Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08610/15
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2016
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO TRIBUNAL.
MATÉRIA DE FACTO. MATÉRIA DE DIREITO.
CRITÉRIO JURÍDICO PARA DESTRINÇAR SE ESTAMOS PERANTE UMA QUESTÃO DE DIREITO OU UMA QUESTÃO DE FACTO.
JUNÇÃO DE DOCUMENTOS AO PROCESSO EM FASE DE RECURSO.
EMBARGOS DE TERCEIRO.
REQUISITOS DE DEDUÇÃO NO PROCESSO TRIBUTÁRIO.
QUALIDADE DE TERCEIRO FACE AO PROCESSO DE EXECUÇÃO.
DÍVIDA DO RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO.
PRODUÇÃO DE PROVA PARA AQUILATAR DA COMUNICABILIDADE OU INCOMUNICABILIDADE DA DÍVIDA.
DÉFICE INSTRUTÓRIO (CFR.ARTº.662, Nº.2, AL.C), DO C.P.CIVIL, NA REDACÇÃO DA LEI 41/2013, DE 26/6).
Sumário:1. Nos termos do artº.280, nº.1, C. P. P. Tributário, das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. A violação desta regra de competência, em razão da hierarquia, determina, por previsão explícita do artº.16, nº.1, do C. P. P. Tributário, a incompetência absoluta do tribunal, ao qual é, indevidamente, dirigido o recurso.
2. A competência do tribunal afere-se face à pretensão formulada pelo autor na petição inicial, traduzida no binómio pedido/causa de pedir, ou seja, face ao “quid disputatum” e não em função do “quid decisum”, isto é, a competência determina-se pelo pedido do autor, irrelevando qualquer tipo de indagação acerca do mérito do mesmo.
3. Nos termos do artº.26, al.b), do E.T.A.F., atribui-se competência à Secção do Contencioso Tributário do S.T.A. para conhecer dos recursos interpostos das decisões dos Tribunais Tributários, com exclusivo fundamento em matéria de direito. Por sua vez, o artº.38, al.a), do E.T.A.F., atribui competência à Secção de Contencioso Tributário de cada Tribunal Central Administrativo para conhecer dos recursos de decisões dos Tribunais Tributários, ressalvando-se o disposto no citado artº.26, al.b), do mesmo diploma.
4. O recurso não versa exclusivamente matéria de direito, se nas suas conclusões se questionar matéria factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à factualidade provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer, ainda, porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos.
5. São factos não só os acontecimentos externos, como os internos ou psíquicos, e tanto os reais, como os simplesmente hipotéticos. São ainda de equiparar aos factos os juízos que contenham subsunção a um conceito jurídico geralmente conhecido e que sejam de uso corrente (v.g.”pagar”; “vender”; “arrendar”). Existe matéria de facto quando o apuramento das realidades se faz todo à margem da aplicação directa da lei, isto é, quando se trata de averiguar factualidade cuja existência, ou não existência, não depende da interpretação a dar a nenhuma norma jurídica. Por sua vez, existe matéria de direito sempre que, para se chegar a uma solução, se torna necessário recorrer a uma disposição legal, ainda que se trate unicamente de fixar a interpretação duma simples palavra constante de uma norma legal concreta, seja de direito substancial, seja de direito processual.
6. O critério jurídico para destrinçar se estamos perante uma questão de direito ou uma questão de facto, passa por saber se o recorrente faz apelo, nos fundamentos do recurso substanciados nas conclusões, apenas a normas ou princípios jurídicos que tenham sido na sentença recorrida supostamente violados na sua determinação, interpretação ou aplicação, ou se, por outro lado, também apela à consideração de quaisquer factos materiais ou ocorrências da vida real (fenómenos da natureza ou manifestações concretas da vida mesmo que do foro espiritual ou volitivo), independentemente da sua pertinência, merecimento ou acerto para a solução do recurso.
7. Em fase de recurso, a lei processual civil (cfr.artºs.524 e 693-B, do C.P.Civil; artºs.425 e 651, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), somente possibilita a junção de documentos ao processo, sempre e só com as alegações (ou contra-alegações) e não em momentos posteriores, quando ocorra alguma das seguintes circunstâncias:
a-Quando não tenha sido possível a respectiva apresentação em momento anterior (artº.524, nº.1, do C.P.Civil);
b-Quando se destinem à demonstração de factos posteriores aos articulados (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
c-Quando a respectiva apresentação se tenha tornado necessária em resultado de ocorrência posterior ao encerramento da discussão em 1ª Instância (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
d-Quando a junção de documentos se torne necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª Instância (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil);
e-Nos casos previstos no artº.691, nº.2, als.a) a g) e i) a n), do C. P. Civil (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil).
8. A verificação das circunstâncias que se acabam de elencar tem como pressuposto necessário que os factos documentados sejam relevantes/pertinentes à decisão a proferir, o que decorre, desde logo, directamente da circunstância dos documentos cuja junção se pretende deverem ter por desiderato a prova dos fundamentos da acção e/ou da defesa (citado artº.523, do C.P.Civil) e, indirectamente e como consequência do que se vem de referir, do facto de o juiz se encontrar vinculado a mandar retirar do processo os que sejam impertinentes ou desnecessários, por força do estipulado no artº.543, do mesmo compêndio legal.
9. No que diz respeito à hipótese de junção de documentos quando esta se torne necessária em virtude do julgamento efectuado em 1ª Instância (cfr.al.d) supra), o advérbio “apenas”, usado no artº.651, nº.1, do C.P.Civil, significa que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª Instância, isto é, se a decisão da 1ª Instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento. A lei quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão da 1ª. Instância ser proferida.
10. No Código de Processo Civil, aprovado pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, os embargos de terceiro deixaram de ter a natureza de processo especial, passando a ser configurados como modalidade do incidente de oposição, ampliando-se os pressupostos da sua admissibilidade, assim deixando de estar ligados, necessariamente, à defesa da posse do embargante. Isto é, face a este novo regime, o embargante, através dos embargos, além da posse, pode defender qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial (cfr.artºs.351 e seg., do C.P.Civil; relatório constante do dec.lei 329-A/95, de 12/12).
11. Os requisitos da dedução dos embargos de terceiro, de acordo com a lei processual tributária, são os seguintes (cfr.artº.237, do C.P.P.Tributário):
a-A tempestividade da petição de embargos;
b-A qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma diligência;
c-A ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial.
12. O embargante deve, além do mais, oferecer prova informatória da qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma.
13. Os embargos de terceiro só podem ser deduzidos por terceiros, não indicando o C.P.P.T. qualquer conceito próprio do processo de execução fiscal, pelo que, de harmonia com a legislação subsidiária, terá de recorrer-se às normas do C.P.Civil relativas aos embargos de terceiro. Com a reforma operada no C.P.Civil pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, deixou de existir qualquer disposição legal equivalente à do anterior artº.1037, nº.2, do C.P.Civil, que estendia o conceito de terceiro de forma a abranger o próprio executado, relativamente a bens que, pelo título da sua aquisição ou pela qualidade em que os possuía, não devessem ser abrangidos pela diligência. Já à face do actual C.P.Civil, considera-se terceiro em relação a qualquer acção judicial, todo aquele que não seja parte na causa (cfr.artº.342, nº.1, do C.P.Civil), sendo de considerar terceiro face a penhora efectuada todo aquele que não é exequente nem executado.
14. A restrição deste conceito de terceiro, levada a cabo pela referida reforma foi acompanhada pelo aditamento de disposições em que se confere ao executado e seu cônjuge a possibilidade de se oporem à penhora de bens de que sejam detentores, mas que não devam ser penhorados (cfr.incidente de oposição à penhora, previsto nos artºs.784, 785 e 787, do C.P.Civil). No C.P.P.T. optou-se por inserir tais situações no âmbito das reclamações previstas no artº.276, do mesmo diploma, assim visando o legislador a protecção dos executados contra actos que atinjam bens que não devem ser penhorados (cfr.artº.278, nº.3, do C.P.P.T.).
15. A dívida do responsável subsidiário que foi gerente de uma sociedade comercial não é sequer uma dívida derivada do exercício da sua própria actividade comercial, mas sim da actividade da sociedade, não emergindo a dívida da responsabilidade subsidiária dos factos tributários que geraram a dívida de impostos, mas sim dos factos ilícitos praticados no exercício das funções, traduzidos na omissão do cumprimento de deveres de diligência, tal implicando a produção de prova para aquilatar da comunicabilidade ou incomunicabilidade da dívida objecto dos processos de execução fiscal em causa.
16. Arrematando, verifica-se uma situação de défice instrutório que demanda o exercício de poderes cassatórios por parte deste Tribunal nos termos do artº.662, nº.2, al.c), do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, devendo ordenar-se a baixa dos autos, com vista a que seja estruturada a instrução do processo pelo Tribunal de 1ª. Instância.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:SILVIA…, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. do Funchal, exarada a fls.96 a 101 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedentes os embargos de terceiro pelo recorrente deduzidos, opondo-se a penhoras de imóvel levadas a efeito no âmbito de execuções fiscais a correrem termos no Serviço de Finanças de e no 1º. Serviço de Finanças d.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.117 a 164 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-Em face dos factos alegados e provados, enunciados no Capítulo III), não subsistem dúvidas de que a recorrente, por não ser responsável pela dívida (trata-se de uma dívida da responsabilidade exclusiva do ex-cônjuge, na medida em que decorre de uma reversão fiscal), por não figurar no título executivo, por estar divorciada a data da apresentação dos embargos, por ter efetuado a partilha e o bem penhorado lhe ter sido adjudicado, passando a constituir um bem próprio e exclusivo seu, por não ter sido citada, designadamente para os efeitos previstos nos artigos 239.º e 220.º do CPPT, antes da apresentação dos embargos, assume a posição de terceiro, sob pena de estarmos a condicionar, de modo intolerável, a defesa dos seus direitos e interesses;
2-Os embargos de terceiro, no âmbito da execução fiscal, estão previstos no art. 237.º do CPPT, o qual não fixa o conceito de "terceiro", tal conceito tem de ser importado do CPC, regime aplicável subsidiariamente ao processo tributário (Art. 2.º do CPPT);
3-Nos termos do art. 342.º do CPC considera-se terceiro o titular de um direito incompatível com a penhora que não é parte na causa;
4-O art. 343.º (art. 352.º do anterior CPC) do NCPC, permite a dedução de embargos de terceiro pelo cônjuge que tenha a posição de terceiro, relativamente a bens próprios ou a bens comuns que tenham sido indevidamente atingidos pela penhora;
5-Só é parte na causa quem tenha sido citado e assumido tal posição;
6-Enquanto não houver citação, ninguém é parte, ao contrário da personalidade judiciária (susceptibilidade de ser parte - art. 11º, n.º 1 do CPC), ser parte na causa pressupõe que acha citação;
7-Razão pela qual o n.º 1 do art. 219.º do CPC determina que "a citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender; emprega-se ainda para chamar, pela primeira vez, ao processo alguma pessoa interessada na causa.";
8-A douta sentença recorre, na falta de citação da recorrente, a uma espécie de ficção e presunção de parte;
9-A qualidade de parte não pode assentar numa presunção ou ficção;
10-Nos Tribunais Administrativos existe uma corrente jurisprudencial que considera que é terceiro quem não tendo sido citado como executado não o deva ser, o que significa que se o dever, mesmo não sendo citado, adquire o estatuto de executado (sem que tenha sido chamado para se defender);
11-Este entendimento assenta numa ficção e numa presunção ilegais e inconstitucionais, por ferir o direito de defesa, consagrado no artigo 20.º da Lei Fundamental, o qual prescreve que "A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos", bem como contra o direito de acesso aos tribunais, previsto no art. 2.º do CPC, aplicável subsidiariamente por força do art. 2.º do CPPT;
12-Acresce referir que este entendimento viola, ainda, o disposto no art. 35.º do CPPT, que impõe a notificação e citação efetivas, e não permite as notificações ou citações presumidas ou ficcionadas, bem como o art. 36.º do mesmo diploma;
13-Mais, este entendimento viola, ainda, por aplicação subsidiária, os artigos 219.º e 343.º do CPC;
14-A embargante/recorrente, na data da interposição dos embargos e na data em que foi citada pelos competentes Serviços de Finanças da existência das penhoras, já não era cônjuge, por força da dissolução do casamento por divórcio e o bem já não era comum, era um bem exclusivo e próprio da recorrente, por lhe ter sido adjudicado no âmbito da partilha pós-divórcio;
15-No Ac. do STA, de 18-05-2012, in www.dgsi.pt. fixou-se que "III - O cônjuge que tenha a posição de terceiro pode, sem autorização do outro, defender por meio de embargos os direitos relativamente aos bens próprios e aos bens comuns que hajam sido indevidamente atingidos pela diligência. IV - A penhora de um bem que faz parte de património comum sem que todos os titulares sejam executados é ilegal, podendo os restantes co-titulares reagir para defesa dos seus direitos através dos adequados meios de resistência legal, por ocorrer uma indevida apreensão de bem comum para satisfação de obrigação que pertence a um só co-titular. V - Numa situação em que a dívida exequenda foi constituída pelo executado após a dissolução do matrimónio com a embargante, em que esta não consta do título executivo, a dívida não lhe é comunicável, não houve reversão da execução contra si nem foi citada para a execução, não se pode negar à embargante a qualidade de terceiro para efeitos de embargos. VI - E porque nessa situação a embargante não pode assumir na execução uma posição igual à do cônjuge, não sendo caso de a citar para os efeitos previstos nos artigos 220.º e 239º do CPPT, os embargos de terceiro constituem o meio processual adequado para defesa dos seus direitos relativamente a um bem comum penhorado, tendo em conta que a penhora não pode incidir sobre esse bem mas apenas sobre o direito que o executado detém no património comum.";
16-No Ac. do TRL, ainda que numa execução comum, datado de 12-01-2012, in www.dgsi.pt, decidiu-se que "É também aplicável ao ex-cônjuge, na ausência de partilha, o regime dos artigos 352.º e 825.º do CPC. (..). Podemos agora dar por garantido que, pelo menos desde 1939, o cônjuge não responsável, cuja citação não tenha sido requerida, nos termos do art. 825. pode embargar de terceiro a penhora. Na verdade, não tendo sido requerida aquela citação, a penhora de bens comuns queda indevida (...). Parece-nos ser esta a posição de longe dominante na jurisprudência (Acs do STJ, de 17.04.19980, BNU, 296:229 e da RL, de 20.10.2005 (processo n.» 7914/2005-8) e de 28.06.2007 (processo n.º 2927/2007-6) in: www.dgsi.pt). Também a doutrina se pronuncia no mesmo sentido. Assim, por exemplo, Fernando Amâncio Ferreira refere que "o cônjuge do executado, que não tenha a posição de terceiro, pode também socorrer-se dos embargos de terceiro, para defender os bens próprios e os bens comuns que acham sido indevidamente atingidos pela diligência de cariz executórío (artigo 352.3): no caso de bens próprios, com fundamento de não ser parte na acção executiva; e no caso de bens comuns, por não ter sido citado para requerer a separação de bens (artigo 825.e, n.º 1)" (Curso de Processo de Execução, 4ª ed., Almedina, Coimbra, 2003:233 (...); no mesmos sentido também Salvador da Costa, Os Incidentes da Instância, 5. ed., Almedina, Coimbra, 2008:216;
17-Neste mesmo Acórdão defende-se a extensão deste regime ao ex-cônjuge, por o elemento teleológico do preceito superar o elemento meramente literal; entendimento aliás sufragada por unanimidade pela jurisprudência;
18-Contudo, esta extensão só faz sentido se os bens permanecessem como bens comuns, o que não é o caso por que houve partilha e o bem passou ser próprio da recorrente;
19-A Fazenda Pública, através do Serviço de Finanças d, apenas citou a embargante em 27/02/2013 (ou seja, depois da dedução dos embargos), nos termos e para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 239.º e 220.º do CPPT, tendo a mesma suscitado a questão da nulidade da penhora e juntado a certidão da escritura pública de partilha, comprovativa da adjudicação do bem penhorado (Vide o documento junto aos autos a 03/04/2013 e doc. 5 que se junta);
20-Note-se, ainda, que depois da apresentação do requerimento a que corresponde o doc. 1 ora junto, o Serviço de Finanças, notificou a embargante, dando conta de que em virtude de o assunto estar a ser discutido os autos de embargos de terceiros com o n.º de processo /12.9 BEFUN, o mesmo não será objeto de análise (Vide doc. 6, que se junta);
21-Por sua vez, em relação à primeira penhora, efetuada pelo Serviço de Finanças de , não foi efetuada a citação, nos termos do disposto no art. 220.º do CPPT, mas foi efetuada uma citação, em data posterior à apresentação dos embargos, para os efeitos do disposto no art. 239.º, comunicando-se que a requerente poderia deduzir oposição à execução e à penhora, sem fazer menção à possibilidade de deduzir reclamação ou de requerer a separação de bens ou fazer prova de a já ter efetuado. (Vide doc. apresentado nos autos a 27/02/2013);
22-Esta citação é nula porque não contém toda a informação imposta pelos artigos 35.º e 36.º do CPPT, designadamente sobre os meios de reação, meios de defesa e respetivos prazos que assistiriam à recorrente;
23-Estas notificações, porque efetuadas depois da apresentação dos embargos não podem acarretar, sem mais, a inutilidade superveniente dos mesmos, por, a partir das mesmas, a embargante deixar de assumir a posição de terceiro, sob pena de se limitar os seus direitos de defesa, sobretudo quando a Fazenda Pública rejeita a apreciação do requerimento apresentado, após a notificação superveniente, efetuada nos termos do disposto no n.º 1 do art. 239 e 220.º (isto no que se refere à segunda penhora, efetuado pelo Serviço de Finanças d), onde a embargante apresenta a escritura de partilha, que lhe titula a adjudicação do bem penhorado;
24-Bem como quando entende que não deve sequer efetuar a citação da embargante, ao abrigo do art. 220.º do CPPT, no caso da primeira penhora efetuada pelo Serviço de Finanças de , tal como consta da informação/despacho, de 23/10/2012, junta com a remessa dos Embargos de Terceiro para o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal;
25-O que significa que mesmo com estas citações, impõe-se reconhecer a qualidade de terceiro da recorrente, ou, subsidiariamente, proceder à declaração de nulidade das penhoras por falta de citação ou nulidade da citação, sob pena de estarmos a limitar as possibilidades de defesa da recorrente;
26-Diferente entendimento poderia ser equacionado se, efetivamente, a embargante tivesse sido citada antes da dedução dos embargos, antes do divórcio e/ou antes da partilha, nos termos e para os efeitos previstos no art. 239.º do CPPT e não somente para os efeitos previstos no art. 220.º do CPPT, na medida em que, como vem sendo esclarecido pela jurisprudência, apenas a citação efetuada nos termos do art, 239.º confere a qualidade de co-executado e parte, ao invés da efetuada ao abrigo do art. 220 do CPPT, que se destina unicamente a possibilitar ao citando requer a separação de bens e não lhe confere o estatuto de parte;
27-A douta sentença ao não considerar que a recorrente detém a qualidade de terceiro e ao não declarar a nulidade das penhoras e dos processos executivos por falta e nulidade das citações, violou os artigos 237.º, 220.º, 239.º, a al. a) do n.º 1 do art. 165.º do CPPT, os artigos 342.º, 343.º,740.º, al. a) do n.º 1 do art. 786.º, 787.º e 219.º do CPC, aplicáveis subsidiariamente por força do art. 2.º do CPPT;
28-Ao presumir e ao ficcionar que a embargante assume a posição de executada a douta sentença viola, ainda, o disposto nos artigos 35.º e 36.º do CPPT e o art. 219.º do CPC, os quais impõem citações efetivas;
29-A douta sentença está, também, ferida de inconstitucionalidade por, seguramente, o juízo de ficção de parte ou de presunção de parte, atentar contra o direito fundamental de acesso ao direito e à tutela jurisdicional, consagrado no Art. 20.º da CRP;
30-A embargante, como já foi referido, não foi citada, nem notificada antes da apresentação dos embargos, da efetivação das duas penhoras sobre o bem comum, quer para os efeitos previstos no art. 239.º, quer para os efeitos previstos no art. 220.º do CPPT;
31-Esta falta de citação consubstancia, "nos termos do disposto no art. 165.º, n.º 1, al. a) do CPPT, uma nulidade insanável, quando possa prejudicar a defesa do interessado, a qual pode ser conhecida oficiosamente, ou na sequência de arguição, até ao trânsito em julgado da decisão final (n.º 4 do mesmo art. 165 do CPPT)." - Neste sentido vide Ac. do TCAN, datado de 10-10-2013, in www.dgsi.pt;
32-Neste mesmo Ac. veiculou-se que: "iii) Não pode ser considerado ou interpretado como citação o acto que, ainda que com referência ao art. 239.º do CPPT, transmite ao cônjuge do executado o conhecimento da existência de um bem penhorado no processo de execução físcal em que é executado o respectivo cônjuge e que na falta de pagamento da dívida aquele iria ser posto à venda, sem nenhuma referência fazer aos direitos que lhe assiste de se opor à execução e das formas de pagamento da dívida exequenda. iv) Omitido o acto de citação do executado, com a consequente possibilidade de prejuízo para a sua defesa, em virtude de, pela falta de citação, ter ficado impossibilitado de utilizar os meios de defesa que a lei prevê para esse efeito, impõe-se a declaração daquela nulidade insanável, com a consequente anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente (nº2 do art. 165° do CPPT).";
33-A notificação póstuma efetuada pelo Serviço de Finanças de , não mencionou todos os meios de reação e defesa e os respetivos prazos, o que a fere de nulidade insanável, bem como induziu a requerente a reagir através da oposição à execução e a penhora, estando este processo em fase de recurso (apresentação de alegações), sendo certo que a própria Fazendo Pública defendeu-se neste processo por exceção, invocando a inidoneidade do meio processual, o qual, no seu entender deveria ser a reclamação, sem que, contudo, o tenha indicado à recorrente;
34-A Fazenda Pública ao informar a embargante, através do Serviço de Finanças de , que poderia opor-se à execução e a penhora para depois vir pugnar pela inadmissibilidade do meio de reação que ela própria indicou comete abuso de direito e viola o principio da boa-fé e da colaboração, bem como do primada da substancia sob a forma;
35-Nesta notificação, como já foi referido, não se faz menção aos efeitos do art. 220.º do CPPT, nem à possibilidade de requerer a separação de bens ou fazer prova de a ter requerido, e o respetivo prazo, o que constitui uma nulidade insanável de conhecimento oficioso e invocável a todo o tempo, na medida em que prejudica a defesa da recorrente (Art. 165.º, n.º 1, al. a) do CPPT);
36. Veja-se no mesmo sentido a seguinte jurisprudência:
- Ac. do TCAN, datado de 23-11-2011, in www.dgsi.pt: "IV. Em processo de execução fiscal, no caso de penhora de imóveis, a falta de citação do cônjuge do executado nos termos e para os efeitos previstos no artigo 239º, nº 1 do CPPT, constitui nulidade insanável nos termos previstos no artigo 165º, nº 1, alínea a) do CPPT. V. A falta de citação é distinta da nulidade de citação. Enquanto a falta de citação só ocorre se se verificar uma situação enquadrável nas alíneas a) a d) do n.º 1 do art. 195.º do CPC e, para além disso, o respectivo destinatário alegar e demonstrar que não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que lhe não foi imputável (artigo 190.º, n.º 6, do CPPT), a nulidade da citação ocorre quando a citação tenha sido realizada, mas não tenham sido observadas as formalidades prescritas na lei (artigo 198.º, n.º 1, do CPC). VI. Só a falta de citação, e não também a nulidade de citação, é enquadrável na alínea a) do n.º 1 do artigo 165.º do CPPT e, por isso, só aquela pode constituir nulidade insanável do processo de execução fiscal, invocável a todo o tempo até ao trânsito em julgado da decisão final, se a falta prejudicar a defesa do citado”
- Ac. do TCAN, de 26-04-2012, in www.dgsi.pt: "I. Nos termos do artigo 220° do CPPT, a citação do cônjuge do executado tem unicamente, como escopo, que ele possa requerer a separação judicial de bens. II. Tal citação é distinta da citação prevista no artigo 239º do CPPT, em que o cônjuge do executado assume a posição de um verdadeiro co - executado, podendo exercer todos os direitos processuais que são atribuídos ao próprio executado, como resulta do art. 864°-A do CPC. III. Em processo de execução fiscal, no caso de penhora de imóveis, a falta de citação do cônjuge do executado nos termos e para os efeitos previstos no artigo 239º, nº 1 do CPPT, constitui nulidade insanável nos termos previstos no artigo 165º, nº 1, alínea a) do CPPT."
- Ac. do TCAN, datado de 18-12-2008, in www.dgsi.pt: "2. A responsabilidade subsidiária dos gerentes das sociedades de responsabilidade limitada recaí unicamente sobre o gerente e não também sobre o seu cônjuge, respondendo por essas dívidas os seus bens próprios e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns. 3. Todavia, na execução podem ser imediatamente penhorados bens comuns do casal desde que o cônjuge do executado seja citado para defender os seus interesses patrimoniais nos termos previstos no art. 220º do CPPT, isto é, seja citado para requerer a separação judicial de bens. 4. Para além disso, sempre que o cônjuge não é, desde o início, executado ou considerado como tal, tem de ser, ainda, citado para intervir na execução sempre que a penhora incida sobre bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, estando a razão de ser desta citação na protecção do interesse da segurança e estabilidade das vendas no processo de execução fiscal, e não na protecção dos interesses patrimoniais do cônjuge. 5. Daí que na execução fiscal possam existir dois tipos de citações do cônjuge: -a prevista no art. 220º, feita com a finalidade de conceder ao cônjuge a faculdade de requerer a separação de bens, não lhe conferindo a qualidade de parte no processo executivo; a prevista no art. 239º, feita sempre que são penhorados bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, e que visa conferir ao cônjuge a qualidade de executado. 6. Só o cônjuge que detenha a posição de terceiro pode deduzir embargos à penhora. 7. O cônjuge que é citado nos termos e para os efeitos previstos no art. 239º perde a qualidade de terceiro e fica impossibilitado de embargar de terceiro. 8. A falta de citação do cônjuge para os efeitos previstos no art. 220º, quando obrigatória, traduz uma nulidade insanável, a arguir no processo executivo nos termos previstos no art. 165º, nº l, alínea a), e nº 4, do CPPT, de cuja decisão o interessado pode reclamar para tribunal nos termos do art. 276º do CPPT."
- Ac. do TCAS, datado de 10-02-2009, in www.dgsi.pt: "l- As dívidas derivadas de responsabilidade subsidiária, assim como as provenientes de coimas, são da exclusiva responsabilidade do cônjuge demandado em tal qualidade. 2- Nos casos referidos em 1., bem como aqueles em que tenham sido penhorados bens imóveis e /ou móveis sujeitos a registo, é através do requerimento de separação de meações que o seu cônjuge pode e deve defender os seus direitos sobre os bens penhorados, não tendo a qualidade de terceiro para poder embargar. 3- Da nulidade decorrente da falta de citação do cônjuge para requerer a separação de meações impõe-se tomar conhecimento oficiosamente. 4- Não sendo de aceitar o articulado de embargos de terceiro deduzido pelo cônjuge do executado, será o mesmo de convolar em requerimento de arguição de nulidade por falta de citação, se com ela nele se esgrime, atendendo ao princípio de prevalência da substância sobre a forma e à circunstância de tal nulidade ser sanável nos termos do disposto no art.s 196º do CPC".
- Ac. do STA de 30-10-2013, in www.dgsi.pt: "São diferentes os actos de citação referidos no art. 220º e no art. 239º, ambos do CPPT. Se devia ter sido feita citação do cônjuge, nos termos do art. 239º do CPPT, por se tratar de caso de penhora de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, e apenas se procedeu à citação a que se reporta o art. 220º do mesmo Código, ocorre uma nulidade insanável por falta de citação (art. 165 do mesmo CPPT), por ter sido omitido o acto que deveria ter sido praticado.";
37-Não subsistem dúvidas de que os processos de execução fiscal em causa padecem de nulidade por falta de citação;
38-O Serviço de Finanças d, por solicitação do Tribunal recorrido juntou a certidão da notificação da embargante, na qualidade de cônjuge, para os efeitos previstos no disposto nos artigos 239.º e 220.º, já depois da apresentação dos embargos;
39-Contudo, à data da notificação a recorrente já não era cônjuge por força da dissolução do casamento por divórcio, ocorrida a 31/01/2011, nem o bem era comum, por já ter sido efetuada a partilha pós-divórcio;
40-Não obstante, a recorrente respondeu e arguiu a nulidade da penhora por falta de citação, bem como juntou a cópia da escritura de partilha (Vide doc. 5, junto com estas alegações);
41-Esta notificação é nula por ser efetuada à embargante numa errada qualidade, ou seja, na qualidade de cônjuge, quando a embargante já estava divorciada e com a partilha dos bens formalizada;
42-Note-se que a recorrente conhece, como já referiu supra, a orientação jurisprudencial que defende que o regime dos artigo 239.º e 220.º do CPPT deve ser estendido e aplicável aos ex-cônjuges, mas tal só seria concebível e admissível se o bem penhorado ainda permanecesse na comunhão, o que não sucede no caso em apreço, uma vez que a partilha pós divórcio foi efetuada em 05/09/2012, ou seja, em data anterior à citação;
43. Por conseguinte, no caso em apreço, estender o regime dos artigos 239.º e 220º do CPPT ao ex-cônjuge não tem sustentação por o bem, à data (Fevereiro de 2013) da citação efetuada após a dedução dos embargos, já ser bem próprio da recorrente;
44-A segunda penhora efetuada pelo Serviço de Finanças d, deve ser declarada nula, também, por arrastamento e contaminação da nulidade da primeira penhora efetuada pelo Serviço de Finanças de , por falta de citação, na medida em que se a citação para a separação de bens tivesse sido realizada, a segunda penhora nunca teria ocorrido por a recorrente ter pedido a separação de bens e a adjudicação do bem, caso não fosse omitida a citação no âmbito do processo executivo onde foi efetiva a primeira penhora;
45-Em relação à citação efetuada pelo Serviço de Finanças de , em Fevereiro de 2013 a mesma padece, sem prejuízo do que já foi supra alegado, da mesma nulidade, ou seja, foi efetuada depois do divórcio e da partilha, num momento em que a embargante já não cônjuge do executado e o bem era próprio;
46-Além desta nulidade, esta citação é nula por se limitar a fazer menção ao artigo 239.º e não mencionar os efeitos do art. 220.º do CPPT, por não mencionar todos meios de defesa e de reação e respetivos prazos e por induzir a recorrente a reagir através de um meio (oposição à execução e à penhora) que a própria Fazendo Pública, em sede de contestação à oposição, vem defender ser inidóneo;
47-Este Serviço de Finanças, repise-se, nunca chegou a efetuar a citação para os efeitos previstos no art. 220.º do CPPT, o que configura uma nulidade insanável, pugnado que tal citação não se imponha;
48-Por conseguinte, as nulidades da falta de citação antes da dedução dos embargos e das citações póstumas nos processos de execução fiscal em apreço existem, lesam e prejudicam os direitos de defesa da recorrente, na medida em que a impossibilitaram de exercer os meios de defesa ao seu dispor, designadamente requerendo a separação de bens, e devem ser declaradas, por serem insanáveis e de conhecimento oficioso, até ao trânsito em julgado da decisão final;
49-Ao não julgar deste modo, a douta sentença recorrida viola o disposto nos artigos 35.º e 36.º, 237.º, 239.º, 220.º e o art. 165.º, n.º 1, al. a) do CPPT e os artigos, 342.º,343.º,740.º, 786.º e 787.º do CPC;
50. Por fim, importa analisar a questão da convolação dos requerimentos de embargos de terceiros em requerimentos de arguição de nulidades;
51-Importa, desde logo, referir que os embargos de terceiros foram tempestivamente interpostos, na medida em que as citações e notificações foram efetuadas em data posterior à sua dedução, não existindo qualquer obstáctulo de ordem temporal à convolação;
52-A causa de pedir, ou seja, os factos alegados e o pedido não obstam à convolação, ou seja, as finalidades e pretensões expressas nos requerimentos de embargos de terceiro são totalmente compatíveis com requerimentos de arguição de nulidades;
53-Na verdade, nos embargos de terceiros o que se suscita é a falta de citação e o que se pede é a declaração de nulidade das penhoras, sendo a sua causa de pedir e o pedido, aqueles que, naturalmente, constariam de um reclamação a efetuada nos termos do art. 276.º do CPPT;
54-Nesta conformidade, imponha-se ao Tribunal a quo, oficiosamente, determinar a convolação dos requerimentos de embargos de terceiro em requerimentos de arguição de nulidades, nos termos do disposto nos artigos 98.º, n.º 4 do CPPT, 97.º, n.º 3 da LGT e 193.º do CPC;
55-A jurisprudência é dominante, no que respeita ao conhecimento oficioso da convolação do requerimento de embargos de terceiro em requerimento de arguição de nulidade, veja-se, a título de exemplo, os seguintes arrestos:
- Ac. do STA, de 23-04-2013, in www.dgsi.pt: "II - Embora o meio adequado de reação ao despacho do órgão da execução fiscal seja a reclamação a que se refere o artº 276º e segs. do CPPT, não é admissível a convolação dos embargos para esta reclamação se estes foram deduzidos para além do prazo previsto no arte 277º, nº 1 do CPPT."
- AC do STJ de 26-06-2012, in www.dgsi.pt: "l - Tendo a Embargante pedido no articulado de resposta às exceções arguidas pela Fazenda Pública a apreciação da questão da nulidade da sua citação e, para o caso de se julgar que ela não detinha a qualidade de "terceiro"» a apreciação da questão da admissibilidade de convolação dos embargos em oposição à execução, convolação que terminou por requerer ao abrigo do disposto nos artigos 98.º, n.º 4, do CPPT, 97.º, n.º 3, da LGT, e 199.º do CPC, é nula a sentença que não se pronunciou sobre essas questões e pretensões, pendentes de resolução à data da sua prolação."
- Ac. do STA, de 06-06-2012, in www.dgsi.pt: "II - Tendo sido deduzidos embargos de terceiro pelo cônjuge não executado e não podendo este utilizar essa forma processual para reagir contra penhora de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo (art. 239º, nº 1, do CPPT), por ser, nesse caso, legalmente imposta a sua citação e ele poder suscitar a nulidade decorrente da falta dessa citação, deve ordenar-se, se a tal nada mais obstar, que a respectiva petição inicial siga a forma processual de requerimento de arguição de nulidade por falta de citação, a qual pode ser oficiosamente conhecida e arguida até ao trânsito em julgado da decisão Final”
- Ac. do STA, de 19-01-2011, in www.dgsi.pt: "l - Dada a obrigatoriedade legal de citação do cônjuge do executado para requerer a separação de bens nos casos de penhora de bens imóveis e de bens móveis sujeitos a registo (cfr. a parte final do n.º 1 do artigo 239.º do CPPT), o cônjuge do executado não poderá, nestes casos, embargar de terceiro, pois que das duas uma: ou foi citado e, nesse caso, deixa de ser considerado "terceiro" face à execução na medida em que tal citação lhe confere a qualidade de co-executado, com possibilidade de exercer, a partir da citação, todos os direitos processuais que são atribuídos a este, ou não o foi, devendo nesse caso, junto do órgão da execução fiscal, invocar a nulidade insuprível por omissão de citação, e, em caso de indeferimento da sua pretensão deduzir reclamação judicial nos termos do artigo 276.º e seguintes do CPPT.
II - Não é possível convolar os embargos deduzidos em reclamação judicial da penhora do imóvel se a petição de embargos deu entrada para além do prazo previsto no n.º 1 do artigo 277.º do CPPT."
- Ac. do STA, de 20-06-2007, in www.dgsi.pt: "Deduzido em embargos de terceiro, o pedido de nulidade e repetição da citação deve ser convolado em requerimento, com o mesmo conteúdo, dirigido ao respectivo processo de execução fiscal."
- Ac. do STA, de 29-11-2006, in www.dgsi.pt: “ - Efectuada a penhora, a falta de citação do cônjuge do executado constituirá nulidade insanável de conhecimento oficioso a todo o tempo.
II - Pelo que o meio processual mais adequado para o cônjuge indevidamente não citado defender os seus direitos processuais será a arguição da correspondente nulidade, para, na sequência da citação obrigatória, exercer todos os poderes que a lei lhe confere.
III - Por isso, no processo de execução fiscal, em todos os casos em que tem de ser efectuada a citação referida no art. 239.º, n.º 1 (isto é, sempre que forem penhorados bens imóveis ou móveis sujeitos a registo), a regra do n.º 2 do art. 97.º da L.G.T., impõe a conclusão de que não será permitido ao cônjuge a dedução de embargos de terceiro, mesmo enquanto não tiver sido citado, devendo a defesa dos seus direitos ser efectuada através da arguição da nulidade por falta de citação, com a consequente possibilidade de exercício de todos os direitos processuais, em que se inclui a oposição à penhora, nos termos dos arts. 276.º e 278.º deste Código.
IV - Assim, é de ordenar a convolação da petição de embargos de terceiro em requerimento de incidente de arguição da nulidade por falta da citação, a juntar ao processo de execução, nos termos do disposto nos artsº 97º, nº 3 da LGT e 98º, nº 4 do CPPT, para aí ser apreciada pelo chefe da respectiva repartição."
- Ac. do TCAS, de 22-09-2009, in www.dgsi.pt: "É de convolar em pedido de declaração de nulidade por falta de citação, no processo de execução fiscal, o articulado deduzido pela cônjuge mulher como embargos de terceiro, em que invoca a falta de citação e a invalidade da penhora, por, no seu entender, a dívida ser exclusiva do cônjuge marido, executado por reversão de dívida de uma sociedade”.
- Ac. do TCAS, de 10-02-2009, in www.dgsi.pt: "l- As dívidas derivadas de responsabilidade subsidiária, assim como as provenientes de coimas, são da exclusiva responsabilidade do cônjuge demandado em tal qualidade.
II- Nos casos referidos em 1. bem como aqueles em que tenham sido penhorados bens imóveis e /ou móveis sujeitos a registo, é através do requerimento de separação de meações que o seu cônjuge pode e deve defender os seus direitos sobre os bens penhorados, não tendo a qualidade de terceiro para poder embargar.
III- Da nulidade decorrente da falta de citação do cônjuge para requerer a separação de meações impõe-se tomar conhecimento oficiosamente.
IV- Não sendo de aceitar o articulado de embargos de terceiro deduzido pelo cônjuge do executado, será o mesmo de convolar em requerimento de arguição de nulidade por falta de citação, se com ela nele se esgrime, atendendo ao princípio de prevalência da substância sobre a forma e à circunstância de tal nulidade ser sanável nos termos do disposto no art.s 196° do CPC.";
56-Os Tribunais existem para realizar a Justiça, o primado da substancia sobre a forma deve constituir o norte da apreciação formal, devendo a rejeição de um meio processual por inadequação constituir a exceção e não a regra;
57-Ao não proceder à convolação a douta sentença violou os artigos 98.º, n.º 4 do CPPT, 97.º, n.º 3 da LGT e 193.º do CPC;
58-Termos em que deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente e, em consequência, determinar-se a revogação da douta sentença recorrida, a qual deve ser substituída por uma outra que admita e julgue procedentes os embargos de terceiros, ordenando-se o cancelamento das penhoras;
59-Subsidiariamente, caso não se entenda que a recorrente detém a qualidade de terceiro, deve ser ordenada a convolação dos requerimentos de embargos de terceiros em requerimentos de arguição de nulidades, declarando-se a nulidade das penhoras;
60-Requer-se, ao abrigo do disposto no art. 651.º do CPC, aplicável subsidiariamente, a admissão de 6 documentos, melhor identificados no presente articulado, os quais são fundamentais para a boa decisão da causa. Os documentos em causa são supervenientes à dedução dos embargos e, em face da prolação da douta sentença sem a realização de audiência de julgamento, não foi possível proceder à sua junção anteriormente, bem como se tornaram necessários juntar em virtude do conteúdo e sentido da decisão proferida pelo Tribunal a quo.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual suscita a excepção de incompetência deste T.C.A. em razão da hierarquia (cfr.fls.208 a 210 dos autos).
X
Notificados os restantes intervenientes processuais da excepção alegada, somente o recorrente veio aos autos juntar requerimento, no qual pugna pela improcedência da mesma (cfr.fls.217 a 219 dos presentes autos).
X
Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
Visando a decisão do presente recurso, este Tribunal dá como provada a seguinte matéria de facto:
1-Em 5/7/2010, no âmbito do processo de execução fiscal nº. e apensos, o qual corre seus termos no Serviço de Finanças de , foi efectuada a penhora de fracção autónoma identificada pela letra O, pertencente ao prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artº.6007, da freguesia d, concelho de , mais sendo nomeado fiel depositário Paulo (cfr.documento junto à cópia parcelar do processo de execução nº. que se encontra apenso aos presentes autos);
2-Em 8/10/2012, a ora recorrente, Sílvia , apresentou junto do Serviço de Finanças de a petição de embargos de terceiro visando a penhora identificada no nº.1, alegando que se encontram reunidos os pressupostos de dedução dos mesmos e terminando a pedir que seja declarado nulo o registo da penhora, que se ordene o cancelamento e levantamento da citada penhora e que a embargante seja declarada dona de 1/2 e legítima possuidora da fracção autónoma penhorada (cfr. articulado inicial junto a fls.9 a 20 do processo de embargos de terceiro nº. /12.7BEFUN que se encontra apenso);
3-Em 8/10/2012, a ora recorrente, Sílvia , apresentou junto do 1º. Serviço de Finanças d a petição de embargos de terceiro visando penhora do imóvel identificado no nº.1, alegadamente efectuada no âmbito do processo de execução fiscal nº., tendo sido registada em 12/10/2011, alegando que se encontram reunidos os pressupostos de dedução dos mesmos embargos e terminando a pedir que seja declarado nulo o registo da penhora, que se ordene o cancelamento e levantamento da citada penhora e que a embargante seja declarada dona de 1/2 e legítima possuidora da fracção autónoma penhorada (cfr.articulado inicial junto a fls.3 a 18 do processo principal de embargos de terceiro nº./12.9BEFUN);
4-No processo de execução fiscal nº. e apensos foi efectuada a citação de Paulo , enquanto revertido, da sociedade "Dupla, L.da." (cfr.documentos juntos à cópia parcelar do processo de execução nº. que se encontra apenso aos presentes autos);
5-No processo de execução fiscal nº. foi efectuada a citação de Paulo, enquanto revertido, da sociedade "V., L.da." (cfr.documentos juntos à cópia parcelar do processo de execução nº. que se encontra apenso aos presentes autos);
6-O executado Paulo e a embargante e ora recorrente, Sílvia, contraíram casamento, com convenção antenupcial, em 16/09/2006, sob o regime de comunhão geral de bens (cfr.assento de casamento junto a fls.47 e 48 dos presentes autos);
7-O casamento identificado no nº.6 foi dissolvido em 31/01/2011, através de decisão homologadora de divórcio por mútuo consentimento, lavrada em conferência e realizada na Conservatória do Registo Civil d (cfr.documento junto a fls.19 e 20 dos presentes autos);
8-Através de partilha consequente a divórcio, realizada no pretérito dia 5/09/2012, foi adjudicado o imóvel/fracção autónoma identificado no nº.1 à pessoa da recorrente, Sílvia , imóvel esse destinado a sua habitação própria e permanente (cfr.documento junto a fls.27 a 34 dos presentes autos);
9-Em 27/02/2013, a embargante e ora recorrente foi citada na qualidade de cônjuge do executado, nos termos dos artºs.220 e 239, do C.P.P.T., no âmbito do processo de execução fiscal nº. (cfr.documentos juntos a fls.75 a 77 dos presentes autos);
10-Em 27/02/2013, a embargante e ora recorrente foi citada na qualidade de cônjuge do executado, nos termos do artº.239, do C.P.P.T., no âmbito do processo de execução fiscal nº. e apensos (cfr.documentos juntos a fls.96 e 97 do processo de embargos de terceiro nº. /12.7BEFUN que se encontra apenso).
X
Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto estruturada supra, no teor dos documentos referidos em cada um dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou totalmente improcedentes os embargos objecto dos presentes autos, tudo em virtude de não reunir a embargante e ora recorrente a qualidade de terceiro nos processos executivos em que se realizou a penhora do imóvel identificado no nº.1 do probatório, assim não se verificando um pressuposto necessário da sua procedência.
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Deve, antes de mais, resolver-se a questão da competência em razão da hierarquia, por força do disposto no artº.13, do C. P. T. Administrativos, aplicável “ex vi” artº.2, al.c), do C. P. P. Tributário, excepção esta aduzida pelo Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal.
Nos termos do artº.280, nº.1, C.P.P.Tributário, das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
A violação desta regra de competência, em razão da hierarquia, determina, por previsão explícita do artº.16, nº.1, do C.P.P.Tributário, a incompetência absoluta do Tribunal, ao qual é, indevidamente, dirigido o recurso.
Como decorre do artº.641, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (aplicável “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.T.), o despacho que admitiu o recurso não vincula o Tribunal Superior, pelo que nada obsta a que se aprecie e decida a questão prévia suscitada pelo Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal e, igualmente, de conhecimento oficioso, a qual se consubstancia na incompetência do T.C.A.Sul em razão da hierarquia.
A competência do Tribunal deve aferir-se pelo “quid disputatum” ou “quid decidendum”, em antítese com aquilo que será mais tarde o “quid decisum”. Por outras palavras, a competência do Tribunal afere-se face à pretensão formulada pelo autor na petição inicial, traduzida no binómio pedido/causa de pedir, ou seja, face ao “quid disputatum” e não ao “quid decisum”, isto é, a competência determina-se pelo pedido do Autor, irrelevando qualquer tipo de indagação acerca do mérito do mesmo (cfr.Manuel A. Domingues de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.91; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.223 e seg.).
Nos termos do artº.26, al.b), do E.T.A.F., atribui-se competência à Secção do Contencioso Tributário do S.T.A. para conhecer dos recursos interpostos das decisões dos Tribunais Tributários, com exclusivo fundamento em matéria de direito.
Por sua vez, o artº.38, al.a), do E.T.A.F., atribui competência à Secção de Contencioso Tributário de cada Tribunal Central Administrativo para conhecer dos recursos de decisões dos Tribunais Tributários, ressalvando-se o disposto no citado artº.26, al.b), do mesmo diploma.
Da concatenação das aludidas normas do E.T.A.F. deve concluir-se que, para o conhecimento dos recursos jurisdicionais interpostos de decisões dos Tribunais Tributários de 1ª. Instância, é competente o S.T.A. quando o recurso tiver por fundamento exclusivamente matéria de direito e, pelo contrário, é competente a secção de contencioso tributário de um dos Tribunais Centrais Administrativos se o fundamento não for exclusivamente de direito.
Na delimitação da competência do S.T.A. em relação à dos Tribunais Centrais Administrativos, a efectuar com base nos fundamentos do recurso, deve entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de direito sempre que nas conclusões das respectivas alegações, as quais fixam o objecto do recurso (cfr.artº.684, nº.3, do C.P.Civil), o recorrente pede a alteração da matéria fáctica fixada na decisão recorrida ou invoca, como fundamento da sua pretensão, factos que não têm suporte na decisão recorrida, independentemente da atendibilidade ou relevo desses factos para o julgamento da causa. Por outras palavras, o recurso não versa exclusivamente matéria de direito, se nas suas conclusões se questionar matéria factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à factualidade provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer, ainda, porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos factos provados (cfr.ac.S.T.A.-2ª. Secção, 29/9/2010, rec.446/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/3/2013, proc.5971/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/6/2013, proc.6465/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.223 e seg.).
São factos não só os acontecimentos externos, como os internos ou psíquicos, e tanto os reais, como os simplesmente hipotéticos. São ainda de equiparar aos factos os juízos que contenham subsunção a um conceito jurídico geralmente conhecido e que sejam de uso corrente (v.g.”pagar”; “vender”; “arrendar”). Existe matéria de facto quando o apuramento das realidades se faz todo à margem da aplicação directa da lei, isto é, quando se trata de averiguar factualidade cuja existência, ou não existência, não depende da interpretação a dar a nenhuma norma jurídica. Por sua vez, existe matéria de direito sempre que, para se chegar a uma solução, se torna necessário recorrer a uma disposição legal, ainda que se trate unicamente de fixar a interpretação duma simples palavra constante de uma norma legal concreta, seja de direito substancial, seja de direito processual (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/6/2013, proc.6465/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, III, Coimbra Editora, 1985, pág.206 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.406 e seg.; Artur Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, III, Almedina, 1982, pág.268 e seg.; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.264 e seg.).
O critério jurídico para destrinçar se estamos perante uma questão de direito ou uma questão de facto, passa por saber se o recorrente faz apelo, nos fundamentos do recurso substanciados nas conclusões, apenas a normas ou princípios jurídicos que tenham sido na sentença recorrida supostamente violados na sua determinação, interpretação ou aplicação, ou se, por outro lado, também apela à consideração de quaisquer factos materiais ou ocorrências da vida real (fenómenos da natureza ou manifestações concretas da vida mesmo que do foro espiritual ou volitivo), independentemente da sua pertinência, merecimento ou acerto para a solução do recurso. Nessa óptica, o que é verdadeiramente determinante é o efeito que o recorrente pretenda retirar de tais asserções cujo conhecimento envolva a elaboração de um dado juízo probatório que não se resolva por meio de uma simples constatação sobre se existiu ofensa de uma disposição legal expressa que implique uma dada espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força probatória de certo meio de prova, caso em que a competência já não caberá ao Tribunal de revista (cfr.artº.12, nº.5, do E.T.A.F.), mas ao Tribunal Central Administrativo por força do artº.38, al.a), do E.T.A.F., o mesmo se devendo referir sempre que, em fase de recurso, for pedida a apreciação da necessidade de realização de diligências de prova ou da sua determinação.
Ora, a identificação dos fundamentos do recurso colhe-se nas conclusões das alegações, conforme se alude supra, porque é nelas que o recorrente tem de condensar as causas de pedir que tenham susceptibilidade jurídica para, segundo o seu prisma, justificar a censura da decisão recorrida.
No caso “sub judice”, conforme se retira das conclusões do recurso explanadas supra, o apelante discorda da decisão recorrida, apelando a factualidade constante do processo, nomeadamente nas conclusões 1, 14, 19 a 21, 24, 30 e 33, destas premissas retirando o desenlace de que se deve revogar a sentença objecto da presente apelação.
Em tais conclusões o recorrente apela à consideração de factos materiais ou ocorrências da vida real, os quais estão para além da mera interpretação de normas ou princípios jurídicos que tenham sido na decisão recorrida, supostamente, violados na sua determinação. Concluindo, os fundamentos do presente recurso não versam exclusivamente matéria de direito, pelo que a competência para o seu conhecimento pertence a este Tribunal, por força do artº.38, al.a), do E.T.A.F., e não ao S.T.A.-2ª.Secção, atento o disposto nos artºs.12, nº.5, e 26, al.b), do E.T.A.F.
Sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente a excepção de incompetência absoluta deste Tribunal (em razão da hierarquia), aduzida pelo Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal.
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Passemos à apreciação do recurso.
Começa por referir-se que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Com as alegações de recurso, o recorrente juntou aos presentes autos seis documentos (cfr.fls.166 a 196 do processo), os quais, segundo alega, são fundamentais para a boa decisão da causa, não tendo sido possível juntar os mesmos em momento anterior (cfr.conclusão 60 do recurso).
Assim, a primeira questão que se impõe decidir, de natureza adjectiva, consiste em saber da possibilidade legal de tal junção e da manutenção do referido documento nos autos.
Vigora no direito português o modelo de apelação restrita, de acordo com o qual o recurso não visa o reexame, sem limites, da causa julgada em 1ª. Instância, mas tão- somente a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal “a quo” no momento em que proferiu a sentença. Como resulta de uma jurisprudência uniforme e reiterada, os recursos são meios processuais de impugnação de anteriores decisões judiciais e não ocasião para julgar questões novas. Em princípio, não pode alegar-se matéria nova nos Tribunais Superiores, em fase de recurso, não obstante o Tribunal “ad quem” tenha o dever de apreciar as questões de conhecimento oficioso. Daí que, não devam ser juntos documentos novos na fase de recurso. A lei, porém, prevê excepções que passamos a analisar.
Dispõe o artº.523, do C.P.Civil (cfr.artº.423, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), que os documentos, como meios de prova, da acção ou da defesa, devem ser apresentados com o articulado em que se invoquem os factos que se destinem a demonstrar. Não sendo apresentados com o respectivo articulado, ainda e por livre iniciativa das partes litigantes, enquanto apresentantes, podem ser juntos ao processo até ao encerramento da discussão em 1ª Instância (actualmente até vinte dias antes da realização da audiência final - cfr.artº.423, nº.2, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), embora com a condenação do apresentante em multa, salvo demonstração de que os não pôde oferecer com o articulado próprio.
Em fase de recurso, a lei processual civil (cfr.artºs.524 e 693-B, do C.P.Civil; artºs.425 e 651, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), somente possibilita a junção de documentos ao processo, sempre e só com as alegações (ou contra-alegações) e não em momentos posteriores, quando ocorra alguma das seguintes circunstâncias:
1-Quando não tenha sido possível a respectiva apresentação em momento anterior (artº.524, nº.1, do C.P.Civil);
2-Quando se destinem à demonstração de factos posteriores aos articulados (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
3-Quando a respectiva apresentação se tenha tornado necessária em resultado de ocorrência posterior ao encerramento da discussão em 1ª Instância (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
4-Quando a junção de documentos se torne necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª Instância (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil);
5-Nos casos previstos no artº.691, nº.2, als.a) a g) e i) a n), do C. P. Civil (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil).
A verificação das circunstâncias que se acabam de elencar tem como pressuposto necessário que os factos documentados sejam relevantes/pertinentes à decisão a proferir, o que decorre, desde logo, directamente da circunstância dos documentos cuja junção se pretende deverem ter por desiderato a prova dos fundamentos da acção e/ou da defesa (citado artº.523, do C.P.Civil) e, indirectamente e como consequência do que se vem de referir, do facto de o juiz se encontrar vinculado a mandar retirar do processo os que sejam impertinentes ou desnecessários, por força do estipulado no artº.543, do mesmo compêndio legal (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/3/2011, proc.4593/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.6953/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2014, proc.2912/09; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.96 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, Setembro de 2008, Almedina, pág.227 e seg.).
No que diz respeito à hipótese de junção de documentos quando esta se torne necessária em virtude do julgamento efectuado em 1ª Instância (cfr.nº.4 supra), o advérbio “apenas”, usado no artº.693-B, do C. P. Civil (cfr.artº.651, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), significa que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª Instância, isto é, se a decisão da 1ª Instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento. A lei quis, manifestamente, cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes da decisão da 1ª. Instância ser proferida (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.6953/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2014, proc.2912/09; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.533 e 534).
Revertendo ao caso dos autos, os documentos juntos a fls.166 a 196 do processo consistem em diversos articulados de oposição à execução deduzido face ao processo de execução fiscal nº. e apensos pela ora recorrente, processo este em que o T.A.F do Funchal viria a julgar verificada a excepção de litispendência, decisão cuja cópia igualmente foi junta. Igualmente foi junto, em duplicado, um articulado a suscitar diversas nulidades no âmbito do processo de execução fiscal nº.. Por último, cópia de um ofício em que o 1º. Serviço de Finanças d informa a recorrente da desnecessidade de conhecer do mencionado articulado, visto serem questões que já se encontram a ser objecto do presente processo de embargos de terceiro.
Ora, nenhum dos documentos identificados reveste qualquer importância para a decisão do presente processo de embargos de terceiro. Por outro lado, não se visualiza a necessidade de junção dos mesmos em virtude do conteúdo da decisão recorrida, contrariamente ao defendido pelo recorrente, porquanto, nenhum destes documentos tem por objectivo a eventual prova da situação de terceiro face aos processos de execução identificados nos nºs.1 e 3 do probatório supra, por parte do apelante.
Concluindo, dada a sua impertinência e desnecessidade, devem os documentos juntos a fls.166 a 196 dos autos ser desentranhados do processo e restituídos ao apresentante, condenando-se este ao pagamento de multa pelo incidente (cfr.artº.443, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.10, do R.C.Processuais), ao que se provirá no dispositivo do presente acórdão.
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O recorrente aduz, em primeiro lugar e conforme se relata acima, que na data da interposição dos embargos e na data em que foi citado pelos competentes Serviços de Finanças da existência das penhoras, já não era cônjuge, por força da dissolução do casamento por divórcio e o bem penhorado já não era comum, antes sendo um bem exclusivo e próprio do recorrente, por lhe ter sido adjudicado no âmbito de partilha pós-divórcio. Que por não ser responsável pela dívida (trata-se de uma dívida da responsabilidade exclusiva do ex-cônjuge, na medida em que decorre de uma reversão fiscal), por não figurar no título executivo, por estar divorciado à data da apresentação dos embargos, por ter efectuado a partilha e o bem penhorado lhe ter sido adjudicado, passando a constituir um bem próprio e exclusivo seu, por não ter sido citado, para os efeitos previstos nos artºs.220 e 239, do C.P.P.T., antes da apresentação dos embargos, assume a posição de terceiro (cfr.conclusões 1 e 14 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar, supomos, um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Os requisitos da dedução dos embargos de terceiro, de acordo com a lei processual tributária, são os seguintes (cfr.artº.237, do C.P.P.Tributário; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/1/95, rec.18307, ap.D.R., 31/7/97, pág.175 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2012, proc.5181/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/4/2013, proc.6544/13; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.670 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.155 e seg.):
1-A tempestividade da petição de embargos;
2-A qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma diligência;
3-A ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial.
No processo vertente é o exame do segundo requisito que está em causa.
Segundo a sentença recorrida, é abundante a jurisprudência superior dos Tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, quanto ao entendimento de que não pode ser reconhecida legitimidade activa para a dedução de embargos de terceiro a quem é parte no processo executivo em que se efectuou a penhora.
Pelo contrário, o recorrente entende que não poderá ser considerado executado, assumindo antes a sua qualidade de terceiro, por não ser responsável pela dívida (trata-se de uma dívida da responsabilidade exclusiva do ex-cônjuge, na medida em que decorre de uma reversão fiscal), por não figurar no título executivo, por estar divorciado à data da apresentação dos embargos, por ter efectuado a partilha e o bem penhorado lhe ter sido adjudicado, passando a constituir um bem próprio e exclusivo seu.
O embargante deve, além do mais, oferecer prova informatória da qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma.
Os embargos de terceiro só podem ser deduzidos por terceiros, não indicando o C.P.P.T. qualquer conceito próprio do processo de execução fiscal, pelo que, de harmonia com a legislação subsidiária, terá de recorrer-se às normas do C.P.Civil relativas aos embargos de terceiro. Com a reforma operada no C.P.Civil pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, deixou de existir qualquer disposição legal equivalente à do anterior artº.1037, nº.2, do C.P.Civil, que estendia o conceito de terceiro de forma a abranger o próprio executado, relativamente a bens que, pelo título da sua aquisição ou pela qualidade em que os possuía, não devessem ser abrangidos pela diligência.
Já à face do actual C.P.Civil, considera-se terceiro em relação a qualquer acção judicial, todo aquele que não seja parte na causa (cfr.artº.342, nº.1, do C.P.Civil), sendo de considerar terceiro face a penhora efectuada todo aquele que não é exequente nem executado.
A restrição deste conceito de terceiro, levada a cabo pela referida reforma foi acompanhada pelo aditamento de disposições em que se confere ao executado e seu cônjuge a possibilidade de se oporem à penhora de bens de que sejam detentores, mas que não devam ser penhorados (cfr.incidente de oposição à penhora, previsto nos artºs.784, 785 e 787, do C.P.Civil).
No C.P.P.T. optou-se por inserir tais situações no âmbito das reclamações previstas no artº.276, do mesmo diploma, assim visando o legislador a protecção dos executados contra actos que atinjam bens que não devem ser penhorados (cfr.artº.278, nº.3, do C.P.P.T.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 5/2/2013, proc.6153/12; Eurico Lopes-Cardoso, Manual de Acção Executiva, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1987, pág.384; Jorge Duarte Pinheiro, Fase Introdutória dos Embargos de Terceiro, Almedina, 1992, pág.46 e seg.; Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.119; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.159 e seg.).
Voltando ao caso concreto, desde logo, se dirá que não resulta do processo principal, tal como da cópia parcelar dos processos de execução fiscal apensos, a correcta identificação de uma das penhoras objecto dos embargos de terceiro ora em exame (cfr. penhora alegadamente efectuada no âmbito do processo de execução fiscal nº., tendo sido registada em 12/10/2011), visto que não se encontra junta a cópia do respectivo auto de penhora. Igualmente não se encontra produzida prova incidente sobre as concretas dívidas exequendas objecto do processo de execução fiscal nº. e apensos. A própria sentença recorrida não estruturou qualquer matéria de facto que considerasse útil para a decisão a que chegou.
E recorde-se que as dívidas de impostos que sejam contraídas em proveito comum do casal são, como todas as outras que sejam contraídas com essa finalidade, da responsabilidade de ambos os cônjuges, como decorre do artº.1691, nº.1, als.b), c) e d), do C.Civil. E, por força desta alínea d), é de presumir que as dívidas de impostos derivados de exercício de actividade comercial são contraídas em proveito comum. Mas, mesmo neste casos, trata-se de um mera presunção ilidível, pelo que, se se demonstrar que uma determinada dívida, mesmo que contraída no exercício do comércio, não o foi em proveito comum do casal, estará afastada a responsabilidade do cônjuge que não a contraiu, quer seja uma dívida de impostos, quer seja qualquer dívida comercial (no caso concreto o recorrente arrola prova testemunhal no final da p.i. de embargos de terceiro a ser ouvida, eventualmente, sobre tal matéria).
Por outro lado, deve vincar-se que a dívida do responsável subsidiário que foi gerente de uma sociedade comercial não é sequer uma dívida derivada do exercício da sua própria actividade comercial, mas sim da actividade da sociedade, não emergindo a dívida da responsabilidade subsidiária dos factos tributários que geraram a dívida de impostos, mas sim dos factos ilícitos praticados no exercício das funções, traduzidos na omissão do cumprimento de deveres de diligência (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.606, nota 3).
Face ao exposto, também para aquilatar da comunicabilidade ou incomunicabilidade da dívida objecto dos processos de execução fiscal nºs. e apensos e se deverá produzir prova, com vista à ampliação da matéria de facto supra estruturada por este Tribunal.
Arrematando, verifica-se uma situação de défice instrutório que demanda o exercício de poderes cassatórios por parte deste Tribunal nos termos do artº.662, nº.2, al.c), do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, devendo ordenar-se a baixa dos autos, com vista a que seja estruturada a instrução do processo pelo Tribunal de 1ª. Instância de acordo com os trâmites mencionados supra, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
1-ORDENAR O DESENTRANHAMENTO E RESTITUIÇÃO AO RECORRENTE dos documentos que juntou às alegações de recurso, a fls.166 a 196 do processo, condenando-se o mesmo em multa no montante de uma (1) U.C.;
2-ANULAR A SENTENÇA RECORRIDA E ORDENAR A BAIXA DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE 1ª. INSTÂNCIA, cumprindo-se em conformidade com as diligências de instrução que se reputem úteis e necessárias à discussão da matéria de facto para os fins acima precisados, após o que se deverá proferir nova sentença que leve em consideração a factualidade entretanto apurada.
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Sem custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 9 de Junho de 2016


(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)