Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:674/19.9BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:06/25/2020
Relator:ANA PINHOL
Descritores:ARRESTO;
SALDO BANCÁRIO.
Sumário:I.O arresto é uma das providências cautelares admitidas em processo judicial tributário “ex vi” do disposto no artigo 135.º do CPPT e de que a Fazenda Pública pode lançar mão desde que preenchidos os requisitos do artigo 136.º do mesmo diploma legal.

II.Nos termos do artigo 51.º, nº.2, da LGT a realização de providências cautelares por parte da Fazenda Pública e no âmbito do procedimento/processo tributário deve respeitar os princípios da necessidade e da proporcionalidade. O que significa que devem ser proporcionais ao dano a evitar e não causar danos de impossível ou difícil reparação, devendo o arresto ser determinado em bens ou rendimentos suficientes para a segurança normal do crédito tributário.

III.O arresto de saldo bancário incidente sobre a única conta bancária que a arrestada dispõe e que se encontra afecta à sua actividade não configura, por si só, uma situação geradora de prejuízo irreparável ou de difícil reparação.
Votação:MAIORIA
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO


I.RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA interpôs o presente recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou parcialmente procedente a oposição deduzida por «T..........., LDA» e M..........., contra o arresto decretado nos autos e, em consequência, determinou a redução da providência decretada, com o levantamento do arresto da conta bancária n.° ................ do B................, de que é titular a sociedade oponente e manteve a providência de arresto anteriormente decretada quanto aos restantes bens.

Nas alegações de recurso que apresentou formulou as seguintes conclusões:

«A) Através da douta Sentença aqui em apreço, julgou a oposição parcialmente procedente e, em consequência, determinou a redução da providência decretada, com o levantamento do arresto da conta bancária n.° ................ do B................, de que é titular a sociedade oponente e manteve a providência de arresto anteriormente decretada quanto aos restantes bens;

B) Salvo o devido respeito por diferente entendimento, a Fazenda Pública entende que tal decisão, no segmento relativo redução da providência cautelar, não pode manter-se na ordem jurídica, nos termos em que foi proferida, porque nela se fez um errado julgamento de facto e também de direito;

C) Não se encontra provado nestes autos que o arresto da referida conta bancária constitui um dano de impossível ou difícil reparação;

D) Apesar do arresto daquela conta bancária, a sociedade continuou a poder desenvolver a sua atividade principal, ou seja, a vender automóveis, já que, para nenhum dos 35 veículos que se encontravam averbados em seu nome, em 1 de agosto de 2019, foi requerido o arresto pela AT;

E) Apesar do arresto daquela conta bancária, a sociedade não ficou impedida de abrir outra conta bancária, na mesma, ou noutra instituição bancária, e assim prosseguir a sua normal atividade;

F) In casu, não lograram os oponentes provar a existência de um nexo de causalidade entre o arresto da conta bancária aqui em causa e os factos elencados nos pontos S., T. e U. dos factos provados;

G) In casu, nem sequer se encontra provada a data a partir da qual a sociedade oponente ficou impedida de movimentar a supra identificada conta bancária;

H) O ofício remetido à AT pela suprarreferida instituição bancária, através do qual esta comunicou o arresto da conta bancária da sociedade oponente, ostenta a data de 9 de outubro de 2019, ou seja, uma data posterior à dos três documentos a que é feita referência nos pontos S., T. e U. dos factos dado como provados na Sentença;

I) Não se provou nestes autos que os salários dos 6 trabalhadores diretos da sociedade oponente não foram pagos devido ao arresto da sua conta bancária;

J) Ao invés do que concluiu o Meritíssimo Juiz do Tribunal "a quo”, na Sentença ora sob recurso, entendemos que os oponentes não lograram demonstrar a existência de danos de difícil reparação resultantes do arresto da conta bancária n.° ................ do B................, titulada pela sociedade;

K) Da factualidade dada por provada nos presentes autos resulta que o valor dos tributos que se pretendem garantir com esta providência cautelar é de € 1 101 688,34;

L) Da factualidade dada por provada nos presentes autos resulta, também, que o valor dos bens arrestados à sociedade T..........., LDA., é de € 283 040,61, e que o valor dos bens arrestados ao seu responsável subsidiário é de € 644 150,72, o que perfaz um valor total de € 927 191,33;

M) Não há dúvida que o valor dos bens arrestados é inferior ao da dívida cujo pagamento se pretende garantir com a presente providência cautelar, numa diferença de € 174 497,01;

N) Se ao valor de € 174 497,01, se adicionar o valor de € 283 005,91 existente na conta bancária arrestada, cujo arresto foi cancelado na decisão sub judice, verifica-se que o valor dos bens arrestados é inferior ao da dívida cujo pagamento se pretende garantir, numa diferença de € 457 502,92;

O) O valor da quota que o responsável subsidiário da sociedade T..........., LDA. detém na sociedade C................, LDA., considerado pelo Tribunal “a quo’’ como o valor real (€ 291 710,15), não pode ser de facto este;

P) Apesar de constar do balanço de 2018 um valor de € 583 420,30, impõe-se reconhecer que este é um valor extremamente volátil, que, nesta data, pode ser já muito inferior, pois nada nos garante que a sociedade não tenha, entretanto, acumulado prejuízos, ou que os seus sócios determinem a redução do capital próprio, não sendo esta, seguramente, a garantia mais idónea;

Q) Sem se apurar o valor que se obteria com a venda da referida participação social, o valor da mesma não pode ser considerado in casu, por um valor superior ao do valor da parte do capital social detido pelo oponente na referida sociedade, ou seja, € 2 500,00;

R) Salvo o devido respeito, entendemos que o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo”, ao considerar o valor do balanço como valor real da quota, apoiando-se no disposto no artigo 15.°, n.os 1 e 2, do CIS, incorreu em erro de julgamento de direito;

S) O disposto naquelas normas do CIS, apenas tem aplicação na determinação do valor tributável para efeitos de liquidação de Imposto do Selo, e nos casos de transmissão de quotas societárias a título gratuito, e não quando se pretenda aferir se a quota é, ou não, idónea para efeitos de garantia de pagamento de uma dívida fiscal, quando for executada;

T) Perante a jurisprudência que resulta do Acórdão do STA, proferido no processo n.°

01458/15, em 02/12/2015, impõe-se reconhecer que, se o recurso ao critério estabelecido no CIS para a avaliação de quotas societárias para efeitos de apreciação da idoneidade da garantia, está vedado à AT, também está vedado aos Tribunais em situações como aquela que aqui se nos apresenta;

U) Salvo o devido respeito, entendemos, também, que, o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo”, através da decisão da redução do arresto anteriormente decretado, tomada na Sentença aqui em apreço, violou o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários que resulta do n.° 2, do artigo 30.°, da LGT;

V) O arresto de bens aqui em causa, decretado através da douta Sentença proferida em 6 de setembro de 2019, respeitou na íntegra a proporcionalidade legalmente exigida no artigo 51.°, n.° 2, da LGT;

W) Salvo o devido respeito, entendemos, ainda, que, o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo”, ao determinar a redução do arresto anteriormente decretado, incorreu em erro de julgamento de direito, violando com a sua decisão o disposto no artigos 30.°, n.° 2, e 51.°, n.° 2, ambos da LGT, e no artigo 15.°, n.os 1 e 2, do CIS;

X) Por assim ser como de facto é, e estando tudo devidamente provado nos presentes autos, não pode a douta Sentença aqui em apreço manter-se na ordem jurídica, nos termos em que foi proferida, já que, nela, o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo”, incorreu em erro de julgamento de facto e de direito.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar o presente recurso PROCEDENTE, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a oposição dos requeridos, e que mantenha na ordem jurídica a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, em 6 de setembro de 2019, tudo com as devidas e legais consequências.».

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Por despacho do Mmo Juíz da 1.ª Instância foi ordenado o desentranhamento das contra - alegações de recurso.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Com dispensa dos vistos dos Desembargadores adjuntos, atento o carácter urgente do
processo, cumpre apreciar e decidir.


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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, vistas as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que, no caso concreto, a questão a decidir é a de saber se a sentença recorrida fez ou não correcto julgamento ao determinar o cancelamento do arresto incidente sobre a conta bancária n.º ................ do B.................


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III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DOS FACTOS
A sentença recorrida deu como assente a factualidade que infra se reproduz:
« A. Em 27.1.2015, foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial de Almada a sociedade "T........... LDA.", com o capital social de € 50.000,00, dividido em duas quotas, no valor de € 25.000,00, pertencentes, respetivamente, a R................ e M........... - cf. ap. 2/20150127 da certidão permanente de fls. 25 a 28 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida;
B. A gerência da sociedade "T........... LDA." ficou a cargo de M..........., obrigando-se a mesma com a assinatura do gerente - cf. ap. 2/20150127 da certidão permanente de fls. 25 a 28 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida;
C. No ano de 2017, a AT realizou uma ação de inspeção à sociedade "T........... LDA.", ao abrigo das ordens de serviço n.° OI201700092 e n.° OI201700093, tendo apurado irregularidades «ao nível do IVA liquidado pelo regime da margem - bens em segunda mão», das quais resultaram correções, em sede de IRC e IVA, referente aos anos 2015 e 2016, no montante total de € 982.109,97 - facto não controvertido; cf. artigo 4.° do requerimento inicial da providência cautelar «r.i.» e artigo 28.° da oposição;
D. As liquidações emitidas na sequência das correções a que se referem o ponto anterior foram impugnadas pela sociedade "T........... LDA.", dando origem ao processo que corre termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada sob o n.° 93/19.7BEALM - facto não controvertido; cf. artigo 4.° do r.i. e artigo 29.° da oposição;
E. Em 26.2.2019, a AT iniciou uma ação de inspeção à sociedade "T........... LOA.", ao abrigo da ordem de serviço n.° OI201900093, de 21.1.2019, relativa ao ano de 2017, visando «a verificação do cumprimento das obrigações fiscais, de acordo com a alínea b) do n.° 1 do n.° 1 do artigo 14.° do RCPITA, com base nas divergências detetadas no sistema entre as transmissões intracomunitárias de bens declaradas pelos vendedores e as aquisições intracomunitárias de bens declaradas pelo sujeito passivo nas suas declarações de IVA» - cf. «Ordem de Serviço» anexa à «Informação» da Direção de Finanças de Setúbal a fls. 44 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida;
F. Em 26.6.2019, o âmbito da ordem de serviço referido no ponto anterior foi alargado, passando a abranger, igualmente, «situações passíveis de correção em sede de IRC» - cf. «Ordem de Serviço» anexa à «Informação» da Direção de Finanças de Setúbal a fls. 47 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida;
G. Em 29.7.2019, pelo ofício n.° 9395, enviado, por carta registada, para a sede da sociedade "T........... .", foi comunicada a prorrogação do procedimento de inspeção a que se refere o ponto E. supra - cf. «Informação» da Direção de Finanças de Setúbal a fls. 14 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida;
H. Em 5.8.2019, no âmbito da ação de inspeção referida no ponto E. supra, foi elaborada «informação», pela Divisão de Inspeção Tributária I, da Direção de Finanças de Setúbal, de onde consta, entre o mais, o seguinte:
«(.)
II. 3 EXERCÍCIO DA GERÊNCIA DE FACTO POR PARTE DO SÓCIO GERENTE "M..........."
Consta como gerente de direito desde a constituição da empresa, e pôde comprovar-se que o sócio "M...........", exerceu no período em causa atos de gerência, tendo sido recolhidas cópias de diversos cheques da conta titulada pela sociedade, bem como cópias de contratos e outros documentos onde assinou em representação da sociedade, nomeadamente:
■ Cheque n.° ................, emitido em 03-08-2015, no montante de 11 900,00€, à ordem de "C................",
■ Cheque n.° ................, emitido em 27-03-2017, no montante de 2.840,00€;
■ Cheque n.° ................, emitido em 28-03-2017, no montante de 492,00€;
■ Cheque n.° ................, emitido em 28-12-2017, no montante de 1.000,00€;

■ Cheque n.° ................, emitido em 27-03-2018, no montante de 17 000,00€;
■ Assinatura em nome da sociedade, em 01-01-2018, do contrato de intermediação financeira com a C................ para o ano de 2018;
■ Assinatura em nome da sociedade, em 26-02-2019, da ordem de serviço 01201900093;
■ Assinatura em nome da sociedade, em 19-03-2019, da autorização de acesso a documentos bancários;
■ Assinatura em nome da sociedade, em 16-05-2019, da notificação para apresentação de documentos;
■ Assinatura em nome da sociedade, em 26-06-2019, da alteração à ordem de serviço OI201900093;

II. 4 ATIVIDADE DESENVOLVIDA
O procedimento de inspeção teve início no local onde a sociedade exerce a sua atividade, correspondente a um stand delimitado (fechado) na Estrada Nacional ….. (estrada que liga o Seixal a Sesimbra, localizado na zona de Fernão Ferro), denominado "L...............".
De acordo com os esclarecimentos do sócio gerente, verificou-se que a T............... exerce a atividade de comércio de veículos automóveis.
No âmbito desta atividade, pratica ainda serviços de intermediação financeira, referentes a negociação e concessão de crédito aos seus clientes.
Relativamente à atividade de compra e venda de veículos automóveis, o sócio gerente esclareceu que adquire veículos em diversos Estados Membros da EU, nomeadamente, Luxemburgo, Holanda, França, Bélgica, Espanha e Alemanha, através de leilão on line, normalmente na "L...............". Para poder adquirir as viaturas na leiloeira, é necessária inscrição prévia, sendo apenas facultada a sociedades constituídas (que não sociedades unipessoais).
Esclareceu ainda, relativamente ao IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado), que praticou no ano de 2017, o regime da margem.
III FACTOS APURADOS NO PROCEDIMENTO DE INSPEÇÃO
III. 1 INDEVIDA APLICAÇÃO DO REGIME DE IVA DA MARGEM
Da análise efetuada aos elementos de contabilidade, foram identificadas as seguintes operações ativas (transmissões e prestações de serviços) realizadas pelo sujeito passivo durante o ano de 2017:
■ Transmissões de viaturas adquiridas pelo regime normal, sujeitas ao regime normal do IVA, nos termos do artigo 1.° do Código do Imposto sobre o valor Acrescentado (CIVA);
■ Transmissões de viaturas adquiridas pelo regime especial da margem, sujeitas ao regime especial de tributação da margem, por força do previsto no DL 199/96, de 18/10;
■ Comissões por intermediação financeira, isentas de IVA, nos termos da alínea 27) do artigo 9.° do CIVA;
■ Outras prestações de serviços, sujeitas ao regime normal do IVA, nos termos do artigo 1.° do CIVA.
Tal como referido pelo sócio gerente e da análise dos elementos de contabilidade, verificou-se que o mesmo praticou o regime especial da margem, relativamente às transações de viaturas automóveis, tendo adquirido a grande maioria das mesmas em Estados Membros da UE.
O regime de bens em segunda mão, também designado por regime especial da margem, é um regime especial de tributação de bens, regulamentado pelo Decreto-lei 199/96, de 18 de Outubro.
Este diploma procede, em matéria de harmonização comunitária, à transposição para a ordem jurídica nacional da Diretiva n.° 94/5/CE, do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1994, relativa à tributação, em imposto sobre o valor acrescentado, das transmissões de bens em segunda mão, objetos de arte, de coleção e antiguidades.
Este regime tem como finalidade eliminar ou atenuar a dupla tributação ocasionada pela reentrada no circuito económico de bens que já tinham sido definitivamente tributados e incide sobre a diferença entre o preço de venda e o preço de compra.
Determina o artigo 3.º deste diploma que,
"As transmissões de bens em segunda mão, de objetos de arte, de coleção ou de antiguidades, efetuadas por um sujeito passivo revendedor, são sujeitas ao regime especial de tributação da margem, desde que este tenha adquirido esses bens no interior da Comunidade, em qualquer uma das seguintes condições:
a) A uma pessoa que não seja sujeito passivo;
b) A outro sujeito passivo, desde que a transmissão feita por este tenha sido isenta de imposto, ao abrigo do n.° 33 do artigo 9° do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, ou de disposição legal idêntica vigente no Estado membro onde tiver sido efetuada a transmissão;
c) A outro sujeito passivo, desde que a transmissão feita por este tenha tido por objeto um bem de investimento e tenha sido isenta de imposto, ao abrigo do artigo 53.° do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, ou de disposição legal idêntica vigente no Estado membro onde tiver sido efetuada a transmissão;
d) A outro sujeito passivo revendedor, desde que a transmissão dos bens por esse outro sujeito passivo revendedor tenha sido efetuada ao abrigo do disposto neste diploma, ou de regulamentação idêntica vigente no Estado membro onde a transmissão dos bens tiver sido efetuada."
Nos termos deste diploma, as viaturas usadas adquiridas para revenda enquadram-se na definição de bens em segunda mão prevista no seu artigo 2.°, sendo que para efeitos de comércio intracomunitário só são consideradas como usadas as que, por força do previsto no n.° 2 do artigo 6.° do RITI, conjugado com o artigo 20.° do DL 199/96, de 18/10, tenham percorrido mais de 6.000 kms e a transmissão seja efetuada mais de seis meses após a data da primeira utilização.
Por sua vez, sujeito passivo revendedor é aquele, que no âmbito da sua atividade, compra para revenda bens em segunda mão, conforme previsto no artigo 2 ° do DL 199/96, de 18/10.
Assim sendo, o valor tributável das transmissões de bens nestas condições, é determinado nos termos do artigo 4.° do mesmo diploma legal,
"1. ... pela diferença, devidamente justificada, entre a contraprestação obtida ou a obter do cliente, determinada nos termos do artigo 16° do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, e o preço de compra dos mesmos bens, com inclusão do imposto sobre o valor acrescentado, caso este tenha sido liquidado e venha expresso na fatura ou documento equivalente."
Da análise das faturas emitidas pelo sujeito passivo, das faturas de aquisição registadas na contabilidade,
e dos restantes elementos contabilísticos, verificaram-se os seguintes factos:
■ Quanto às vendas das viaturas, pela análise das faturas, verifica-se que estas foram emitidas não sendo indicado o montante do imposto (IVA), dado o sujeito passivo ter considerado que as vendas foram realizadas ao abrigo do regime especial da margem;
■ Quanto às compras das viaturas, é necessário distinguir as aquisições de veículos nacionais, das aquisições de veículos intracomunitários:
◦ As aquisições de veículos nacionais foram efetuadas a sujeitos particulares, registadas através de um documento de intenção de compra, assinado pelo proprietário do veículo;
◦ As aquisições de veículos intracomunitários foram efetuadas a operadores registados noutros estados membros, cujas faturas indicam que foram sujeitas ao regime normal de transmissões intracomunitárias.
Concluindo-se portanto que nos documentos aquisição que não cumprem os requisitos impostos no n.° 1 do artigo 3 ° do Decreto-lei n.° 199/96, de 18/10, a transmissão de bens (viaturas) por parte do sujeito passivo é sujeita ao regime normal de IVA, sendo o seu valor tributável determinado nos termos do n.° 1 do artigo 16.° do CIVA e não nos termos da alínea f) do n.° 2 do artigo 16.° do CIVA.

III. 2 OMISSÕES NAS VENDAS
Da confrontação dos dados obtidos junto das financeiras com os documentos registados na contabilidade do sujeito passivo, verificou-se que não foram contabilizadas as transmissões relativas a 86 viaturas que foram objeto de financiamento durante o ano de 2017, e cujo valor de venda indicado pelas entidades financeiras totaliza 1.392.610,83€.
Relativamente a essas viaturas, foi o sujeito passivo notificado em 16-05-2019 para apresentar os documentos de alienação e aquisição, tendo apenas apresentado os documentos de aquisição de 21 viaturas, não tendo apresentado quaisquer documentos de alienação.
Da confrontação dos valores de aquisição constantes das faturas apresentadas pelo sujeito passivo com os valores de aquisição constantes dos dados fornecidos pelas entidades financeiras, verificou-se que são coincidentes, permitindo face à não apresentação das restantes faturas de aquisição por parte do sujeito passivo, basear os cálculos a efetuar, nos valores da aquisição constantes dos dados fornecidos pelas financeiras.
Relativamente ao valor de alienação das viaturas, e dado que o sujeito passivo, apesar de notificado para tal, não apresentou quaisquer dados ou documentos relativos à sua alienação, considerou-se o valor de venda (PVP) indicado pelas entidades financeiras, uma vez que o mesmo lhe foi fornecido pelo sujeito passivo.
IV QUANTIFICAÇÃO DAS CORREÇÕES PREVISTAS
IV. 1 EM SEDE DE IRC - CORREÇÕES ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLETÁVEL
Com base nos factos apurados no procedimento de inspeção, nomeadamente, as omissões de vendas de viaturas mencionadas no ponto anterior, foram já apuradas as seguintes correções aritméticas ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo no período de 2017, que se encontram devidamente fundamentadas no projeto de relatório, que se encontra em fase de execução:


IV.2 EM SEDE DE IVA - IMPOSTO EM FALTA
Com base nos factos apurados no decorrer do procedimento de inspeção, descritos no projeto de relatório, que se encontra em fase de execução, verificaram-se incorreções na aplicação no Regime de IVA da Margem e omissões nas vendas, resultando os seguintes montantes de IVA em falta, por período de imposto:



RESUMO DO IMPOSTO EM FALTA
Com base nos cálculos efetuados nos pontos anteriores, são os seguintes os montantes de imposto que se determinaram em falta relativamente ao ano de 2017:


Resulta, portanto, um total de imposto em falta estimado, nos montantes de 1.101.688,34€
V MOTIVOS QUE JUSTIFICAM A ADOÇÃO DA MEDIDA CAUTELAR
Atualmente em nome da empresa encontra-se registado o seguinte imóvel:
1. Prédio rústico sito em Pinhal de Frades, freguesia de Fernão Ferro, concelho do Seixal, distrito de Setúbal, correspondente ao artigo …. da Secção ”AL", com o valor patrimonial de 34,70€; Relativamente a veículos, verificou-se o seguinte:
■ Em 2017 pagou IUC referente a 38 veículos automóveis;
■ Em 2018, pagou IUC referente a 61 veículos automóveis;
■ Em 01-08-2019, tinha 35 veículos automóveis averbados em seu nome.
Acresce ainda que, desde 2017 foram detetadas 127 infrações tendo sido instaurados os competentes processos de redução de coima e processos de contra ordenação.
Face aos valores de imposto em falta (IRC e IVA) estimados calculados no ponto anterior, verifica-se que o valor de IVA em divida é superior ao Resultado Liquido declarado do período de 2017 (740.596,74€), significando portanto, que a riqueza gerada pela sociedade não é suficiente para suportar o pagamento do imposto em divida, colocando em risco o cumprimento dos compromissos financeiros por parte da sociedade, e revelando um risco eminente de situação de insolvência.
Verifica-se ainda, da análise do balancete de 2017 que não existem contas de SNC da classe ”4", apesar de o sujeito passivo ter adquirido em 20-07-2017, o prédio rústico acima identificado, pelo montante de 77.000,00€. A inexistência de outros bens em nome do sujeito passivo, não dá garantias de cobrança dos créditos apurados no decurso do procedimento de inspeção.
Resulta da conjugação do preceituado nos artigos 136.° e 214.°, ambos do CPPT, que, havendo justo receio de insolvência, poderá ser requerido o arresto em bens suficientes para garantir a dívida exequenda e o acrescido.
Arresto este que poderá ser efetuado em bens do responsável subsidiário, desde que verificadas as seguintes condições cumulativas:
■ Haver fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis;
■ O tributo estar liquidado ou em fase de liquidação.
VI PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS PARA A REVERSÃO
Face aos factos elencados encontram-se verificados os requisitos para a reversão:
■ Insuficiência de património do devedor originário para a satisfação da dívida exequenda e acréscimos legais;
■ Prova da gerência de facto do gerente;
■ O prazo legal de pagamento ou entrega terminou no período de exercício do seu cargo;
Resulta assim dos factos elencados que:
■ Os 35 veículos automóveis existentes em nome do sujeito passivo, são manifestamente insuficientes para a satisfação da dívida;
■ O gerente de facto e de direito é, e sempre foi, M..........., NIF ...............;
■ O prazo legal de pagamento dos impostos em causa terminou no período de exercício do seu cargo, cargo que sempre deteve e detém.
Pelo que, se afigura que se encontram reunidos os pressupostos para requerer o arresto em bens do responsável subsidiário determinado nos termos das alíneas a) e b) do n.° 1 do artigo 24.° da Lei Geral Tributária, "M...........", NIF ................
VII BENS A ARRESTAR
Neste sentido, a fim de acautelar o pagamento dos impostos apurados, bem como os que se irão apurar, propõe-se o arresto dos seguintes bens, do responsável originário T..............., LDA:
Imóveis:
1. Prédio rústico sito em Pinhal de Frades, freguesia de Fernão Ferro, concelho do Seixal, distrito de Setúbal, correspondente ao artigo …… da Secção AL", com o valor patrimonial de 34,70€;
Conta bancária titulada pelo sujeito passivo:
……………………………, BIC/SWIFT: BCOMPTPL – Banco……………;
Em nome do responsável subsidiário, o sócio-gerente M...........:
Imóveis:
1. Prédio urbano sito em Urbanização …………10, Lote 37, freguesia de União de Freguesias de Azeitão, concelho de Setúbal, correspondente ao artigo ……. com o valor patrimonial de 143.406,91€, inscrito na Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o registo n.° 4184;
2. Prédio rústico com o nome "Redondo", inscrito sob o artigo …… da secção "M", da freguesia de Fernão Ferro, concelho de Seixal, com o valor patrimonial de 35,95€;
3. Prédio urbano sito em Avenida……………., n.° 44, freguesia de Fernão Ferro, concelho de Seixal, correspondente à fração "H" do artigo ………. com o valor patrimonial de 79 326,34€, inscrito na Conservatória do Registo Predial de Seixal sob o registo n.° 2039;
4. Prédio urbano correspondente a um lote de terreno para construção de 369 m2 sito Rua……….., Lote 679, freguesia de Fernão Ferro, concelho de Seixal, correspondente ao artigo ……… com o valor patrimonial de 54.160.00;
5. 1/2 de Prédio urbano sito na Rua…………., lote 4, freguesia de Fernão Ferro, concelho Seixal, correspondente ao artigo …… com o valor patrimonial de 151.022,74€.
Quotas noutras sociedades:
6. Quota detida pelo sócio (gerente de facto) M..........., na sociedade "C................ Lda." NIF..............., no montante de 2.500,00€.
Termos em que se propõe que seja solicitado à Representação da Fazenda Pública a promoção das diligências tendentes ao decretamento da Providência Cautelar de Arresto dos bens supra indicados, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal competente, em conformidade com o disposto no artigo 214° do CPPT e do artigo 51° da LGT.». - cf. «Informação» de fls. 13 a 23 dos autos e documentos a ela anexos de fls. 29 a 47 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);
I. Em 9.8.2019, o Diretor de Finanças Adjunto, da Direção de Finanças de Setúbal, exarou despacho de «Concordo» sobre a informação referida no ponto anterior - cf. «despacho» a fls. 13 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido;
J. Em 30.8.2019, P..............., contabilista da sociedade "T........... LDA.", emitiu o documento denominado «DECLARAÇÃO» com o seguinte teor:
«DECLARAÇÃO
Eu P............... no âmbito de responsabilidade técnica na sociedade S............... Lda NIF ..............., contabilista certificado, inscrito na OCC com o numero 72021.
Declaro Para os devidos efeitos, que sou responsável pela planificação, organização e execução da contabilidade e assunção da responsabilidade técnica, em termos contabilísticos e fiscais, da sociedade T............... LDA NIF ............... com sede na rua …………lote 188 2865 065 Fernão Ferro, tendo sido o declarante que apurou os impostos IVA, constante das declarações periódicas dos exercícios 2015 2016 2017
Mais declaro que foi o declarante que fez a opção pela tributação pelo método do regime da margem, nos anos em causa.» - cf. «declaração» junta como doc. 5 da oposição, a fls. 239 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida;
K. Em 17.9.2019, foi efetuado o registo do arresto sobre o prédio rústico sito em Pinhal dos Frades, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Fernão Ferro, concelho do Seixal, sob o artigo……, da secção "AL", com o valor patrimonial tributário («VPT») de € 34,70, registado na Conservatória do Registo Predial do Seixal sob o n.°……., em nome da sociedade "T........... LDA." - cf. ap. 2630 de 2019/09/17 da certidão permanente a fls. 157 e 158 dos autos e caderneta predial a fls. 48 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
L. Em 17.9.2019, foi efetuado o registo do arresto sobre o prédio urbano sito na Urbanização………….., lote 37, inscrito na matriz predial urbana da união das freguesias de Azeitão (São Lourenço e São Simão), concelho de Setúbal, sob o artigo………, com o VPT de € 143.406,91, registado na Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o n.°……, em nome de M........... - cf. ap. 2630 de 2019/09/17 da certidão permanente de fls. 137 a 139 dos autos e caderneta predial a fls. 54 e 55 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
M. Em 17.9.2019, foi efetuado o registo do arresto sobre o prédio rústico sito em Redondo, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Fernão Ferro, concelho do Seixal, sob o artigo……., da secção "M", com o VPT de € 35,95, registado na Conservatória do Registo …….. predial do Seixal sob o n.°………, em nome de M........... - cf. ap. 2630 de 2019/09/17 da certidão permanente a fls. 133 e 134 dos autos e caderneta predial a fls. 56 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
N. Em 17.9.2019, foi efetuado o registo do arresto sobre a fração autónoma designada pela letra "H", do prédio urbano sito na Avenida………., n.° 44, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Fernão Ferro, concelho do Seixal, sob o artigo……., com o VPT de € 79.326,34, registado na Conservatória do Registo Predial do Seixal sob o n.°……., em nome de M........... - cf. ap. 2630 de 2019/09/17 da certidão permanente a fls. 135 e 136 dos autos e caderneta predial a fls. 57 e 58 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
O. Em 17.9.2019, foi efetuado o registo do arresto sobre o prédio urbano, correspondente a um lote de terreno para construção, com a área de 369,00m2, sito na Rua………., Lote 679, inscrito na matriz predial da freguesia de Fernão Ferro, concelho do Seixal, sob o artigo………., com o VPT de € 54.160,00, registado na Conservatória do Registo Predial do Seixal sob o n.°….., em nome de M........... - cf. ap. 2630 de 2019/09/17 da certidão permanente de fls. 143 a 156 dos autos e caderneta predial a fls. 59 e 60 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
P. Em 17.9.2019, foi efetuado o registo do arresto sobre % do prédio urbano, correspondente a um lote de terreno para construção, sito na Rua…………, Lote 4, inscrito na matriz predial da freguesia de Fernão Ferro, concelho do Seixal, sob o artigo…….., com o VPT de € 151.022,74, registado na Conservatória do Registo Predial do Seixal sob o n.°…….., em nome de M........... - cf. ap. 2630 de 2019/09/17 da certidão permanente de fls. 140 a 142 dos autos e caderneta predial a fls. 61 e 62 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
Q. Em 19.9.2019, foi efetuado o registo do arresto sobre a quota detida por M........... na sociedade C................, Lda., no valor nominal de € 2.500,00 - cf. Dep 1174/2019-09-19 da certidão permanente de fls. 170 a 175 dos autos;
R. Em 19.9.2019, H.............., «Gestor Conta Subgerente» do Banco………, enviou «e-mail» para «………… », com o seguinte teor:
«Junto anexo simulação para financiamento 500.000€ prazo 24 meses» - cf. «e-mail» junto como doc. 3 da oposição, a fls. 229 e 230 dos autos, que se dá por integralmente reproduzidos;
S. Em 23.9.2019, a sociedade T.............. - Reparações Auto, Unipessoal, Lda. emitiu o documento denominado «DECLARAÇÃO» com o seguinte teor:
«DECLARAÇÃO
T.............. - Reparações Auto, unipessoal, Lda., sociedade unipessoal por quotas, pessoa colectiva n° .............., com sede na Av………….., Lote A2, 2865-001 Fernão Ferro,
Venho por este meio informar, que a contar da data 23/09/2019 por falta de pagamentos por parte da empresa T.............. Lda. NIF .............., vamos cancelar o crédito e qualquer trabalho a efetuar para a referida empresa.» - cf. «declaração» junta como doc. 10 da oposição, a fls. 245 dos autos;
T. Em 30.9.2019, A............., da sociedade T..........., LDA., enviou «e-mail» para «……………. » e «…………… » com o seguinte teor:
«Junto envio em anexo declaração do nosso fornecedor na Bélgica a informar da perda de um sinal no valor de 9.000€ referente a aquisição de 3 veículos por falta de pagamento dos mesmos.
E mais informam por quebra de confiança que não nos vão vender mais veículos.
(...)» - cf. «e-mail» junto como doc. 8 da oposição, a fls. 242 dos autos;
U. Em 30.9.2019, a sociedade L............. emitiu o documento no qual, além do mais, consta o seguinte:
«(…)
Em virtude do não pagamento dos honorários vimos por este meio informar que iremos proceder ao cancelamento das davs suspensas já emitidas não nos responsabilizando assim por quaisquer multas que venham a decorrer por parte da Alfandega.
Mais informamos que iremos suspender os serviços de legalização de viaturas, até à situação dos pagamentos de honorários estar resolvida.
(...)» - cf. documento junto como doc. 9 da oposição, a fls. 244 dos autos;
V. Em 9.10.2019, o B................ dirigiu à AT - Direção de Finanças de Setúbal o ofício n.° AP/AJ1347A19, no qual, além do mais, consta o seguinte:
«Processo n.° 674/19.9BEALM
Requerido: T........... Lda (NPC ..............)
Assunto: Auto de Arresto
Exmos Senhores,
Acusamos a recepção dos V/ Ofícios em referência, que nos mereceu a melhor atenção, relativamente à instituição de crédito nossa agrupada Banco ……………….(…………..).
De acordo com o solicitado, serve a presente para informar que no âmbito do V/ Processo n° 674/19.9BEALM, encontra-se arrestado e cativo na conta de depósitos à ordem n°................, titulada pela T........... Lda, o valor total de 283.005,91 €.
(...)» - cf. «ofício» a fls. 164 dos autos;
W. A sociedade “T........... LDA." tem ao seu serviço seis trabalhadores - cf. documento junto como doc. 11 da oposição, a fls. 246 dos autos;
X. Da declaração anual IES/DA da sociedade C................ Lda., referente ao ano de 2017, consta, entre o mais, o seguinte:



- cf. «declaração IES/DA» junta como doc. 14 da oposição, de fls. 257 a 264 dos autos;
Y. Da declaração anual IES/DA, da sociedade C................ Lda. referente ao ano de 2018, consta, entre o mais, o seguinte:


Z. Em 17.10.2019, a presente oposição deu entrada neste Tribunal - cf. «comprovativo de entrega de documento» a fls. 182 a 184 dos autos.

Com relevância para a boa decisão da causa não se consideram indiciariamente provados os seguintes factos:
1. Entre 15.2.2018 e 19.3.2018, a sociedade Oponente procedeu ao pagamento das liquidações emitidas na sequência das correções efetuadas, em sede de IRC e IVA, pela AT relativamente aos anos de 2015 e 2016, no montante total de € 982.109,97;
2. Para efetuar o pagamento das liquidações referidas no ponto 1. que antecede, a sociedade Oponente recorreu a um empréstimo bancário no montante de € 400.000,00;
3. A sociedade Oponente obteve a aprovação de um novo empréstimo bancário, no montante de € 500.000,00, para liquidação dos impostos devidos na sequência das correções referentes ao procedimento inspetivo em curso;
4. A sociedade Oponente não procedeu ao pagamento dos vencimentos de seis trabalhadores, referentes ao mês de setembro de 2019.
*
A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto assentou no teor dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, conforme referido a propósito de cada ponto do probatório.
Quanto aos factos constantes dos pontos 1. e 2. dos factos não provados, os Oponentes fundamentaram a sua alegação no teor dos documentos juntos como documentos 1 e 2 da oposição (cf., respetivamente, fls. 212 a 227 e 228 dos autos), dos quais, porém, apenas resulta que foram efetuados pagamentos ao Estado e não que tais pagamentos tenham sido efetuados na sequência das correções que resultaram da fiscalização realizada pela AT, em 2017, em sede de IRC e IVA, no montante total de € 982.109,97 (constatando-se, aliás, que o total dos pagamentos efetuados não perfaz essa quantia), nem que, para tanto, tenham recorrido a um empréstimo bancário no valor de € 400.000,00, sendo certo que o documento junto nada prova a este respeito.
Quanto ao facto constante do ponto 3. dos factos não provados, os Oponentes fundamentaram a sua alegação no teor do documento junto como documento 3 da oposição (cf. fls. 229 e 230 dos autos), do qual não resulta, porém, que tenha sido concedido à sociedade Oponente um empréstimo bancário no montante de € 500.000,00, mas tão-só que foi solicitada e feita uma simulação, pelo Banco BPI, para financiamento da quantia de € 500.000,00, por um prazo de 24 meses.
Por último, quanto ao facto constante do ponto 4. dos factos não provados, os Oponentes fundamentaram a sua alegação no teor do documento junto como documento 11 da oposição (cf. fls. 246 dos autos), do qual não resulta, porém, que não tenham sido pagos os vencimentos, referentes ao mês de setembro, mas, tão só, que, nesse mês, a sociedade “T..........., LDA.” tinha ao seu serviço seis trabalhadores.
Em face do exposto, pelas razões acima enunciadas, não se consideram provados os factos constantes dos pontos 1., 2., 3. e 4. do probatório.».


**

B.DE DIREITO

No Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, a Fazenda Pública instaurou o Procedimento Cautelar de Arresto contra «T..........., Lda» e M........... que veio a ser decretado por sentença de 6 de Setembro de 2019.

Notificados, os arrestados deduziram ao abrigo do artigo 372.º, n.º1, al.b) do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, al.e) do CPPT, oposição pedindo o « cancelamento do arresto dos bens e direitos » decretados.

O Meritíssimo Juiz de 1.ª instância julgou a oposição parcialmente procedente e, em consequência, determinou «a redução da providência decretada, com o levantamento do arresto da conta bancária n.º ................ do B................, de que é titular a sociedade oponente e manteve a providência de arresto anteriormente decretada quanto aos restantes bens.».

Para decidir pela redução da providência decretada, considerou-se na sentença recorrida que: « (…) da factualidade assente nos autos, resulta que o arresto da (única) conta bancária titulada pela sociedade oponente (cf. ponto V. dos factos provados) está a dificultar o exercício da respetiva atividade e a motivar o incumprimento das suas obrigações (cf. pontos S., T. e U. dos factos provados), donde poderão resultar prejuízos de difícil reparação senão de impossível – pelo menos de muito difícil – reparação.».

Inconformada, a Fazenda Pública (doravante recorrente) começa por sustentar que contrariamente ao decidido « (…) não lograram os oponentes provar a existência de um nexo de causalidade entre o arresto da conta bancária aqui em causa e os factos elencados nos pontos S., T. e U. dos factos provados» para daí concluir que « Não se encontra provado nestes autos que o arresto da referida conta bancária constitui um dano de impossível ou difícil reparação».

Temos, assim, que o decretamento da providência não vem atacado, apenas se discute neste recurso a extensão do arresto.

Vejamos, então.

Nos termos do artigo 51.º, nº.2, da LGT a realização de providências cautelares por parte da Fazenda Pública e no âmbito do procedimento/processo tributário deve respeitar os princípios da necessidade e da proporcionalidade. O que significa que devem ser proporcionais ao dano a evitar e não causar danos de impossível ou difícil reparação, devendo o arresto ser determinado em bens ou rendimentos suficientes para a segurança normal do crédito tributário.

Conforme refere o Acórdão deste Tribunal Central Administrativo de 10.07.2015, proferido no processo n.º 8820/15: « Este normativo traça, pois, um duplo limite à adopção das providências cautelares: não devem ser excessivas, o que é uma proibição meramente relativa, respeitando ao conteúdo e extensão concretos de cada providência; nem causar dano de impossível ou difícil reparação ao particular, o que significa a proibição absoluta das medidas provisórias que atinjam esse resultado, mesmo quando o seu objectivo seja evitar um dano de difícil ou impossível reparação à Fazenda Nacional, e gerando a inobservância dessa disposição um dever de indemnização por parte da Administração Tributária. O princípio da proporcionalidade não apenas proíbe a adopção de providências cautelares excessivas, como impõe a sua caducidade no momento em que seja obtido o fim para que foram decretadas (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/6/2011, proc. 4809/11;Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Editora Encontro de Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.420; António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária anotada, Rei dos Livros, 2000, pág.237 e seg.)(disponível em www.dgsi.pt).

Estamos aqui num domínio, como refere JORGE LOPES DE SOUSA, onde: « (…) estão em causa, normalmente, meros interesses patrimoniais, pelo que os prejuízos deste tipo que se podem considerar como irreparáveis serão aqueles que não sejam susceptíveis de quantificação pecuniária minimamente precisa.».

E, como concretiza aquele Autor:

«Serão de considerar factos geradores de prejuízos irreparáveis, por exemplo, a paralisação da actividade comercial de uma empresa, desde que se comprove que tenha como consequência a perda de clientela (…) dispêndio de quantias cujo pagamento seja susceptível de afectar significativamente a estrutura económico-financeira de uma empresa, fazendo perigar a sua subsistência como empresa» (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.595).

A provisoriedade das providências cautelares e a sua finalidade de garantia, de regulação ou de antecipação, como salienta MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA « (…) justificam que as medidas tomadas ou impostas devam ser adequadas às situações que se pretende acautelar ou tutelar. As relações entre aquelas medidas e estas situações devem orientar-se por uma regra de proporcionalidade: as medidas provisórias não podem impor ao requerido um sacrifício desproporcionado relativamente aos interesses que o requerente deseja acautelar ou tutelar provisoriamente. (artº 387º, nº 2; cfr. também artºs 397º, nº 2, 408º, nºs 2 e 3 e 419º)» (Estudos sobre o Novo Processo Civil”, pág. 249).

Por outro lado, «A providência deve, entretanto, ser recusada (mesmo que os seus dois pressupostos se verifiquem), se o prejuízo por ela causado ao requerido for superior ao dano que o requerente pretende evitar”» (A. Varela, “Manual de Processo Civil”, pág. 25).

Concordando-se com tais apreciações, não se antevê, máxime do teor da matéria de facto dada como provada sob os pontos S. T. e U. do probatório, qualquer possibilidade que permita extrair a conclusão a que chegou o Tribunal de 1.ª instância.

Desde logo, como refere - e bem- a recorrente as declarações inscritas nos apontados pontos do probatório, foram emitidas em data anterior ao ofício remetido pela Administração Tributária ao B................, através do qual lhe comunicou o arresto da conta bancária n.º .................

Acresce que:

*do documento denominado «DECLARAÇÃO» emitido, em 23 de setembro de 2019, pela sociedade T.............. – Reparações Auto, Unipessoal, Lda. (cfr. ponto do probatório), não se extrai em que data(s) tais alegados pagamentos deveriam ter ocorrido.

*do email enviado por A............. para os endereços «………….. e «………………. », em 30 de setembro de 2019 (cfr. ponto T. do probatório), não se prova que o pagamento solicitado pela empresa belga, em 23 de setembro de 2019, que deveria ter sido efetuado até 26 de setembro de 2019, não ocorreu de facto e que tal se ficou a dever ao arresto da conta bancária da sociedade

*do documento mencionado no ponto U. do probatório, que tem a data de 30 de setembro de 2019, também não se fica a saber em que data é que o alegado pagamento de honorários deveria ter ocorrido.

Neste cenário inexistem factos susceptíveis de permitir traçar qualquer nexo entre o incumprimento dos mencionados pagamentos e o “saldo bancário” arrestado.

Complementarmente, também se não vê em como é que o arresto decretado impossibilite a recorrida de efectuar negócios e prosseguir com a sua actividade.

De facto, o arresto incide sobre o saldo bancário e não sobre a própria conta bancária, por conseguinte nada impede que continue a ser utilizada nem determina, por si só, que a actividade comercial da sociedade não possa continuar a ser exercida. Repare-se, que não obstante ter sido alegado pelos recorridos que os salários dos seus seis trabalhadores não foram pagos, tal factualidade não resultou provada.

Consequentemente, na situação dos autos, ao contrário do que é entendimento do Tribunal de 1.ª instância, não logram os recorridos demonstrar a existência de danos de difícil ou impossível reparação derivados do arresto do saldo bancário existente na conta n.º ................ do B.................

Mas o Tribunal de 1.ª instância invocou um outro argumento para ancorar a redução do arresto, e o consequente levantamento: « a providência decretada recai sobre quantia necessária para assegurar mais de metade o direito do credor tributário».

Na matéria das suas conclusões K. a V. das alegações do recurso, sustenta a recorrente que o arresto decretado respeita o princípio da proporcionalidade.

As providências cautelares estão sujeitas ao princípio da proporcionalidade, significando isto que não devem ser decretadas quando o prejuízo resultante das mesmas exceda significativamente o dano que se pretende evitar – artigo 368.º nº 2 do CPC - A providência pode, não obstante, ser recusada pelo tribunal quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar. Isto é assim, sem prejuízo de a jurisprudência propender para aceitar uma certa margem de excesso no valor dos bens arrestados sobre o montante que se pretende acautelar (neste sentido, entre muitos outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 13.04.10, proferido no processo nº 42404/08.7YIPRT-A:C1).

No caso concreto, compulsada a matéria de facto assente, verifica-se que o valor dos tributos que se pretendem garantir com a providência cautelar é de 1.101.688,34€ (cfr. ponto H. dos probatório) e que o valor dos bens arrestados à sociedade T..............., Lda, é de 283.040,61€ - correspondente à soma do valor patrimonial do prédio rústico de que é proprietária, 34,70€ (cfr. ponto K. do probatório), acrescido do montante cativado na (única) conta bancária de que é titular, € 283.005.91 (cfr. ponto V. do probatório), o que perfaz o valor de 927. 191,33€.

Desde modo, não existe uma desproporção entre o valor dos tributos que se pretendem garantir no valor de 1. 101. 688,34€ (cfr. ponto H. dos probatório) e o valor dos bens e direitos arrestados que é de 927.191,33€.

O que significa que, como bem refere a recorrente «não há duvida que o valor dos bens arrestados é inferior ao da dívida cujo pagamento se pretende garantir, numa diferença de €174 497,01.».

E porque assim é, mostra-se inequívoco que não existe uma desproporção entre o valor dos tributos que se pretende acautelar e o valor dos bens arrestados, pelo que entendemos que se mostra assegurado o princípio da proporcionalidade

Acresce que, que a redução do arresto subsequente à oposição dos arrestados só poderia fundar-se na situação em que o valor a garantir fosse menor ou que o valor dos bens arrestados fosse maior que aqueles que foram pressupostos aquando do decretamento da medida, o que no caso não se verificada qualquer uma das apontadas circunstâncias.

Por outro lado, não se alcança como pode ser invocada para justificar a redução a circunstância de estar garantido metade do valor garantir quando é mister assinalar que, tal como se referiu supra, não lograram os recorridos demonstrar que o prejuízo que para eles decorreria em consequência do mencionado arresto do saldo bancário é de difícil ou de impossível reparação.
Por tudo o acima exposto, impõe-se julgar procedente o recurso interposto pela Fazenda Pública.


IV.CONCLUSÕES
I.O arresto é uma das providências cautelares admitidas em processo judicial tributário “ex vi” do disposto no artigo 135.º do CPPT e de que a Fazenda Pública pode lançar mão desde que preenchidos os requisitos do artigo 136.º do mesmo diploma legal.
II.Nos termos do artigo 51.º, nº.2, da LGT a realização de providências cautelares por parte da Fazenda Pública e no âmbito do procedimento/processo tributário deve respeitar os princípios da necessidade e da proporcionalidade. O que significa que devem ser proporcionais ao dano a evitar e não causar danos de impossível ou difícil reparação, devendo o arresto ser determinado em bens ou rendimentos suficientes para a segurança normal do crédito tributário.
III.O arresto de saldo bancário incidente sobre a única conta bancária que a arrestada dispõe e que se encontra afecta à sua actividade não configura, por si só, uma situação geradora de prejuízo irreparável ou de difícil reparação.


V.DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes que integram a 1ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em conceder provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, revogando-se a sentença recorrida na parte em que determinou a redução da providência decretada, consubstanciada no levantamento da conta bancária n.º ................ do B................, e, consequentemente, mantem-se o arresto decretado nos seus precisos termos.

Custas pelos recorridos.

Lisboa, 25 de Junho de 2020


[Ana Pinhol]

[Isabel Fernandes]
com voto de vencido

[Jorge Cortês]




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Vencida. Negaria provimento ao recurso por entender que, in casu, a manutenção do arresto do saldo da conta bancária da executada é susceptível de causar um dano de impossível ou difícil reparação, nos termos do preceituado no nº2 do artigo 51º da LGT, como entendeu a sentença recorrida.


(Isabel Fernandes)