Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:894/12.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:03/25/2021
Relator:ANA PINHOL
Descritores:EFEITO DO RECURSO;
IVA;
FACTURAS FALSAS.
Sumário:I. Decorre expressamente do nº 5 do artigo 641.º do CPC, que a decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior.

II.A recusa do direito à dedução do IVA oposta a sujeitos passivos constitui uma excepção ao princípio fundamental do sistema comum do IVA que, só é admitida em circunstâncias excepcionais.

III. Para que a Administração Tributária, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 19.º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova do acordo simulatório para satisfazer o ónus da prova que sobre si impende.

IV. Basta à Administração Tributária provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução do imposto (ou a isenção de IVA), factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I.RELATÓRIO

C…………., Lda, recorre para este Tribunal Central Administrativo da sentença proferida pelo Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial que deduzira contra os actos de liquidação adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) dos anos de 2005 e 2006, no montante total de € 24.365,47.

O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e a Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu nas seguintes conclusões:

«A)Vem o presente Recurso interposto da Douta Sentença de fls. dos autos na parte em que julgou improcedente a Impugnação apresentada pela Recorrente, quanto às liquidações adicionais de IVA dos anos de 2005 e 2006 realizadas pela Fazenda Pública.

B)Por via do Douto Despacho de 11.04.2018 o Tribunal “a quo” admitiu o presente recurso, contudo fixou-lhe efeito meramente devolutivo. Contudo, dispõe o n.º 2 do artigo 286º do CPPT que: “2 - Os recursos têm efeito meramente devolutivo, salvo se for prestada garantia nos termos do presente Código ou o efeito devolutivo afectar o efeito útil dos recursos.”

C)No caso, a Recorrente prestou garantia (Garantia Bancária (n.º………….), no montante de € 30.920,00 (trinta mil, novecentos e vinte euros)), conforme resulta do Requerimento que dirigiu à Autoridade Tributária e Aduaneira em 20.07.2010 (Cfr Doc. 1). Motivo pelo qual, deverá ser atribuído efeito suspensivo ao presente recurso, o que ora se requer.

D)No que tange à Douta Sentença recorrida, não pode a Recorrente conformar-se a mesma, por entender que a prova efectivamente produzida impunha que houvesse o Tribunal “a quo” alcançado conclusão diversa no que concerne ao julgamento da matéria de facto.

E)Das declarações prestadas pelo legal representante da Recorrente, resultou a confirmação de que entre a sua representante e a sociedade S............ foram celebrados contratos de sub-empreitada, não reduzidos a escrito (como aliás frequentemente sucede no âmbito deste tipo de contratos, em especial no ramo de actividade em questão - construção civil). Sendo que o único suporte documental das transacções em causa são as facturas emitidas (Declarações prestadas em Audiência de Julgamento realizada em 30.04.2015, faixa única, minutos 01:11:58 a 01:12:38 e 01:15:14 a 01:15:17)

F)As quais – contrariamente ao entendimento do Tribunal “a quo” - foram corroboradas pelo depoimento prestado pela Testemunha A............, que referiu ser prática corrente (fruto da confiança entre as partes) que no meio em questão tais contratos se bastassem com o acordo verbal das partes (Declarações prestadas em (Audiência de Julgamento realizada em 30.04.2015, faixa única, minutos 00:59:38 a 00:59:47)

G)Mais resultou da prova produzida a confirmação da alegação da Recorrente, de que entre si e a sociedade S............ existiu um contrato de subempreitada, de fim finalístico, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 1213º do Código Civil, pelo qual à Recorrente interessava tão-somente o resultado, i.e., a realização da obra, e não os meios para a obtenção desse resultado. Veja-se, a esse propósito, aquelas que foram as declarações prestadas pelo legal representante da Recorrente (Declarações prestadas em Audiência de Julgamento realizada em 30.04.2015, faixa única, minutos 01:12:49 a 01:13:24, 01:16:06 a 01:16:31, 01:16:39 a 01:17:02, 01:17:43 a 01:17:45, 01:20:25 a 01:20:48)

H)Delas tendo resultado esclarecido o motivo subjacente à celebração dos contratos entre a Recorrente e a sociedade S............ e que foi o da circunstância da estrutura produtiva da Recorrente ser insuficiente para assegurar a realização, em tempo, da totalidade dos trabalhos que, em determinados momentos temporais, lhe foram em simultâneo adjudicados (fruto do acréscimo da actividade da construção nessas datas).

I)Sendo que essa necessidade, descrita pelo legal representante da Recorrente, foi corroborada pelo depoimento prestado pela testemunha V............, que referiu saber que aquela havia contratado com outras empresas a realização de trabalhos que lhe haviam sido adjudicados (um regime de sub-sub-empreitada) por não dispor de trabalhadores que lhe permitissem assegurar a realização da totalidade dos trabalhos.

J)Mais tendo referido recordar-se da circunstância da Recorrente haver contratado os serviços de “uma equipa” liderada pelo “Sr. D............”, reportando-se assim à S............ e a D............, seu representante - confirmando assim as declarações prestadas pelo legal representante da Recorrente- (Declarações prestadas Audiência de Julgamento realizada em 30.04.2015, faixa única, minutos 14:55 a 15:50 e 26:42 a 27:11)

K)Não se vislumbrando como pode o Tribunal “a quo” haver concluído que tal testemunha “nunca mencionou a sociedade S............, Lda., como prestadora de serviços à C… Lda.”, quando tal testemunhal se referiu à pessoa do legal representante da S............ (D............), cujo nome foi igualmente confirmado pelo legal representante da Recorrente.

L)Também a Testemunha A............ referiu recordar-se da obra sita na Calçada da Estrela, na Travessa da Pena, que consistia em um prédio de sete andares, uma loja e dois pisos de garagem, confirmando que toda a pintura do prédio ficou a cargo da Recorrente e que, atenta a necessidade de reforço de trabalhadores para a execução dos trabalhos, a mesma contratou os serviços de outra empresa (Declarações prestadas em Audiência de Julgamento realizada em 30.04.2015, faixa única, minutos 01:00:05 a 01:01:17 e 01:01:32 a 01:02:11)

M)A testemunha A............ explicitou, de forma clara, que os trabalhos de pintura das obras da E............, de que era funcionário, eram adjudicados em exclusivo à Recorrente e que nos anos de 2005,2006, tal empresa mantinha em simultâneo cerca de seis, sete obras, nas quais a Recorrente executava os serviços da sua especialidade.

N)E se é certo que tal testemunha não se referiu, especificamente, à sociedade S............, não se poderá ter por despiciendo que a mesma confirmou assim (e como se transcreveu) a necessidade da Recorrente em celebrar os referidos contratos de sub-empreitada, bem como a efectiva existência da obra sita na Calçada da Estrela (!) Declarações essas que, salvo o devido respeito, mal andou o Tribunal “a quo” ao desconsiderar/ignorar.

O)Também a Testemunha L............, funcionário da empresa C……….., Lda., à data de 2005 e 2006, afirmou que a mesma fornecia materiais para a Recorrente, recordando-se de, no âmbito das suas funções, se haver deslocado a uma obra sita em Vila Moura, onde a Recorrente desempenhava os trabalhos da sua especialidade.

P)E, por conhecer os trabalhadores da Recorrente, referiu que a mesma tinha, à data dos factos, cerca de 10 (dez) trabalhadores. Mais referiu que na obra sita em Vila Moura haviam outras equipas de trabalhadores a trabalhar para a Recorrente – na sua maioria de origem africana - os quais adquiriam materiais na loja onde presta funções, em nome de outra empresa distinta da Recorrente (Declarações prestadas Audiência de Julgamento realizada em 30.04.2015, faixa única, minutos 38:00 a 40:18)

Q)No que tange à inexistência de comprovativos dos pagamentos efectuados pela Recorrente à S............, que concluiu a Autoridade Tributária constituir em indício da simulação das operações, também ela resultou explicitada, atenta a prova produzida. Tendo o legal representante da Recorrente referido que os pagamentos tiveram lugar, em várias ocasiões, por meio de numerário entregue ao representante da S............, D............, atentas as solicitações do mesmo (Declarações prestadas em Audiência de Julgamento realizada em 30.04.2015, faixa única, minutos 01:13:48 a 01:14:00)

R)Havendo ainda o mesmo confirmado que os trabalhos constantes das facturas em questão, foram efectivamente realizados e pagos (Declarações prestadas Audiência de Julgamento realizada em 30.04.2015, faixa única, minutos 01:20:08 a 01:20:10)

S)Resultou assim manifesto, ante aquela que foi a prova produzida, que as facturas em questão traduzem trabalhos efectivamente realizados pela sociedade sua emissora à Recorrente e por esta pagos. Traduzindo uma mesma relação comercial que, de facto e efectivamente, existiu.

T)Tendo ficado afastadas quaisquer dúvidas quanto à circunstância de entre a Recorrente e a sociedade S............ haverem sido celebrados, verbal e pontualmente, contratos de prestações de serviços (subempreitada), atentas as necessidades da Recorrente e, bem assim, que os trabalhos descritos nas facturas foram efectivamente realizados pela S............ e pagos pela Recorrente.

U)E sequer se diga que a falta de redução a escrito do contrato celebrado entre a Recorrente e a sociedade S............ poderá permitir concluir pela “falsidade” das mesmas. Já que as regras da experiência comum das quais se deve o Julgador socorrer em sede da apreciação da prova, impõe-se ser moldadas de acordo com as características específicas de cada quadro factual.

V)E acaso o Tribunal “a quo” houvesse realizado tal ponderação, analisando a prova tendo presente que os trabalhos em questão se inserem no ramo da construção civil e no âmbito da relação entre o empreiteiro e o subempreiteiro, e facilmente teria concluído em sentido diverso.

W)Tão pouco poderá colher o entendimento do Tribunal “a quo”, segundo o qual a prova testemunhal produzida não reveste credibilidade. Uma vez que a mesma se mostrou coerente, objectiva e clara, inexistindo qualquer fundamento que validamente permita concluir o nesse sentido.

X)tento o conjunto da prova documental e testemunhal produzida, deverão dar-se por provados os seguintes factos:

1 - Que entre a Recorrente e a sociedade S............ ........ Unipessoal, Lda., foram celebrados contratos de subempreitada, sob a forma verbal e não reduzidos a escritos.

2 - Que por via desses contratos a sociedade S............ ........ Unipessoal, Lda. prestou serviços à Recorrente, designadamente os discriminados nas faturas emitidas pela S............ ........ Unipessoal, Lda. à Recorrente, no período entre 03/2005 a 02/2006, identificadas no ponto 5. (factos provados) e que correspondem a serviços efetivamente realizados.

3 - Que a Recorrente, por sua vez, efectuou o pagamento da totalidade das facturas identificadas no ponto 5. (factos provados) à sociedade S............ ........ Unipessoal, Lda.”, nos montantes aí constantes.

Y)Segundo as regras do ónus da prova, antes de se poder onerar a Recorrente com a prova de que as facturas em causa corresponderam a prestações de serviços efectivas (e que provou), era à Fazenda pública que caberia demonstrar que tais facturas diziam respeito a operações simuladas. O que não fez (!)

Z)Impunha-se que houvesse o Tribunal “a quo” julgado procedente a Impugnação apresentada pela Recorrente, por carecerem de fundamento legal as liquidações adicionais promovidas pela Fazenda Pública, determinando a sua anulação.

AA)Devendo pois, nessa conformidade, ser julgado procedente o presente recurso, substituindo a Douta Sentença recorrida por decisão que, julgando procedente a Impugnação apresentada pela Recorrente e, por carecerem de fundamento legal, determine a anulação das liquidações adicionais promovidas pela Fazenda Pública.

NESTES TERMOS

E nos demais de direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve ser julgado procedente o presente recurso, substituindo a Douta Sentença recorrida por decisão que, julgando procedente a Impugnação apresentada pela Recorrente e, por carecerem de fundamento legal, determine a anulação das liquidações adicionais promovidas pela Fazenda Pública.

É o que, com o douto suprimento que se pede, se espera, por ser de JUSTIÇA!!!»


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A Recorrida, notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.


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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal Central emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.


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Colhidos que foram os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.


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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, e face ao teor das conclusões formuladas as questões a decidir são as seguintes:

(i) Efeito do recurso;

(ii) Erro de julgamento da matéria de facto;

(iii) Saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao concluir que a Administração Tributária demonstrou os pressupostos de facto que a legitimaram a corrigir as liquidações de IVA na consideração de que as operações mencionadas nas emitidas pela firma «S............ ........ Unipessoal, Lda» não tiveram subjacentes quaisquer operações económicas realizadas, violando o disposto nos artigos 75.º, nº 1 da LGT e 19.º, nº 3 do CIVA.


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III. FUNDAMENTAÇÃO

A. DOS FACTOS

Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:

«1.A impugnante, C……….. Lda., encontrava-se registada, à data dos factos, na atividade de “Pintura e colocação de vidros”, a que correspondia o CAE 43440, tendo dado início de atividade em 02/01/1992 - cfr. consta 28 do PA aqui em anexo;

2.Os Serviços de Inspeção Tributária (SIT) da Direção de Finanças de Lisboa desencadearam um procedimento inspetivo externo e parcial à sociedade Impugnante, para os exercícios de 2005, 2006 e 2007, ao abrigo das Ordens de Serviço n.º O12009055294, O12009055295 e O1200905297, de 02/07/2009, do qual resultou correções aritméticas à matéria coletável em IRC e correções em IVA - cfr. consta do PA aqui em anexo.

3.No âmbito da acção inspectiva supra a Administração Fiscal concluiu nos termos do relatório contante de fls. 23 a 49, do qual se extrai que e seguinte:

“ (…)

III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL

Da análise aos elementos apresentados, em resposta à notificação para justificar a veracidade das facturas emitidas pela “S............” verifica-se que:

- Não foi apresentado qualquer contrato ou orçamento, folhas de presença, autos de medição, folhas de obra, notas de encomenda e guias de transporte, qualquer troca de correspondência ou qualquer outro documento justificativo de cedência de mão- de-obra por parte do referido fornecedor.

- Relativamente aos meios de pagamento utilizados para pagar os montantes facturados, o contribuinte afirmou que foram sempre pagos em dinheiro.

Resumindo, concluímos que não ficou inequivocamente demonstrado o pagamento das facturas em causa, nem que os serviços foram efectivamente prestados, pela entidade emitente da facturação.

Ora, conforme se referiu anteriormente, o fornecedor “S............”, não possui nem equipamento, nem força de trabalho, nem instalações que permitisse a realização dos trabalhos, ou seja, os dados constantes das facturas são incoerentes com a falta de capacidade estrutural do emitente, o que, aliado à falta de elementos comprovativos por parte do sujeito passivo da veracidade das operações constantes nas facturas são indícios fortes de que as mesmas não titulam operações reais, configurando portanto operações simuladas.

(…)

Há ainda a referir que os pagamentos, não cumprem o disposto no artigo 63º-C da Lei Geral Tributária, uma vez que ultrapassam o limite de 20 vezes o salário mínimo nacional (+-7.500,000), valor esse, que define que, os pagamentos referentes a facturas ou documentos equivalentes devam ser efectuados de forma a permitir a identificação do respectivo destinatário, designadamente transferência bancária, cheque nominativo ou débito directo.

É de referir ainda que, as facturas emitidas, não cumprem os formalismos legais previstos no artigo 36 do CIVA e no Ofício-Circulado n.º 181044 de 06/12/1991, pois, não contêm a indicação específica da obra, a descrição tipificada dos serviços prestados, as quantidades e data de execução dos mesmos. Este formalismo por si só impediria a dedução do IVA conforme o previsto no artigo 19º do CIVA.

1. Correcções propostas em Imposto sobre o Valor Acrescentado

Pelos factos atrás descritos, as deduções do IVA efectuadas nos anos de 2005, 2006 e 2007, pela firma C........ Lda. por via da contabilização das facturas que resultam do montante global descrito no Quadro 1 do ponto 3.5.1. do Capítulo II, não obedecem aos requisitos previstos no n.ºs 3 e 4 do artigo 19º e no artigo 20º do CIVA, pelo que o imposto deduzido o foi indevidamente, o que implica a necessidade de efectuar as correspondentes correcções (liquidações adicionais), como se demonstram no quadro seguinte:
      Períodos
Base TributávelImposto a Corrigir
0503T
24.300,004.617,00
0506T
22.680,004.309,20
0509T
31.200,006.552,00
0512T
14.750,003.097,50
0603T
10.950,002.229,50
        Total
103.880,0020.875,20

(…)”

4. As conclusões constantes do relatório supra foram objeto de concordância Chefe de Divisão, M........,

“Concordo com o parecer do Chefe de Equipa e com o relatório anexo. Remeta-se cópia do Relatório à Divisão de Processo Criminais Fiscais, para ser integrado no Processo de Inquérito n.º 1709/09.9IDSLB. Notifique o contribuinte nos termos do 77º da LGT e do artº 62º do RCPIT.” (…)

Tudo conforme fls. 23 do PA aqui em anexo

5. A sociedade “S............ ........ Unipessoal, Lda.” emitiu em nome da Impugnante as faturas nas datas, valores e com a designação dos serviços que a seguir se enunciam:

N .º
    Data
      Designação
    Valor
IVA
    TOTAL
0201
11/03/2005
Aplicação de massa de estuque em tectos e paredes na nossa obra de Calçada da Estrela24.300,004.617,0028.917,00
Trabalho de reparação de betão na
0211
25/05/2005
nossa obra de Dom Pedro Golf22.680,004.309,2026 989,20
0217
29/08/2005
Pinturas diversas18.700,003.927,0022.627,00
0225
30/09/2005
Trabalhos de pinturas diversas em vossas obras de Lisboa12.500,002.625,0015.125,00
0301
21/12/2005
Trabalhos de pinturas diversas em V/ obras de Lisboa14.750,003.097,5017.827,50
0324
24/02/2006
Trabalhos de pinturas executados na Vossa obra sita na Rua Silva
Carvalho Nº
10.950002.299,5013.249,50

Tudo conforme consta de fls. 53 a 58 do PA aqui em anexo.

6. Na sequência das correcções efectuadas, foi liquidado IVA e juros compensatórios nos termos em que a seguir se discrimina:
    N.º de liquidação
      Tributo
    Valor (€)
      10003817
      LA 0503T
      4.617,00
      10003819
      LA 0506T
      4.309,20
      10003821
      LA 0509T
      6.552,00
      10003823
      LA 0512T
      3.097,50
      10003825
      LA 0603T
      2.299,50
      10003818
      JC 0503T
      846,49
      10003820
      JC 0506T
      753,70
      10003822
      JC 0509T
      1.078,48
      10003824
      JC 0512T
      477,95
      10003826
      JC 0603T
      333,65

Tudo conforme fls. 20 /21 do PA aqui em anexo

7. O prazo de pagamento voluntário das quantias liquidadas terminou em 30/11/2010 - cfr. 20 a 21 dos autos.

8. A aqui Impugnante deduziu Reclamação Graciosa das liquidações adicionais mencionadas em 6., em 04/08/2010, que foi instaurada sob o n.º ........ do SF de Oeiras 3 e foi indeferido por despacho do Chefe de Divisão da Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa, datado de 16/11/2011 – cfr. fls. 151 dos respectivos autos aqui em anexo;

9. Em 22/12/2010, interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, a qual foi instaurado sob o n.º 321/2011 e foi indeferido por despacho do Substituto Legal do Diretor-Geral, datado de 17/11/2011 – cfr. fls. 35 do processo de recurso hierárquico apenso;

10. Em 16/12/2011, a Impugnante tomou conhecimento da decisão de indeferimento do recurso hierárquico – cfr. fls. 45 do processo de recurso hierárquico apenso;

11. A petição inicial da presente impugnação foi apresentada em 14/03/2012 – cfr. fls. 26 do processo físico.

Facto não provados:

Com interesse para a decisão, dos factos alegados não ficou provado:

I.Que tenha sido celebrado um contrato de subempreitada entre a Impugnante e a

S............ ........ Unipessoal, Lda.

II.Que os serviços discriminados nas faturas emitidas pela S............ ........ Unipessoal, Lda. à Impugnante, no período entre 03/2005 a 02/2006, identificadas no ponto 5., dos factos dados por provados correspondam a serviços efetivamente realizados.

III.Que a Impugnante tivesse efetuado os pagamentos a favor da S............ ........ Unipessoal, Lda.”, nos montantes constantes das faturas supra referidas.

MOTIVAÇÃO

A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto dada como provada resultou da análise crítica dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo em apenso, conforme indicado em cada uma das respetivas alíneas.

No respeitante à factualidade dada como não provada, o convencimento do tribunal resultou do depoimento das testemunhas e do depoimento de parte produzidos em audiência realizada para o efeito, bem como do confronto dos mesmos com os documentos existentes nos autos.

Da ponderação realizada resulta a impossibilidade de dar como provado o alegado pela Impugnante.

Na verdade as testemunhas ouvidas revelam incongruências entre si, para além dos seus depoimentos se revelarem genéricos e pouco circunstanciados relativamente ao modus operandi da Impugnante no exercício da sua atividade e no âmbito das relações comerciais com as respetivas entidades com quem se relaciona, como é o caso do depoimento da testemunha, V............, que exerce funções como encarregado-geral de construção civil na empresa G….., Lda., de que a impugnante foi sub-empreiteira. Este referiu que a sociedade impugnante, também recorria a sub-empreitadas por não ter condições para responder ao trabalho que lhe era solicitado. Disse ainda que esteve em obra com outras pessoas da C…… Lda., que identificou pelos nomes, mas nunca mencionou a sociedade S............, Lda., como prestadora de serviços à C…… Lda.

Por seu lado a testemunha, L............, exercia à data dos factos e ainda exerce funções de balconista da sociedade “C............ Lda.”, que é uma empresa de comércio de tintas de quem a C…….. Lda., é cliente. Diz conhecer os trabalhadores da aqui Impugnante, que também identificou pelos nomes, mas quanto à sociedade S............ Lda., nada disse.

Por fim, a testemunha, A............, que trabalhou durante o biénio 2005/2006, desempenhando as funções de diretor de obras e encarregado-geral da E........, Lda., cliente de prestação de serviços de pintura da sociedade impugnante confirma que esta recorria a sub- empreiteiros, porém, também esta testemunha, a respeito da S............ Lda., nada disse. Acresce referir que ouvido o sócio-gerente da Impugnante, J........, este veio a confirmar os factos relatados e constantes da petição inicial, porém nada adiantou quanto à materialidade subjacente à comprovação dos mesmos, nomeadamente no que respeita aos pagamentos, disse que estes eram feitos em dinheiro e por vezes em cheque, mas não logrou juntar aos autos qualquer cópia de cheque capaz de suportar as suas afirmações.

Concluímos assim pela impossibilidade objectiva de o tribunal de formular um juízo de convencimento quanto à existência de um contrato de subempreitada entre a Impugnante e a S........ Lda., e consequentemente, quanto à materialidade dos serviços constantes das faturas emitidas por esta última e ora postas em causa.»


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Alteração oficiosa, por ampliação, da decisão sobre a matéria de facto

Por se entender relevante à decisão de mérito a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada, adita-se, ao probatório, a coberto do estatuído no artigo 662.º, nº.1, do CPC ex vi artigo 281.º do CPPT, a seguinte factualidade:

12.No âmbito do processo de execução fiscal n.º ........, instaurado para cobrança coerciva da dívida subjacente às liquidações sindicadas, foi prestada garantia bancária pela impugnante, para efeitos de suspensão do processo (cfr. doc. junto aos autos não numerado)


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QUANTO AO EFEITO DO RECURSO:

Por despacho de 11.04.2018, foi admitido o presente recurso, com subida imediata nos próprios autos e com efeito devolutivo.

Nos termos do n.º 2 do artigo 286.º do CPPT «Os recursos têm efeito meramente devolutivo, salvo se for prestada garantia nos termos do presente Código ou o efeito devolutivo afetar o efeito útil dos recursos».

No caso dos autos, resulta provado que a recorrente prestou garantia bancária, e, assim sendo, ao recurso deveria ter sido conferido efeito suspensivo e não devolutivo.

Porém, como decorre expressamente do nº 5 do artigo 641.º do CPC, aplicável ex vi al.e) do artigo 2.º do CPPT, a decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior.

Neste quadro, fixa-se ao presente recurso jurisdicional efeito suspensivo.

ERRO DE JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO

Segundo a recorrente os factos não provados 1, 2 e 3 fixados na sentença recorrida deviam ter sido dados como provados, em virtude de assim o imporem os depoimentos das testemunhas inquiridas nos autos.

Estabelece este artigo 640.º nº 1, alíneas a), b) c), do CPC, que deve, aquele que impugne a matéria de facto, especificar, obrigatoriamente, sob pena de rejeição, quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, indicando os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou de gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos impugnados diversa da recorrida e referenciar a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Acrescenta o nº 2 da disposição, que no caso previsto na alínea b), quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.

No caso concreto, a recorrente efectuou a indicação exigida pelo apontado preceito quanto às passagens da gravação (cfr. artigo 640.º, nº 2, alínea a) do CPC), quanto aos depoimentos das testemunhas cuja reapreciação requereu de molde alcançar a pretendida alteração da matéria de facto e especificou os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados.

É entendimento generalizado que quando se trata de reapreciar a força probatória dos depoimentos das testemunhas que no processo tributário português vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido (cfr. artigo 607.º nº5 do CPC aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT).

O princípio da prova livre significa a prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente; mas apreciada em conformidade racional com tal prova e com as regras da lógica e as máximas da experiência (cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed. III, p.245).

Posto isto, vejamos, então, a factualidade posta em causa e o que se afere dos meios de prova que na Primeira Instância que estiveram na base da fixação da mesma.

Os factos impugnados (não provados) são os seguintes:

1 - Que entre a Recorrente e a sociedade S............ ........ Unipessoal, Lda., foram celebrados contratos de subempreitada, sob a forma verbal e não reduzidos a escritos.

2 - Que por via desses contratos a sociedade S............ ........ Unipessoal, Lda. prestou serviços à Recorrente, designadamente os discriminados nas faturas emitidas pela S............ ........ Unipessoal, Lda. à Recorrente, no período entre 03/2005 a 02/2006, identificadas no ponto 5. (factos provados) e que correspondem a serviços efetivamente realizados.

3 - Que a Recorrente, por sua vez, efectuou o pagamento da totalidade das facturas identificadas no ponto 5. (factos provados) à sociedade S............ ........ Unipessoal, Lda.”, nos montantes aí constantes.

Como o dissemos já antes, visa a recorrente que os factos supra identificados sejam dado como Provados, por entender que o Tribunal «a quo» fez uma errada apreciação da prova testemunhal produzida.

Quanto ao facto identificado em 1.- analisado e ponderado os depoimentos das testemunhas (J........ e A............), entende-se, que não que há alterar a matéria de facto dada como não provada pela Primeira Instância porquanto decorre do depoimento da testemunha A............ que embora afirmando a existência dos acordos verbais não deixou de mencionar que « depois fazia-se um auto escrito daquilo que ficou acordado realmente».

Quanto ao facto identificado em 2.- embora resulte dos depoimentos referenciados que a recorrente tinha a seu cargo obras, localizadas na « Estrela», « Saraiva de Carvalho, é atrás das amoreiras» (testemunha A............) «Vila Moura, Rua D. Pedro» e em «Elvas» (testemunha L............) é, contudo, uma prova insuficiente, já que a prova tem de ir no sentido da demonstração concreta de cada operação, referindo o prestador do serviço, a importância recebida e a data da respectiva prestação.

Quando ao facto identificado em 3.- mesmo admitindo que os pagamentos foram efectuados em numerário teria a recorrente, o que de resto não ficou provado, (testemunha J........) dada a ausência de qualquer elemento (temporal/valor do pagamento/ prestação do serviço) capaz de estabelecer uma ligação directa às facturas em causa nos autos, sempre teria de provar em termos contabilísticos através de extractos bancários que revelassem o fluxo financeiro derivado dos alegados pagamentos.

Em suma, a motivação da decisão sobre a matéria de facto mostra-se adequada, analisando criticamente os depoimentos prestados pelas testemunhas ouvidas.

Não se vislumbrando, portanto, qualquer razão que nos leve a alterar nos termos pretendidos pela recorrente, significa isso, que permanece inalterada a matéria dada por não provada, e como já se antevê, que improcede o recurso quanto a este fundamento.

DO MÉRITO DO RECURSO

Conforme decorre dos autos, os Serviços da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa desencadearam um procedimento inspectivo levado a cabo à recorrente relativamente aos anos de 2005 e 2006.

Na sequência desta acção, foram efectuadas correcções em sede de IVA, com fundamento de que as aquisições de bens efectuadas ao prestador de serviços «S............ ........ unipessoal, Lda» não correspondem a operações reais, não sendo o IVA dedutível nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 19.º do CIVA.

Consequentemente, a Administração Tributária liquidou adicionalmente o imposto que considerou indevidamente deduzido.

A recorrente discordou dessas liquidações adicionais de imposto, que impugnou judicialmente.

Por sentença do Tribunal Tributário de Lisboa a impugnação foi julgada improcedente e mantidas na Ordem Jurídica liquidações sindicadas. Considerou a sentença recorrida que a Administração Tributária logrou demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações constantes das facturas emitidas pela sociedade «S............ ........ unipessoal, Lda» não consubstanciavam operações reais, prova que não foi afastada pela recorrente.

A questão está, pois, em saber se a sentença procedeu a uma incorrecta apreciação da matéria de facto bem como a uma incorrecta aplicação do disposto no artigo 75.º da LGT.

Vejamos.

O Tribunal de Justiça tem vindo, a entender de modo reiterado, que, o direito a dedução constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA que não pode, em princípio, ser limitado e que se exerce imediatamente em relação à totalidade dos impostos que tenham onerado as operações efectuadas a montante (Neste sentido, vide entre outros - Acórdãos de 21 de março de 2000, Gabalfrisa, C-110/98 a C-147/98,15 de dezembro de 2005, Centralan Property, C-63/04, de 6 de julho de 2006, Kittel e Recolta Recycling, C-439/04 e C-440/04 e 6 de dezembro de 2012, Bonik, C-285/11).

Por economia de meios, transcreve-se, o que, a este propósito, se escreveu no processo C-285/11, que acima se assinalou: «O regime das deduções assim estabelecido visa aliviar inteiramente o empresário do peso do do IVA devido ou pago no quadro de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante dessa forma a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente do seu fim ou do seu resultado, na condição de essas atividades estarem elas mesmas, em princípio, sujeitas a IVA (v. acórdãos de 29 de abril de 2004, Faxworld, C-137/02, Colet., p. I-5547, n.° 37, e de 22 de dezembro de 2010, Dankowski, C-438/09, Colet., p. I-14009, n.° 24).
24 Resulta assim do artigo 17.°, n.° 2, da Sexta Diretiva que o sujeito passivo tem o direito de deduzir os montantes de IVA que lhe são faturados pelos serviços que lhes são prestados, na medida em que esses serviços sejam utilizados para as necessidades inerentes às suas operações tributadas (v., neste sentido, acórdão de 23 de abril de 2009, PARAT Automotive Cabrio, C-74/08, Colet., p. I-3459, n.° 17 e jurisprudência referida). (http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?docid=137304&doclang=PT).

Não obstante o que supra se disse, não se pode perder de vista que o direito à dedução do IVA está subordinado à observância de exigências ou de requisitos tanto materiais como de natureza formal (Acórdão do Tribunal de Justiça de 19.11.2017, processo C-101/16, SC Paper Consult SRL/Direcția Regională a Finanțelor Publice Cluj-Napoca).(http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=195735&doclang=PT)

Efectivamente, não há direito à dedução quando a operação é simulada ou se o preço constante da factura ou documento equivalente é simulado, o que o mesmo é dizer que nessas situações não é admitido o direito à dedução do imposto respectivo a fim de não se obter dedução de um imposto que não foi suportado pelo sujeito passivo.

No plano nacional, dispõe o artigo 19.º, nº 3 do CIVA (redacção à data dos factos) que «Não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que esteja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente», e o nº 4 do mesmo normativo determina « não pode igualmente deduzir-se o imposto que resulte de operações em que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado, quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento de que o transmitente dos bens ou prestador de serviços, não dispõe de adequada estrutura empresarial susceptivel de exercer a actividade».

Esse princípio vai na linha de defesa dos interesses da Fazenda Pública sendo seu escopo fundamental a manutenção da cadeia das deduções ao frustrar as tentativas de obtenção da dedução de imposto não suportado mediante a exigência de facturas de aquisição de bens e serviços pelos sujeitos passivos, travando o passo à evasão fiscal.

Com efeito, não há direito à dedução quando a operação é simulada ou se o preço constante da factura ou documento equivalente é simulado, o que o mesmo é dizer que nessas situações não é admitido o direito à dedução do imposto respectivo a fim de não se obter dedução de um imposto que não foi suportado pelo sujeito passivo.

Daí que a Administração Tributária tenha o ónus de demonstrar a factualidade que a levou a desconsiderar uma determinada operação que se encontre relevada na contabilidade do contribuinte, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte (atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso ordenamento jurídico), só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente.

Como se sumariou no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Secção Pleno da Secção do Contencioso Tributário) de 16.03.2016, proferido no processo 0587/15: « II.Para que a AT, ao abrigo do disposto no nº 3 do art. 19º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240º do CCivil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende. III - Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução(disponível em texto integral e www. dgsi.pt).

Assim, se a Administração Tributária não demonstrar a falta de correspondência com a realidade do teor das declarações, contabilidade e da escrita, estas são consideradas verdadeiras (nesse sentido, Diogo Leite de campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária – Anotada e Comentada, 4.ª ed., Vislis, 2012, pág. 664).

Esses indícios podem colher-se não só junto da escrita e contabilidade de quem arquivou e relevou contabilisticamente os documentos em causa, como colher-se junto de elementos externos a essa contabilidade, sendo que só perante esses concretos indícios, essa elevada probabilidade, cessa a presunção de veracidade das operações constantes da escrita e dos respectivos documentos de suporte.

Considerando que a recusa do direito à dedução do IVA oposta a sujeitos passivos constitui, como já referimos e aqui reiteramos, uma excepção ao princípio fundamental do sistema comum do IVA cuja legalidade, que segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, só é admitida em circunstâncias excecionais, vejamos, então se, no caso concreto, existiram ou não indícios suficientes para que a Administração Tributária pudesse desconsiderar como custos as factura emitida pela «S............ ........ unipessoal, Lda» e contabilizadas pela recorrente.

Relativamente à emitente da facturação S............ ........ unipessoal, Lda») os Serviços de Inspecção Tributária apuraram que não possui nem equipamento, nem força de trabalho, nem instalações que permitisse a realização dos trabalhos. Estes indícios são consistentes e sólidos para sustentar a conclusão de que a prestadora de serviços não tinha estrutura para desenvolver a actividade. Quanto à recorrente, é referido que: - não apresentou qualquer contrato, orçamento, folhas de presença, autos de medição, folhas de obra, notas de encomenda e guias de transporte, qualquer troca de correspondência ou documento justificativo de cedência de mão do fornecedor; não possui nem equipamento, nem força de trabalho, nem instalações que permitisse a realização dos trabalhos e os pagamentos, não cumprem o disposto no artigo 63º-C da LGT.

É certo que a ausência dos autos de medição e folhas de obra só por si nada significa, já que nada impede que uma empresa contrate uma terceira para a execução de obra sem exigência da elaboração de auto de medição, dando mais, que apenas se trata de documento que em regra tem por finalidade medir o volume de trabalhos executados em ordem a permitir a emissão da factura correspondente.

Porém, da análise conjunta dos indícios internos (por ex. pagamentos em dinheiro, não possui nem equipamento, nem força de trabalho, nem instalações que permitisse a realização dos trabalhos) conjugado com os indícios externos, apurados junto do emitente das facturas sustentam a conclusão que com elevada probabilidade as facturas em causa consubstanciam operações fictícias.

Posto isso, decorre do que vimos dizendo que a Administração Tributária demonstrou os pressupostos legitimadores da sua actuação correctiva, cumprindo, nos termos já expostos, o ónus da prova que lhe competia (cf. artigo 74º da LGT) na demonstração de indicadores seguros, credíveis e consistentes de que as facturas contabilizadas pela recorrente não reflectem reais e efectivas operações económicas.

Cabe, assim, à recorrente o ónus da prova da veracidade das operações, mediante a demonstração da existência dos factos que alegou como fundamento do seu direito, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o artigo 100.º do CPPT não tem aplicação.

E, no nosso caso, não restam dúvidas de que o sucesso do recurso dependia integralmente do prévio sucesso da impugnação da decisão da matéria de facto, concretamente das alterações preconizadas pela recorrente tendo em vista a demonstração como provados dos pontos de factos não provados, o que não sucedeu.

Do exposto, resulta a falta de razão da recorrente pelo que o presente recurso deve ser julgado procedente.

IV. CONCLUSÕES

I. Decorre expressamente do nº 5 do artigo 641.º do CPC, que a decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior.

II.A recusa do direito à dedução do IVA oposta a sujeitos passivos constitui uma excepção ao princípio fundamental do sistema comum do IVA que, só é admitida em circunstâncias excepcionais.

III. Para que a Administração Tributária, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 19.º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova do acordo simulatório para satisfazer o ónus da prova que sobre si impende.

IV. Basta à Administração Tributária provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução do imposto (ou a isenção de IVA), factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente.

V. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes que integram a 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.


Lisboa, 25 de Março de 2021


[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, Isabel Fernandes e Jorge Cortês]


(Ana Pinhol)