sua actividade, efectue transmissões de bens e prestações de serviços, parte das quais não confira direito à dedução, o imposto suportado nas aquisições é dedutível apenas na percentagem correspondente ao montante anual de operações que dêem lugar a dedução(5). 2. Não obstante o disposto no número anterior, poderá o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, sem prejuízo de a Direcção-Geral dos Impostos lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificarem distorções significativas na tributação. 3. A administração fiscal pode obrigar o sujeito passivo a proceder de acordo com o disposto no número anterior: a) Quando o sujeito passivo exerça actividades económicas distintas; b) Quando a aplicação do processo referido no n.° 1 conduza a distorções significativas na tributação. 4. A percentagem de dedução referida no n.° 1 resulta de uma fracção que comporta, no numerador, o montante anual, imposto excluído, das transmissões de bens e prestações de serviços que dão lugar a dedução nos termos do artigo 19.° e n.° 1 do artigo 20.° e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo, incluindo as operações isentas ou fora do campo do imposto, designadamente as subvenções não tributadas que não sejam subsídios de equipamento. 5. No cálculo referido no número anterior não serão, no entanto, incluídas as transmissões de bens do activo imobilizado que tenham sido utilizadas na actividade da empresa nem as operações imobiliárias ou financeiras que tenham um carácter acessório em relação à actividade exercida pelo sujeito passivo. 6. A percentagem de dedução, calculada provisoriamente, com base no montante de operações efectuadas no ano anterior, será corrigida de acordo com os valores referentes ao ano a que se reporta, originando a correspondente regularização das deduções efectuadas, a qual deverá constar da declaração do último período do ano a que respeita. 7. Os sujeitos passivos que iniciem a actividade ou a alterem substancialmente poderão praticar a dedução do imposto com base numa percentagem provisória estimada, a inscrever nas declarações a que se referem os artigos 30.° e 31.° 8. Para determinação da percentagem de dedução, o quociente da fracção será arredondado para a centésima imediatamente superior. 9. Para efeitos do disposto neste artigo, poderá o Ministro das Finanças e do Plano, relativamente a determinadas actividades, considerar como inexistentes as operações que dêem lugar à dedução ou as que não confiram esse direito, sempre que as mesmas constituam uma parte insignificante do total do volume de negócios e não se mostre viável o procedimento previsto nos n.os 2 e 3.» As considerações tecidas a propósito do conceito de actividade económica e o quadro jurídico aplicável permitem concluir que se as prestações de serviços em causa foram exclusiva e integralmente consumidas na actividade principal da PT SGPS, de gestão e administração das participações sociais, então o IVA não é dedutível. Se, pelo contrário, esses serviços foram utilizados para prestar serviços técnicos de administração e de gestão em apoio às participadas (actividade complementar da principal), então o IVA suportado na aquisição desses bens e serviços é integralmente dedutível, nos termos do n.° 2 do artigo 17.° da Sexta Directiva. Mas para se extrair essa conclusão torna-se necessário que se estabeleça, sem margem para dúvidas, um nexo directo, causal, imediato, entre as operações a montante (o fornecimento das prestações de serviços por terceiros) - inputs - e os seus efeitos a jusante (na esfera jurídica das sociedade participadas) - outputs. Isto é, tem de ser inequívoco que tais serviços foram utilizados apenas no imediato e único interesse das participadas, servindo apenas a PT SGPS como veículo para a concretização desse resultado. Ora, no número 48 do acórdão do TJUE é dito que “cabe ao juiz de reenvio determinar se todos os serviços em causa no processo principal apresentam um nexo directo e imediato com as operações económicas a jusante que dão direito a dedução, ou se esses serviços são utilizados pelo sujeito passivo para realizar simultaneamente operações económicas com direito a dedução e operações económicas sem direito a dedução, ou ainda se esses serviços são utilizados pelo sujeito passivo, simultaneamente, para operações económicas e para operações não económicas”. Vejamos então. O art.º 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.° 495/88, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 318/94, dispõe: “É permitida às SGPS a prestação de serviços técnicos de administração e gestão a todas ou a algumas das sociedades em que detenham participações previstas no n.º 2 do artigo 1.º e nas alíneas a) a c) do n.º 3 do artigo 3.º ou com as quais tenham celebrado contratos de subordinação”. O n.º 2 do mesmo artigo, na redacção do Decreto-Lei n.º 378/98, de 27 de Novembro, estabelece: ”A prestação de serviços deve ser objecto de contrato escrito, no qual deve ser identificada a correspondente remuneração”. Não está provado nem documentalmente demonstrado nos autos que as prestações de serviço em causa tenham sido reduzidas a escrito. Consequentemente, a conclusão a extrair é de que tais prestações de serviço não foram efectuadas em benefício das participadas mas sim no exclusivo interesse da PT SGPS. E mesmo abstraindo dessa realidade a conclusão a que se chega é a mesma. Com efeito, para além da mera afirmação da impugnante de que tais prestações de serviços se reflectiram na actividade das participadas, nada mais confirma esta asserção. Pelo contrário, os contornos da operação induzem em sentido inverso, de que as referidas prestações de serviço se deram no exclusivo interesse da impugnante, que no âmbito da sua actividade de gestão e administração de participações sociais pretendia obter elementos que lhe permitissem decidir se certos investimentos das participadas deveriam ser concretizados ou não. Não foi, portanto, em benefício directo destas que tais serviços foram prestados. Isto é, a pergunta quanto ao “nexo directo, causal, imediato, entre as operações a montante (o fornecimento das prestações de serviços por terceiros) - inputs - e os seus efeitos a jusante (na esfera jurídica das sociedade participadas) - outputs”, merece um resposta negativa, na medida em que não existe nexo directo, mas eventualmente meramente reflexo, entre tais operações e os efeitos produzidos na esfera jurídica das participadas. E sendo assim, tais operações não são caracterizáveis como operações de prestação de serviços técnicos de administração e gestão às participadas. Quando muito podem vir a influenciar a estratégia de investimentos das participadas e as decisões a tomar nesse domínio, por um lado em função do peso específico da impugnante no capital social de cada uma delas e por outro em função dos serviços técnicos de administração e gestão que lhes presta. Dito de uma forma mais prosaica, poderão ter influência na tomada de decisões quanto a investimentos das participadas, mas não determinam por si mesmas essas decisões. Não apresentam, pois, um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade da impugnante, que abrange duas áreas: a (i) gestão de participações sociais e a (ii) de prestação de serviços técnicos de administração e gestão às participadas. Com efeito. Apenas produzem resultados directos na primeira área, ou seja, na actividade principal, embora possam gerar efeitos reflexos na segunda. Neste contexto e como observou o TJUE no acórdão Midland Bank(6) o art.º 17.º, n.os 2, 3 e 5, da Sexta Directiva “devem ser interpretados no sentido de que, em princípio, a existência de uma relação directa e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução é necessária para que o direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado a montante seja reconhecido ao sujeito passivo e para determinar a extensão desse direito”, incumbindo “ao órgão jurisdicional nacional aplicar o critério da relação directa e imediata aos factos de cada processo que lhe seja presente. Um sujeito passivo que efectua simultaneamente operações com direito à dedução e operações sem direito à dedução pode deduzir o imposto sobre o valor acrescentado que incidiu sobre os bens ou serviços por si adquiridos, desde que estes tenham uma relação directa e imediata com as operações a jusante que dão direito à dedução, e sem que se deva proceder de forma diferente consoante se apliquem os n.os 2, 3 ou 5 do artigo 17.º da Sexta Directiva”, Todavia, acrescenta o Tribunal, “este sujeito passivo não pode deduzir na íntegra o imposto sobre o valor acrescentado que incidiu sobre os serviços a montante quando estes tenham sido utilizados não para a realização de uma operação com direito à dedução, mas sim no quadro de actividades que são apenas a sua consequência, salvo quando o sujeito passivo demonstre, através de elementos objectivos, que as despesas relacionadas com a aquisição destes serviços fazem parte do custo dos diversos elementos constitutivos do preço da operação a jusante”. Neste contexto, a impugnante não tem direito à dedução do IVA suportado nos termos do art.º 17.°, n.° 2, da Sexta Directiva e art.º 23.º, n.º 2, do CIVA, mas antes nos termos do n.º 5 do mesmo artigo, como lembrou o TJUE no número 46 do acórdão de reenvio: “Quando os referidos serviços são utilizados para realizar simultaneamente operações com direito a dedução e operações sem direito a dedução, a dedução só é admitida para a parte do IVA que seja proporcional ao montante relativo às primeiras operações e os Estados-Membros estão autorizados a prever um dos métodos de determinação do direito a dedução enumerados no artigo 17.°, n.° 5, da Sexta Directiva”. O que de resto resulta também do dispositivo do acórdão. O art.º 17.º, n.º 2, da Sexta Directiva consagra um regime de dedução do IVA proporcional ao montante das operações com direito à dedução, relativas a bens ou serviços utilizados pelo sujeito passivo para operações com direito e sem direito à dedução(7). Neste caso o direito à dedução é calculado pelo método pro rata, determinado em conformidade com o art.º 19.° dessa Directiva. Porém, o art.º 17.º, n.º 5, da mesma Directiva permite, mediante certas condições, que os Estados-Membros consagrem um dos outros métodos de determinação do direito à dedução, quer através de um específico pro rata para cada sector de actividade, quer pela afectação de toda ou parte dos bens e serviços a uma certa actividade. E permite mesmo a exclusão do direito a dedução, quando o montante do imposto for insignificante. E como foi afirmado pelo TJUE no n.º 22 do recente acórdão Finanzamt Hildesheim(8), “na falta de indicações na Sexta Directiva, cabe aos Estados-Membros instituir, dentro dos limites do direito da União e dos princípios em que assenta o sistema comum do IVA, métodos e normas para o cálculo do pro rata de dedução do IVA pago a montante. No exercício desse poder, esses Estados são obrigados a ter em conta a finalidade e a sistemática dessa Directiva”. Embora a impugnante argumente que o método da afectação real que utilizou é compatível com as actividades principal e acessória que desenvolve (cfr. art.º 35.º das alegações de recurso), o certo é que no caso em concreto não comprovou que as operações em causa foram utilizadas indistintamente nas duas actividades. Como já se salientou, os elementos dos autos apontam em sentido diferente, de existir apenas uma repercussão mediata e reflexa na actividade acessória, não estando sequer demonstrado que estão na origem de operações concretas de prestação de serviços técnicos às sociedades por si participadas. Resumindo: é correcto o entendimento da AT na utilização do método de dedução concretamente aplicado ao caso sub judice, não merecendo por isso qualquer censura a sentença que julgou a impugnação parcialmente improcedente, o mesmo é dizer, o recurso não logra obter provimento. * 3 - Dispositivo: Em face de todo o exposto acordam em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida. Custas pela recorrente. D.n. Lisboa, 2013-01-15 (Benjamim Barbosa, Relator) (Pedro Vergueiro) (Aníbal Ferraz) 1- Aplicável à situação sub judice atendendo a que as liquidações em causa respeitam ao exercício do ano de 2000. 2- Cfr., designadamente, acórdão do TJUE de 21-02-2006, Halifax, (Proc. n.º C-255/02, Col., 2006, p. I-01609). 3- Enfatiza-se esta afirmação por não se desconhecer que a gestão e administração de participações sociais é incluída na Classificação Portuguesa das Actividades Económicas (CAE-Rev.3). 4- “A interferência de uma holding na gestão das sociedades em que tomou participações constitui uma actividade económica na acepção do artigo 4.° , n.° 2, da Sexta Directiva 77/388 relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, na medida em que implique a realização de transacções sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado nos termos do artigo 2.° dessa directiva, tais como o fornecimento, pela holding às suas filiais, de serviços administrativos, financeiros, comerciais e técnicos”. Acórdão de 27-09-2001, Cibo Participations (Proc. C-16/00). [em linha]. Eur-Lex. [Consult. 15-12-2012]. Disponível em: WWW: <URL: http://eur-lex.europa.eu/. 5 - A referida norma já foi objecto de exame, pelo TJUE: acórdão de 29 de Abril de 2004, EDM (Proc. C-77/01, Col. 2004, p. I-04295). 6 - De 08-06-2000, Commissioners of Customs and Excise contra Midland Bank plc. (Proc. C-98/98). [em linha]. Eur-Lex. [Consult. 15-12-2012]. Disponível em: WWW: <URL: http://eur-lex.europa.eu/. 7 -Acórdão de 18 de Dezembro de 2008, Royal Bank of Scotland (C-488/07, Colet., p. I-10409, n.° 17). 8 - De 8 de Novembro de 2012, processo C-511/10, integralmente disponível em: http://eur-lex.europa.eu |