Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1529/19.2 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:05/18/2023
Relator:VITAL LOPES
Descritores:REFORMA DE ACÓRDÃO
RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO
FAZENDA PÚBLICA
CONDENAÇÃO EM CUSTAS
Sumário:I - Do capítulo IX do RGCO decorre que o arguido paga taxas de justiça e suporta custas quando as decisões lhe são desfavoráveis (art.ºs 93 n.º 3 e 94.º n.º 3 do RGCO) e porque as autoridades administrativas estão isentas do pagamento de taxas de justiça, as custas serão suportadas pelo erário público (art.ºs 93 n.ºs 2 e 3 e 94.º n.ºs 3 e 4 do RGCO).
II - Pese embora a FP não beneficie de qualquer isenção no pagamento de custas no âmbito dos processos judiciais tributários (cfr. art.º 4.º n.ºs 4 e 5 do Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de Dezembro), o mesmo não se poderá afirmar no que concerne à presente espécie processual. Ou seja, o regime de custas em processo de contra-ordenação tributária é regulado, em primeira linha, pelos normativos constantes dos art.ºs 92.º a 94.º do RGCO.
III - Assim sendo, por força das disposições conjugadas do art. 66.º do RGIT, bem como dos art.ºs 93.º n.ºs 3 e 4 e 94.º n.ºs 3 e 4 do RGCO, tem de concluir-se que nos processos de recurso de contra-ordenação não são devidas taxas de justiça nem custas pela FP, devendo o processo ficar sem custas, por inexistência de norma legal que preveja a responsabilidade da FP por custas em processo de contra-ordenação.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1- RELATÓRIO

O Exmo. Representante da Fazenda Pública, notificado do acórdão proferido em 02/02/2023, vem requerer a sua reforma quanto a custas, alegando para tanto o seguinte:
«
I. Dos Factos
1.
O presente recurso de contraordenação (doravante, Recurso de CO) foi objeto de sentença exarada pelo Tribunal Tributário (TT) de Lisboa, a qual julgou prescrito e determinou a extinção do processo de contraordenação aqui em crise.
2.
A FP, inconformada com a decisão, apresentou recurso para o Tribunal Central Administrativo (TCA) Sul.
3.
Os Ilustres Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul, por acórdão de 02 de fevereiro de 2023, acordaram em negar provimento ao recurso.
4.
Já no segmento decisório relativo às custas entenderam, que seriam:
Custas a cargo da Recorrente.”.
II. Do Direito
5.
Diga-se, desde já, que a condenação em custas pela FP não se pode manter, porquanto, em processo de contraordenação tributária, afigura-se-nos líquido concluir pela inexistência de qualquer norma legal que preveja a condenação da FP, quer em custas quer no pagamento de taxas de justiça.
6.
Neste sentido, entre muitos, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 24-02-2016 processo 01408, de 13-12-2017 processo 712/17, de 04-10-2017 processo 0721/17, de 20-09-2017 processo 0560/17, de 13-09-2017 processo 0702/17 e de 11-01-2017 processo 01283/16.
7.
Vai também neste sentido o acórdão do STA de 06-02-2019, exarado no processo 667/17.OBEAVR, onde se entende que:
“3. Tem razão a reclamante FP.
Com efeito a questão da condenação em custas da Fazenda Pública foi já apreciada, entre outros, nos acórdãos deste Supremo Tribunal Administrativo de 23.01.2019, recurso 03044/12.6BELRS, de 13/12/2017 e 28/02/2018, processos n.2s 0703/17 e 01151/17, respectivamente, e nos acórdãos de 24/02/2016, recurso n.2 01408 e 23/11/2016, recurso n.2 01106, que trataram de casos idênticos.
Acompanha-se tal orientação jurisprudencial, por inexistirem motivos para dela divergir.”.
Vejamos:
8.
As custas em processo de contraordenação tributária regem-se, em primeira instância, pelo Regulamento das Custas dos Processos Tributários (RCPT), conforme dispõe o art.º 66.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).
9.
Sendo (cfr. primeira parte do art.º 66.º RGIT) subsidiariamente aplicável o regime de custas estatuído nos art.ºs 92.º a 94.º do decreto-Lei n.º 433/82 de 27 de outubro (RGCO).
10.
Ou seja, no processo contraordenacional tributário tem aplicação mediata o regime de custas estatuído nos art.ºs 92.º a 94.º do RGCO e, imediatamente – porque especial relativamente àqueloutras – a norma contida no art.º 66.º do RGIT.
11.
Não olvidamos que, por força do disposto no art.º 4.º nºs. 4 e 5 do Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de dezembro, a FP deixou de estar isenta de custas nos processos judiciais tributários a partir de 01/01/2004.
12.
No entanto, in casu, estamos perante um recurso de decisão de aplicação de coimas e sanções por contraordenações tributárias que, sendo um «meio processual tributário» [art.º 101.º, alínea c), da Lei Geral Tributária (LGT)] não está incluído no conceito de «processo judicial tributário», pois deixou de estar incluído na lista de processos judiciais tributários que consta do art.º 97.º n.º 1 do CPPT.
13.
Ora, em matéria de custas dos processos de contraordenações tributárias, a primeira norma a atender, por ter natureza especial é, como já referido, a do art. 66.º do RGIT.
14.
Dispõe aquele normativo que, sem prejuízo da aplicação subsidiária do regime geral do ilícito de mera ordenação social (RGCO), as custas em processo de contraordenação tributário regem-se pelo RCPT.
15.
Sucede que o n.º 6 do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de dezembro revogou o RCPT, com exceção das normas relativas a atos da fase administrativa.

16.
Assim, não havendo na legislação aprovada por aquele Decreto-Lei normas especiais para a fase judicial dos processos de contraordenações tributárias, haverá que fazer apelo à primeira parte do art.º 66.º do RGIT, que conduz à aplicação subsidiária do regime de custas previsto no RGCO para as contraordenações comuns, nomeadamente o disposto nos art.ºs 92.º a 94.º do RGCO. (Vide, neste sentido, Lopes de Sousa e Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 4.ª edição, pag. 458).
17.
Do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art.º 93.º do RGCO, decorre que as autoridades administrativas estão isentas do pagamento de taxas de justiça nos processos de contraordenação.
18.
Nos termos do n.º 3 do art.º 93.º do RGCO, há lugar a pagamento de taxa de justiça sempre que houver uma decisão judicial desfavorável ao arguido.
19.
Resultando, do n.º 3 art.º 94.º do RGCO, que as custas são suportadas pelo arguido em caso de aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória, de desistência ou rejeição da impugnação judicial ou dos recursos de despacho ou sentença condenatória, sendo que, nos demais casos, as custas serão suportadas pelo erário público (n.º 4 do mesmo normativo).
Em resumo:
20.
Do capítulo IX do RGCO decorre que, o arguido paga taxas de justiça e suporta custas quando as decisões lhe são desfavoráveis (art.ºs 93 n.º 3 e 94.º n.º 3 do RGCO).

21.
Por outro lado, encontrando-se as autoridades administrativas isentas do pagamento de taxas de justiça, as custas serão suportadas pelo erário público (art.ºs 93 n.ºs 2 e 3 e 94.º n.ºs 3 e 4 do RGCO).
22.
Assim, pese embora a FP não beneficie de qualquer isenção no pagamento de custas no âmbito dos processos judiciais tributários (cfr. art.º 4.º n.ºs 4 e 5 do Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de dezembro), o mesmo não se poderá afirmar no que concerne à presente espécie processual.
23.
Até porque, o regime de custas em processo de contraordenação tributária é regulado, em primeira linha, pelos normativos constantes dos art.ºs 92.º a 94.º do RGCO.
24.
Desta forma, por força das disposições conjugadas do art. 66.º do RGIT, bem como dos art.ºs 93.º n.ºs 3 e 4 e 94.º n.ºs 3 e 4 do RGCO, será de concluir, contrariamente ao decidido no douto aresto ora recorrido, que nos processos de recurso de contraordenação não são devidas taxas de justiça nem custas pela FP.

Nestes termos e nos demais de Direito, se requer que seja determinada A REFORMA QUANTO A CUSTAS no sentido proposto pela FP, ou seja, de que o processo fique sem custas, por inexistência de norma legal que preveja a responsabilidade da FP por custas em processo de contraordenação.».

Não houve resposta da parte contrária.

A Exma. Senhora PGA emitiu mui douto parecer no sentido da procedência do pedido de reforma do acórdão quanto a custas, por as mesmas não serem devidas.

Com dispensa dos vistos legais por manifesta simplicidade, cumpre decidir, em conferência.

*

2 – FUNDAMENTAÇÃO

As custas em processo de contra-ordenação tributária regem-se pelo Regulamento das Custas dos Processos Tributários.

Na falta de normas especiais para a fase judicial dos processos de contra-ordenações tributárias, haverá que fazer apelo à primeira parte do art.º 66.º do RGIT, segundo o qual, «Sem prejuízo da aplicação subsidiária do regime geral do ilícito de mera ordenação social, nomeadamente no que respeita às custas nos processos que corram nos tribunais comuns, as custas em processo de contra-ordenação tributário regem-se pelo Regulamento das Custas dos Processos Tributários», o que conduz à aplicação subsidiária do regime de custas previsto no RGCO para as contra-ordenações comuns, nomeadamente o disposto nos seus artigos 92.º a 94.º - vd., neste sentido, Lopes de Sousa e Simas Santos, “Regime Geral das Infracções Tributárias Anotado”, Áreas Ed., 4.ª ed., pág.458.

Ora, nos termos dos artigos 93.º e 94.º do RGCO, é manifesto que inexiste norma legal que preveja a condenação da Fazenda Pública em custas. Com efeito,

Dispõe o art.º 93/3 do RGCO: «Dão lugar ao pagamento de taxa de justiça todas as decisões judiciais desfavoráveis ao arguido».

E de acordo com o n.º 3 do RGCO, «As custas são suportadas pelo arguido em caso de aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória, de desistência ou rejeição da impugnação judicial ou dos recursos de despacho ou sentença condenatória», dispondo o n.º 4 do mesmo preceito que «Nos demais casos, as custas serão suportadas pelo erário público».

Assim e continuando a acompanhar o douto parecer da Exma. Sra. PGA, por força das disposições conjugadas dos artigos 66.º do RGIT e 94.º, n.ºs 3 e 4, do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social, num processo de contra-ordenação tributária, anulada a decisão de aplicação da coima, não são devidas custas pela Fazenda Pública.

No caso em apreço foi julgado prescrito o procedimento de contra-ordenação.

Num processo de contra-ordenação tributária em que a decisão tenha sido favorável ao arguido, não são devidas custas pela Fazenda Pública.


3. DECISÃO

Nestes termos,

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em deferir o presente pedido de reforma de acórdão quanto a custas, com a consequente revogação do aresto identificado nos autos no segmento em que condenou em custas a Recorrente, determinando-se que o processo fica “Sem Custas”.

Incidente sem tributação.

D.N.

Lisboa, 18 de Maio de 2023


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Vital Lopes



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Luísa Soares



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Tânia Meireles da Cunha