Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03575/09
Secção:Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/25/2009
Relator:Pereira Gameiro
Descritores:ISENÇÃO DA PRESTAÇÃO DE GARANTIA
Sumário:1. Sobre o requerente da isenção da prestação de garantia incumbe o ónus da prova dos pressupostos contidos no art. 52 nº4 da LGT (prejuízo irreparável ou insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da quantia exequenda e que não houve, em qualquer desses casos, dissipação de bens com intuito de diminuir a garantia dos credores).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – A Procuradora da República no TAF de Loulé e o executado João ...recorrem da decisão de fls. 534 a 543 do Mmo. Juiz do TAF de Loulé que julgou improcedente a reclamação que João ...apresentou contra o indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia pretendendo ambos a sua revogação, tendo, por decisão do STA de 7.10.2009, sido declarado competente este Tribunal para o conhecimento do recurso.

A Procuradora da República, nas suas alegações de recurso, formula as seguintes conclusões:
l - Mostra-se ferido de nulidade o despacho de fls. 408 que determinou a prestação de garantia, dado que não foi proferida no processo a informação de que a penhora já realizada não garante a totalidade da quantia exequenda, violando-se assim o disposto no art° 169° n°1 parte final do C.P.P.T., bem como o art° 98° n° 1 al. b) do C.P.P.T.
II - Constitui facto notório que não carece de prova nem de alegações, nos termos, do art° 514° do C.P.C., a existência de prejuízo irreparável para os efeitos previstos no art° 52° n° 4 da LGT, de concessão de isenção de garantia, sempre que a oposição deduzida pelo executado tenha sido judicialmente suspensa, dada a manutenção da garantia por tempo indeterminado, sem sujeição a qualquer prazo te caducidade, atenta a revogação do art° 183° A do C.P.P.T., operada pela Lei 53 A/2006.
III - Mostra-se inconstitucional, por violação do disposto nos art°s 2°, 13°, 20° e 62°, a norma constante do art° 52° n°4 da L.G.T., quando interpretada no sentido de que não constitui prejuízo irreparável a exigência de prestação de garantia a um executado que tenha deduzido oposição, quando esta tenha sido declarada judicialmente suspensa.
IV - Pelo exposto, foram violadas as disposições do art° 169° n°1 e 98° n°1 do C.P.P.T., art° 52° n° 4 da LGT. e art°s 10° e 148° n° 2 do C.P.P.T , bem como os art°s 2º, 13º 20º 62º 168º nº1 al.q) e 201º nº 1 al. b) da C.R.P..
Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que tenha em consideração as conclusões atrás formuladas.

Por sua vez o recorrente João ...formulou as conclusões seguintes:
1 - Constitui facto notório que não precisa de prova nem de alegação, nos termos do art. 514° do Código de Processo Civil, a existência de prejuízo irreparável, para os efeitos previstos no art. 52°, n°4, da LGT, de concessão de isenção de garantia, se a oposição deduzida pelo executado, foi judicialmente suspensa, mantendo-se a garantia.
2 - A não ser assim, a norma constante do n°4, do art. 52° da LGT, quando interpretada no sentido de que não constitui prejuízo irreparável a exigência de garantia ao executado cuja oposição tenha sido declarada judicialmente suspensa, mostra-se inconstitucional, por violação do disposto nos artºs. 2°, 13°, 20°, 62° e 268° da CRP.
3 - Foi feita prova adequada e suficiente do prejuízo irreparável que sofreu na sua saúde, encontrando-se a sua vida sob risco intenso.
4 - A prova de que o ora recorrente não contribuiu para a insuficiência ou inexistência de bens, resulta, directa e imediatamente da sentença que julgou a instância executiva suspensa e,
5 - Por último o próprio despacho de fls. 408, que determinou a prestação de garantia mostra-se ferido de nulidade, dado que não foi proferida no processo a informação de que a penhora já realizada não garante a totalidade da dívida exequenda, violando-se assim o disposto no art. 169°, n°1, parte final do CPPT, bem como o art° 98°, n°1, al. b) do CPPT.
6 - Face ao exposto, foram violadas as disposições dos art°s. 52°, nº4, da LGT, 2°, 13°, 20°, 62° e 268° da CRP e, 169°, n°1 e 98°, n°1, al. b) do CPPT.
Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis deve a douta sentença recorrida ser revogada com tocas as consequências, como é de Justiça.

Contra alegou a exequente recorrida Caixa Geral de Depósitos, SA terminando as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo:
1.ª As alegações e conclusões do recurso interposto pelo executado/ reclamante João Rodrigues Martins, são dirigidas ao Tribunal Central Administrativo do Sul, contudo versam apenas matéria de direito e são uma reprodução do contido nas alegações de recurso apresentadas pela Ilustre Procuradora da República em 31.03.2008, a fls., 547 a 575 dos presentes autos, alegações essas que foram então dirigidas pela Ilustre Procuradora ao Supremo Tribunal Administrativo.
2.ª Como as questões suscitadas nas alegações e conclusões do recurso interposto pelo executado/ reclamante João ...versam apenas matéria de direito e se encontram contidas nas alegações de recurso apresentadas pela ilustre Procuradora da República, relativamente a ambas as alegações a exequente/ recorrida apresenta uma única contra -alegação dirigida ao Supremo Tribunal Administrativo;
3 .ª No caso de existência de penhora de bens, a informação a que alude o n.°1, do artigo 169.°, do CPPT, tem de ser prestada apenas e tão só quando no processo executivo tenham sido penhorados ao executado bens que garantam a totalidade da dívida exequenda;
4.a Tal informação destina-se a prevenir que seja exigida a prestação de garantia a executado cujo valor dos bens já penhorados no processo garantam a totalidade da quantia exequenda e acrescido;
5.a No caso concreto, ao executado João ... não havia sido penhorado qualquer bem, pelo que a informação a que alude o n.°1, do artigo 169.°, do C. P. P. T., não tinha de ser prestada;
6.ª Mesmo que se entenda que, no caso duma pluralidade de executados, o que interessa é que os bens já penhorados a alguns deles garantam a totalidade da quantia exequenda e acrescido, no caso concreto dos autos, tal informação não tinha de ser prestada dado que o que se encontra penhorado nos lutos de execução é apenas a percentagem de 1/3 da pensão mensal auferida por dois executados, cujo valor é irrisório para garantir a liquidação da quantia exequenda e acrescido liquidada pelo serviço de finanças em 82.428,19 €;
7.a Independentemente de ter sido invocado o disposto na alínea b), do n.°1, do artigo 98.°, do CPPT, há que ter em atenção o facto da Ilustre Procuradora da Republica vir suscitar agora a nulidade do despacho de fIs., 408, por falta dessa informação, quando é um facto que, no parecer que emitiu em 15.03 2008, a fIs., 529 a 533, antes da prolação da douta sentença recorrida, nada disse quanto à existência de tal nulidade.
8.a Não existe qualquer nulidade processual no despacho de fls., 408, dado que a informação a ele subjacente só tinha de mencionar a existência de bens penhorados se estes fossem suficientes para garantir o pagamento da totalidade da quantia exequenda e acrescido o que não é o caso dos autos de execução.
9.a Quem deduziu a oposição foi o executado e não a exequente. A exequente tem o dever de promover a acção executiva, contudo, não tem o dever de promover o processo de oposição.
10.ª Não é verdade que o processo de oposição fique eternamente suspenso (vide o disposto nos n.°s 1 a 3, do artigo 15.°, do CPTA, aplicável ex- vi da alínea c), do artigo 2.°, do CPPT), pelo que não é um facto notório a existência de prejuízo irreparável para o executado para efeitos do disposto no n.°4, do artigo 52.°, da LGT;
11.ª Assim sendo, a invocação da manutenção da garantia por tempo indeterminado, sem sujeição a prazo de caducidade é destituída de fundamento, nada tendo a ver com a situação a alteração operada pela Lei 53-A/2006, na redacção do artigo 183°-A, do CPPT.
12.ª A exigência de prestação de garantia não constituí qualquer prejuízo irreparável para o executado que tenha deduzido oposição à execução, quando esta oposição tiver sido declarada judicialmente suspensa, face ao disposto no artigo 15.°, do CPTA, aplicável ex-vi da alínea c), do artigo 2.°, do CPPT. ;
13.ª Assim sendo, a norma constante do n.°4, do artigo 52.°, da LGT, na interpretação que a Ilustre Procuradora da República refere, não padece de qualquer inconstitucionalidade, não violando o disposto nos art.°s 2.°, 13.°, 20° e 62.°, da CRP. 14.ª A douta decisão recorrida não merece qualquer censura.
Nestes termos, e contando com o Douto suprimento de Vossas Excelências para as lacunas do patrocínio, sempre deve ser negado provimento aos recurso e em consequência, manter-se a Douta Decisão recorrida, por não merecer qualquer censura,
Procedendo conforme se regue, será feita a costumada e esperada JUSTIÇAI

Sem os vistos legais dado o carácter urgente do processo, cumpre decidir.
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II – Na sentença recorrida deu-se, como assente, a seguinte matéria de facto:

A) - Em 22/09/1992, a Caixa Geral de Depósitos requereu a instauração dos presentes autos de execução contra a Sociedade de..., pessoa colectiva n.° ..., com sede na Rua ...., em Vila Real de Santo António, para cobrança coerciva de dívida decorrente de empréstimo, cfr. fls. 3 a 8 destes autos.
B) - São fiadores e principais pagadores da obrigação exequenda Filipe ... e mulher Maria ... e João ...e mulher Maria ..., cfr. fls. 3 destes autos.
C) - Em 22/05/2007, a Administração Fiscal enviou ao Oponente o oficio 4857 do seguinte teor (fls. 265):
Assunto: EMPRÉSTIMO CONTRAÍDO PELA SOCIEDADE PESCAS RAINHA DO SUL, LDA
«Em resposta ao requerimento apresentado pela Sociedade de ..., Lda., NIPC ..., cumpre-me informar que consultada a Direcção Assuntos Jurídicos SAJ — 1ª Secção III da Caixa Geral de Depósitos, conclui-se que os empréstimos n.° 0909/000202/481/0019 e 0909/000204/081/0019 não estão liquidados encontrando-se em divida o montante de € 63.042,47 acrescido de juros e custas processuais.
Assim, informo que o Processo executivo irá prosseguir os seus termos para penhora e venda dos bens existentes em nome da Sociedade de Pescas Rainha do Sus Lda., e/ou dos seus principais fiadores.» — Cfr. fls. 265 a 267 destes autos.
D) - O Reclamante foi citado em 31/05/2007, cfr. fls. 276 a 278 destes autos.
E) - Em 02/07/2007, deduziu oposição à execução fiscal, cfr. cota de fls. 279.
F) - Por despacho de 21/11/2007 foi liminarmente admitida a oposição à execução fiscal, cfr. fls. 406 destes autos.
G) - Em 06/12/2007, o ora Reclamante foi notificado por carta regista com aviso de recepção para prestar garantia, cfr. fls. 410 a 412 destes autos.
H) - Em 27/12/2007, foi requerida a dispensa de prestação de garantia cfr. fls. 421 destes autos.
I) - O Escrivão do processo prestou em 07/01/2008, a seguinte informação (fls. 442):
«Cumpre-me levar ao conhecimento de V. Exa., o seguinte:
O contribuinte João..., portador do NIF — ..., residente na Rua ... — 2950-492 Cascais, apresentou neste Serviço de Finanças, em 27/12/2007, em resultado da notificação efectuada para o efeito, uma petição requerer a dispensa da prestação da garantia em de harmonia com o disposto no Artigo 170º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e no Artigo 52° n.° 4, da Lei Geral Tributária, na qualidade de revertida de Sociedade ... Lda., portadora do NIF ..., conforme processo de execução fiscal n.°1155199201600873, fazendo assentar tal petição, nos pressupostos de que o requerente tem como único rendimento certo permanente o que resulta da sua pensão de reforma, bem como o que resulta do exercício da actividade liberal, que para além de ser variável está fortemente condicionada pela sua idade 74 anos, não tendo condições de forma directa e imediata, dada a extensão da garantia A prestar, condições para lhe dar satisfação porquanto tal só seria possível com recuso a uma instituição financeira, não se apresentando viável o recurso aquelas entidades.
Consultando as diversas aplicações informáticas, verifiquei que:
- Rendimento auferidos pelo requerente no ano de 2006, conforme listagem em anexo Categoria H—€22.961,00, Categoria B-€89.500,00;
- Imposto Municipal sobre Imóveis, consta bens imóveis susceptíveis de penhora, conforme listagem que se junta apresente informação;
- Imposto sobre Veículos/Circulação — Um veículo automóvel ligeiro de passageiros, marca Mercedes — Benz, matricula 78-16-XP;
- E tudo, o que me cumpre informar.
Serviço de Finanças de Vila Real de Santo António, 07 de Janeiro de 2008.»
J) - Em 07/01/2008 foi proferido o despacho ora sob reclamação (fls. 442), donde resulta:
«Em face da petição apresenta nestes Serviços, em 27/12/2007, vem João ..., portador do NIF — ..., residente na Rua... — 2950-492 Cascais, em resultado da notificação efectuada para o efeito, requerer a dispensa da prestação da garantia, de harmonia com o disposto no Artigo 170° do Código de Procedimento e de Processo Tributário e no Artigo 52° n.° 4 da Lei Geral Tributária, na qualidade de revertido de Sociedade ..., Lda., portadora do NIF — ...., conforme processo de execução fiscal nº 1155199201600873, fazendo assentar tal petição, nos pressupostos de que o requerente tem como único rendimento certo e permanente o que resulta da sua pensão de reforma, bem como o que resulta do exercício da actividade liberal que para além de ser variável está fortemente condicionada pela sua idade - 74 anos, não tendo condições de forma directa e imediata, dada a extensão da garantia a prestar, condições para lhe dar satisfação, porquanto tal só seria possível com recurso a uma instituição financeira, não se apresentando viável o recurso aquelas entidades.
Reconhecendo a tempestividade na apresentação da petição e a legitimidade do requerente para o pedido e considerando, os rendimentos auferidos no ano de 2006 e que o mesmo tem bens imóveis, em seu nome, nos Concelhos de Celorico da Bera e Gouveia, os quais podem valer como garantia, nos termos do art. 169° e 199° ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, INDEFIRO o pedido de dispensa de prestação de garantia.
Notifique-se o contribuinte, através de carta registada c/aviso de recepção, enviando-lhe cópia da presente decisão, comunicando-lhe que o presente acto é susceptível de reclamação para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, de harmonia com o preceituado nos Art.°276° a 278° do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Serviço de Finanças de Vila Real de Santo António, 07 de Janeiro de 2008.
O Chefe de Finanças.»
L) - A antecedente despacho foi notificado ao Reclamante, em 08/01/2008, por carta regista com aviso de recepção, cfr. fls. 444 a 446 destes autos.
M) - Em 23/01/2008, foi apresenta a presente reclamação, cfr. fls. 463 destes autos. • j
N) - O Oponente juntou documento comprovativo do internamento em estabelecimento hospitalar no Porto, desde o dia 03/01/2008 até ao dia 18/01/2008, cfr, fls. 470 destes autos.
O) - A Chefe do Serviço de Finanças de Vila Real de Santo António, em 29/01/2008, proferiu o seguinte despacho:
«O contribuinte João .., portador do NIF — ..., residente na Rua... — — Vila Cobres — 2950-4Z2 Cascais, na qualidade de revertido no processo de execução fiscal instaurado em nome de Sociedade ... Lda, portador do NIPC — ..., com sede na Rua ... — 8900 Vila Real de Santo António, apresentou em 23/01/2008, uma reclamação, nos termos do Art.° 276° do Código de Processo e CE Procedimento Tributário (C. P. P.T.), da notificação efectuada em 08/01/2008, nos termos do Art ° 215° do C.P.P. T., do despacho de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, proferido em 07/01/2008.
Face dos elementos existentes no Serviço de Finanças, constata-se que o contribuinte fundamentou o pedido de dispensa de garantia nos pressupostos de que tem como único rendimento certo e permanente o que resulta da sua pensão de reforma, bem como o que resulta do exercício da actividade liberal, que para além de ser variável está fortemente condicionada pela idade do mesmo — 74 anos — não tendo condições deforma directa e imediata, dada a extensão da mesma (82. 428, 19 €), para lhe dar satisfação.
Reconhecida a tempestividade e legitimidade na apresentação da petição, foi indeferido o pedido, tendo em consideração os rendimentos auferidos no ano de 2006 (Categoria H - € 22.961,00 e Categoria B - € 89.500,00), bem como os Bens Imóveis nos Concelhos de Celorico da Beira e Gouveia, conforme listagem a folhas 433 e 434, cujos prédios ainda não foram avaliados para efeitos de calculo de valor patrimonial nos termos do Código de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMl), sendo que, atendendo à sua descrição, nomeadamente o artigo urbano n.°40 da Freguesia do Minhocal, parece ser susceptível de garantir a divida, pelo que mantenho o meu despacho a folhas 442.
Foi paga a taxa de justiça inicial no valor de € 480, 00, através da transacção n.°90, de 22/01/2008 — NIP 122 862 341.
Face ao disposto nos Art.° n.°278° do C.P.P.T. junte-se a reclamação ao processo de execução fiscal e remeta-se ao Digníssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé.
Serviço de Finanças de Vila Real de Santo António, 29 de Janeiro de 2008».
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Aí se consignou que todos os factos têm por base probatória os documentos referidos em cada ponto e que de relevante.
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III - Expostos os factos, vejamos o direito.

A decisão recorrida, após equacionar que a questão a decidir consistia em saber se o pedido de dispensa de prestação de garantia se encontra fundamentado de facto e de direito e foi instruído com a prova documental necessária e sendo negativa a resposta fica prejudicado o conhecimento de outras questões, julgou improcedente a reclamação com base na seguinte fundamentação que, da mesma, se transcreve:
“Prevê o n.°4 do artigo 52,° da L.G.T.:
«A administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.»
Resulta do n.°3 do artigo 170.° do C.P.P.T.:
«O pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com aprova documental necessária.»
O reclamante pretende ser isentado da prestação de garantia por entender que tal prestação lhe causa prejuízo irreparável e, também, que não foi por responsabilidade sua que os bens da devedora principal se tornaram insuficientes ou inexistentes.
Os requisitos a que deve obedecer o pedido de dispensa da prestação de garantia já mereceram a atenção do Tribunal Central Administrativo Sul no acórdão de 19/12/2007, recurso n.° 02133/07, em www.dgsi.pt. , nos termos seguintes:
«Nos termos do disposto no art.° 52.° n.°4 da Lei Geral Tributária (LGT), aprovada pelo art.°1.° do Dec-Lei n.°398/98, de 17 de Dezembro, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 1999, por força do seu art.° 6.°, a administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.
Dando execução a esta norma substantiva, estipula a norma do art.°170 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que o pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária.
Temos assim que, o executado numa dada execução fiscal contra si instaurada, e que se encontre em alguma das situações subsumíveis à citada norma do art.° 52.° n.° 4 da LGT (no caso de a garantia lhe causar prejuízo irreparável ou no caso de manifesta falta de bens penhoráveis para o pagamento da dívida e do acrescido), pode requerer ao órgão da execução fiscal, a isenção dessa prestação, invocando os correspondentes factos e o direito aplicável ao caso, mas desde que em qualquer dos casos, a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado. Matéria esta que, desde logo, cabe ao requerente alegar, nos termos citados, como parte do direito que pretende ver reconhecido e como factos que lhe são pessoais e que ninguém melhor do que a requerente se encontrará em condições de os conhecer e, depois, os vir provar.
O que se encontra dentro do regime geral no que à aquisição das provas tange, quer no domínio do direito civil, em que se dispõe que àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado - art.° 342.° n.°1 do Código Civil (CC) - quer no domínio tributário, em que se dispõe que, o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque - art.° 74.° n.º1 da LGT - ou seja, aquele que invoca determinado direito tem de provar os factos que normalmente o integram; a parte contrária terá de provar, por seu turno, os fatos anormais que excluem ou impedem a eficácia dos elementos constitutivos (a incapacidade, a falta ou vícios da vontade, a impossibilidade do objecto, a fraude à lei, etc.) Cfr. Código Civil Anotado, 3.a Edição revista e actualizada, de Pires de Lima e Antunes Varela, Vol. I, nota 3., pág. 304..»
No caso dos autos, o Reclamante alega no artigo 3.° da reclamação que não tem qualquer responsabilidade directa ou indirecta na existência da dívida exequenda.
Tudo indica que assim seja, uma vez que foi chamado ao processo de execução porque os bens do principal devedor se tornaram insuficientes ou inexistentes.
No entanto, para além de atribuir a responsabilidade ao credor exequente, não indica qualquer facto que afaste a sua própria responsabilidade na insuficiência ou inexistência de bens, como lhe cabia.
E tal resulta quer do regime geral da prova quer, expressamente do disposto no artigo 170.°, n.° 3, do C.P.P.T. - o pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária.
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No que concerne ao prejuízo irreparável, o interessado deverá indicar em que é que ele se concretiza e indicar as razões que levam a crer que existe uma séria probabilidade de ele poder vir a ocorrer se não for dispensada a prestação de garantia — Cfr. neste sentido, Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 5.a Edição, 2007, volume II, de Jorge Lopes de Sousa, pág. 183, nota 4.
Refere o Reclamante que, por um lado, tem como único rendimento certo e permanente o que resulta da sua pensão de reforma e, por outro, que tem vinde a usufruir ainda do rendimento que resulta do exercício da actividade liberal.
De forma directa e imediata, dada a extensão da garantia a prestar, não tem a esfera jurídico - patrimonial do executado condições para lhe dar satisfação, porquanto, tal só seria possível com recurso a uma instituição financeira.
Não lhe é, possível obter qualquer tipo de caução bancária ou outra do tipo, porque face à sua situação tributária e à sua vida útil não há instituição que arrisque.
«É certo que, nos termos do disposto nos art.°s 99.° da LGT e 13.° do CPPT, vigora no direito tributário o princípio do inquisitório, segundo o qual o tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer.
Ao contrário do que ocorre no processo civil, no processo tributário a administração, que surge colocada processualmente numa posição oposta à do particular, não é titular de um interesse oposto ao do particular, antes está constitucional e legalmente obrigada a actuar exclusivamente subordinada ao interesse público e com imparcialidade, tanto nos processos administrativos como nos judiciais, por força do disposto nos art.°s 266.° n.°s1 e 2 da CRP e 55.° da LGT.
Porém, às normas que consagram tal princípio do inquisitório na descoberta da verdade material não se lhes podem dar total prevalência sobre outras normas contidas nos mesmos códigos e leis tributárias e que impõem ao contribuinte um ónus de alegar e provar os factos com relevo para a satisfação da sua pretensão, como acontece com a norma do art.° 74.° n.°1 da LGT quanto à distribuição do ónus da prova, em geral, e no caso, com a do art.° 170.° n.°3 do CPPT, que impõe ao interessado que elabore um pedido dirigido à administração tributária, onde mencione os respectivos fundamentos de facto e de direito, e que o instrua com a prova documental necessária para a sua apreciação e decisão, sobretudo com aquela prova atinente aos factos que lhe sejam pessoais e que interessem à procedência do seu pedido, sob pena de, não se mostrar satisfeito tal ónus probatório que, no caso, sobre si impende, e de a sua pretensão não poder deixar de naufragar» — neste sentido ver o acórdão citado.
Também no caso dos autos, não se vê, como poderia ser o próprio Tribunal a carrear para os autos os elementos probatórios atinentes aos factos pessoais alegados pelo Reclamante, de que a prestação da garantia lhe iria causar prejuízo irreparável.
Porque o Reclamante não cumpriu o ónus que sobre ele impendia a presente reclamação não pode proceder, devendo, embora com a presente fundamentação, manter-se o despacho reclamado”.

Os recorrentes dissentem do decidido invocando que o despacho de fls. 408 se mostra ferido de nulidade dado que não foi proferida no processo a informação de que a penhora já realizada não garante a totalidade da quantia exequenda, sendo que constitui facto notório que não carece de prova nem de alegações, nos termos do art. 514 do CPC, a existência de prejuízo irreparável para os efeitos previstos no art. 52 nº 4 da LGT, de concessão de isenção de garantia, sempre que a oposição deduzida pelo executado tenha sido judicialmente suspensa, dada a manutenção da garantia por tempo indeterminado, sendo que se mostra inconstitucional essa norma por violação do disposto nos art. 2º, 13º, 20º e 62º da CRP quando interpretada no sentido de que não constitui prejuízo irreparável a exigência de prestação de garantia a um executado que tenha deduzido oposição quando esta tenha sido declarada judicialmente suspensa. Mais invoca o recorrente João Martins que foi feita a prova adequada e suficiente do prejuízo irreparável que sofreu na sua saúde, encontrando-se a sua vida sob risco intenso e a prova de que não contribuiu para a insuficiência ou inexistência dos bens resulta, directa e imediatamente da sentença que julgou a instância executiva suspensa.
Afigura-se-nos não assistir razão aos recorrentes.
O despacho de fls. 408 foi o que determinou a prestação de garantia no prazo de 15 dias e que foi feito em obediência ao disposto no nº 2 do art. 169 do CPPT face à informação de fls. 406 de que foi admitida liminarmente a oposição deduzida pelo ora recorrente João Martins. Sucede que este despacho não foi objecto de reclamação nos termos do art. 276 do CPPT e, por isso, não poderá ser objecto de apreciação nestes autos de recurso da decisão de fls. 534 a 543 que apreciou a reclamação do despacho que indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia que foi formulado na sequência da notificação do despacho de fls. 408 (cfr. art. 169 e 170 do CPPT). Não sendo tal despacho objecto de apreciação na decisão recorrida por não ter havido reclamação dele não se pode do mesmo, agora, conhecer por se tratar de situação não invocada na reclamação e daí não se emitir pronuncia sobre o suscitado relativamente a esse despacho.
Como se sabe a administração tributária, nos termos do disposto no n.° 4 do art. 52° da LGT, pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada por insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado cabendo ao executado efectuar a prova de todos os requisitos desse normativo como condição de obter a procedência da sua pretensão. ( Cfr. Ac. TCA Sul de 20/12/2006, processo n.° 1520/06).
Daqui resulta que os pressupostos da isenção de prestação de garantia são a existência de prejuízo irreparável que seja causado pela prestação da garantia e a manifesta falta de meios económicos para a prestar.
Todavia, em relação a ambos os casos, a lei impõe, ainda, que a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.
Ou seja, da interpretação conjugada do disposto no n° 4 do art. 52° da LGT e n° 3 do art. 170° do CPPT, vemos que aquele primeiro impõe que «em qualquer dos casos» (quando a prestação da garantia causar prejuízo irreparável ou quando haja manifesta falta de meios económicos, que pode ser revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, para pagamento da dívida exequenda e acrescido) a insuficiência ou inexistência de bens não pode ser da responsabilidade do executado.
Ora, como acentuam Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (Lei Geral Tributária, comentada e anotada, reimpressão, pag., 153) "a responsabilidade do executado, prevista na parte final do n° 4, se deve entender em termos de dissipação de bens com intuito de diminuir a garantia dos credores, e não como mero nexo de causalidade desprovido de carga de censura ou simples má gestão dos seus bens, então só pode concluir-se que ao executado incumbe provar que, apesar da insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, não houve dissipação de bens com intuito de diminuir a garantia dos credores".
E esta conclusão resulta, igualmente, da conjugação do disposto no n° 3 do art 170° do CPPT (o pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária) com o também disposto no art. 342° do Código Civil (quem invoca um direito ou pretensão tem o ónus da prova dos respectivos factos constitutivos, cabendo à contraparte, a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos).
Neste mesmo sentido se pronunciam, ainda, Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão (Código de Procedimento e de Processo Tributário, comentado e anotado, Almedina, pag. 422): "o pedido deve ser alicerçado em razões de facto e de direito, justificativas, designadamente, do prejuízo irreparável ou da manifesta falta de meios económicos. E deve ser instruído com a indispensável prova documental".
Há que provar os pressupostos legais da dispensa de garantia, sendo que sobre o reclamante impende o ónus da prova do prejuízo irreparável ou da insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido e de que não houve dissipação de bens com intuito de diminuir a garantia dos credores.
A prova da inexistência desta responsabilidade recai, nos termos gerais, sobre o executado, já que é sabido que o ónus consiste na necessidade de observância de determinado comportamento, não para satisfação do interesse de outrem, mas como pressuposto de uma vantagem para o próprio (cfr. A. Varela, Obrigações, pág. 35).
Acresce que a falta manifesta de meios económicos pode ser revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, porém não se inverte o ónus da prova quanto à existência daquele pressuposto (falta de meios económicos)(Cfr. nesse sentido Ac. TCA sul de 27/04/2006, processo n.° 1139/06, disponível no site da dgsi).
Tal como se entendeu e bem na decisão recorrida o reclamante não indica qualquer facto que afaste a sua responsabilidade na insuficiência ou inexistência de bens como lhe competia para a verificação do seu direito à dispensa da prestação de garantia, sendo que não resulta da sentença que julgou a instância executiva suspensa (não será instância da oposição suspensa?) a prova de que o recorrente não contribuiu para a insuficiência ou inexistência dos bens como parece pretender fazer crer o recorrente.
Entendem os recorrentes que a prestação de garantia estando suspensa a oposição por decisão judicial lhe causa prejuízo irreparável por ela se encontrar suspensa ad eternam, mas não lhe assiste razão, pois, como refere e bem a recorrida, tal suspensão nos termos invocados não se mantém se a acção da competência do tribunal doutra jurisdição não for proposta no prazo de dois meses ou se ao respectivo processo não for dado andamento, por negligência das partes durante o mesmo prazo (cfr. nº 2 do art. 15 do CPTA). Assim, não resulta dessa suspensão prejuízo irreparável com a prestação da garantia nem a exigência nesses termos da garantia se traduz em violação de qualquer norma legal ou constitucional como defendem os recorrentes. Não se mostram, assim, violadas as disposições legais citadas pelos recorrentes com a exigência da prestação da garantia na situação em apreço. Acresce que na situação da suspensão da oposição a reclamante terá todo o interesse em intentar a acção respectiva no Tribunal comum para ver dirimida a questão por ela suscitada em relação à execução sendo que no caso de paragem nos termos do nº 2 do art. 15 do CPTA o processo deve prosseguir, sendo a questão prejudicial decidida com efeitos a ele restritos.
Quanto ao invocado na conclusão 3 do recorrente João ... (foi feita a prova adequada e suficiente do prejuízo irreparável que sofreu na sua saúde, encontrando-se na sua vida sob risco imenso), trata-se de matéria nova não invocada na reclamação nem objecto de apreciação na decisão recorrida, pelo que não pode ser objecto de conhecimento nesta sede dado que o recurso se destina a escrutinar a decisão e não a proferir decisão sobre matéria não objecto de apreciação e que não é de conhecimento oficioso.
Em face do exposto, entende-se que não se mostram reunidos os pressupostos para que a reclamante/recorrente beneficie da dispensa de prestação de garantia, pelo que a decisão recorrida é de manter não nos merecendo qualquer censura.

IV – Termos em que acordam os Juízes deste Tribunal em, negando provimento aos recursos, manter a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente João Martins.

Lisboa, 25.11.2009

Joaquim Pereira Gameiro
Manuel Malheiros
Eugénio Sequeira.