Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:812/18.9BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:03/28/2019
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:INCIDENTE RELATIVO AO REQUERIMENTO DE SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO, COM PRESTAÇÃO DE GARANTIA IDÓNEA.
Sumário:1) O pedido de suspensão da execução, com oferecimento de garantia idónea, origina um incidente, o qual termina com a decisão (negativa ou positiva) a proferir no mesmo por parte do órgão de execução fiscal competente, o qual deve sobrestar na execução até ao termo do incidente.

2) É ilegal a compensação efectuada pela AT, sem ter sido apreciado o pedido prévio de suspensão da execução, com base na garantia oferecida em requerimento autónomo.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão
I- Relatório
A Fazenda Pública interpõe o presente recurso jurisdicional contra a sentença proferida a fls. 617/634, (numeração em formato digital – sitaf), que julgou procedente a reclamação do acto de compensação parcial de dívida, com o crédito no montante de €63.153,37, resultante de reembolso de IRC, do exercício de 2016, no processo de execução fiscal n.º ..............., instaurado para cobrança de IRC, relativo ao exercício de 2011.
Nas alegações de recurso de fls. 660 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente formula as conclusões seguintes:
«II – Conclusões
a) Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a reclamação, em que é Reclamante L............... SGPS, S.A., deduzida do acto de compensação de dívida fiscal levado a cabo nos termos do artigo 89.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário em 17-07-2017 com referência ao processo de execução fiscal n.º ..............., no valor de € 63.153,37, e diverge a Fazenda Pública, com o devido respeito, com tal entendimento vertido na douta sentença, aqui recorrida, porquanto procede a mesma a um errado julgamento de facto da matéria pertinente para decisão da causa, com consequente errado julgamento de direito, com violação de lei.
b) Assenta o entendimento do Tribunal a quo na consideração de que, por um lado, encontrando-se pendente impugnação judicial de IRC referente ao exercício de 2010, um pedido de revisão de IRC referente aos exercícios de 2011 e 2012 e existindo pedido de suspensão da execução e de constituição de garantia por depósito o acto de compensação viola o dever de decisão previsto no artigo 56.º da Lei Geral Tributária.
c) Desde logo, o princípio da decisão está consagrado no artigo 56.º da LGT, e inserido portanto no Título III dedicado ao Procedimento Administrativo, enquanto o processo de execução fiscal se encontra regulado no Capítulo II, sob a epígrafe Formas de Processo e Processo de Execução, do Título IV dedicado precisamente ao processo tributário.
d) Pelo que, não nos merece acolhimento a tese da aplicação do dever de decisão previsto no artigo 56.º da LGT nos presentes autos, uma vez que em sede de execução fiscal, e seus incidentes, nos movemos no âmbito de processo judicial, pelo que, o dever de decisão a que apela a douta sentença, enquanto princípio enformador do procedimento administrativo, sofrerá aqui notórios constrangimentos.
e) Concedemos até que pudesse estar em causa questão atinente a execução de decisão jurisdicional, uma vez que indeferido o requerimento da Reclamante interposto em 20/04/2016 e subsequentemente anulado por sentença de procedência proferida nos autos de reclamação, com termos no Tribunal Tributário de Lisboa, sob o n.º 2496/16.0BELRS, confirmada por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 25/01/2017, cf. alíneas I) e J) do probatório, mas não questão enquadrável no âmbito do princípio da decisão decorrente da mencionada norma.
f) Nem em causa está efectivamente uma obrigação de decisão da Administração Tributária, porquanto tal decisão existiu e está consubstanciada no despacho de indeferimento de 10/05/2016, por isso, não podemos partir do pressuposto de que, em virtude do julgamento procedente dos autos n.º 2496/16.0BELRS tal despacho de indeferimento deixou de existir na ordem jurídica, porque aquilo que decorre e apenas da decisão jurisdicional é a obrigação de execução da mesma, em consonância com o decidido.
g) Ainda, a considerar-se a aplicação do princípio da decisão previsto no artigo 56.º da LGT, como faz a douta sentença, considerando ademais a aplicação de tal princípio a requerimento da reclamante datado de 20/04/2016, e à inexistência de decisão da Administração Tributária, incontornavelmente teríamos de aplicar o disposto nos n.ºs 1 e 5 do artigo 57.º da LGT, e assim teríamos não uma ausência de decisão, mas sim um acto de indeferimento tácito pelo decurso do prazo de 4 meses a contar de tal requerimento, sendo nesse caso o acto de compensação de dívida, que a reclamante ataca nos presentes autos de reclamação de acto de órgão de execução fiscal, uma mera concretização de tal indeferimento tácito, não padecendo do vício de violação de lei que lhe é imputado pela douta sentença.
h) Pelo que, neste particular segmento procedeu o tribunal a quo a uma errada apreciação da matéria de facto relevante para efeitos de decisão nos presentes autos.
i) Ainda discordamos da sentença quando afirma ter sido “aplicado o crédito de reembolso de IRC de 2016 a dívidas fiscais, sem as identificar, sem a indicação do processo de execução fiscal e sem ter proferido decisão sobre o pedido de suspensão e de prestação de garantia de depósito de caução.". (sublinhado nosso).
j) No referente à falta de decisão sobre o pedido de suspensão e de prestação de garantia de depósito de caução, reiteramos o acima afirmado, pois que efectivamente consta dos autos de execução fiscal, conforme alínea I) dos factos assentes, despacho de indeferimento do requerimento apresentado pela reclamante em 20/04/2016.
k) Sendo que, mais discordamos do entendimento de que o acto de compensação não procede à identificação das dívidas fiscais e do respectivo processo de execução fiscal, por se mostrar desconforme com os factos contantes do probatório a alíneas N), O) e P).
l) De tais factos decorre indubitavelmente que a reclamante foi notificada em 17/07/2017 da compensação de dívidas efectuada pela Administração Tributária nos termos do artigo 89.º do CPPT, dívidas essas referentes a IRC referente ao exercício de 2011, tituladas pela certidão de dívida no documento enunciada (vide alínea N) do probatório), tendo tal compensação sido efectuada com o valor do crédito de que era titular a reclamante em sede de IRC, relativo ao exercício de 2016, e que ascendia ao valor de € 63.135,57, conforme documento de demonstração de crédito constante da alínea N) e na demonstração de liquidação de IRC com valor a reembolsar no montante de € 63.135,57 referente a 2016 e constante na alínea O) dos factos assentes.
m) Ainda se note que foi tal demonstração de liquidação de IRC notificada na mesma data que o acto de compensação de dívidas acima referido, 17/07/2017, e nessa mesma data foi a reclamante notificada do acerto de contas constante da alínea P) dos factos assentes a que faz referência a demonstração de liquidação de IRC de 2016.
n) Deste modo, configura-se a sentença proferida em erro de julgamento de facto, por via da deficiente apreciação da matéria de facto pertinente, manifestamente expressa nos factos das alíneas N), O) e P) do probatório, e sua subsequente subsunção às normas jurídicas pertinentes, o artigo 89.º da LGT, o que determinaria a consideração da legalidade do acto de compensação de dívidas.
o) Acresce que, a subsequente fundamentação da douta sentença padece igualmente de erro de julgamento, senão vejamos que se refere o tribunal a quo, com o fim de fundamentar a ilegalidade do acto de compensação de dívidas datado de 17/07/2017, ao facto de resultar do probatório que em 11/11/2017 a Administração Tributária proferiu despacho de indeferimento do requerimento apresentado em 20/04/2016, o qual veio a ser anulado parcialmente por sentença proferida nos autos de reclamação n.º 384/18.4BELRS, processo que aguarda decisão de recurso, e que se constitui como facto determinante da pendência de acção judicial na qual se discutia o pedido de suspensão da execução fiscal.
p) Sucede que tal raciocínio se mostra cronologicamente viciado, efectivamente tal acção resulta do indeferimento datado de 11/11/2017 do requerimento da reclamante, enquanto o acto de compensação de dívidas data de 17/07/2017, pelo que, nunca tal pendência poderia ser ponderada pela Administração Tributária à data da compensação da dívida fiscal, pelo simples facto de não se encontrar a 17/07/2017 pendente qualquer acção cujo objecto fosse a apreciação da legalidade do indeferimento do pedido de suspensão da execução fiscal, porque tal acção foi interposta apenas na sequência do subsequente despacho de indeferimento datado de 11/11/2017.
q) Assim, se a Administração Tributária não estava, à data da compensação de dívidas, em condições de considerar tal facto, porque inexistente, também o tribunal a quo não o pode agora considerar para efeitos de aferir da legalidade do acto de compensação de dívidas, daí o decorrente erro de julgamento de facto e de direito.
r) Aqui chegados, é entendimento da Fazenda Pública que não se mostra a reclamação em causa nos presentes autos de molde a proceder, porquanto destituída de fundamentos a pretensão do reclamante, conforme argumentos aventados em sede de contestação e que aqui se reiteram, pois que aquando da compensação de dívidas reclamada não se mostravam reunidos, conforme teor do despacho de indeferimento de 11/11/2017, os requisitos legais necessários à suspensão da execução fiscal.
s) Pelo que, ainda que o despacho tivesse sido proferido em momento anterior à compensação de dívidas a garantia não teria sido prestada por não estarem reunidos os condicionalismos legais exigidos para a suspensão da execução fiscal, pelo que, sempre a compensação de dívidas se teria concretizado.
t) Ademais, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 52, nºs.1 e 2, da LGT, e 169, nº1, do CPPT, a execução fiscal só pode ser suspensa mediante prestação de garantia (ou dispensa da mesma) em virtude de pagamento em prestações da dívida exequenda ou, por outro lado, ocorrendo dedução de reclamação, recurso, impugnação ou oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, pelo que, a suspensão dos processos de execução fiscal depende, portanto, da verificação de dois requisitos legalmente consagrados, sendo estes cumulativos.
u) E tais requisitos não se verificam no caso concreto, nem se verificavam à data da compensação de dívidas concretizada nos autos de execução fiscal, pois nem foi prestada garantia idónea no âmbito do processo de execução fiscal identificado após o levantamento pelo órgão de execução fiscal da garantia de depósito caução prestada pela executada, levantamento esse conforme com o pedido da reclamante nesse sentido, conforme consta dos autos, nem foi apresentada reclamação, recurso, impugnação ou oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda.
v) Efectivamente, os créditos tributários são indisponíveis, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária (vide artigo 30.º, n.º 2 da LGT), e a Administração Tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei, conforme estipula o artigo 36.º n.º 3 da LGT), e a concessão de moratória ou a suspensão da execução fiscal fora dos casos previstos na lei, quando dolosas, são fundamento de responsabilidade subsidiária, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 85.º do CPPT.
w) Destarte, a execução fiscal, como decorre do n.º 3 do artigo 36.º da LGT e está previsto no n.º 3 do artigo 85.º do CPPT, não pode ser suspensa, a não ser nas situações em que a lei expressamente o permite (vide, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 25-09-2013, proferido no âmbito do processo 01377/13), tudo isto em conformidade com os princípios da legalidade tributária e da igualdade ínsitos na artigos 103.º, n.º 3, 266.º, n.º 2, e artigo 13.º da CRP e artigos 3.º, n.º 1, e 6.º do CPA.
x) Ora, no caso concreto, a dívida que se encontra a ser exigida no processo de execução fiscal é referente a IRC do período de 2011, ao passo que o objecto da impugnação judicial é a liquidação de IRC de 2010, sendo que da leitura do n.º 1 do artigo 52.º da LGT e do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT resulta claro que o legislador quis estabelecer uma conexão necessária e directa entre o meio procedimental ou processual apresentado pelo executado e a discussão da legalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, não podendo o órgão de execução fiscal conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias salvo nos casos expressamente previstos na lei.
y) Aliás, considerando o interesse público que subjaz à cobrança de impostos e tributos, a aceitar-se a interpretação extensiva ao n.º 1 do artigo 169.º do CPTT que a Reclamante faz, correr-se-ia o risco (não configurável pelo legislador, parece-nos notório) de poder vir o sujeito passivo a suspender todos os processos de execução fiscal que se encontrassem em curso para cobrança de créditos tributários respeitantes aos exercícios posteriores ao daquela liquidação que se encontra a ser discutida.
z) Assim, sem a prestação de garantia idónea e sem a dedução de qualquer dos meios procedimentais e processuais previstos nos n.ºs 1 dos artigos 52.º da LGT e 169.º do CPPT que tenha como objecto a discussão da legalidade do acto de liquidação de IRC relativo ao ano de 2011 ou a exigibilidade da dívida exequenda que se encontra a ser exigida no âmbito do processo de execução fiscal identificado, não poderá o órgão de execução fiscal suspender o mesmo por não se encontrarem preenchidas as condições estabelecidas naquelas normas legais.
aa) Nestes termos, foi o acto de compensação de dívidas concretizado nos autos de execução na sequência da normal prossecução da execução fiscal, mercê de não se encontrar suspensa por não haver sido constituída qualquer garantia com tal fim, bem como por não se encontrarem ademais reunidos os requisitos legais exigidos para a sua prestação, não padecendo de qualquer ilegalidade, e devendo, pois, ser mantido na ordem jurídica.
bb) Pelo que, incorreu a douta sentença num errado julgamento de facto, por errónea apreciação dos factos pertinentes, com errado julgamento de direito patente na violação das normas contidas do n.º 4 do artigo 52º da LGT, do artigo 169.ºdo CPPT, bem como do n.º 1 do artigo 89.º do CPPT, e do n.º 1 do artigo 56.º da LGT, esta por não aplicável aos presentes autos.
X
A fls. 697/705, a Recorrida, apresentou contra-alegações.
Formula as conclusões seguintes:
1. Discute-se, neste processo, única e exclusivamente, a legalidade do ato de compensação praticado pela Autoridade Tributária nos termos dados como provados.
2. A Recorrente, ao estender as suas alegações e conclusões a aspetos relativos ao processo de execução que aqui não estão causa, antes constituem objeto de outro processo, também em recurso no STA, pratica atos inúteis neste processo, assim violando o princípio da economia processual.
3. A Recorrida obteve ganho integral de causa na l.ª instância, através da, aliás, douta sentença nela proferida e agora sob recurso.
4. O ato de compensação praticado pela Autoridade Tributária é ilegal, indiretamente por vício de omissão de pronúncia e diretamente por vício de violação de lei, pelo que deve ser anulado.
5. A Recorrida viu frustradas as suas legítimas expetativas de pronúncia da administração fiscal sobre como suspender o processo de execução mediante a substituição de uma penhora de contas financeiras por garantia constituída por depósito caução.
6. Seja num processo judicial, seja num processo administrativo, essa não pronúncia denomina-se vício de violação de pronúncia e constitui uma ilegalidade recorrível.
7. O ato de compensação praticado pela Autoridade Tributária e cuja anulação aqui é requerida, está também inquinado por vício de violação de lei.
8. O ato foi praticado sem ser notificado à ora Recorrida.
9. O ato não identifica a dívida fiscal nem o processo executivo.
10. O ato foi praticado na pendência de um processo judicial e de uma decisão judicial onde estava em causa a própria admissibilidade da prestação de garantia.
11. Mostrando-se, assim, violados o artigo 56.º e 59.º da LGT.
12. Foi, ainda, praticado um ato durante o período em que o processo deveria estar suspenso por estar em discussão judicial a situação do pedido de suspensão, por força do disposto no artigo 205.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, que, assim também foi violado.

X
A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer a fls. 200 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), no sentido da improcedência do recurso.
X
Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.
X

II- Fundamentação.
2.1.De Facto.
A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes:
A) Em 27/11/2014, foi autuado no Serviço de Finanças de Lisboa …, em nome da ora Reclamante, o processo de execução fiscal n.º ..............., para cobrança de liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2011, no montante de € 1 392 593,45 - cfr. fls. 1 do processo instrutor apenso.
B) A Reclamante apresentou Impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2010, que correu termos neste Tribunal sob o n.º 1799/13.0BELRS, tendo sido proferida sentença de procedência em 31/03/2017 e que aguarda decisão do recurso - cfr. documento 3 junto com a petição inicial e Sitaf.
C) A Reclamante requereu pronúncia arbitral a correr no Centro de Arbitragem Administrativa, Proc. n.º 30/2015, contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2011, tendo sido proferida decisão arbitral, em 11/12/2015, transitada em julgado em 26/01/2016, no sentido de ser anulada parcialmente a liquidação ficando saldo devedor de € 476 806,38 acrescido de juros de mora - cfr. decisão arbitral de fls. 50 a 74, teor das informações, a fls. 77 verso, 131 e 133 todas do Processo Instrutor apenso.
D) Para efeitos de suspensão do Processo de Execução Fiscal n.º ..............., a ora Reclamante prestou um depósito caução no Banco ..............., no montante de € 1 785 090,41, em 27/03/2015 - cfr. fls. 18 do Processo Instrutor apenso.
E) Na sequência da decisão arbitral referida em C, por despacho da Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa …, datado de 26/02/2016, foi ordenado o cancelamento da caução referida na alínea precedente - cfr. despacho a fls. 78 e fls. 79 a 81 verso do Processo Instrutor apenso.
F) Em 28/03/2016, a ora Reclamante apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC dos anos de 2011 e 2012 - cfr. fls. 95 verso a 107 do Processo Instrutor apenso.
G) No âmbito do processo de execução fiscal n.º ..............., foram penhorados Depósitos Bancários da ora Reclamante, os depósitos a ordem ............... e ............... do Banco ....... - cfr. ofício do ....... dirigido ao Serviço de Finanças de Lisboa …, com data de 21/04/2016, a fls. 132 do Processo Instrutor apenso.
H) Em 20/04/2016, a ora Reclamante acabando de ser informada da penhora das suas contas bancárias n.º ............... e ............... do ......., vem requerer ao Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … a suspensão da execução fiscal n.º ............... e a substituição da penhora de contas bancárias, referida em G por garantia, oferecendo depósito caução em valor a fixar, com os seguintes fundamentos:
1. Está em causa, no processo de execução, uma dívida de IRC relativa ao período de 2011.
2. Esta dívida foi objecto de pedido de pronúncia arbitral do CAAD, que julgou precedente a pretensão da exponente, tendo dado origem a uma anulação de imposto e que reduziu o montante em execução fiscal.
3. A parte remanescente do imposto em dívida diz respeito ao reporte de prejuízos fiscais do ano anterior, isto é, de 2010, que estão a ser discutidos em processo de impugnação (Processo 1799/13.0BELRS TT de Lisboa) (...)
4. Como é jurisprudência firmada, a impugnação de um ato de que outros são consequentes constitui requisito suficiente para suspensão dos atos de execução fiscal a que os atos consequentes possam ter dado origem
(...)
7. Nestes termos, relativamente ao imposto em dívida está pendente um processo de impugnação judicial, pelo que, nos termos do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT deve ser suspenso o processo de execução fiscal.
8. Paralelamente, a exponente pede a substituição da penhora das contas bancárias recentemente efectuada, por garantia que cubra o imposto em dívida e o acrescido.
(...) propõe-se oferecer depósito caução em valor a fixar por V. Exa." - cfr. requerimento a fls. 108 verso a 110 verso do Processo Instrutor apenso, cujo teor integral dou aqui por reproduzido.
I) Em 10/05/2016, a Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … proferiu despacho de indeferimento do requerimento apresentado em 20/04/2016 - cfr. despacho a fls. 134 do Processo Instrutor apenso.
J) Em 20/05/2016, a ora Reclamante apresentou reclamação contra o despacho de indeferimento proferido em 10/05/2016, que correu termos neste Tribunal sob o n.º 2496/16.0BELRS, tendo sido proferida sentença de procedência (anulação do despacho de indeferimento de 10/05/2016) em 31/10/2016 confirmada por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, recurso 12/17 de 25/01/2017 - cfr. Documento 2 junto com a petição inicial de reclamação.
K) Em 08/05/2017, a ora Reclamante requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa …, informação sobre o estado em que se encontra o requerimento que apresentou em 20/04/2016 - cfr. Documento 4 junto com a petição de inicial de reclamação;
L) Em 11/11/2017, a Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … proferiu despacho de indeferimento do requerimento apresentado em 20/04/2016 e insistência apresentada em 08/05/2017 - cfr. despacho a fls. 221 verso e 222 exarado em informação de fls. 220 a 221, todas do Processo Instrutor apenso;
M) Em 21/11/2017, a ora Reclamante apresentou reclamação contra o despacho de indeferimento proferido em 11/11/2017, que correu termos neste Tribunal sob o n.º 384/18.4BELRS, tendo sido proferida sentença em 25/04/2018 que aguarda decisão do recurso, no sentido de proferir despacho que dê sequência à tramitação para prestação de garantia para suspender a execução fiscal - cfr. fls. 232 a 257 do Processo Instrutor apenso e Sitaf;
N) A Reclamante foi notificada da seguinte demonstração da aplicação do crédito, com data de 17/07/2017:
"texto integral no original; imagem"

O) A Reclamante foi notificada da seguinte demonstração de liquidação de IRS relativo ao período de 2016, no valor a reembolsar de € 63 135,57, com data do acerto de contas de 17/07/2017:
"texto integral no original; imagem"

P) A Reclamante foi notificada do seguinte acerto de contas com data de 17/07/2017:
"texto integral no original; imagem"

Q) Em 30/08/2017, a Reclamante apresenta a presente petição de reclamação contra a compensação parcial da dívida, do processo de execução fiscal n.º ..............., com crédito no montante de € 63 135,37 resultante do reembolso de IRC, do exercício de 2016, na qual conclui pedindo: "deve a presente reclamação ser julgada procedente por provada e, em consequência, deve a compensação de dívidas ser anulada, com todas as consequências legais, pedindo-se, ainda, que a omissão de pronúncia imputada ao órgão de execução fiscal seja suprida por sentença que determine a suspensão do processo de execução fiscal nos termos do disposto no artigo 183.º-B do CPPT ou, assim não se entendendo, a substituição da penhora de contas bancárias pelo depósito caução
X

Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
R) Por meio de Acórdão de 25.07.2018, o STA negou provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública e confirmou a sentença proferida no n.º 384/18.4BELRS – sitaf.
S) A sentença referida em M) ordenou a apreciação do pedido de prestação de garantia, com vista à suspensão da execução, considerando que existe pleito pendente sobre a validade da dívida em execução – sitaf.
X
2.2. De Direito
2.2.1. Nos presentes autos, é sindicada a sentença proferida a fls. 617/634, (numeração em formato digital – sitaf), que julgou procedente a reclamação do acto de compensação parcial de dívida, com crédito no montante de €63.153,37, resultante de reembolso de IRC, do exercício de 2016, no processo de execução fiscal n.º ..............., instaurado para cobrança de IRC, relativo ao exercício de 2011.
2.2.2. Para julgar procedente a presente reclamação, a sentença estruturou, em síntese, a argumentação seguinte:
«Em 28/03/2016, a ora Reclamante apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC dos anos de 2011 e 2012.
Pelo ofício datado de 21/04/2016, do Banco BPI dirigido ao Serviço de Finanças de Lisboa … é informado que foram penhorados depósitos à ordem da Reclamante no âmbito do processo de execução fiscal citado.
Em 20/04/2016, a Reclamante endereçou ao Serviço de Finanças de Lisboa …, um pedido de substituição da penhora de depósitos a ordem efetuada no processo de execução fiscal n.º ..............., por garantia idónea a prestar por depósito caução para suspender o processo de execução fiscal enquanto não for decidida, definitivamente a questão que está a discutir nos Tribunais Tributários, relativamente ao exercício fiscal de 2010, e que se repercute na sua situação tributária relativa a 2011 e em IRC. Ou seja, a Reclamante seguindo a teoria do ato consequente defende que, o que for decidido quanto ao IRC de 2010 tem consequências no IRC de 2011. Assim sendo, requereu em 20/04/2016 a suspensão daquele processo executivo até decisão definitiva do IRC de 2010. A Reclamante apresentou Impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2010, que correu termos neste Tribunal sob o n.º 1799/13.OBELRS, tendo sido proferida sentença de procedência em 31/03/2017 e que aguarda decisão do recurso. Para tanto, propôs-se oferecer como garantia, depósito caução em valor a fixar pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa ….
Em 10/05/2016, a Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … proferiu despacho de indeferimento do requerimento apresentado em 20/04/2016. Contudo, este despacho de indeferimento foi anulado por sentença de 31/10/2016 proferida no processo de Reclamação n.º 2496/16.OBELRS que correu termos neste Tribunal e confirmada por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, recurso 12/17 de 21/01/2017.
Esta anulação do despacho de indeferimento implica nova decisão a proferir no requerimento de 20/04/2016, no qual é pedida a suspensão da execução e a aceitação de depósito caução, como garantia.
Em 08/05/2017, a ora Reclamante requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … informação sobre o estado do requerimento apresentado em 20/04/2016.
(…)
Pelo que, a Autoridade Tributária procedeu a um ato de extinção do crédito, em 17/07/2017, quando ainda aguardava por decisão, o pedido de suspensão de execução e de constituição de garantia por depósito caução apresentado em 20/04/2016 e a insistência de 08/05/ 2017.
Resulta do probatório, que o requerimento de 20/04/2016 foi objeto de despacho de indeferimento proferido em 11/11/2017 pela Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa …, anulado parcialmente por sentença proferida no processo de reclamação n.º 384/18.4BELRS que aguarda a decisão do recurso entretanto interposto. Significa que até à presente data ainda, não transitou em julgado uma decisão sobre o pedido de suspensão da execução e da constituição de garantia requerida em 20/04/2016. Pelo que, aquando do ato de compensação, houve violação do dever de pronúncia sobre o requerimento de 20/04/2016, em desrespeito do preceituado no artigo 56.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária, nos termos do qual a Administração Tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência e que lhe sejam apresentados por meio previsto na lei, que é o caso dos presentes autos».
2.2.3. Contra o veredicto que fez vencimento na instância, a recorrente sustenta a legalidade do acto de compensação. Defende que houve erro de julgamento da matéria de facto, porquanto a cronologia a atender é outra que não a considerada pela sentença (i) e erro de julgamento quanto à matéria de direito (ii), porquanto «sem a prestação de garantia idónea e sem a dedução de qualquer dos meios procedimentais e processuais previstos nos n.ºs 1 dos artigos 52.º da LGT e 169.º do CPPT que tenha como objecto a discussão da legalidade do acto de liquidação de IRC relativo ao ano de 2011 ou a exigibilidade da dívida exequenda que se encontra a ser exigida no âmbito do processo de execução fiscal identificado, não poderá o órgão de execução fiscal suspender o mesmo por não se encontrarem preenchidas as condições estabelecidas naquelas normas legais».
2.2.4. No que respeita ao alegado erro de julgamento da matéria de facto, cumpre referir o seguinte.
Do probatório resultam os elementos seguintes:
1) Em 27/11/2014, foi autuado no Serviço de Finanças de Lisboa …, em nome da ora Reclamante, o processo de execução fiscal n.º ..............., para cobrança de liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2011, no montante de € 1 392 593,45 (alínea A).
2) Em 28/03/2016, a ora Reclamante apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC dos anos de 2011 e 2012 (alínea F).
3) No âmbito do processo de execução fiscal n.º ..............., foram penhorados Depósitos Bancários da ora Reclamante, os depósitos a ordem ............... e ............... do Banco ....... (alínea G).
4) Em 20/04/2016, a ora Reclamante acabando de ser informada da penhora das suas contas bancárias n.º ............... e ............... do ......., vem requerer ao Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … a suspensão da execução fiscal n.º ............... e a substituição da penhora de contas bancárias, referida em G por garantia, oferecendo depósito caução em valor a fixar (alínea H).
5) Em 10/05/2016, a Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … proferiu despacho de indeferimento do requerimento apresentado em 20/04/2016 (alínea I).
6) Em 20/05/2016, a ora Reclamante apresentou reclamação contra o despacho de indeferimento proferido em 10/05/2016, que correu termos neste Tribunal sob o n.º 2496/16.0BELRS, tendo sido proferida sentença de procedência (anulação do despacho de indeferimento de 10/05/2016) em 31/10/2016 confirmada por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (alínea J).
7) Em 08/05/2017, a ora Reclamante requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa …, informação sobre o estado em que se encontra o requerimento que apresentou em 20/04/2016 - cfr. Documento 4 junto com a petição de inicial de reclamação (alínea K).
8) Em 11/11/2017, a Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … proferiu despacho de indeferimento do requerimento apresentado em 20/04/2016 e insistência apresentada em 08/05/2017 (alínea L).
9) Em 21/11/2017, a ora Reclamante apresentou reclamação contra o despacho de indeferimento proferido em 11/11/2017, que correu termos neste Tribunal sob o n.º 384/18.4BELRS, tendo sido proferida sentença em 25/04/2018 que aguarda decisão do recurso, no sentido de proferir despacho que dê sequência à tramitação para prestação de garantia para suspender a execução fiscal (alínea M).
10) Por meio de Acórdão de 25.07.2018, o STA negou provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública e confirmou a sentença proferida no n.º 384/18.4BELRS (alínea R).
Ou seja, «[é] na pendência da decisão do pedido de revisão oficiosa da liquidação de 2011 e 2012, na pendência de decisão transitada em julgado sobre a liquidação do IRC de 2010, com implicações na liquidação do IRC de 2011, em cobrança coerciva na execução em que os presentes autos de reclamação são incidente e, na pendência de decisão sobre o pedido de suspensão da execução e de constituição de garantia por depósito caução requerida em 20/04/2016 e com insistência em 08/05/2017, que a Reclamante é notificada da demonstração da aplicação do crédito e da demonstração de acerto de contas, datados de 17/07/2017. A Reclamante é notificada que a Autoridade Tributária procedeu a compensação de dívida fiscal, nos termos do artigo 89.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicando o reembolso relativo a IRC, do período de 2016, no montante de € 63 135,57 para pagamento de dívidas em execução fiscal, sem as identificar (cfr. factos N, O e P)»(1).
Por outras palavras, do probatório resulta que as dívidas objecto de compensação não coincidem (alíneas N), O) e P), o que obsta à compreensão por parte do seu destinatário do acto de compensação em apreço. Para além de que resulta do probatório a cronologia fáctica indicada na sentença, a qual não enferma de erro, nesta parte.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não enferma de erro de julgamento, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.5. A recorrente assaca à sentença em crise erro de julgamento quanto à matéria de direito.
Do probatório resulta que, em 20.04.2016, a recorrida dirigiu ao órgão de execução fiscal pedido de suspensão da execução, oferecendo garantia. Em 11/11/2017, a Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … proferiu despacho de indeferimento do requerimento em apreço; por seu turno, o despacho em apreço foi objecto de anulação judicial, confirmada por Acórdão do STA (alíneas H), L), M), R) e S), do probatório).
«A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda, (…), desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que deve ser informado no processo pelo funcionário competente» (artigo 169.º/1, do CPPT).
O pedido de suspensão da execução origina um incidente, o qual termina com a decisão a proferir no mesmo por parte do órgão de execução fiscal competente (artigo 169.º/3, do CPPT).
No caso, foi ordenada, por sentença, confirmada por Acórdão do STA, a apreciação do pedido de constituição de garantia de 20.04.2016, com vista à suspensão da execução, em apreço, considerando que existe pleito pendente sobre a validade da dívida em execução.
Seja o disposto no artigo 56.º/1, da LGT, seja o disposto no artigo 169.º/3, do CPPT, obstam à prossecução da execução, enquanto estiver pendente, sem decisão, o incidente relativo ao pedido de suspensão da execução, com oferecimento de garantia a prestar.
Em face da determinação contida na sentença, confirmada por Acórdão do STA, mais não resta à AT de que apreciar e decidir o pedido de suspensão da execução, com base na garantia oferecida no requerimento de 20.04.2016, considerando que a dívida em execução foi sujeita a contestação judicial pendente. O que até à data não foi feito.
Em vez de apreciar e decidir o requerimento de 20.04.2016, reiterado em 08/05/2017, a AT optou por efectuar a compensação da dívida em execução nos autos com crédito fiscal da recorrida (alíneas N), O) e P), o que colide com o dever de decisão que recai sobre a AT em relação aos requerimentos que lhe são dirigidos (artigo 56.º/1, da LGT), para além de constituir inobservância das determinações contidas em decisões judiciais já proferidas nos autos (artigo 100.º da LGT), nos termos das quais se impôs ao órgão de execução fiscal sobrestar na execução, apreciar e decidir o pedido de suspensão da execução, com base na garantia oferecida no requerimento de 20.04.2016, considerando que a dívida em execução foi sujeita a contestação judicial pendente (alíneas M), R) e S), do probatório). De onde se extrai que o acto de compensação em exame é ilegal, por preterição do disposto nos preceitos dos artigos 169.º/3, 100.º e 56.º/1, da LGT, devendo ser anulado, como foi determinado pela sentença recorrida.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não merece censura, devendo ser confirmada na ordem jurídica, ainda que com a presente fundamentação.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.

DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)


(1º. Adjunto)

(2º. Adjunto)



(1) Sentença recorrida.