Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:73/17.BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:03/11/2021
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:IVA 1997
OPERAÇÕES INTRACOMUNITÁRIAS E OPERAÇÕES INTERNAS
ARTIGO 9.º RITI
Sumário:I. Uma sucursal configura, entre nós, uma realidade desprovida de personalidade jurídica, constituindo, apenas, uma extensão da própria entidade, sem património próprio e é criada nos termos do artigo 13.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).
II. De acordo com a jurisprudência reiterada do Tribunal de Justiça, uma sociedade estabelecida num Estado Membro e uma sua sucursal noutro Estado-membro constituem um só e mesmo sujeito passivo de IVA, a não ser que a sucursal exerça uma actividade económica independente (vide neste sentido, entre outros, Acórdão do TJUE de 23/03/2006, FCE Bank, C-210/04 e de 12/09/2013, Le Crédit Lyonnais, C-388/11, disponíveis em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/).
III. As normas do RITI prevalecem sobre as do Código do IVA, aplicando-se a disciplina geral prevista neste último Código com as devidas adaptações, caso não seja aplicável nenhuma norma do RITI, por força do estatuído no artigo 33.º do RITI.
IV. Nos termos dos artigos 9.º e 7.º, n.º 2, alínea a) do RITI, nos casos de transmissões de bens com instalação ou montagem noutro Estado membro, os movimentos de bens não dão origem a transacções intracomunitárias de bens, pelo que estão excluídas do conceito de transmissão de bens, considerando-se operações internas, ainda que pressuponham um movimento intercomunitário de bens.
V. A sujeição a imposto deriva do facto de a transmissão de bens com montagem se enquadrar no n.º 2, do artigo 9.º do RITI, sendo apenas admissível caber ao adquirente substituir o fornecedor na liquidação do IVA, no caso do fornecedor não ter estabelecimento estável ou representante, o que não sucede no presente caso (cfr. artigos 2.º, n.º 1, alínea g) e 30.º, ambos do CIVA).
VI. Sendo, como é, o verdadeiro devedor do imposto o fornecedor de bens com montagem, caso o adquirente tenha efectuado a liquidação de IVA e pago por erro o imposto à Autoridade Tributária, pode exigir o reembolso do montante pago indevidamente.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

1. FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por M... & CO. KG – Sucursal em Portugal contra a liquidação adicional de IVA n.º 00115335 no valor de Esc. 11.669.504$00 (€ 58.207,24) e de juros compensatórios no montante de Esc. 324.717,00 (€ 1.619,68), relativas ao ano de 1997, bem como contra o acto de avaliação directa da matéria tributável relativo ao mesmo exercício.

2. A Recorrente, FAZENDA PÚBLICA, apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«a) Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos, na parte respeitante ao processo 16/02, que julga procedente a impugnação judicial deduzida pela impugnante, nos presentes autos devidamente identificada, contra o acto de liquidação adicional de IVA n.º 00115335 e respectivas liquidações de juros compensatórios n.ºs 00115334, 00115333 e 00115332, referentes ao exercício de 1997, no montante, respectivamente, de €58.207,24 e € 19.364,21.

b) Entendeu a douta sentença não se encontrarem verificados os pressupostos vertidos no n.º 2 do artigo 9.º do RITI para efeitos de localização da operação em território nacional, com consequente liquidação do IVA enquanto operação interna, e tal não preenchimento dos requisitos deve-se à consideração de que não resulta dos autos prova de que a instalação e montagem do bem fornecido pelo sujeito passivo de outro Estado membro tenha sido levado a cabo pela sociedade-mãe, entendimento este do qual a Fazenda Pública discorda.

c) A Recorrida é uma sucursal em Portugal da empresa alemã «M...» (DE 8...). e tal como consta do Relatório de Inspecção anexo aos autos, e do probatório, «em 24 de Janeiro de 1995, foi celebrado entre a E..., EP, pessoa colectiva n.º 5... (...) e a empresa alemã M... (DE 8...), um contrato que de acordo com a respectiva clausula 1ª tinha por objecto o fornecimento, montagem e lançamento em operação industrial de um Grupo Gerador de 2 Mw na Central térmica do Belo Jardim, Ilha Terceira, com o necessário equipamento apto a queimar gasóleo. Fazia parte do objecto do contrato uma segunda fase relativa à desmontagem, transporte, montagem e lançamento em exploração industrial, na Central Térmica do Pico, do mencionado gerador diesel, queimando combustível pesado, na qual se incluía também o fornecimento de equipamento adicional ...»

d) Sendo que "a M... inscreveu o montante total da 2ª fase do contrato e adenda, 2.281.741 DM, no seu anexo recapitulativo referente ao 4° trimestre de 1997, com base numa factura interna n.º 120/014/97 de 10/12/97, como se de transmissões intracomunitárias se tratasse (...) parte da facturação (relativa a fornecimentos de materiais e trabalhos diversos) é emitida pelo estabelecimento estável da M... em Portugal, sendo utilizado o seu n.º PT 9..., facturação esta que está registada na respectiva contabilidade, e que tanto é emitida em escudos como em marcos alemães, tendo em ambos os casos sido declaradas para efeitos de IRC e o IVA liquidado e inscrito nas declarações periódicas. A outra parte da facturação é emitida directamente pela sede da M... (DE 8...) e está obviamente expressa em marcos alemães”.

e) Sucedendo que "apenas foi liquidado IVA sobre o valor das facturas emitidas pelo estabelecimento estável (quer as expressas em DM quer as expressas em PTE), mas não sobre as facturas emitidas pela sede (...)".

f) Ora, de acordo com o Relatório de Inspecção e o referido contrato, efectivamente, cabia à Impugnante a responsabilidade pelo apuramento e entrega do imposto devido, uma vez que cabe ao estabelecimento estável em Portugal o cumprimento das obrigações fiscais, e de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 9.º do RITI, consideram-se localizadas no território nacional e aí tributáveis as transmissões de bens expedidos ou transportados a partir de outro Estado membro, quando os bens sejam instalados ou montados em território nacional, pelo fornecedor, sujeito passivo noutro Estado membro, ou por sua conta.

g) Pelo que, se trata aqui de saber se a situação fáctica dos autos se subsume na previsão normativa, mais concretamente, na segunda parte da norma referente à instalação e montagem de bens em território nacional pelo fornecedor sujeito passivo noutro Estado membro.

h) Entendeu a AT que a operação em causa nos autos se enquadrava no supra citado normativo porque: (i) se trata de empresa sediada num Estado membro, ai sujeito passivo; (ii) empresa que fornece um bem, no caso, grupo gerador diesel de 2Mw e equipamento conexo; (iii) com instalação e montagem em território nacional; (iv) bem esse expedido a partir de outro Estado membro; (v) com destino a um sujeito passivo em Portugal - E..., EP, com sede em Ponta Delgada; (vi) tendo tal sujeito passivo. que expede o bem a partir de outro Estado membro, recorrido (de acordo com o clausulado contratual) à sociedade A..., Lda. para o fornecimento, montagem, testes e colocação em serviço da parte eléctrica do gerador, conforme decorre da cláusula de discriminação dos preços relativos à 2. ª fase do contrato e adenda; (vii) sendo que o sujeito passivo que transmite o bem possui estabelecimento estável em Portugal.

i) E a afirmação de que a instalação e montagem do bem foi assegurada pela sociedade mãe com sede noutro Estado membro não resulta, contrariamente ao defendido na douta sentença, de uma mera invocação levada a cabo no Relatório de Inspecção, mas antes do contratualmente definido entre as partes, pois da referida cláusula de discriminação dos preços relativos à segunda fase do contrato, e respectiva adenda, decorre a regulação da fase relativa à instalação e montagem do equipamento de acordo com o definido entre as partes. e não resulta dos autos que tenham sido em qualquer momento os termos definidos contrariados pelas partes, ou que o contrato tenha sido incumprido.

j) Constitui-se assim o contrato como documento idóneo apto a produzir a prova dos factos em si insertos, não constando dos autos e da factualidade dada como assente prova documental ou outra diversas que permitam concluir da execução do contrato em termos diversos dos constantes nesse mesmo contrato, do mesmo resultando a convicção segura de que a instalação e montagem ocorreu em Portugal por conta do fornecedor sujeito passivo noutro Estado membro.

k) Por outro lado, não obstante estarmos perante documentos particulares, cuja livre apreciação fica na disponibilidade do tribunal, tal livre apreciação não exime o tribunal de apreciar e analisar criticamente as provas e fundamentar a ausência de força probatória que lhes atribui, o que não aconteceu nos presentes autos.

l) Pois que se limita a douta sentença a desconsiderar o contrato assinalado, entendendo, sem fundamentar, não constarem quaisquer indícios dos autos (para além do contrato e respectivas cláusulas), para concluir acerca da montagem e da instalação em território nacional por conta da sociedade-mãe, quando temos sobre a matéria contrato celebrado entre a sociedade-mãe e a adquirente cliente português.

m) E a convicção de que a instalação e montagem era obrigação da responsabilidade da sociedade mãe, não resultando prova do contrário dos autos ou do probatório, é reforçada pelo facto assente constante da alínea d) do probatório, pois o contrato em causa nos presentes autos e ao abrigo do qual foi executada a instalação e montagem controvertida nos autos foi celebrado entre a E..., EP e a sociedade K... GmbH (sociedade mãe da aqui rcorrida) e tinha por objecto, nomeadamente, o fornecimento, montagem e lançamento em operação industrial de um Grupo Gerador de 2 Mw na Central Térmica do Belo Jardim, na Ilha Terceira.

n) De tal contrato não resulta qualquer fracionamento no referente à execução das várias fases contratuais, sendo que se obrigou a M..., sujeito passivo noutro Estado membro, a fornecer e proceder à montagem e devida instalação em território português, tendo sido depois fraccionada a facturação por razões alheias ao contratualmente estabelecido em termos de prestação do serviço.

o) Ainda, a reforçar a força probatória do documento temos que, de acordo com o Relatório de Inspecção Tributária, parcialmente transcrito na alinea l) do probatório da douta sentença, as facturas emitidas pela M... - sociedade mãe reflectem as cláusulas contratuais decorrentes do identificado contrato, facto do qual resulta afirmada a credibilidade do conteúdo do contrato, o qual foi executado de acordo com os termos estabelecidos pelas partes, não se afigurando válido que, para efeitos da determinação da inclusão ou exclusão da situação tributária no n.º 2 do artigo 9.º do RITI, seja o mesmo desconsiderado.

p) Assim, aquilo com que nos deparamos, no respeitante à facturação, é com facto subsequente ao contrato, da responsabilidade da sociedade mãe e da aqui recorrida, as quais, não obstante tratar-se de operação localizada em Portugal à luz do disposto no n.º 2 do artigo 9.º do RITI e do artigo 6.º do CIVA, decidiram proceder a uma facturação diferenciada, imputando os resultados à aqui recorrida e à sociedade mãe sem que qualquer suporte documental para tal fosse possível eleger.

q) Nos termos expostos, configurando-se o contrato como prova a considerar e do qual decorre a conclusão de que a instalação e montagem se constituiu como obrigação a cargo da M... sociedade-mãe, para além do fornecimento do bem, concluiremos necessariamente acerca do enquadramento dos factos na previsão do n.º 2 do artigo 9.º do RITI.

r) Pelo que, a liquidação do imposto sobre a totalidade da facturação emitida para o cliente português competia ao estabelecimento estável, aqui recorrida.

s) Ora, de acordo com o estabelecido no artigo 29.º do CIVA, daqui resulta que a partir do momento em que a Impugnante se constituiu em território nacional como estabelecimento estável estaria sujeita ao cumprimento de um conjunto de obrigações definidas legalmente, de entre as quais a de proceder à liquidação do IVA devido pelas operações imputáveis à sociedade mãe e em território nacional localizadas.

t) Atento o exposto, incorreu a sentença de erro na apreciação dos factos e de violação de lei por ofensa aos normativos do n.º 2 do artigo 9.º do RITI quando retira do seu âmbito de aplicação a as operações em causa nos presentes autos.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação totalmente improcedente, com as devidas consequência legais.

SENDO QUE EXAS. DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.»

3. A recorrida, M... & CO. KG – Sucursal em Portugal, apresentou as suas contra-alegações, tendo formulado as conclusões seguintes:

«A) Vem a Recorrente Fazenda Pública pleitear pela revogação da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, em 25.01.2017, que julgou procedente a presente Impugnação Judicial, anulando as liquidações adicionais de IVA e os juros compensatórios correspondentes, relativos ao ano de 1997, por entender não se encontrarem verificados os pressupostos constantes do n.º 2 do art. 9.º do RITI e por considerar não resultar demonstrado que tenha sido a casa-mãe, com sede na Alemanha, a efectuar a instalação e montagem, em território nacional, dos equipamentos por si comercializados.

B) Bem decidiu a douta Sentença em recurso, revelando uma correcta valoração da matéria de facto com interesse para a decisão e uma correspondente subsunção da mesma na matéria de direito aplicável, devendo, por conseguinte, ser integralmente mantida na ordem jurídica. Porquanto,

C) Falece, na íntegra, razão à Recorrente Fazenda Pública, que nas suas alegações de recurso, para além de reforçar a interpretação errónea que fez, quer do Contrato, quer da Adenda em questão nos presentes autos, demonstrou um total desconhecimento da tributação aplicável em sede de transacções intracomunitárias e, bem assim, da função de um estabelecimento estável para efeitos jurídico-fiscais.

D) A Recorrente Fazenda Pública, no raciocínio por si desenvolvido, e que conduziu às liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios à Recorrida, partiu de um erro de base que, inevitavelmente, inquina toda a sua fundamentação posterior e fere de ilegalidade os actos por si levados a cabo, razão pela qual a sua argumentação não pode prosperar.

E) Efectivamente, a AT interpretou erradamente o objecto do contrato celebrado entre a C... e a empresa Electricidade dos Açores, EP, dado que do mesmo resulta um fraccionamento do objecto contratual: os serviços relativos à concepção, fabricação e fornecimento dos bens e equipamentos foram prestados pela casa-mãe, com sede na Alemanha, sem qualquer intervenção da Recorrida, ao passo que os serviços relativos à instalação, montagem, supervisão e manutenção desses mesmos equipamentos foram prestados pela Recorrida e por esta facturados.

F) A diferença na facturação efectuada é um claro indício da repartição de tarefas entre a casa-mãe e a ora Recorrida na execução do objecto contratual.

G) A própria instalação, em Portugal, da Recorrida enquanto estabelecimento estável só pode ser compreendida no contexto do desempenho, por banda desta, de uma função útil para a execução do objecto acordado entre as partes, in casu, da instalação, montagem, supervisão e manutenção dos equipamentos em causa.

H) As operações de comercialização dos produtos praticadas pela casa-mãe são e devem ser tidas como intracomunitárias, cabendo ao Adquirente dos bens o pagamento, em território nacional, do IVA devido, nos termos dos arts. 1.º, alínea a), 2.º, alínea a), 3.º e 28.º, n.º 1do RITI.

I) O entendimento da Recorrente de que a situação dos autos é subsumível à previsão constante do n.º 2 do art. 9.º do RITI resulta, uma vez mais, do erro que esta incorre, considerando que a instalação e montagem dos equipamentos ocorreram em Portugal, pelo fornecedor, sujeito passivo, com sede na Alemanha.

J) Em momento algum cumpriu a Recorrente o ónus, que sobre si impendia, de alegar e provar que foi efectivamente a casa-mãe a assegurar a liquidação e a montagem dos bens em território nacional, nos termos do disposto no art. 74.º da LGT.

K) Uma vez mais, a Recorrente interpreta erradamente o conceito de estabelecimento estável e a sua relevância em termos jurídico-fiscais.

L) Só quando existe um estabelecimento estável e os rendimentos em causa lhe são imputáveis, ou seja, entre estes e aquele existe um nexo causal juridicamente relevante, é que a sua intervenção se torna legalmente exigível.

M) Contrariamente ao entendimento da Recorrente, nem todos os proveitos advenientes do Contrato e Adenda em causa, incluindo os relativos ao fornecimento e venda do equipamento pela sede na Alemanha são imputáveis ao estabelecimento estável em Portugal, apenas o sendo parte destes, in casu, os respeitantes aos serviços de instalação, montagem, supervisão e manutenção dos equipamentos fornecidos, serviços esses executados em território nacional e que a Recorrida facturou para efeitos de IRC e IVA.

N) Tal resulta claramente da Convenção para evitar a Dupla Tributação (CDT), celebrada entre Portugal e a Alemanha.

O) Não basta, assim, a mera criação de um estabelecimento estável para que este assuma a totalidade das obrigações fiscais, mesmo as referentes à empresa-mãe, qualquer conexão com a causa jurídica dessas mesmas obrigações.

P) A tributação fiscal de um estabelecimento estável deve assentar em duas vertentes: no exercício de actividade por meio de um estabelecimento estável e na necessidade de determinação quantitativa de lucros que o estabelecimento estável obteria se fosse uma empresa autónoma e independente que exercesse essas mesmas actividades.

Q) Não podem assim considerar-se, para efeitos de tributação dos rendimentos alegadamente obtidos pelo estabelecimento estável, cuja legalidade se discute nos presentes autos, a existência de actividades outras que não conexas com a actividade por si desenvolvida, nomeadamente actividades directamente exercidas pela sociedade-mãe desse estabelecimento estável.

R) ln casu, o estabelecimento estável, ou seja, a ora Recorrida, não concebe ou projecta, não fabrica e não negoceia a venda dos equipamentos transaccionados pela casa-mãe, com sede na Alemanha, pelo que não lhe pode, em caso algum, ser imputada a totalidade da facturação emitida para o cliente português.

S) Dando razão à Recorrida, o TCA no Acórdão de 15-02-2005, Rec. 379/03 (disponível em www.dgsi.pt ) confirmando a decisão do Tribunal de 1." Instância de 07-01-2003, proferida no processo de impugnação n.º 69/01, instaurado pela Recorrida contra as liquidações adicionais de IRC dos anos de 1993 e 1994, veio dizer: "Impõe-se, por isso, no seu entendimento, concluir que, ocorrendo a concepção, fabricação e comercialização (a que acresce todo o que tem a ver com o transporte para Portugal) dos equipamentos objecto dos contratos em causa, na Alemanha, o preço (proveito) que lhes diga respeito não pode ser imputado ao estabelecimento estável situado em Portugal por não ser causa da sua actividade por si desenvolvida - o estabelecimento estável não concebe ou projecta, não fabrica e não negoceia a venda desses equipamentos pesados ".

T) É pois forçoso concluir-se que não podem ser imputáveis à sucursal quaisquer proveitos que não sejam obtidos por seu intermédio, para efeitos de tributação em Portugal.

U) Pelo que, tal como decidiu o Tribunal a quo e atendendo à posição já assumida pela jurisprudência supra invocada, deverá a decisão do presente caso igualmente levar à anulação das liquidações de IVA de 1997 nos termos supra mencionados.

TERMOS EM QUE, EM FACE DA FUNDAMENTAÇÃO EXPOSTA E PORQUE A DOUTA SENTENÇA EM RECURSO BEM DECIDIU, DEVE ESTA SER MANTIDA NA ORDEM JURÍDICA E, POR CONSEGUINTE, NEGADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO APRESENTADO PELA FAZENDA PÚBLICA,

ASSIM FAZENDO V. EXAS. A COSTUMADA JUSTIÇA.»

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista à Exma. Procuradora-Geral Adjunta, emitiu parecer, nos termos constantes de fls. 587 a 588 (da numeração dos autos de suporte físico), no sentido da procedência do recurso.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.

II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença recorrida padece de erro de julgamento por errada apreciação dos factos e de direito por violação do n.º 2, do artigo 9.º do RITI.


*

III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«a) A ora Impugnante, M... & CO. KG - Sucursal cm Portugal foi alvo de acção inspectiva, por parte dos serviços de inspecção tributária da 1ª Direcção de Finanças de Lisboa que abrangeu IVA referente ao exercício de 1997 - Cfr. Relatório a fls. 80 a 90, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

b) A Impugnante encontra-se enquadrada, em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (adiante IVA), no regime normal, com periodicidade mensal - Cfr. documento a fls. 80;

c) O objecto da Sucursal ora Impugnante, tal como consta na certidão do Registo Comercial constante do PAT é: instalação fixa para a execução de empreitadas de projectos, fabrico, transporte, montagem no local e comissionamento de centrais termoeléctricas - Cfr. Documento constante do PAT, não paginado, apenso;

d) Em 24 de Janeiro de 1994 foi assinado contrato entre a E..., EP e K... M... GmbH (depois designada por M... e, actualmente, C... GmbH, com sede em Kiel. na Alemanha), tendo por objecto, nomeadamente, o fornecimento, montagem e lançamento em operação industrial de um Grupo Gerador dc 2 Mw na Central Térmica do Belo Jardim, na Ilha Terceira, com o necessário equipamento apto a queimar gasóleo — Cfr. Documentos a fls. 58, 97 a 101, os quais se dão, aqui, por integralmente reproduzidos;

e) Em 19/02/1997 foi emitida a factura n° 320/015/97, pela empresa M..., no valor de DM 93.249.00. na qual consta como adquirente “E...”, com o NIPC 5... — Cfr. Documento a fls. 1 18, o qual se dá, aqui por integralmente reproduzido;

f) Em 19/02/1997 foi emitida a factura n° 320/024/97, pela empresa M..., no valor de DM 51.192,00. na qual consta como adquirente “E...”, com o NIPC 5... - Cfr. Documento a fls. 119, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

g) Em 30/06/1997 foi emitida a factura n° 320/074/97, pela empresa M..., no valor de DM 466.245,00, na qual consta como adquirente “E...”, com o NIPC 5... - Cfr. Documento a fls. 120, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

h) Em 30/06/1997 foi emitida a factura n° 320/077/97, pela empresa M..., no valor de DM 255.960.00, na qual consta como adquirente “E...”, com o NIPC 5... - Cfr. Documento a fls. 121, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

i) Em 08/12/1997 foi emitida a factura n° 320/174/97, pela empresa M..., no valor de DM 62.166,00, na qual consta como adquirente “E...”, com o NIPC 5... - Cfr. Documento a fls. 122, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

j) Em 10/12/1997 foi emitida a factura n° 120/014/97 (intern), pela empresa M..., no valor de DM 2.281.741.00. na qual consta como adquirente “E...”, com o NIPC 5... - Cfr. Documento a fls. 117, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

k) Em 08/12/1997 foi emitida a factura n° 320/175/97, pela empresa M..., no valor de DM 34.128,00. na qual consta como adquirente “E...”, com o NIPC 5... - Cfr. Documento a fls. 123, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

l) Em 29 de Maio de 2000 foi elaborado Relatório de Inspecção pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção Distrital de Finanças de Lisboa, relativo ao exercício de 1997, do qual se destaca o seguinte:

“(...) I- Conclusões da Acção Inspectiva

Em resultado da inspecção à M... & CO. KG - Sucursal em Portugal constatou-se que relativamente a um contrato de fornecimento, montagem e colocação em serviço de um conjunto gerador diesel e equipamento conexo, em território nacional, não foi liquidado a totalidade do IVA que se mostra devido na facturação emitida. A sujeição a este imposto deriva do facto de a transmissão em causa integrar a previsão normativa do n°2 do artigo 9º do RIH

Esta norma é clara: “ São, no entanto, tributáveis as transmissões de bens expedidos ou transportados a partir de outro estado membro, quando os bens sejam instalados ou montados em território nacional, pelo fornecedor, sujeito passivo nesse outro estado membro, ou por sua conta. ”

Em virtude de ter sido constatado que relativamente àquele contrato não foi liquidado imposto por parte daquela sucursal, demonstrou-se que a operação em causa preenche todos os requisitos para o seu enquadramento nas normas de incidência do CIVA e do RITI por força daquela regra de localização peto que se procedeu nesta inspecção à liquidação adicional de IVA relativo ao exercício de 1997 que ascendeu a 11.669.504$00.

(...)

2.3.2 - Enquadramento fiscal da actividade

Decorrente desta situação, relativamente ao IRC a sucursal em Portugal é pois um sujeito passivo não residente com estabelecimento estável, conforme alínea c) do n.º1 do artigo 3º, ambos do Código do IRC. Quanto ao IVA está enquadrado no regime normal de periodicidade mensal com direito à dedução relativamente á totalidade da actividade.

III - Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável

Na sequência do referido em 2.2, constatou-se que em 24 de Janeiro de 1995 foi celebrado entre a E.... ER, pessoa colectiva n" 5..., com sede na Rua E..., em Ponta Delgada e a empresa alemã M... GMGH (DE 8...) um contrato que de acordo com a respectiva cláusula 1ª tinha por objecto o fornecimento, montagem e lançamento em operação industrial de um Grupo Gerador de 2 Mw na Central Térmica do Beto Jardim, Ilha Terceira, com o necessário equipamento apto a queimar gasóleo. Fazia igualmente parte do objecto do contrato uma segunda fase relativa à desmontagem, transporte, montagem e lançamento em exploração industrial, na Central Térmica do Pico do mencionado gerador diesel, queimando combustível pesado, na qual se incluía também o fornecimento de equipamento adicional. De acordo com a cláusula 3ª o preço contratual da 1ª fase era de RTF 82.948.22$00 e o da 2ª de RTE 67.610.400$00 e DM 1.007.370.00. (...)

As considerações que se seguem respeitam à 2a fase do contrato e adenda que ocorreram em 1997, período abrangido pela Ordem de Serviço identificada no início deste relatório.

Relativamente à facturação, a M... inscreveu o montante total da 2a fase do contrato e adenda, 2.281.741 DM, no seu anexo recapilulativo referente ao 4º trimestre de 1997, com base numa factura interna para efeitos de cumprimento da obrigação fiscal; na realidade o preço mencionado no contrato surge decomposto em duas moedas, parte em marcos alemães e parte em escudos. A facturação propriamente dita consiste em várias facturas que se iniciam sempre com o nº320 e que reflectem as condições de pagamento expressas na cláusula 4ª do contrato n.º 212132 de 24 de Janeiro de 1995 em que os pagamentos são fraccionados nas proporções de 15%, 75% e 10%, como adiante se especifica.

De referir que parte da facturação (relativa a fornecimentos de materiais e trabalhos diversos) é emitida pelo estabelecimento estável da M... em Portugal, sendo utilizado o n° PT 9..., facturação esta que está registada na respectiva contabilidade, e que tanto é emitida em escudos como em marcos alemães, tendo em ambos os casos sido declaradas para efeitos de IRC e o IVA liquidado e inscrito nas declarações periódicas.

A outra parte da facturação é emitida directamente pela sede da M... ( DE 811152469) e está obviam ente expressa em marcos alemães.

As facturas emitidas pela sede da M... também reflectem as cláusulas contratuais no que respeita ao citado esquema de pagamentos.

(…)

Uma vez que apenas foi liquidado IVA sobre os valores das facturas emitidas pelo estabelecimento estável (quer as expressas em DM quer as expressas em PTE), mas não sobre as facturas emitidas pela sede, há que enquadrar a situação tributária daqui decorrente sob o ponto de vista jurídico-fiscal.

O IVA liquidado nas facturas emitidas correspondentes à parte local foi contabilizado e inscrito nas declarações periódicas.

Há que analisar, no entanto, se relativamente à operação acima descrita foram cumpridas todas as obrigações fiscais para o que se procede ao respectivo enquadramento.

Em conformidade com o estabelecido na Directiva n° 91/680/CEE, do Conselho, de 16 de Dezembro de 1991, Portugal transpôs para o direito interno o conjunto das medidas necessárias para a realização do mercado interno europeu, seguindo de perto o articulado no referido ciclo comunitário, através do Decreto-Lei n° 290/92, de 28 de Dezembro, publicado no Diário da República - I Série A, n° 298, de 28/12/1992, o qual aprova e faz entrar em vigor em 1 de Janeiro de 1993 o Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (doravante designado por RITI).

De realçar que aquele acto comunitário altera e complementa a Directiva n°77/388/CEE de 17 de Maio, conhecida por 6ª Directiva e relativa à harmonização das legislações dos Estados Membros, a qual constitui o texto normativo básico do sistema comum comunitário de Imposto sobre o Valor Acrescentado.

Nesta base e de acordo com o disposto na alínea a) do n° l do artigo 8° daquela Directiva, “Quando o bem deva ser instalado ou montado, com ou sem ensaio de funcionamento, pelo fornecedor ou por conta deste, por lugar de entrega emende-se o lugar onde se efectua a instalação ou montagem. "

Esta base comunitária encontra-se expressa no artigo 9º do RITI que introduziu no nosso ordenamento jurídico as regras de harmonização transitória de um regime definitivo do IVA, baseado na tributação do imposto na origem, conforme o artigo 28º- M da 6ª Directiva no que respeita à localização das transmissões de bens com instalação ou montagem.

Enquanto esse regime definitivo não for implementado, o princípio geral aplicável nas transmissões entre sujeitos passivos nacionais devidamente identificados para efeitos de IVA, os quais realizem operações tributáveis que lhes confere direito à dedução total ou parcial do imposto e sujeitos passivos devidamente registados em outros Estados membros da CEE é, pois, o da liquidação de imposto no país de destino dos bens.

De acordo com o disposto no n°2 do artigo 9º do RITI consideram-se localizadas no território nacional, e consequentemente, aí tributáveis as transmissões de bens expedidos ou transportados a partir de outro Estado membro, quando os bens sejam instalados ou montados em território nacional, pelo fornecedor, sujeito passivo nesse outro Estado membro, ou por sua conta.

Ou seja, este n°2 enquadra os casos em que a instalação ou montagem ocorre em território nacional pelo que a transmissão desses bens se verifica em Portugal e como tal são tributados.

Ao invés, o n° 1 daquele artigo regulamenta as transmissões de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta para fora do território nacional, quando os bens sejam instalados ou montados no território de outro estado membro. Nesta situação, o disposto no n°l do artigo 6° não terá aplicação, isto é este tipo de transmissões não é tributável em Portugal.

Isto é, o n° 1 enquadra os casos em que a instalação ou montagem tem lugar noutro Estado membro, ainda que os bens sejam expedidos a partir do território nacional, casos estes em que não haverá lugar a tributação em Portugal.

O articulado do artigo 9º do RITI define, por conseguinte, a regra da localização aplicável às transmissões de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta para outro Estado membro, para aí serem instalados ou montados, que é a do princípio da tributação no país de destino.

E o disposto no n°2 do artigo 9° do RITI localiza em Portugal a transmissão de bens cuja instalação ou montagem é aqui efectuada pelo fornecedor sujeito passivo noutro Estado membro, que expediu ou transportou tais bens a partir do respectivo país.

Efectivamente, a transferência de bens para serem objecto de instalação ou montagem não origina uma transmissão intracomunitária (o que equivale a dizer que o adquirente desses bens - a E..., EP - não faz uma aquisição intracomunitária desses bens), sendo sempre tais operações tributadas no país de destino, independentemente do respectivo valor.

Note-se que a operação se considera como localizada no território nacional, cabendo ao fornecedor que procede à instalação ou montagem, ou a qual é efectuada por sua conta, a responsabilidade pelo apuramento e entrega do imposto que se mostre devido. Ou seja, estas transmissões são internas, ainda que pressuponham um movimento intracomunitário de bens.

Isto também significa que as referidas operações não serão consideradas aquisições intracomunitárias de bens, muito embora a legislação que as rege se insira no RIPI.

Posto isto, torna-se demasiado evidente que a operação atrás descrita efectuada pela sede da M... se enquadra, indubitavelmente no n°2 do artigo º 9 do RITI. E repare-se que estão preenchidos na íntegra os requisitos para que tal aconteça:

a) - trata-se de uma empresa sediada num Estado membro e que é aí sujeito passivo;

b) - que fornece um bem - grupo gerador diesel de 2 Mw e equipamento conexo;

c) - com instalação ou montagem, e lançamento em operação industrial, o mesmo é dizer com ensaios e colocação em serviço em território nacional;

d) — expedido ou transportado a partir de outro Estado membro;

e) - para um cliente sujeito passivo em Portugal, a E..., EP, com sede em Ponta Delgada;

f) - tendo também recorrido à A..., Ldª para o fornecimento, montagem, testes e colocação em serviço da parte eléctrica do gerador, conforme decorre da cláusula de discriminação dos preços relativos À 2.ª fase do contrato e adenda;

g) - que possui estabelecimento estável em Portugal para o qual foi nomeado um director.

(...)

De salientar e de acordo com o ponto 8 daquela informação que como a M... possui em Portugal estabelecimento estável a este competirá o cumprimento das obrigações derivadas da aplicação das normas do Código do IVA, designadamente a liquidação do imposto sobre a totalidade da facturação emitida para o cliente português. E frisa-se que é sobre a totalidade da facturação, ou seja, quer sobre a emitida pelo estabelecimento estável quer sobre a da sede e não apenas sobre a do estabelecimento estável.

E o estabelecimento estável da M... não liquidou IVA sobre a facturação emitida pela sede relativa à parte estrangeira do preço do contrato.

De referir que nestas situações é frequente incorrer-se num erro de apreciação e que é o seguinte: se a M... não liquidou IVA embora o devesse ter feito mas se esta obrigação foi eventualmente cumprida pelo adquirente então o Estado português não ficou lesado. Esta apreciação é incorrecta pelos motivos a seguir indicados.

Em primeiro lugar, a obrigatoriedade de liquidação deriva do facto de se terem verificado os pressupostos, ou melhor, actos ou situações que integram a previsão das normas de incidência.

Em segundo lugar, uma vez preenchido o requisito de incidência, a liquidação propriamente dita que está prevista nos artigos 19° a 25° e 26° do C1VA não é facultativa, pelo contrário é obrigatória. Do ponto de vista de cálculo o apuramento final da dívida do imposto faz-se através de uma operação subtractiva.

Em terceiro lugar, e desde que se verifique a existência de estabelecimento estável a obrigatoriedade de liquidação é a ele que lhe compete nos termos do artigo 29º do CIVA, não podendo ser transferida para outrem por não ser admissível, dado não se encontrar prevista na lei fiscal, uma situação com contornos de substituição tributária.

(...)

Desconhece-se, por motivos óbvios, se a E.... EP terá ou não liquidado aquele imposto em falta. Se assim aconteceu, fê-lo indevidamente tornando-se, por esse motivo, sujeito passivo do imposto conforme alínea c) do n° 1 do artigo 2° do CIVA, situação que não desobriga o estabelecimento estável da M... dos seus deveres de liquidação e entrega de imposto. Não releva aqui o procedimento adoptado pelo adquirente até porque isso também dependerá do tipo de sujeito passivo que é quanto ao respectivo enquadramento.

O que releva sim é que a reposição da legalidade passa pela liquidação ao estabelecimento estável em Portugal da M... do IVA que se mostra devido.

Não é pois sobre a E..., EP adquirente dos bens, que recai a obrigatoriedade de liquidação do IVA, o que só aconteceria se a M... não possuísse estabelecimento estável ou em alternativa não tivesse nomeado representante legal, também nos termos do artigo 29° do CIVA.

Ficou pela e claramente demonstrado que é a totalidade da facturação que está sujeita a imposto e não apenas a referente à parte portuguesa do preço do contrato. Para o apuramento do IVA em falta será aplicada às facturas emitidas pela sede da M... a seguir discriminadas a mesma taxa de câmbio que a utilizada pelo sujeito passivo nas facturas em que liquidou imposto, em virtude de as datas de emissão serem coincidentes. (...) - Cfr. Relatório a fls. 80 a 90, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

m) Em 12 de Agosto de 2000, foi remetida à impugnante notificação para pagamento voluntário da importância de Esc. 11.669.504$00. referente à liquidação de IVA n° 00115335, período 1997 - Cfr. Documento a fls. 51, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

n) Em 12 de Agosto de 2000, foi remetida à Impugnante notificação para pagamento voluntário da importância de Esc. 324.717$00. referente à liquidação de juros compensatórios n° 00115334, período 9712 - Cfr. Documento a fls. 51, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

o) Em 11 de Junho de 2001 foi prestada garantia bancária, pelo D... (Portugal), S.A., a favor da Direcção-Geral dos Impostos, para garantia das dívidas da ora impugnante respeitantes aos processos de execução fiscal n° 3522- 01/180740.4, 3522-01/180741.2. 3522-01/180742.0 e 3522-01/180743.9 - Cfr. Documento a fls. 191, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

p) Em 9 de Julho de 2001, no âmbito do PEF n° 3522-01/180740.4 e apensos, foi proferido despacho, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 3, nos seguintes termos: “ Verificada a apresentada a garantia bancária, suspende-se a execução fiscal nos termos do art° 169° do CP P T até ao trânsito em julgado da impugnação judicial apresentada." - Cfr. Documento a fls. 192, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

q) Em 22/11/2000 deu entrada a presente impugnação - Cfr. Carimbo aposto no rosto da p.i., a fls. 2;

r) A tramitação da presente impugnação judicial esteve parada entre 05/01/2006 e 11/02/2008 - Cfr. Fls. 164 e 165;

s) A Impugnante suportou encargos com a prestação de garantia a que se refere a alínea o) no montante de £ 7.911,74 - Cfr. Documentos a fls. 257 a 336, não impugnados.


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Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.

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A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos, não impugnados, das informações oficiais constantes dos autos e da leitura e análise do PAT, conforme referido no probatório.»

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2. ADITAMENTO OFICIOSO À MATÉRIA DE FACTO

Por ser relevante para a decisão da causa, ao abrigo do disposto no n.º 1, do artigo 662.º do Código de Processo Civil (CPC), importa aditar ao probatório a seguinte matéria que igualmente se encontra provada nos autos:

t) Do objecto do contrato identificado na alínea d) faz parte uma segunda fase, relativa à desmontagem, transporte, montagem e lançamento em exploração industrial, na Central Térmica do Pico, do mencionado gerador diesel, queimando combustível pesado, na qual se incluiu também o fornecimento de equipamento adicional, tendo sido acordado que o preço da segunda fase é de Esc.: 67.610.400$00 e de DM 1.007.370,00 e que os trabalhos da segunda fase se iniciariam o mais tardar em finais de Dezembro de 1996 e concluíam-se em Dezembro de 1997 (cfr. contrato constante do PAT apenso);

u) Em 24/01/1997, a E…-E..., E.P., enviou à M... GmbH, para o endereço P.O. Box 9.. Kiel, Alemanha, “Carta de intenção de adjudicação de fornecimentos e trabalhos complementares à instalação de Grupo Gerador de 2 MW”, da qual consta, designadamente, o seguinte: Apraz-nos informá-lo que a E..., E.P., (…) decidiu adjudicar a Adenda ao contrato inicial em causa à M... e seu subempreiteiro da parte eléctrica A..., E… Lda., Porto, Portugal. (…). (cfr. Documento constante do PA apenso);

v) O “Anexo “A” da Carta de Intenção”, que faz parte integrante da adenda e do contrato inicial consta no ponto 1. com a epígrafe “Âmbito da adenda ao contrato” o seguinte: O âmbito da adenda ao contrato incluirá todos os fornecimentos dos equipamento elétricos, mecânicos, e serviços de montagem, lançamento em exploração de uma grupo gerador de 2 MW a transferir da Central Termoeléctrica de Belo Jardim para a Central Termoeléctrica de Sta. Bárbara e não contemplados no âmbito do contrato inicial por ambas as empresas em 24 de janeiro de 1995, o qual previa a instalação final na Central Termoeléctrica do Pico. (cfr. Documento junto ao PA apenso);

x) As partes contratantes celebraram a “Adenda ao contrato de fornecimento, montagem e lançamento em operação industrial do Grupo gerador de 2 Mw na Central Térmica do Belo Jardim” celebrado em 24/01/1995, tendo por objecto a desmontagem, transporte, montagem e lançamento em exploração industrial na Central Térmica de Santa Bárbara, ilha do Faial, do Grupo Gerador de 2 Mw instalado na Central Térmica do Belo Jardim, ilha Terceira, e inicialmente destinado à Central Térmica do Pico, queimando combustível pesado, no qual se incluiu também o fornecimento de equipamento adicional, cujo preço contratado foi de Esc.: 24.812.700$00 e de DM 374.695,00, que acresce ao valor fixado no n.º 2 da cláusula terceira do contrato original, tendo sido ainda acordado que a execução dos fornecimentos e serviços objecto da Adenda terá inicio em Abril de 1997 e o seu termo em Agosto do mesmo ano (cfr. Documento junto ao PA apenso);

z) No quadro de preços relativos ao contrato inicial constam de forma discriminada os valores da parte mecânica, que inclui desmontagem e transporte, equipamentos adicionais e montagem, e os valores da parte eléctrica, que inclui Gerador auxiliar, transformador, quadro BT serv. Auxiliares, Cabos e Sistema de comando (cfr. documento junto a PA apenso);

aa) No quadro de preços relativos à adenda constam de forma discriminada os valores da parte mecânica, que inclui equipamento adicional, adicional para montagem e comiss., taque de comb. Trat 40 m3, e os valores da parte eléctrica, que inclui transformador, equipamento 15 kV e equipamento adicional (cfr. documento junto a PA apenso);


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3. DE DIREITO

3.1. O presente recurso vem interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que, julgou a impugnação procedente e anulou as liquidações adicionais impugnadas por não ser o fornecimento dos autos subsumível à disciplina do n.º 2, do artigo 9.º do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI), por ter considerado ter havido um tratamento diferenciado por parte da Impugnante (sucursal) da facturação respeitante à instalação e montagem dos bens que assumiu ser da sua responsabilidade, tendo liquidado e pago o IVA devido, não sendo curial a conclusão de que a instalação e montagem do equipamento foi assegurado pela casa-mãe, por si ou sua conta.

A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, invocando, no essencial, que resulta do contratualmente definido entre as partes, concretamente da cláusula de discriminação dos preços relativos à segunda fase do contrato e respectiva Adenda, que regula a fase relativa à instalação e montagem do equipamento de acordo com o definido entre a partes, que a instalação e montagem do bem foi assegurada pela sociedade mãe com sede noutro Estado Membro, o que é reforçado pelo facto assente constante da alínea d) do probatório, não resultando dos autos que tenham sido em qualquer momento os termos definidos contrariados pelas partes, ou que o contrato tenha sido incumprido. Mais alega que a sentença recorrida limitou-se a desconsiderar o contrato assinado, entendendo, sem fundamentar, não constarem quaisquer indícios dos autos que a montagem e instalação em território nacional foi feita por conta da sociedade-mãe.

Alega ainda que os factos enquadram-se na previsão do n.º 2, do artigo 9.º do RITI, competindo a liquidação do IVA devido sobre a totalidade da facturação pelas operações imputáveis à sociedade-mãe, em território nacional, ao estabelecimento estável, aqui Recorrida, nos termos do artigo 29.º do CIVA.

Conclui a Recorrente que a sentença recorrida incorreu em erro na apreciação dos factos e de violação de lei.

3.2. Iniciamos a apreciação das questões que nos são colocadas pelo erro na apreciação dos factos, sendo que de tal erro de julgamento está depende do que este Tribunal de recurso venha a decidir quanto ao erro de julgamento de direito, pelo que se impõe que a sua apreciação venha a ser dada primazia.

Vejamos, então.

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (cfr. artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr. artº. 607.º, n.º 5, do CPC).

A este Tribunal de recurso assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo Tribunal a quo, desde que ocorram os pressupostos previstos nos artigos 662.º do CPC, incumbindo-lhe reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.

Não obstante a amplitude conferida a um segundo grau de jurisdição, na caracterização da amplitude dos poderes de cognição do Tribunal ad quem sobre a matéria de facto, não se está perante um segundo ou novo julgamento de facto, porquanto, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o Recorrente considere incorrectamente julgados e desde que cumpra os pressupostos fixados no artigo 640.º, n.ºs. 1 e 2 do CPC.

O Tribunal ad quem aprecia apenas os aspectos sob controvérsia e não vai à procura duma nova convicção, pois o que visa determinar é se a motivação apresentada pelo Tribunal a quo encontra suporte razoável naquilo que resulta dos elementos probatórios existentes ou produzidos nos autos (neste sentido vide Acórdão do TCAS, processo nº 2327/08.4BEBLS, disponível em www.dgsi.pt.).

Nos sistemas da livre apreciação da prova, como é o nosso, detendo o julgador a liberdade de formar a sua convicção, não se pode associar o arbítrio no julgamento da matéria de facto efectuado pelo tribunal a quo, pois o Tribunal não está isento de indicar os fundamentos onde aquela assentou, de modo a que, com recurso às regras da ciência, da lógica e da experiência, possa ser controlada a razoabilidade do processo de formação da convicção do tribunal sobre a prova e não prova dos factos apurados dos autos, deste modo se sindicando o processo racional da decisão (artigo 607.º, n.º 4 do CPC).

A exigência legal de enunciação ou explicitação da convicção sobre a prova constitui uma garantia da transparência, da imparcialidade e da inerente assunção da responsabilidade por parte do julgador.

Se, à luz desta caracterização a decisão, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, então ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.

Diga-se, ainda, que a Recorrente não impugnou a matéria de facto (artigo 640.º do CPC) e com o aditamento oficioso à matéria de facto ao abrigo do artigo 662.º do CPC, considera-se a mesma assente.

Analisada a decisão recorrida constatamos que o Tribunal a quo, sustentado no princípio da livre apreciação da prova produzida nos autos, fixou os factos que resultaram da prova documental existente no processo e que considerou necessários para a solução dada ao caso (artigo 607.º, n.º 5 do CPC).

Assim, deu provado que em 24 de Janeiro de 1994 foi assinado contrato entre a E..., EP e K... M... GmbH (depois designada por M... e, actualmente, C... GmbH, com sede em Kiel. na Alemanha), tendo por objecto, nomeadamente, o fornecimento, montagem e lançamento em operação industrial de um Grupo Gerador dc 2 Mw na Central Térmica do Belo Jardim, na Ilha Terceira, com o necessário equipamento apto a queimar gasóleo (alínea d) do probatório) e que a sua Sucursal, aqui Recorrida, de acordo com o objecto, tal como consta na certidão do Registo Comercial, é a instalação fixa para a execução de empreitadas de projectos, fabrico, transporte, montagem no local e comissionamento de centrais termoeléctricas (alínea c) do probatório).

Do objecto do contrato faz parte uma 2.ª fase relativa à desmontagem, transporte, montagem e lançamento em exploração industrial na Central Térmica do Pico do mencionado gerador diesel, na qual se incluía também o fornecimento de equipamento adicional, tendo sido celebrado uma adenda ao contrato adicional para a Central Termoeléctrica de Sta. Bárbara, ilha do Faial, e a que respeitam as liquidações adicionais em crise nos autos, conforme decorre do factos fixados pela primeira instância e oficiosamente aditados ao probatório por este Tribunal.

A Recorrida foi alvo de uma acção inspectiva, na qual os serviços de inspecção concluíram que ocorreu uma operação de fornecimento de bem com instalação e montagem em território nacional cujas características a enquadram no n.º 2, do artigo 9,º do RITI, na sequência da qual foram emitidas as liquidações dos autos (cfr. alínea l) do probatório).

No relatório de inspecção tributária (RIT) considerou-se que se encontram preenchidos os requisitos para que o IVA incida sobre a totalidade da facturação e não apenas sobre a parte portuguesa do preço do contrato.

Refere-se no RIT, quando elenca as várias situações que permitem tal conclusão, nomeadamente que: tendo também recorrido à A..., Ldª para o fornecimento, montagem, testes e colocação em serviço da parte eléctrica do gerador, conforme decorre da cláusula de discriminação dos preços relativos à 2.ª fase do contrato e adenda. (cfr. alínea l) do probatório).

Sobre esta matéria escreveu-se na sentença recorrida:

Não podemos considerar suficiente para a afirmação de que tenha sido o fornecedor do equipamento (a casa-mãe) a assegurar, por si, ou por sua conta, a instalação e montagem dos bens no território nacional, a mera invocação que do relatório consta de que a Casa- mãe tenha recorrido à A..., Ldª para o fornecimento, montagem, testes e colocação em serviço da parte eléctrica do gerador, conforme decorre da cláusula de discriminação dos preços relativos à 2ª fase do contrato e adenda. (…)

Não só não consta dos autos qualquer tipo de indício de que assim tenha sido, como referido pela AT, como não se vislumbra em que elementos, para além da referência à cláusula de discriminação de preços constante do contrato (que se considera manifestamente insuficiente), se terá baseado para chegar à conclusão de que a montagem e instalação do equipamento foi assegurada pela casa-mãe.

Acrescente-se que, ainda que se pudesse concluir, com segurança, que a montagem tinha sido efectuada pela referida A..., o que não sucede, não logrou a AT demonstrar que quem tinha assegurado o pagamento dos serviços de montagem contratados tivesse sido a casa-mãe.

A Recorrente insurge-se contra tal entendimento, em suma, como já deixamos expresso supra, por a cláusula de discriminação dos preços relativos à segunda fase do contrato inicial e Adenda celebrados entre a Empresa de Eletricidade dos Açores, EP (adiante EDA) e sociedade alemã “M...” (adiante M...) regularem a fase relativa à instalação e montagem do equipamento.

Aqui chegamos, adianta-se, desde já, que não há como negar razão à Recorrente.

Conforme resulta do probatório o contrato inicial e adenda dos autos foram celebrados entre EDA e M..., tendo como objecto o fornecimento e montagem de bens em território nacional, prevendo, para além do mais, preços, condições de pagamento, prazos de execução e penalidades para o seu incumprimento.

Nos autos não resultou provado que tais contratos tenham sido alterados.

Resulta igualmente provado que a EDA na sua carta de intenção adjudicou a Adenda ao contrato inicial à M... (sociedade-mãe) e ao seu subempreiteiro da parte eléctrica A..., Eléctrica, Lda..

Acresce que a “A...” é referida, não só na identificada carta de intenção de adjudicação, como também no seu anexo “A”, ao distinguir-se a parte eléctrica (respeitante ao subempreiteiro A...), da parte mecânica (referente à M...).

Assim, os contratos em questão foram celebrados entre a M... (sociedade-mãe) e a EDA, tendo aquela subempreitado a parte eléctrica à sociedade A....

Existem, pois, nos autos, elementos de que a montagem e instalação do equipamento foi assegurado pela casa-mãe, em resultado do expressamente contratado, como foi evidenciado no RIT.

Assim, procede o apontado erro de julgamento por errada valoração da prova.

3.3. Atentemos, agora, se ocorre o invocado erro de julgamento da matéria de direito.

No caso em apreço, como já ficou expresso, a sociedade-mãe (M...) criou uma sucursal (aqui Recorrida) em território nacional com o objecto definido na alínea c) do probatório.

O cerne da discórdia decorre do procedimento adoptado na liquidação do IVA na facturação emitida, referente ao contrato inicial e adenda em questão.

Na execução da segunda 2.ª fase do contrato e adenda, que ocorreu em 1997, foram emitidas as respectivas facturas, sendo que parte da facturação foi emitida pelo estabelecimento estável da M... em Portugal, e outra parte da facturação foi emitida pela sede da M..., e que reflectem as cláusulas contratuais do esquema de pagamentos, sendo certo que nos contratos nada se diz sobre o fracionamento ocorrido (cfr. alínea l) do probatório).

Assim, o procedimento adoptado resultou em fraccionar as facturas, de forma que as emitidas pela M..., não foi liquidado IVA e as facturas emitidas pela sua sucursal, foi liquidado IVA.

Entendendo a Administração Tributária que a liquidação de IVA devia ser efectuada sobre a totalidade da facturação, aqui sustentado pela Recorrente, e defendendo a Recorrida, por sua vez, que o IVA apenas é devido nas facturas emitidas pela sucursal, por as operações constantes das facturas emitidas pela sociedade mãe deverem ser tidas como intracomunitárias, estando, por isso, tais operações isentas, cabendo ao adquirente dos bens o pagamento do IVA.

Importa, antes de mais, que nos debrucemos sobre as relações entre a sociedade-mãe e a sucursal, bem como sobre a natureza jurídica dos estabelecimentos estáveis.

Uma sucursal configura, entre nós, uma realidade desprovida de personalidade jurídica, constituindo, apenas, uma extensão da própria entidade, sem património próprio e é criada nos termos do artigo 13.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).

De acordo com o disposto no n.º 1, do artigo 4.º do CSC, as sociedades que actuem em Portugal por mais de um ano devem constituir uma sucursal.

Nas palavras de Alberto Xavier «Não sendo pessoas colectivas distintas da sede, as agências ou sucursais (tanto de sociedades estrangeiras como de sociedade nacionais) revestem a natureza jurídica de meros estabelecimentos comerciais. Com efeito, importa distinguir neste caso a empresa, que é uma pessoa colectiva, e o estabelecimento, que é um simples conjunto de coisas corpóreas e incorpóreas, de bens e serviços, organizado pelo comerciante com vista ao exercício da sua actividade mercantil. Cada empresa pode ter mais do que um estabelecimento, representado, cada um, uma unidade económica.

Os estabelecimentos estáveis, por não erem personalidade jurídica própria, não podem figurar como partes em contratos de qualquer natureza. De harmonia com os ensinamentos da teoria geral do direito, parte (ou sujeito do negócio) é a pessoa titular dos interesses cuja regulamentação o contrato visa prosseguir. Onde não exista sujeito, por carência de personalidade jurídica, como sucede nos estabelecimentos estáveis, não pode falar-se em parte de um contrato. (…)

As relações internas entre a sede e a sucursal surgem de necessidades de economia e disciplina interna das organizações, podendo traduzir-se em movimentos de dinheiro, de mercadorias ou de pessoas de um para outro estabelecimento de uma pessoa colectiva. Todavia, tais relações não revestem a natureza de relações jurídicas, precisamente porque este conceito pressupõe logicamente a existência de dois sujeitos de direito e, no caso, existe apenas um.» (in Direito Tributário Internacional, 2.ª Edição Actualizada, Almedina, págs. 32 a 325).

Contudo, no âmbito do direito tributário reconhece-se à sucursal uma subjectividade distinta da sede, através da tributação independente e da contabilidade separada.

Ainda de acordo com Alberto Xavier «(…) entre nós, a autonomia patrimonial dos estabelecimentos não conduz à atribuição de personalidade jurídica, para efeitos fiscais, de tal sorte que o contribuinte continua a ser o residente no estrangeiro, só que tributado no país em que a sucursal se situa através de uma metodologia idêntica à das pessoas colectivas nele residentes. Com efeito, o artigo 13.º, n.º 1 do CIRS, e o artigo 2.º do CIRC, consideram sujeito passivo do imposto, não o estabelecimento estável, em si mesmo considerado, mas as pessoas singulares ou colectivas, residentes no estrangeiro, que sejam os seus titulares.

A autonomia dos estabelecimentos estáveis para efeitos tributáveis, conduz a que as relações com terceiros, sejam equiparadas a verdadeiras relações jurídicas geradores de rendimentos tributáveis e custos dedutíveis, como se o estabelecimento fosse uma entidade juridicamente independente.» (ob. cit. pág. 327).

No caso dos autos, a sociedade alemã não constitui em Portugal qualquer entidade jurídica com autonomia face a si. Ao criar a sucursal visou, actuar em Portugal, única e exclusivamente para a execução de empreitadas, designadamente a execução do contrato que celebrou com a EDA (cfr. alíneas c) e d) do probatório).

A sucursal foi, pois, criada para efeitos fiscais, imposto pela lei fiscal nas circunstâncias da actividade da M... em Portugal (empreitada/subempreitada com duração superior a 6 meses).

Nos termos das clausulas acordadas no contrato inicial e adenda, todas as obrigações, riscos e responsabilidades que directa ou indirectamente resultem da execução e conclusão dos contratos, incluindo fornecimento de bens, serviços de montagem e lançamento em exploração, eram da responsabilidade da M... (sociedade-mãe).

Dito por outras palavras, a relação jurídica estabeleceu-se entre a M... e a EDA, pois, por força do contrato e adenda celebrado, estabeleceram-se obrigações reciprocas, obrigando-se a EDA ao pagamento devido à M... (sociedade-mãe).

Ora, o artigo 9.º da Directiva IVA define «sujeito passivo» como qualquer pessoa que exerça uma actividade económica «de modo independente.»

De acordo com a jurisprudência reiterada do Tribunal de Justiça, uma sociedade estabelecida num Estado Membro e uma sua sucursal noutro Estado-membro constituem um só e mesmo sujeito passivo de IVA, a não ser que a sucursal exerça uma actividade económica independente (vide neste sentido, entre outros, Acórdão do TJUE de 23/03/2006, FCE Bank, C-210/04 e de 12/09/2013, Le Crédit Lyonnais, C-388/11, disponíveis em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/).

In casu, em face dos factos provados, na execução do contrato e da adenda ao mesmo celebrado entre a sociedade-mãe e a EDA, a sucursal da M... não agiu de modo independente, nem assumiu qualquer risco económico (cfr. Ac. do TCAS de 13/10/2016, proc. n.º 09658/16, disponível em www.dgsi.pt/).

De salientar que a liquidação adicional de IVA refere-se às facturas emitidas pela sociedade-mãe, nas quais não foi liquidado IVA, pelo que a apreciação que se segue restringe-se a essas facturas e em saber se o IVA devido era da responsabilidade do fornecedor ou do adquirente.

A Recorrente sustenta o entendimento vertido no RIT, de que cabia à Impugnante, aqui Recorrida, enquanto estabelecimento estável em Portugal, a responsabilidade pelo apuramento e entrega do imposto devido, nos termos do contrato celebrado, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 9.º do RITI, por se considerarem localizadas no território nacional e aí tributáveis as transmissões de bens expedidos ou transportados a partir de outro Estado membro, quando os bens sejam instalados ou montados em território nacional, pelo fornecedor, sujeito passivo noutro Estado membro, ou por sua conta.

Relembremos o que no RIT se deixou expresso para alicerçar a emissão da liquidação adicional de IVA impugnada, na parte relevante:

(…) Uma vez que apenas foi liquidado IVA sobre os valores das facturas emitidas pelo estabelecimento estável (quer as expressas em DM quer as expressas em PTE), mas não sobre as facturas emitidas pela sede, há que enquadrar a situação tributária daqui decorrente sob o ponto de vista jurídico-fiscal.

O IVA liquidado nas facturas emitidas correspondentes à parte local foi contabilizado e inscrito nas declarações periódicas.

Há que analisar, no entanto, se relativamente à operação acima descrita foram cumpridas todas as obrigações fiscais para o que se procede ao respectivo enquadramento.

Em conformidade com o estabelecido na Directiva n° 91/680/CEE, do Conselho, de 16 de Dezembro de 1991, Portugal transpôs para o direito interno o conjunto das medidas necessárias para a realização do mercado interno europeu, seguindo de perto o articulado no referido ciclo comunitário, através do Decreto-Lei n° 290/92, de 28 de Dezembro, publicado no Diário da República - I Série A, n° 298, de 28/12/1992, o qual aprova e faz entrar em vigor em 1 de Janeiro de 1993 o Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (doravante designado por RITI).

De realçar que aquele acto comunitário altera e complementa a Directiva n°77/388/CEE de 17 de Maio, conhecida por 6ª Directiva e relativa à harmonização das legislações dos Estados Membros, a qual constitui o texto normativo básico do sistema comum comunitário de Imposto sobre o Valor Acrescentado.

Nesta base e de acordo com o disposto na alínea a) do n° l do artigo 8° daquela Directiva, “Quando o bem deva ser instalado ou montado, com ou sem ensaio de funcionamento, pelo fornecedor ou por conta deste, por lugar de entrega emende-se o lugar onde se efectua a instalação ou montagem. "

Esta base comunitária encontra-se expressa no artigo 9º do RITI que introduziu no nosso ordenamento jurídico as regras de harmonização transitória de um regime definitivo do IVA, baseado na tributação do imposto na origem, conforme o artigo 28º- M da 6ª Directiva no que respeita à localização das transmissões de bens com instalação ou montagem.

Enquanto esse regime definitivo não for implementado, o princípio geral aplicável nas transmissões entre sujeitos passivos nacionais devidamente identificados para efeitos de IVA, os quais realizem operações tributáveis que lhes confere direito à dedução total ou parcial do imposto e sujeitos passivos devidamente registados em outros Estados membros da CEE é, pois, o da liquidação de imposto no país de destino dos bens.

De acordo com o disposto no n°2 do artigo 9º do RITI consideram-se localizadas no território nacional, e consequentemente, aí tributáveis as transmissões de bens expedidos ou transportados a partir de outro Estado membro, quando os bens sejam instalados ou montados em território nacional, pelo fornecedor, sujeito passivo nesse outro Estado membro, ou por sua conta.

Ou seja, este n°2 enquadra os casos em que a instalação ou montagem ocorre em território nacional pelo que a transmissão desses bens se verifica em Portugal e como tal são tributados.

Ao invés, o n°l daquele artigo regulamenta as transmissões de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta para fora do território nacional, quando os bens sejam instalados ou montados no território de outro estado membro. Nesta situação, o disposto no n°l do artigo 6° não terá aplicação, isto é este tipo de transmissões não é tributável em Portugal.

Isto é, o n°l enquadra os casos em que a instalação ou montagem tem lugar noutro Estado membro, ainda que os bens sejam expedidos a partir do território nacional, casos estes em que não haverá lugar a tributação em Portugal.

O articulado do artigo 9º do RITI define, por conseguinte, a regra da localização aplicável às transmissões de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta para outro Estado membro, para aí serem instalados ou montados, que é a do princípio da tributação no país de destino.

E o disposto no n°2 do artigo 9° do RITI localiza em Portugal a transmissão de bens cuja instalação ou montagem é aqui efectuada pelo fornecedor sujeito passivo noutro Estado membro, que expediu ou transportou tais bens a partir do respectivo país.

Efectivamente, a transferência de bens para serem objecto de instalação ou montagem não origina uma transmissão intracomunitária (o que equivale a dizer que o adquirente desses bens - a E..., EP - não faz uma aquisição intracomunitária desses bens), sendo sempre tais operações tributadas no país de destino, independentemente do respectivo valor.

Note-se que a operação se considera como localizada no território nacional, cabendo ao fornecedor que procede à instalação ou montagem, ou a qual é efectuada por sua conta, a responsabilidade pelo apuramento e entrega do imposto que se mostre devido. Ou seja, estas transmissões são internas, ainda que pressuponham um movimento intracomunitário de bens.

Isto também significa que as referidas operações não serão consideradas aquisições intracomunitárias de bens, muito embora a legislação que as rege se insira no RIPI.

Posto isto, torna-se demasiado evidente que a operação atrás descrita efectuada pela sede da M... se enquadra, indubitavelmente no n°2 do artigo º do RJTJ. E repare-se que estão preenchidos na íntegra os requisitos para que tal aconteça:

a) - trata-se de uma empresa sediada num Estado membro e que é aí sujeito passivo;

b) - que fornece um bem - grupo gerador diesel de 2 Mw e equipamento conexo;

c) - com instalação ou montagem, e lançamento em operação industrial, o mesmo é dizer com ensaios e colocação em serviço em território nacional;

d) — expedido ou transportado a partir de outro Estado membro;

e) - para um cliente sujeito passivo em Portugal, a E..., EP, com sede em Ponta Delgada;

f) - tendo também recorrido à A..., Ldª para o fornecimento, montagem, testes e colocação em serviço da parte eléctrica do gerador, conforme decorre da cláusula de discriminação dos preços relativos À 2.ª fase do contrato e adenda;

g) - que possui estabelecimento estável em Portugal para o qual foi nomeado um director.

(...)

De salientar e de acordo com o ponto 8 daquela informação que como a M... possui em Portugal estabelecimento estável a este competirá o cumprimento das obrigações derivadas da aplicação das normas do Código do IVA, designadamente a liquidação do imposto sobre a totalidade da facturação emitida para o cliente português. E frisa-se que é sobre a totalidade da facturação, ou seja, quer sobre a emitida pelo estabelecimento estável quer sobre a da sede e não apenas sobre a do estabelecimento estável.

E o estabelecimento estável da M... não liquidou IVA sobre a facturação emitida pela sede relativa à parte estrangeira do preço do contrato.

Por sua vez, a Recorrida advoga, em síntese, que as operações de comercialização dos produtos praticados pela casa-mãe devem ser tidas como intracomunitárias, cabendo ao adquirente dos bens o pagamento, em território nacional do IVA devido, nos termos dos artigos 1.º, alínea a), 2.º, alínea a), 3.º e 28.º, n.º 1do RITI, e que a instalação em Portugal da Recorrida, enquanto estabelecimento estável só pode ser compreendida no sentido da instalação, montagem, supervisão e manutenção dos equipamentos em causa, resultando um fracionamento do objecto contratual. Mais alega que nem todos os proveitos advenientes do contrato e adenda em causa, são imputáveis ao estabelecimento em Portugal, apenas sendo parte deles, que a Recorrida facturou para efeitos de IRC e IVA, como resulta da Convenção para evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e a Alemanha.

Porém, nos presentes autos não estão em causa proveitos, mas a liquidação de IVA sobre a totalidade do preço do contrato e adenda. E como é consabido o IRC e o IVA não dependem de aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito.

De referir ainda que em sede de IVA não são aplicáveis os mecanismos destinados a impedir a dupla tributação constantes das Convenções para Evitar a Dupla Tributação, as quais só têm aplicação em sede de IRC e IRS.

Como já deixamos expresso supra, a Recorrida não agiu no âmbito da execução dos contratos de forma independente, nem assumiu quaisquer riscos, não sendo relevante a intermediação da sucursal em representação da sociedade-mãe no cumprimento dos contratos, pois, o que releva é a realidade económica por trás das operações tributáveis.

A questão está, pois, em saber se o contrato e adenda dos autos, de acordo com matéria de facto dada como assente, se subsume ao estatuído no n.º 2 do artigo 9.º do RITI.

Para efeitos de IVA, os critérios de localização dos bens e da prestação de serviço, seguem de perto os critérios definidos pela 6.ª Directiva da CE, de 17 de Maio de 1977, e Directiva n.º 2006/112/CE, do Conselho que reformulou aquela por questões de clareza e racionalidade sem, contudo, ter introduzido alterações de substância.

O princípio fundamental consagrado no artigo 1.º do CIVA é o de que são tributáveis em Portugal as transmissões de bens e as prestações de serviço efectuadas no território português.

Porém, esta regra geral é complementada por outras, prevendo-se elementos de conexão de determinação mais precisa e excepções, cujo regime não cabe apreciar no presente caso, por aqui estar em causa operações de transmissão de bens com montagem entre dois Estados membros.

A 6.ª Directiva da CEE, no que concerne à transmissão de bens com instalação ou montagem adoptou como critério de localização o lugar onde se efectua a instalação ou montagem.

A Directiva n.º 91/680/CEE, de 16 de Dezembro, que completa o sistema comum do IVA e altera, tendo em vista a abolição das fronteiras fiscais, a Directiva 77/3888/CEE, foi transporta para a ordem interna pelo Dec.-Lei n.º 290/92, de 28 de Dezembro, que aprovou o Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI).

Este regime assumido como transitório, destinado a vigorar 4 anos, mantem-se em vigor na actualidade, por falta de consenso na passagem a um regime definitivo prevendo a Directiva 91/680/CEE que passado o período transitório esta se vai automaticamente prorrogando até que se passe ao regime definitivo.

As normas do RITI prevalecem sobre as do Código do IVA, aplicando-se a disciplina geral prevista neste último Código com as devidas adaptações, caso não seja aplicável nenhuma norma do RITI, por força do estatuído no artigo 33.º do RITI.

O RITI define no artigo 1.º a regra geral de incidência subjectiva nas transacções intracomunitárias, no artigo 2.º a incidência subjectiva e o conceito de aquisição de aquisição intracomunitária de bens no artigo 3.º.

No que respeita especificamente à localização das aquisições intracomunitárias de bens, a regra geral encontra-se ínsita no n.º 1, do artigo 8.º do RITI, que dispõe: São tributáveis as aquisições intracomunitárias de bens quando o lugar de chegada da expedição ou transporte com destino ao adquirente se situe no território nacional.

O artigo 9.º do RITI, consagra uma regra especifica para a “Localização das transmissões de bens com instalação ou montagem”, preceituando o seguinte:

«1 – O disposto no n.º 1 do artigo 6.º do Código do IVA não tem aplicação relativamente a transmissões de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta para fora do território nacional quando os bens sejam instalados ou montados no território de outro Estado membro.

2 – São, no entanto, tributáveis as transmissões de bens expedidos ou transportados a partir de outro Estado membro quando os bens sejam instalados ou montados em território nacional, pelo fornecedor, sujeito passivo nesse outro Estado membro, ou por sua conta.»

Por sua vez, a alínea a) do n.º 2 do artigo 7.º do RITI, estatui:

«2 – Não são, no entanto, consideradas transmissões de bens, nos termos do número anterior as seguintes operações:

a) Transferência de bens para serem objecto de instalação ou montagem noutro estado membro nos termos do n.º 1 do artigo 9.º (…)»

Nos termos dos artigos 9.º e 7.º, n.º 2, alínea a) do RITI, nos casos de transmissões de bens com instalação ou montagem noutro Estado membro, os movimentos de bens não dão origem a transacções intracomunitárias de bens, pelo que estão excluídas do conceito de transmissão de bens, considerando-se operações internas, ainda que pressuponham um movimento intercomunitário de bens.

Sobre as regras de localização dos bens a instalar ou montar previstas no artigo 9.º do RITI, diz Clotilde Celorico Palma «O n.º 2 do citado normativo determina que são tributáveis no território nacional as transmissões de bens expedidos ou transportados a partir de outro Estado membro, quando os bens sejam instalados ou montados no território nacional, pelo fornecedor, sujeito passivo nesse outro Estado membro, ou por sua conta.

Inclui-se nesta norma, por ex., a transmissão de um elevador de Espanha para Portugal para ser objecto de instalação ou montagem no território nacional. A transmissão do bem não é tributável nem a título de transmissão intracomunitária de bens nem a título de aquisição intracomunitária de bens, dado que a operação é excluída do conceito de transmissão de bens. Trata-se de uma simples transmissão de bens localizada em Portugal, pelo que o espanhol passará a ser sujeito passivo de IVA no território nacional, com as consequências daí subjacentes.» (in Introdução ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, 3.ª Edição, Almedina, págs. 278).

No mesmo sentido escreve Alberto Xavier «Caso se esteja perante entregas de bens de um Estado-membro para outro, para nesse outro Estado-membro serem objecto de instalação ou montagem, toda a operação é tributada como transmissão de bens localizada no Estado-membro onde ocorre a instalação ou montagem.» (ob. cit., pág. 246).

Face a todo o exposto, e do enquadramento legal, forçoso é concluir que numa situação como a dos autos, em que o fornecedor criou uma representação através da criação de uma sucursal, se está em presença de uma transmissão de bens realizada em Portugal, nos termos do n.º 2, do artigo 9.º do RITI, não sendo legalmente admissível diferenciar os pagamentos a efectuar nos termos do contrato e adenda em questão, através do fracionamento da facturação, por forma a enquadrar os montantes a pagar pelos equipamentos como aquisição intracomunitária de bens, por a transmissão destes terem sido objecto de montagem pelo fornecedor, pelo que toda a operação é tributável, cabendo ao fornecedor a responsabilidade pelo apuramento e entrega do imposto que se mostre devido em toda a operação, visto que as transmissões de bens são internas, ainda que pressuponham um movimento intercomunitário de bens.

Ressalvado o respeito devido a outras opiniões, crê-se não ser passível de acolhimento a argumentação da Recorrida na conclusão H) das suas contra-alegações, de que cabe ao adquirente dos bens o pagamento, em território nacional, do IVA devido, porque este não fez uma aquisição intracomunitária de bens e isenta, nem são aplicáveis as normas que indica (quer na petição inicial, quer agora em sede contra-alegações), insistindo em desconsiderar o regra especifica previsto no artigo 9.º, n.º 2 do RITI relativo às transmissões de bens com instalação ou montagem, onde se enquadram as operações previstas e reguladas no contrato inicial e adenda em causa.

A sujeição a imposto deriva do facto de a transmissão de bens com montagem se enquadrar no n.º 2, do artigo 9.º do RITI, sendo apenas admissível caber ao adquirente substituir o fornecedor na liquidação do IVA, no caso do fornecedor não ter estabelecimento estável ou representante, o que não sucede no presente caso (cfr. artigos 2.º, n.º 1, alínea g) e 30.º, ambos do CIVA).

Concluindo, a decisão recorrida enferma do erro de julgamento que a Recorrente lhe assaca, pelo que julga-se o presente recurso procedente e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida, a qual viola do disposto no n.º 2, do artigo 9.º do RITI, ao que se procederá na parte dispositiva

3.4. Alega ainda a Recorrida que o entendimento de que o fornecimento de bens se tratava de uma operação intracomunitária foi partilhado pelo adquirente de bens, que liquidou o IVA (cfr. pontos 43, 44, 49 e 50 da contra-alegação e alínea H) das conclusões), matéria que já tinha invocado na petição inicial e que subsumiu à figura de duplicação de colecta.

Ora, a sentença recorrida julgou prejudicado o conhecimento da duplicação de colecta invocada na petição inicial, em face da solução que deu ao litigio, sendo uma uma ilegalidade do conhecimento oficioso (cfr. artigos 175.º do CPPT e 5.º, n.º 3 do CPC), que foi alegada pela recorrida nas suas contra-alegações, pelo que julgamos desnecessário proceder à audição das partes, por não configurar uma decisão surpresa, questão que agora se impõe conhecer, atento o principio da economia processual.

A duplicação de colecta é proibida por lei, quando ela deriva da emissão de uma nova liquidação e está pago por inteiro tributo liquidado, relativamente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo, constituindo ilegalidade essa nova liquidação, susceptível de ser invocada em processo de impugnação judicial, que pode ter como fundamento «qualquer ilegalidade» (artigo 99.º do CPPT e 78.º, n.º 6 da LGT).

O artigo 205º, n.º 1 do CPPT dispõe que haverá duplicação de colecta quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou de diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo.

É, pois, necessária a verificação cumulativa dos seguintes requisitos:

a) unicidade de facto tributário;

b) identidade da natureza entre o imposto já pago e o que de novo se exige;

c) coincidência temporal entre o imposto pago e o que se pretende cobrar.

No que respeita a esta questão, é de referir que não resultou provado nos autos que o alegado IVA liquidado pela EDA tenha sido entregue ao Estado, sendo certo que, no RIT, não foi tal circunstância, em momento algum, reconhecida pela AT.

Aliás, sobre esta matéria escreveu-se no RIT:

De referir que nestas situações é frequente incorrer-se num erro de apreciação e que é o seguinte: se a M... não liquidou IVA embora o devesse ter feito mas se esta obrigação foi eventualmente cumprida pelo adquirente então o Estado português não ficou lesado. Esta apreciação é incorrecta pelos motivos a seguir indicados.

Em primeiro lugar, a obrigatoriedade de liquidação deriva do facto de se terem verificado os pressupostos, ou melhor, actos ou situações que integram a previsão das normas de incidência.

Em segundo lugar, uma vez preenchido o requisito de incidência, a liquidação propriamente dita que está prevista nos artigos 19° a 25° e 26° do C1VA não é facultativa, pelo contrário é obrigatória. Do ponto de vista de cálculo o apuramento final da dívida do imposto faz-se através de uma operação subtractiva.

Em terceiro lugar, e desde que se verifique a existência de estabelecimento estável a obrigatoriedade de liquidação é a ele que lhe compete nos termos do artigo 29º do CIVA, não podendo ser transferida para outrem por não ser admissível, dado não se encontrar prevista na lei fiscal, uma situação com contornos de substituição tributária.

(...)

Desconhece-se, por motivos óbvios, se a E.... EP terá ou não liquidado aquele imposto em falta. Se assim aconteceu, fê-lo indevidamente tornando-se, por esse motivo, sujeito passivo do imposto conforme alínea c) do n°l do artigo 2° do CIVA, situação que não desobriga o estabelecimento estável da M... dos seus deveres de liquidação e entrega de imposto. Não releva aqui o procedimento adoptado pelo adquirente até porque isso também dependerá do tipo de sujeito passivo que é quanto ao respectivo enquadramento.

O que releva sim é que a reposição da legalidade passa pela liquidação ao estabelecimento estável em Portugal da M... do IVA que se mostra devido.

Não é pois sobre a E..., EP adquirente dos bens, que recai a obrigatoriedade de liquidação do IVA, o que só aconteceria se a M... não possuísse estabelecimento estável ou em alternativa não tivesse nomeado representante legal, também nos termos do artigo 29° do CIVA.

Secundamos tal entendimento da AT.

O Supremo Tribunal Administrativo, em Acórdão de 27/02/2017, proferido no processo n.º 01079/12, pronunciou-se em situação similar, que sufragamos, cujo sumário, com a devida vénia, transcrevemos:

«I – Por aplicação das regras gerais, o prestador de serviços é o sujeito passivo de IVA, mas nas denominadas situações reversão da dívida tributária ou inversão da sujeição ou do sujeito passivo (reverse charge) o adquirente dos serviços ou dos bens torna-se o sujeito passivo do imposto pela respectiva aquisição, devendo proceder, em conformidade, à liquidação do imposto, sendo-lhe atribuído o direito à dedução do IVA pago pela aquisição dos serviços.

II – A duplicação da colecta, prevista no art. 205º do CPPT, resulta da aplicação do mesmo preceito legal mais do que uma vez ao mesmo facto tributário ou situação tributária concreta, sendo que a não exigência de segundo pagamento, a que a invocação da duplicação de colecta se reconduz, apenas se pode justificar se o primeiro era devido, pois, se não o foi, o que foi pago poderá ser ulteriormente reembolsado, através dos meios adequados de impugnação e revisão do acto tributário e, numa situação desse tipo, não se justifica que se prescinda do segundo pagamento, que é efectivamente devido.» (disponível em www.dgsi.pt/).

Sendo, como é, o verdadeiro devedor do imposto o fornecedor de bens com montagem, caso o adquirente tenha efectuado a liquidação de IVA e pago por erro o imposto à Autoridade Tributária, pode exigir o reembolso do montante pago indevidamente.

O TJUE afirmou já em diversos acórdãos que não havendo regulamentação da União em matéria de pedidos de restituição de impostos, cabe ao ordenamento jurídico interno de cada Estado-membro prever as condições em que esses pedidos podem ser exercidos.

Cita-se, por todos, o Acórdão do TJUE, proferido no processo n.º C-712/17, de que se transcreve a seguinte passagem:

«A este respeito, deve recordar-se que, não havendo regulamentação da União em matéria de pedidos de restituição de impostos, as vias processuais destinadas a garantir a proteção dos direitos que decorrem para os cidadãos do direito da União dependem do ordenamento jurídico interno de cada Estado-Membro, por força do princípio da autonomia processual dos Estados-Membros, devendo as condições em que esses pedidos podem ser exercidos respeitar os princípios da equivalência e da efetividade, isto é, não devem ser menos favoráveis do que as condições relativas a reclamações semelhantes baseadas em disposições de direito interno, nem organizadas de modo a impossibilitar ou tornar excessivamente difícil na prática o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (disponível em http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf; vide ainda neste sentido, Acórdão de 15/03/2007, Reemtsma Cigarettenfabriken, C-35/05, Eu:C:2007 e Acórdão de 26/04/2017, Farkas, C-564/15, EU:C:2017:302).

Pelo exposto, não assiste razão à Recorrida.

Concluindo, a AT logrou demonstrar que se verificavam os pressupostos fáctico-jurídicos fundamentadores da sua actuação e, por outra banda, a Recorrida não logrou demonstrar a tese que defende.

Termos em que na procedência das conclusões de recurso da Fazenda Pública relativas à anulação da liquidação adicional de IVA do ano de 1997 e respectivos juros compensatórios, impõe-se revogar a decisão da primeira instância, e em substituição, julgar improcedente a invocada duplicação de colecta.


*

Conclusões/Sumário:

I. Uma sucursal configura, entre nós, uma realidade desprovida de personalidade jurídica, constituindo, apenas, uma extensão da própria entidade, sem património próprio e é criada nos termos do artigo 13.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).

II. De acordo com a jurisprudência reiterada do Tribunal de Justiça, uma sociedade estabelecida num Estado Membro e uma sua sucursal noutro Estado-membro constituem um só e mesmo sujeito passivo de IVA, a não ser que a sucursal exerça uma actividade económica independente (vide neste sentido, entre outros, Acórdão do TJUE de 23/03/2006, FCE Bank, C-210/04 e de 12/09/2013, Le Crédit Lyonnais, C-388/11, disponíveis em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/).

III. As normas do RITI prevalecem sobre as do Código do IVA, aplicando-se a disciplina geral prevista neste último Código com as devidas adaptações, caso não seja aplicável nenhuma norma do RITI, por força do estatuído no artigo 33.º do RITI.

IV. Nos termos dos artigos 9.º e 7.º, n.º 2, alínea a) do RITI, nos casos de transmissões de bens com instalação ou montagem noutro Estado membro, os movimentos de bens não dão origem a transacções intracomunitárias de bens, pelo que estão excluídas do conceito de transmissão de bens, considerando-se operações internas, ainda que pressuponham um movimento intercomunitário de bens.

V. A sujeição a imposto deriva do facto de a transmissão de bens com montagem se enquadrar no n.º 2, do artigo 9.º do RITI, sendo apenas admissível caber ao adquirente substituir o fornecedor na liquidação do IVA, no caso do fornecedor não ter estabelecimento estável ou representante, o que não sucede no presente caso (cfr. artigos 2.º, n.º 1, alínea g) e 30.º, ambos do CIVA).

VI. Sendo, como é, o verdadeiro devedor do imposto o fornecedor de bens com montagem, caso o adquirente tenha efectuado a liquidação de IVA e pago por erro o imposto à Autoridade Tributária, pode exigir o reembolso do montante pago indevidamente.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso jurisdicional, revogar a sentença recorrida, e, em substituição, julgar a impugnação totalmente improcedente.

Custas pela Recorrida nesta instância de recurso e em primeira instância

Notifique.

Lisboa, 11 de Março de 2021.


*

A Juíza Desembargadora,
Maria Cardoso
(assinatura digital)

(A Relatora consigna e atesta, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, o voto de conformidade com o presente Acórdão das restantes Juízas Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Exmas. Senhoras Juízas Desembargadoras Catarina Almeida e Sousa e Hélia Gameiro Silva).