Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:758/09.1BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:02/24/2022
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
PENHORA DE CRÉDITOS
TÍTULO EXECUTIVO
Sumário:I. De acordo com o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 856.º do CPC a penhora de créditos consiste na notificação ao devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que o crédito fica à ordem do agente de execução, cumprindo ao devedor declarar se o crédito existe.

II. Na notificação da penhora de crédito ao devedor, o valor do crédito deve estar perfeitamente identificado, através da indicação exacta do montante, sendo também indispensável para que a certidão da notificação possa assumir a natureza de título executivo, no caso do devedor não efectuar o pagamento do crédito reconhecido.

III. Não tendo a Recorrente sido notificada do valor do crédito penhorado, para que pudesse reconhecer, negar ou configurar de maneira diferente a existência do crédito, não pode funcionar aqui a aceitação do crédito a que alude o n.º 4, do artigo 856.º do CPC.

IV. A Recorrente não está identificada nas certidões de dívida, como devedora da quantia exequenda, pelo que não pode ser responsabilizada pelo pagamento da dívida exequenda, ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

1. A….., Lda., veio recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente a oposição por si deduzida contra o processo de execução fiscal (PEF) n.º 206….., a correr contra si na sequência da penhora de créditos, nos termos dos artigos 224.º do CPPT e 856.º do COC, no Serviço de Finanças (SF) de Rio Maior, no valor de € 71.673,40.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«MATÉRIA DE FACTO

1. Foi incorretamente julgado o seguinte facto que consta da alínea D) do probatório:

“Em Setembro de 2008, o balancete analítico acumulado da executada revelava que a oponente detinha créditos sobre a Executada, no valor de € 18.973.29”.

2. A sentença fundamentou a decisão no doc. 4 junto a fls. 95 a 99 dos autos, que deu por integralmente reproduzido, mas errou manifestamente, pois o que consta do balancete analítico é que a executada detinha créditos sobre a oponente no valor de € 18.973.29 e que a oponente detinha créditos sobre a executada no valor de € 18o.oo9.70. conforme se pode constatar das contas 2111372 (4.ª folha) e 2210015; (5.ª folha), respetivamente.

3. Impõe-se que a alínea D) do probatório seja alterada e passe a constar que “Em Setembro de 2008, o balancete analítico acumulado da executada revelava que a executada detinha créditos sobre a oponente, no valor de € 18.973.29 e que a oponente detinha créditos sobre a Executada, no valor de € 18o.oo9.70"

4. Deve ser ainda dado como provado, porque relevante para a decisão da causa, o seguinte facto:

“Foi com base nas informações constantes deste balancete. recolhido pela inspeção, que a AT, procedeu à penhora de créditos alegadamente detidos pela executada sobre a recorrente.”

A prova deste facto resulta das passagens do depoimento da testemunha da Fazenda Pública E...., chefe do SF de Rio Maior à data dos factos [ 00:47:30 a 01:11:10 — inicio e fim do depoimento] indicadas no corpo desta alegações e muito em especial da seguinte passagem:

EF-“ eu tenho também uma aplicação informática que é o SIPA. na altura era o SIPA. em que o inspetor que faz a ação de inspeção recolhe os créditos dos clientes para essa aplicação. Portanto. os créditos apareciam no SIPA e depois também o relatório que foi entreaue lá no serviço após uma fiscalização, eu quando quero penhorar créditos, eu peço os relatórios. Do relatório está lá um balancete analítico onde constava que a Ibérica da Beira devia à ibérica.” (00:50:02 a 00:50:44).

Este facto resulta, ainda, da afirmação da Fazenda Pública constante do art. 16o da douta contestação.

5. A douta sentença errou também ao decidir que “não se provou que”

“Em 12.03.2009, a Oponente tivesse um saldo credor sobre a Executada no valor de € 137.447,99”

6. Ao invés deve considerar-se provado que:

Em 12.02.2009, a oponente não era devedora da executada A…... Lda. e era credora da mesma no valor de 137.447,99.

A prova deste facto resulta do extrato de conta corrente de cliente da contabilidade da A......, Lda, respeitante à ora oponente do qual consta um saldo de zero, resultando ao invés na contabilidade da ora oponente, o extrato de conta corrente que tem como cliente a sociedade A......, Lda um saldo a favor da oponente de 137.447,99 €.

Estes documentos constam do processo, tendo sido juntos pela oponente no decorrer da audiência de inquirição de testemunhas e não foram impugnados pela Fazenda Pública e os mesmos mostram-se perfeitamente coerentes com os valores de dever/haver constantes do balancete apresentado pela Fazenda Pública com referência a Setembro de 2008, alguns meses antes. Todos os documentos apontam e patenteiam que era a oponente credora da A......, Lda e não o contrário.

Esta ideia foi ainda confirmada, com toda a clareza, pelos depoimentos das testemunhas A...... [00:17:10 a 00:30:19] e J......[00:36:27 a 00:37:41], funcionários da sociedade A......, Lda [,..],A primeira, entre outras declarações no mesmo sentido constantes do corpo da alegações referiu especificamente que:

A...... não nos ficou a dever nada, mas nós ficámos a dever à beira. (24:36) (...) este extrato está a zeros. A a…… não nos ficou a dever nada, mas nós ficámos a dever 137mil euros. (00:24:29 a 00:24:49)

A J......, por sua vez declarou:

- MANDATÁRIO DA RECORRENTE diga-me uma coisa. O que é que levava daqui? O que é que transportava? (00:37:00 a 00:37:03)

J…..- era tubos flexíveis. (00:37:04 a 00:37:05)

MANDATÁRIO DA RECORRENTE - tubos flexíveis. E o que é que trazia de lá? (00:37:07 a 00:37:09)

J…. - Tubo inox e acessórios. (00:37:09 a 00:37:11)

MANDATÁRIO DA RECORRENTE - E levava mais coisas daqui para lá ou de lá para cá? (00:37:12 a 00:37:15)

J......- ao contrário. (00:37:16)

MANDATÁRIO DA RECORRENTE - de lá para cá? (00:37:17)

J...... - A nível de valores, portanto, o material de inox é muito mais caro. (...) mas apesar do carro ir pra cima carregado com tubos flexíveis...(oo:37:18 a 00:37:26)

MANDATÁRIO DA RECORRENTE - então (...) trazia mais em volume e mais em valor lá de cima... (00:37.30 a 00:37:38)

J......- Talvez mais em valor. (00:37:39)

Por sua vez, as duas testemunhas apresentadas pela Fazenda Pública nada afirmaram suscetível de pôr em causa os documentos constantes dos autos, bem como as afirmações das testemunhas apresentadas pela opoente e pelo contrário, o senhor Inspetor P......, confrontado com os documentos terminou o seu depoimento a referir expressamente referindo- se à suposta dívida da recorrente para com a executada que “(02:25:16 a 02:25:25) “a única coisa que eu posso confirmar convosco, não havendo cheques, transferências para encontro de contas é que no dia 12.2.2000 não há divida” (referindo-se ao extrato da executada, tendo como cliente a recorrente).

7. Caso assim se não entenda, com base nos mesmos depoimentos, deve ser dado como provado que a oponente nessa data não era devedora da executada.

MATÉRIA JURÍDICA E CONCLUSIVA

8. Não emerge de qualquer elemento probatório dos autos, que este hipotético crédito de 292.567,26 € da sociedade A......, Lda, alguma vez tenha existido, o mesmo se diga de qualquer hipotético crédito no valor de 122.441,778 € nem a própria Representante da Fazenda Pública afirma que tais alegados créditos existam ou tenham existido e a própria sentença recorrida também não dá como provada a existência de tais créditos.

9. Da própria notificação de penhora dos créditos emerge a consciência da exequente da inexistência dos mesmos pois a mesma refere “o saldo credor da executada para com a vossa empresa à data da recepção da presente notificação ou outros que venham a surgir posteriormente

10. O que existiu foi apenas e tão só um crédito da sociedade A......, Lda, no valor de 18.973,29 €, constante do balancete desta sociedade e que motivou a notificação da penhora de créditos à recorrente sendo que, no mesmo balancete constava simultaneamente um débito daquela sociedade para com a recorrente no valor de 180.009,70 €

11. É a própria Fazenda Pública que faz assentar no balancete em causa a existência do crédito e considera reconhecido por presunção o valor do mesmo constante (no valor de 18.973,29 € e não evidentemente no montante de €292.567,26).

12. A AT para um crédito de € 292.567,26 considera reconhecido por presunção o valor de 18.973,29 € (valor do crédito descrito no Balancete da Executada/devedora originária).

13. Na pior das hipóteses para a recorrente, face à própria posição da Fazenda Pública do alegado crédito de 292.567,26, apenas poderiam haver-se como reconhecidos 18.973,29 € a “ratear” pela quantia exequenda no presente processo e pelas quantias exequendas a que respeitam os processos de oposição n°s 610/09.0BELRA e 758/09.1BELRA, no valor de 97.302,73 € e 71.673,40 €, respetivamente, apresentados pela ora recorrente com idêntico fundamento ao dos presentes autos e que respeitam aos valores que perfazem a restante parte do alegado crédito penhorado no valor de € 292.567,26 e que correspondem aos processo executivos n°s 2062…….; 2062……..; 2061….. e 2062……, referidos na notificação de fls. 606, ofício n° 9…, mencionado na al. H) do probatório.

14. Sem conceder, cabe ainda questionar-se à luz do caso concreto e considerando que a ATA ao efetuar a penhora não tinha elementos ao seu dispor que lhe permitissem crer na existência dum crédito a no valor de 292.597,26 € e fez assentar a sua penhora nos dados constantes do balancete analítico donde consta que a oponente era devedora da executada no valor de 18.973,29 € e credora no valor de 180.009,70 €, se será conforme à constituição a interpretação do art. 856º, n° 4 do CPC (art. 773º, n° 4 do atual CPC), implícita na decisão recorrida, segundo a qual 0 crédito se deva ter por reconhecido, apesar de na notificação da penhora do crédito resultar pressuposto que tal crédito no montante indicado não existe no momento da comunicação, embora possa a existir, no futuro, cabendo responder negativamente a esta interrogação uma vez que tal interpretações é contrária à Lei fundamental porquanto violaria, designadamente, o direito de propriedade privada previsto no art. 62º, n° 1, da Constituição da República Portuguesa, o princípio da proporcionalidade, constante do art. 18º, n° 2, e no art. 266º, n° 2, do mesmo diploma e, ainda os princípios da justiça, da imparcialidade e da boa-fé, constantes deste preceito.

15. Numa interpretação confornme à constituição, o art. 856º, n° 4, do CPC deve ser interpretado no sentido de que o reconhecimento do crédito, na ausência de declaração do terceiro suposto devedor, só opera se o exe- quente tiver razões para crer que o crédito existe ou, pelo menos, que tal reconhecimento não opera se o mesmo tiver em seu poder elementos donde resulte, segundo o normal acontecer a inexistência do mesmo e ainda que, em caso algum opera se tiver sido efetuado não como crédito atual mas como crédito total ou parcialmente futuro pois Ora, como escreve José Lebre de Freitas “A penhora pressupõe a existência do crédito e incide sobre ele, tal como existe”.

16. A douta sentença recorrida errou quer de facto, quer de Direito tendo violado os arts 856º, n° 4, do CPC, na redação em vigor à data dos factos e ainda os arts. 18º, n° 2, 62º, n° 1 e 266º, n° 2 da Constituição da Republica Portuguesa, devendo ser revogada e substituída por acórdão que julgue a oposição procedente por provada.

Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA»

3. A recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Ministério Público, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.


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II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito, ao julgar improcedente a oposição à execução fiscal, por o quadro factual criar a convicção de que a Oponente possuía um crédito a favor da executada.


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III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida proferiu a seguinte decisão relativa à matéria de facto:

«A) Em 8/07/2008, foi instaurado no Serviço de Finanças de Rio Maior o processo de execução fiscal n.° 2062….. em nome da A......, Lda., no valor de 53.844,26€ - cfr. fls. 35 dos Autos;

B) Em 12/02/2009, o Serviço de Finanças de Rio Maior remeteu para a Oponente por correio registado e com aviso de recepção, o oficio n.° 9…. constante a fls. 38 dos Autos, e cujos termos se dão por integralmente reproduzidos, no qual refere-se que dever-se-ia considerar penhorado à ordem do Serviço de Finanças de Rio Maior o saldo credor da executada (A......, Lda.) para com a Oponente;

C) O Aviso de Recepção referido na alínea anterior foi assinado a 16/02/2009 - cfr. fls. 40 dos Autos;

D) Em 19/03/2009, a Chefe de Finanças de Rio Maior subscreveu o despacho constante a fls. 42 dos Autos, cujos termos se dão por integralmente reproduzidos, tendo determinado a execução nos presentes Autos da devedora A……., Lda., pela importância de 71.673,40€;

E) Em 19/03/2009, o Serviço de Finanças de Rio Maior remeteu para a Oponente por correio registado e com aviso de recepção, o oficio n.° 1…. constante a fls. 43 dos Autos, e cujos termos se dão por integralmente reproduzidos, no qual citou a Oponente para efeitos da execução fiscal n.° 2062…….;

F) O Aviso de Recepção referido na alínea anterior foi assinado a 24/03/2009 - cfr. fls. 46 dos Autos;

G) A Executada não possui bens susceptíveis de penhora, tendo os veículos automóveis que possuía sido alienados à ora Oponente e à A….., que pertence aos mesmos sócios daquela - cfr. depoimento da testemunha E….; e quanto à segunda parte, depoimento das testemunhas A…… e J…..;

H) A Executada, num primeiro momento e até 02/02/2009, teve uma postura de colaboração, tendo apresentado as declarações de IVA em falta e procedido à respectiva regularização - cfr. fls. 83 dos autos e depoimento da testemunha P......;

I) A Executada e a Oponente têm como gerente B......- cfr. certidões da Conservatória do Registo Comercial, a fls. 72 a 76 e 78 a 81 dos Autos, respectivamente;

J) Em Setembro de 2008, o balancete analítico acumulado da Executada revelava que a Oponente detinha créditos sobre a Executada, no valor de € 18.973,29 - cfr. doc. 4 junto a fls. 85 dos Autos, que se dá por integralmente reproduzido;

K) O valor referido na alínea anterior foi apurado durante uma acção de inspecção tributária realizada à Executada, tendo o inspector tributário procedido à inscrição do referido valor na aplicação informática SIPA - cfr. depoimento da testemunha E......;

L) A p.i. foi apresentada em 24/04/2009 junto do Serviço de Finanças de Rio Maior - cfr. fls. 3 dos Autos.


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MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA:

Vislumbram-se «todos os restantes, nomeadamente os alegados em contrário do que se deu como provado supra, e ainda, com interesse, o seguinte:

1) Em 12/03/2009, a Oponente tinha um saldo credor sobre a Executada no valor de 137.447,99€ - facto alegado no artigo 5.º da p.i.»


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MOTIVAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO:

A convicção do Tribunal fundou-se no que ora se segue:

«A convicção do Tribunal que permitiu dar como provados os factos acima escritos assentou na análise dos documentos constantes dos Autos, referidos a propósito de cada alínea do probatório, bem como, nos depoimentos das testemunhas arroladas.

As testemunhas arroladas pela Oponente, A......e J....., funcionários da Executada, não revelaram ter um conhecimento directo dos valores que se encontram inscritos na contabilidade da Oponente, e responderam aos factos que lhes foram perguntado em termos genéricos, e por isso, o Tribunal entendeu que os seus depoimentos também pouco aditaram.

As testemunhas arroladas pelo Fazenda Pública demonstraram ter um conhecimento directo sobre os factos inquiridos, permitindo o seu depoimento dar por assente os factos constantes das alíneas G), K) e H) supra.

Quanto ao facto não provado, o Tribunal considerou que uma vez que os extractos de conta corrente, juntos a fls. 6 e 7 dos Autos, bem como as facturas e as 2.as vias dos documentos juntos a fls. 8 a 29 dos Autos, que referem liquidações efectuadas por “encontro de contas” e cheques bancários, realizados já após citação da Executada, A…., no âmbito dos processos de execução fiscal e, à excepção de um, após a acção de inspecção, na qual foi apurado o crédito inscrito documento referido em J), desacompanhados de outros elementos de prova, designadamente cópias dos extractos bancários e dos cheques bancários, bem como o comprovativo do seu depósito na conta, não permitem demonstrar esse facto.

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.»


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2. DO MÉRITO DO RECURSO

2.1. DO ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO

Entende a Recorrente que foram incorrectamente julgados os pontos de facto que constam da alínea D) dos factos provados e o 1) dos factos não provados, e que foi ainda omitido facto relevante para a decisão da causa (pontos 1 a 7 das conclusões da alegação de recurso).

Vejamos.

Como é consabido, a alteração pelo Tribunal Central Administrativo da decisão da matéria de facto fixada em primeira instância pressupõe, não só a indicação dos concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, como também, os concretos meios de prova constantes do processo e/ou da gravação dos depoimentos das testemunhas, que imponham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, nos termos dos artigos 640.º e 662.º do CPC, sob pena de rejeição nesta parte do recurso (vide neste sentido Acórdão do TCA Sul de 13/03/2012, processo n.º 05275/12, disponível em www.dgsi.pt).

No caso dos autos, a simples leitura das conclusões da alegação de recurso permite concluir que foram integralmente cumpridos os ónus referidos nos artigos 639.º, n.º 1 e 640.º, n.º 1, ambos do CPC.

Com efeito, a Recorrente identificou concretamente os pontos de facto tidos por mal julgados, indicou os meios de prova que, na sua opinião, impunham decisão diversa sobre os pontos de facto impugnados e mencionou também o sentido da decisão que deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Concluiu-se, assim, que as alegações de recurso apresentadas pela Recorrente respeitavam as exigências dos artigos 639.º e 640.º do CPC, necessárias para que este Tribunal Central Administrativo Sul cumpra os poderes que lhe estão atribuídos pelo artigo 662.º do CPC, e, consequentemente, passamos a apreciar o recurso sobre a matéria de facto.

No ponto 1 das conclusões da alegação de recurso, a Recorrente sustenta que o facto que consta da alínea D) do probatório foi incorrectamente julgado.

E transcreve o facto, nos seguintes termos:

«Em Setembro de 2008, o balancete analítico acumulado da executada revelava que a oponente detinha créditos sobre a Executada, no valor de € 18.973,29.»

Ora, este facto consta do probatório, mas na alínea J), pelo que entende-se que houve lapso manifesto na identificação da alínea, e, assim, consideramos corrigida a referência da alínea, para aquela que está indicada no probatório.

Pretende a Recorrente que o facto vertido na alínea J) do probatório seja alterado, alicerçando a alteração no documento n.º 4 junto com a contestação (balancete analítico), indicado para prova desse facto e que foi dado como reproduzido, referindo que a sentença errou manifestamente por esse facto não resultar do balancete analítico, devendo a referida alínea, de acordo com o que consta do aludido documento, passar a ter o seguinte teor:

«Em Setembro de 2008, o balancete analítico acumulado da executada revelava que a executada detinha créditos sobre a oponente, no valor de € 18.973,29 e que a oponente detinha créditos sobre a Executada, no valor de € 180.009,70.»

Analisado o documento n.º 4 junto com a contestação da Fazenda Pública (fls. 82 a 86 dos autos de suporte físico), constatamos que a razão está do lado da Recorrente.

Com efeito, consta do balancete analítico, tal como alegado pela Recorrente que a executada, “A......, Lda.” detinha créditos sobre a ora Oponente, “A….., Lda.”, no valor de € 18.973,29, e não o contrário – cfr. Balancete, conta 2111371 (4.ª folha) e 2210014.

No mesmo balancete consta ainda que a Oponente detinha créditos sobre a executada no valor de € 180.009,70 – cfr. Balancete, contas 2210014 (5.ª folha).

Assim, é de deferir a pretendida alteração da alínea J) do probatório.

A Recorrente, por considerar que resulta do depoimento da testemunha E….. , pretende que seja aditado ao probatório o seguinte facto:

«Foi com base nas informações constantes deste balancete, recolhido pela inspecção, que a AT, procedeu à penhora de créditos, alegadamente detidos pela executada sobre a recorrente.»

No que respeita a este facto, o mesmo já consta do probatório, embora com teor diferente, tendo para esse efeito sido considerado o depoimento da identificada testemunha– cfr. alínea K) dos factos dados como provados.

Na sua contestação, a Fazenda Pública também confirmou que o balancete analítico foi recolhido pelo inspector que se encontrava a proceder à acção de inspecção à contabilidade da executada (cfr. ponto 20 da contestação).

Porém, atenta a alteração da alínea J), importa adequar a redacção da alínea K), no sentido de precisar a que valor se refere, isto é, o valor de crédito detido pela executada sobre a Oponente, pois, será apenas esse que tem relevância para a penhora de créditos realizada e que terá sido inscrito na aplicação informática SIPA.

Por último, pretende a Recorrente que o ponto 1) dos factos dados como não provados seja eliminado e que seja dado como provado, com o seguinte teor:

«Em 12.02.2009, a oponente não era devedora da executada A…., Lda., e era credora da mesma no valor de 137.447,99 €.»

Alicerça a alteração em documentos junto aos autos, com a petição inicial e em sede de diligência de inquirição de testemunhas, consubstanciados em extractos de conta corrente de cliente das contabilidades da executada “A….., Lda.” e da Oponente, nos quais consta um saldo a favor da oponente de 137.447,99 €.

Lidos os referidos extractos verifica-se o seguinte:

- o extracto de conta de cliente da executada referente à oponente (cfr. doc. n.º 1 da p.i.) foi emitido em 25/02/2009, refere-se a transacções ocorridas entre 28/01/2008 e 05/12/2008, indicando um saldo a favor da oponente de € 186.266,05 em 10/09/2008 (a operação seguinte foi registada no mês de Outubro), e de € 137.447,00 em 05/12/2008 (cfr. fls. 6 dos autos de suporte físico).

- o extracto de conta de cliente da oponente referente à sociedade executada, foi emitido em 12/03/2009, indica um saldo a favor da sociedade executada de € 24.555.52, em 30/09/2008, e de 0,00 € em 18/12/2008.

Analisados tais extractos em conjugação com o balancete analítico constata-se que de nenhum constam valores actualizados e contemporâneos da realização da penhora (12/02/2009), e os valores constantes dos extractos nas referidas datas não correspondem aos indicados no balancete analítico, considerando a data da emissão deste último.

Assim, para além das discrepâncias, tais extractos não são suficientes, nem idóneos para dar como provado que à data de 12/02/2009 a Oponente era credora da sociedade executada em € 137.447,99 e que não era devedora a esta de qualquer quantia.

O depoimento das testemunhas também por si só é imprestável para prova desta matéria, por lhe caber prova documental.

Em todo o caso, relembramos o que sobre o depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrente se escreveu na motivação da decisão da matéria de facto:

As testemunhas arroladas pela Oponente, A......e J....., funcionários da Executada, não revelaram ter um conhecimento directo dos valores que se encontram inscritos na contabilidade da Oponente, e responderam aos factos que lhes foram perguntado em termos genéricos, e por isso, o Tribunal entendeu que os seus depoimentos também pouco aditaram.

Daqui resulta que o Tribunal a quo ponderou toda a prova produzida sobre os factos em causa, incluindo a prova testemunhal produzida pela Recorrente.

Nesta conformidade, mantém-se o facto dado como não provado.

Face ao exposto procede parcialmente o alegado erro de julgamento da matéria de facto.


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2.1.1. Deste modo, ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, procede-se à alteração das alíneas J) e K) dos factos dados como provados, que passam a ter o seguinte teor:

J) Em Setembro de 2008, o balancete analítico acumulado da Executada revelava que a Oponente detinha créditos sobre a Executada, no valor de 180.973,29, e que a Executada detinha créditos sobre a Oponente de € 18.973,29 (cfr. Doc. n.º 4 junto com a contestação, fls. 82 a 86 dos autos de suporte físico).

K) Os valores referidos na alínea anterior foram apurados durante uma acção de inspecção tributária realizada à Executada, no suporte documental do balancete analítico acumulado de Setembro de 2008, tendo o inspector tributário procedido à inscrição do valor do crédito da Executada sobre a Oponente na aplicação informática SIPA - cfr. depoimento da testemunha E......; ponto 20 da contestação).


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2.2. Estabilizada a matéria de facto objeto de crítica no recurso, e fixado o quadro factual, impõe-se agora analisá-lo à luz do direito, e saber se permitem concluir pela improcedência da oposição.

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2.3. DE DIREITO

A Recorrente insurge-se contra a sentença recorrida alegando que não emerge de qualquer elemento probatório dos autos, que este hipotético crédito de € 292.567,26 da sociedade executada alguma vez tenha existido, o mesmo se diga de qualquer hipotético crédito no valor de € 122.441.778, nem a Fazenda Pública afirma que tais alegados créditos existam ou tenham existido e a própria sentença recorrida também não dá como provada a existência de tais créditos.

Mais alegou que a própria notificação de penhora dos créditos emerge a consciência da exequente da inexistência dos mesmos, e o que existiu foi apenas um crédito da executada, no valor de € 18.973,29, constante do balancete desta sociedade e que motivou a notificação da penhora de créditos, sendo que a AT para um crédito de € 292.567,29, considera reconhecido por presunção o valor de € 18.973,29, constante do balancete, do qual consta que a Recorrente era credora da executada no valor de € 180.009,70, pelo que no caso concreto a AT no momento em que efectuou a penhora não tinha elementos ao seu dispor que lhe permitissem crer na existência do crédito.

Invocou ainda que numa interpretação conforme a constituição, o artigo 856.º, n.º 4 do CPC deve ser interpretado no sentido de que o reconhecimento do crédito, na ausência de declaração do terceiro suposto devedor, só opera se o exequente tiver razões para crer que o crédito existe, tendo a sentença recorrida violado a referida norma do CPC, na redacção em vigor à data dos factos e ainda os artigos 18.º, n.º 2, 62.º, n.º 1 e 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.

A sentença recorrida fundamentou a improcedência da oposição ponderando o seguinte:

Do probatório retira-se que a Oponente foi citada pelo Serviço de Finanças de Rio Maior no âmbito da penhora de créditos no montante de 292.597,26€.

E decorre da factualidade assente, que apesar da Oponente ter sido notificada da penhora de créditos efectuada pela AF, aquela nada disse ou requereu.

Posto isto, e conjugando as disposições normativas supra referidas com os factos dados como assentes, podemos desde já referir que a Oponente não tem razão.

Com efeito, como decorre da factualidade assente, a Oponente notificada da penhora de créditos efectuada pela AT, nada disse ou requereu.

Nessa medida, a execução prosseguiu contra a Oponente, na qualidade de executada, como decorre do disposto nas citadas disposições legais.

Por outro lado, no âmbito da presente oposição, a Oponente não logrou provar que em Março de 2009 tivesse um saldo credor sobre a Executada no valor de 137.447,99€.

Assim sendo, todo este quadro factual cria a convicção no Tribunal, atentas as regras da experiência, que a Oponente possuía um crédito a favor da executada, razão pela qual a Oposição tem que improceder com base neste fundamento.

Vejamos.

A Recorrente é executada no processo de execução fiscal subjacente aos presentes autos na sequência de penhora de créditos, ao abrigo dos artigos 224.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 856.º do Código Processo Civil (CPC).

Importa, antes de mais, relembrar o regime jurídico da penhora de créditos.

Dispõe o n.º 1 do artigo 224.º do CPPT (na redacção introduzida pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12) que:

A penhora de créditos consiste na notificação ao devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que todos os créditos do executado até ao valor da dívida exequenda e acrescido ficam à ordem do órgão da execução fiscal, observando-se o disposto no Código de Processo Civil, com as necessárias adaptações (…).

Por sua vez, o artigo 856.º e segs. do CPC (na redacção aplicável) regula a penhora de direitos.

De acordo com o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 856.º do CPC a penhora de créditos consiste na notificação ao devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que o crédito fica à ordem do agente de execução, cumprindo ao devedor declarar se o crédito existe.

O n.º 4, do artigo 856.º do CPC dispunha «Se o devedor nada disser, entende-se que ele reconhece a existência da obrigação, nos termos da indicação do crédito à penhora.»

E a alínea f) do n.º 1 do artigo 224.º do CPPT preceitua:

«Inexistindo o crédito ou sendo o seu valor insuficiente para garantir a dívida exequenda e acrescido, o órgão da execução fiscal pode notificar o devedor da penhora de créditos futuros até àquele valor, mantendo-se válida a notificação por período não superior a um ano, sem prejuízo da renovação.»

Dos artigos 224.º do CPPT e 856.º do CPC ressalta que a finalidade da execução é assegurada com a penhora do crédito, após o que tem lugar os actos tendentes à sua confirmação que, no âmbito da execução, se resumem à declaração do devedor, não afectando a legalidade da penhora a existência ou inexistência do crédito.

Significa que quando o terceiro devedor é notificado da penhora de créditos tem que tomar posição sobre esse concreto crédito, reconhecendo-o ou negando-o.

Para o efeito, a notificação da penhora de créditos tem que observar determinado conteúdo.

Nas palavras de Jorge Lopes de Sousa, os requisitos da notificação são os seguintes:

«A notificação da penhora de crédito ao indigitado devedor deverá ser efectuada com:

- indicação do valor dos créditos do executado abrangidos pela penhora (que é o da dívida exequenda e acrescido) (corpo do n.° 1 deste art. 224.°) ;

- esclarecimento de que esses créditos ficam à ordem do órgão da execução fiscal, devendo as quantias correspondentes serem depositadas em operações de tesouraria, à ordem daquele órgão, no prazo de 30 dias a contar da penhora [corpo do n.° 1 deste art. 224 .° e sua alínea b)];

- indicação de que o devedor não se exonera pagando directamente ao credor [alínea d) do n.° 1 deste art. 224.°]

Todos estes requisitos são indispensáveis para que se considere efectuada a penhora, pela que a sua omissão não constituirá mera irregularidade processual sanável pelo decurso do tempo, tendo antes como efeito que não se considera a penhora como efectuada . O devedor do crédito penhorado não é parte, nem sequer interessado, no processo de execução fiscal, pelo que não podem fazer-se em relação a ele as exigências processuais que podem ser feitas a quem é parte no processo, designadamente diligenciar no sentido de arguir nulidades processuais no prazo legal, para evitar a sua sanação (art. 205.°, n.º 1, do CPC).

Assim, por exemplo, se o devedor a quem não foi feita a advertência de que não se exonera se pagar directamente ao credor vier a efectuar o pagamento a este, considerar-se-á desonerado da respectiva obrigação.» (in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª Edição, vol. 3, nota 2 ao artigo 224.º, pág. 616).

Na notificação da penhora de crédito ao devedor, o valor do crédito deve estar perfeitamente identificado, através da indicação exacta do montante, sendo também indispensável para que a certidão da notificação possa assumir a natureza de título executivo, no caso do devedor não efectuar o pagamento do crédito reconhecido (vide neste sentido ob cit. pág. 617)

Voltando ao caso dos autos.

Como resulta da alínea B) do probatório e documento de fls. 38 (dos autos de suporte físico), a notificação da penhora à Oponente apenas refere que «(…) deve considerar penhorado à ordem do Chefe do Serviço de Finanças de Rio Maior, o saldo credor da executada para com a vossa empresa à data da recepção da presente notificação (…).»

Daqui resulta que o crédito penhorado não foi identificado e individualizado, não bastando a referência genérica de “saldo credor da executada”.

Acresce realçar, que a notificação da penhora foi concretizada no dia 16/02/2009 (cfr. alínea C) do probatório), com base em informação recolhida em balancete da sociedade executada de Setembro de 2008 (cfr. alíneas J) e K) do probatório), porém, os autos nada dizem sobre a actualidade do crédito inscrito no balancete à data de penhora, isto é, se tal crédito ainda existia inscrito na contabilidade da executada.

Não sendo despiciendo referir que no mesmo balancete de Setembro de 2008 consta um crédito da Oponente sobre a executada de valor superior (cfr. alínea J) do probatório).

Não tendo a Recorrente sido notificada do valor do crédito penhorado, para que pudesse reconhecer, negar ou configurar de maneira diferente a existência do crédito, não pode funcionar aqui a aceitação do crédito a que alude o n.º 4, do artigo 856.º do CPC.

Não só a Oponente não está obrigada a tomar posição sobre a existência do crédito, como também a notificação da penhora dos créditos dos autos não assume o papel de título executivo.

A falta de titulo executivo integra a nulidade insanável prevista na alínea b), do n.º 1, do artigo 165.º do CPPT.

Sendo que as nulidades mencionadas no n.º 1, do artigo 165.º do CPPT são do conhecimento oficioso (cfr. n.º 4 da citada norma).

Prosseguindo.

Resultou provado, de acordo com a alínea D) do probatório, que o Chefe de Finanças de Rio Maior determinou a execução contra a aqui Recorrente pela importância de € 71.673,40.

O despacho que determinou a execução contra a Oponente esclarece que tal importância corresponde ao valor em dívida no processo de execução fiscal à data da penhora, no total de € 71.673,40, sendo € 53.844,26 referentes a quantia exequenda, € 17.766,58 a juros de mora e € 62,56 de custas. (cfr. fls. 41 e 42 dos autos de suporte físico).

Como se viu, a notificação de penhora de créditos não pode constituir titulo executivo, por a mesma não se mostrar regularmente realizada, faltando-lhe requisitos essenciais dos títulos executivos, pelo que carece de força executiva (cfr. artigo 163.º, n.º 1 e) do CPPT).

Porém, a execução fiscal prosseguiu contra a Oponente, como se viu, pelo valor em dívida na execução fiscal, considerando as certidões de dívidas, que constituem os títulos executivos, a partir das quais foi instaurada a execução fiscal contra a sociedade “A......, Lda.” (cfr. alínea A) do probatório).

Assim sendo, tem que se dar razão à Recorrente.

A Recorrente não está identificada nas certidões de dívida, como devedora da quantia exequenda, pelo que não pode ser responsabilizada pelo pagamento da dívida exequenda, ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

Nesta conformidade, tem que se entender que o despacho do Chefe do Serviço de Finanças que Rio Maior que determinou o chamamento à execução da Oponente foi proferido sem que existisse título adequado para o efeito.

Pelo exposto, assiste razão à Recorrente, não podendo manter-se a sentença recorrida, impondo-se julgar extinta a execução por ilegitimidade, nos termos do disposto no artigo 204.º n.º 1 alínea b) do CPPT, o que implica a procedência do presente recurso e da oposição à execução fiscal, com a extinção da execução fiscal descrita nos autos contra a aqui Recorrente, ficando prejudicado o conhecimento da existência do direito de crédito da executada suscitado no âmbito do presente recurso.


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Conclusões/Sumário:

I. De acordo com o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 856.º do CPC a penhora de créditos consiste na notificação ao devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que o crédito fica à ordem do agente de execução, cumprindo ao devedor declarar se o crédito existe.

II. Na notificação da penhora de crédito ao devedor, o valor do crédito deve estar perfeitamente identificado, através da indicação exacta do montante, sendo também indispensável para que a certidão da notificação possa assumir a natureza de título executivo, no caso do devedor não efectuar o pagamento do crédito reconhecido.

III. Não tendo a Recorrente sido notificada do valor do crédito penhorado, para que pudesse reconhecer, negar ou configurar de maneira diferente a existência do crédito, não pode funcionar aqui a aceitação do crédito a que alude o n.º 4, do artigo 856.º do CPC.

IV. A Recorrente não está identificada nas certidões de dívida, como devedora da quantia exequenda, pelo que não pode ser responsabilizada pelo pagamento da dívida exequenda, ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da 1.º Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e, em consequência, julgar procedente a presente oposição à execução fiscal.

Custas pela Recorrida

Notifique.

Lisboa, 24 de Fevereiro de 2022.



Maria Cardoso - Relatora
Catarina Almeida e Sousa – 1.ª Adjunta
Isabel Fernandes – 2.ª Adjunta

(assinaturas digitais)