Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:727/04.8BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:03/25/2021
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:IVA,
OBRAS DE INFRA-ESTRUTURAS REVERTIDAS PARA O MUNICÍPIO,
ALVARÁ DE LOTEAMENTO
Sumário:As obras de infraestrutura efetuadas pela Impugnante em benefício do Município ao abrigo do DL 555/99, de 16 de dezembro, não constitui uma contrapartida do alvará de loteamento, mas antes uma condição sine qua non para a sua obtenção, pelo que não estamos perante uma transmissão de serviços a título oneroso, na aceção do artigo 2.º n.º 1 da Sexta Diretiva, por não haver uma contrapartida, mas antes uma decisão unilateral do Município na concessão do alvará de loteamento, sujeita à condição de realização de infraestruturas.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

F..., S.A. – Massa Insolvente, veio deduzir IMPUGNAÇÃO Judicial contra as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, dos exercícios de 1999 e 2000, no valor total de € 626.944,47.

A Fazenda Pública veio recorrer da sentença, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«I. Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença que julgou procedente a impugnação judicial, deduzida por F..., SA – Massa Insolvente, melhor identificado nos autos, contra as liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios, referentes aos exercícios de 1999 e 2000, no valor total de € 626.944,47.

II. A questão decidenda nos presentes autos é a de saber se estando em causa o IVA referente a trabalhos de construção de infra-estruturas que foram transferidas para o domínio público, na sequência do alvará emitido, as mesmas devem ser classificadas como obras públicas e prestações de serviço, nos termos previstos no art,º 4.º do CIVA, e, como tal, deve ser admitida a dedução do IVA, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art.º 20.º do CIVA.

III. O IVA referente a trabalhos de construção de infra-estruturas que foram transferidas para o domínio público, na sequência do alvará emitido, não podem ser consideradas prestações de serviço, nos termos previstos no art,º 4.º do CIVA,

IV. Consequentemente não deve ser admitida a dedução do IVA, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art.º 20.º do CIVA.

V. A douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correcta apreciação da matéria de facto e de direito relevante no que concerne ao enquadramento em sede de IVA, das operações em apreciação, nomeadamente, no que se refere à realização de trabalhos de infra-estruturas de loteamento urbano, uma vez que tal questão não foi analisada na referida sentença, violando assim, o disposto nos art.º 9.º, 12.º, 19.º e 20.º do Código do imposto sobre o valor acrescentado (CIVA) e art.º 615.º n.º 1 al.d) do Código de processo Civil (CPC).

VI. Há erro de julgamento por omissão de pronúncia, porquanto o Tribunal a quo não fez o enquadramento em sede de IVA, das operações referentes à realização de trabalhos de infra- estruturas de loteamento urbano,

VII. A douta sentença fez tábua rasa do facto da actividade principal da impugnante consistir na aquisição de terrenos rústicos que, após operação urbanística, converte em lotes de terreno para construção e vende a terceiros, encontrando-se, em parte, isenta de IVA, em violação do disposto no n.º 30 do art.9.º do CIVA;

VIII. O Tribunal a quo errou ao considerar dedutível o IVA suportado relativo às operações de loteamento urbano, designadamente, no que toca à construção das infra-estruturas necessárias, por estas serem operações isentas enquadráveis no nº 31º do art.º 9º do CIVA, violando, assim, o disposto al. a), do nº 1 do art.º 20º do referido diploma legal.

IX. O Tribunal a quo limitou-se a fazer uma apreciação do mecanismo de funcionamento do IVA (quanto à sua neutralidade do ponto de vista económico) sem ter apreciado a actividade (isenta) exercida pelo sujeito passivo, enquadrável no n.º 31 (actual n.º 30) do art.º 9.º do CIVA e, no âmbito da mesma, o enquadramento em IVA da realização das infra-estruturas urbanísticas, as quais são executadas como contrapartida da emissão de um alvará de loteamento, sendo condição essencial à aprovação do mesmo.

X. A douta sentença a quo não considerou no caso concreto as operações enquadráveis no n.º 30 do art.º 9.º como operações sujeitas a IMT e, por este facto, isentas de IVA.

XI. O tribunal a quo errou na qualificação da isenção em sede de IVA da actividade principal da impugnante, porquanto não a reputou como uma isenção incompleta, na medida em que o sujeito passivo não pode exercer o direito à dedução do IVA suportado a montante nas suas operações, pelo que violou o disposto no artigo 9º do CIVA.

XII. É manifesto o erro de julgamento do tribunal a quo, uma vez que as operações de realização de infra-estruturas de loteamento em causa nos presentes autos, estavam relacionadas com a actividade isenta do sujeito passivo, ou seja a venda de lotes de terreno (incluídos nos terrenos objecto de urbanização), e a impugnante não optou pela renúncia à isenção de IVA.

XIII. Tendo a impugnante por actividade principal a aquisição de terrenos rústicos que, após operação urbanística, converte em lotes de terreno para construção e vende a terceiros, praticando por conseguinte operações sujeitas a IMT e isentas do imposto, nos termos do n.º 30 do art.º 9.º do CIVA, para que pudesse deduzir o IVA referente a bens e serviços adquiridos para o exercício dessa parcela do seu objecto social, impunha-se ter renunciado à isenção e optado pela aplicação do IVA a esses serviços, pelo que é flagrante a violação do estatuído no art.º 12.º n.º 1 al. b) e n.º 2 CIVA.

XIV. A douta sentença a quo é omissa quanto à renúncia à isenção e opção pela tributação em IVA, em violação do disposto no art.º 12.º e 23.º do CIVA.

XV. Salvo o devido respeito, mal andou o Tribunal a quo, pois no caso concreto não está em causa a prestação de serviços em terrenos pertencentes à Câmara Municipal, como a impugnante pretendeu fazer crer, mas a construção de infra-estruturas obrigatórias no loteamento urbano, nas condições previstas no Dec-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro.

XVI. As operações em causa nos autos não configuram prestações de serviços, na acepção do art.º 4.º do CIVA.

XVII. Não sendo dedutível o IVA suportado com as operações abrangidas pela isenção prevista no nº 30 do art.º 9º do CIVA, como sejam, a transmissão de terrenos para construção, ou a transmissão do direito de propriedade de prédios urbanos ou fracções autónomas destes (sem renúncia à isenção do IVA, prevista no nº 5 do art.º 12º do CIVA), também não pode ser dedutível o IVA suportado com a realização das respectivas infra-estruturas.

XVIII. Este entendimento encontra-se plasmado na informação vinculativa – ficha doutrinária a que corresponde o processo nº 10327, sancionado por despacho de 2016.08.12, do SDG do IVA, por delegação do Director Geral da AT, emitida sobre a questão “operações imobiliárias – Renuncia à isenção – direito à dedução”.

XIX. Entendimento esse jurisprudencialmente sustentado pelo acórdão do TCA Sul, de 2010.06.22, proferido no processo nº 03961, cujas conclusões sufragamos, por ser aplicável mutati mutantis ao presente caso.

XX. Aqui chegados, e com o devido respeito, somos levados a concluir que, ao decidir como decidiu, a douta sentença incorreu em erro de julgamento.

XXI. No mesmo sentido o Digno Magistrado do Ministério Público, pronunciou-se no sentido da improcedência da impugnação, com os fundamentos expressos a fls. 217 dos autos.

XXII. Atento ao exposto, afigura-se a liquidação foi efectuada em cumprimento das normas legais vigentes, pelo que, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao julgar procedente a presente impugnação judicial, enferma de erro de apreciação da prova, de erro de interpretação de lei, nomeadamente, dos artigos 9.º, 12.º, 19.º, 20.º e 23.º do Código do imposto sobre o valor acrescentado (CIVA) e art.º 615.º n.º 1 al.d) do Código de processo Civil (CPC).

Termos em que, com o douto suprimento de Vossa Excelências, deve o presente recurso ser provido e, consequentemente ser revogada a sentença proferida pelo douto Tribunal a quo assim se fazendo a costumada justiça.»
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A recorrida, devidamente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.
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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

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As questões invocadas pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir são as seguintes:

_ Nulidade da sentença (art. 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC) por não ter analisado a questão do enquadramento em sede de IVA das operações em questão (cf. conclusão V) e VI das alegações de recurso);
_ Erro de julgamento de facto e de direito, porquanto o IVA referente a trabalhos de construção de infraestruturas que foram transferidas para o domínio público, na sequência do alvará emitido, não podem ser consideradas prestações de serviços, nos termos do art. 4.º do CIVA, e consequentemente, não confere o direito à dedução do IVA ao abrigo da alínea a), do n.º 1, do art. 20.º do CIVA, tendo sido violado o disposto no n.º 30, do art. 9.º do CIVA, no art. 19.º, do CIVA, no art. 12.º, n.º1, alínea b) do CIVA, e art. 23.º do CIVA.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«A. A Impugnante, F..., S.A., é uma sociedade anónima que tem por actividade principal a aquisição de terrenos rústicos que, após operação urbanística, converte em lotes de terreno para construção e vende a terceiros – cf. relatório de inspecção tributária (adiante RIT), a fls. 113 a 126 do PAT apenso;

B. A Impugnante é a “empresa-mãe” de um grupo de empresas das quais fazem parte as seguintes sociedades: S... – Soc. de Promoção, S.A., L... – Soc. Com. Ind. Mater., S.A., S... – Soc. Explor. Esp. Lúdicos, S.A., S... – Soc. Explor. Unid. Hot., S.A., V… – Soc. de Mediaç. Imobiliária, Lda., C… – Construção e Arquitectura, Lda. e M… – Soc. de Explor. de Activ. Hoteleira, Lda. (cfr. p. 5 do RIT);

C. A sua actividade principal encontra-se, em parte, isenta de IVA (cfr. p. 4 do RIT);

D. No exercício de 1999, a Impugnante emitiu:
i. A factura vc 034 364, de 31.01.99, com uma base tributável de Esc. 60.000$00;
ii. A factura 51N90185, com IVA no valor de Esc. 479.287$00 e 81.479$00, que não foi objecto de dedução.
(cfr. docs. 32 e 33 juntos com a petição inicial (adiante, p.i.), não impugnados, a fls. 80 a 104 dos autos);

E. No exercício de 2000, a Impugnante emitiu:
i. A factura n.º 893, com a base tributável de Esc. 737$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 88$00, e com a base tributável, no valor de Esc. 939.852$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 159.775$00;
ii. A factura n.º 1124, com base tributável no valor de Esc. 6.779$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 1.153$00, e com a base tributável, no valor de Esc. 1.473$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 177$00;
iii. A factura n.º 2121, com base tributável, no valor de Esc. 20.651$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 3.511$00, e com base tributável de Esc. 737$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 88$00;
iv. A factura n.º 2366, com a base tributável de Esc. 19.633$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 3.338$00;
v. A factura n.º 2411, com a base tributável de Esc. 791$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 134$00, e com a base tributável de Esc. 5.424$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 651$00;
vi. A factura n.º 3397, com a base tributável de Esc. 1.258.370$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 213.923$00, e com a base tributável de Esc. 3.769$00, com IVA dedutível no valor de Esc. 188$00.
(cfr. anexo 5 do RIT, a fls. 160 e 161 do PAT apenso, em conjugação com os docs. 32 e 33 juntos com a p.i., não impugnados, a fls. 80 a 104 aos autos);

F. Através do ofício n.º 021182, de 03.10.2002, a Direcção de Finanças (DF) de Lisboa remeteu à Impugnante carta-aviso relativa ao início de uma acção inspectiva, de âmbito geral, aos exercícios de 1999 e 2000, mas com referência a IRC e IVA (cfr. doc. 27 junto com a petição inicial, a fls. 73 dos autos);

G. A coberto das Ordens de Serviço nº 78.843 e 78.844, a Impugnante foi alvo, por parte dos Serviços de Inspecção Tributária (SIT) da DF de Lisboa, da acção de inspecção referida na alínea antecedente, que teve início a 16.01.2003 e que teve como objectivo principal verificar a compra de um terreno a uma “offshore” (cfr. p. 3 do RIT e docs. 28 e 29 juntos com a p.i., a fls. 75 e 76 dos autos);

H. Através do ofício n.º 7132, de 05.06.2003, a Impugnante foi notificada da alteração do técnico de inspecção por “razões de natureza estratégica do foro interno destes serviços” (cfr. p. 3 do RIT e doc. 30 junto aos autos com a p.i., a fls. 77 dos autos);

I. Através de ofício remetido por fax a 09.06.2003, os SIT notificaram a Impugnante da prorrogação do prazo de inspecção tributária “por mais um período de 3 meses”, com fundamento na existência de um elevado número de operações entre empresas do grupo (cfr. doc. 31 junto com a p.i., a fls. 78 e 79 dos autos);

J. Em 12.06.2003, a Impugnante foi notificada pela equipa de inspecção para apresentar os respectivos registos contabilísticos (cfr. p. 3 do RIT);

K. Na sequência da solicitação referida na alínea antecedente, a Impugnante informou que só poderia dar a informação solicitada em 23.06.2003, por não dispor “(…) de meios humanos alternativos para poder prestar os esclarecimentos necessários (…)” à equipa de inspecção (cfr. p. 3 do RIT);

L. Em 12.09.2003, foi elaborado o relatório final de inspecção, do qual se destaca, na parte relevante, o seguinte:
«Imagem no original»



(cfr. RIT);

M. Na sequência da acção inspectiva referida na alínea antecedente, em 18.11.2003, foram emitidas, em nome da Impugnante, a liquidação adicional de IVA n.º 03349459, relativa ao exercício de 1999, no valor de € 246.536,85, e, em 26.01.2004, a liquidação adicional de IVA, n.º 04023135, relativa ao exercício de 2000, no valor de € 263.669,68, com datas limite de pagamento voluntário a 31.01.2004 e 31.03.2004, respectivamente – cfr. docs. 1 e 14 juntos aos autos com a p.i., a fls. 47 e 60 dos autos;

N. Na mesma data, foram emitidas, em nome da Impugnante, as liquidações adicionais de juros compensatórios n.º 03349447, relativa ao período de 9901, no montante de € 2.199,00, n.º 03349448, relativa ao período de 9902, no montante de € 6.935,27, n.º 03349449, relativa ao período de 9903, no montante de € 2.408,38, n.º 03349450, relativa ao período de 9904, no montante de € 2.236,68, n.º 03349451, relativa ao período de 9905, no montante de € 3.146,39, n.º 03349452, relativa ao período de 9906, no montante de € 3.227,09, n.º 03349453, relativa ao período de 9907, no montante de € 7.666,01, n.º 03349454, relativa ao período de 9908, no montante de € 3.341,08, n.º 03349455, relativa ao período de 9909, no montante de € 3.639,54, n.º 03349456, relativa ao período de 9910, no montante de € 3.463,57, n.º 03349457, relativa ao período de 9911, no montante de € 1.885,72, n.º 03349458, relativa ao período de 9912, no montante de € 24.135,10, com datas limite de pagamento voluntário a 31.01.2004, e as liquidações adicionais n.º 04023123, relativa ao período de 0001, no montante de € 5.593,83, n.º 04023124, relativa ao período de 0002, no montante de € 4.447,14, n.º 04023125, relativa ao período de 0003, no montante de € 3.778,58, n.º 04023126, relativa ao período de 0004, no montante de € 1.573,57, n.º 04023127, relativa ao período de 0005, no montante de € 3.679,86, n.º 04023128, relativa ao período de 0006, no montante de € 3.816,38, n.º 04023129, relativa ao período de 0007, no montante de € 3.028,89, n.º 04023130, relativa ao período de 0008, no montante de € 12.378,25, n.º 04023131, relativa ao período de 0009, no montante de € 2.425,96, n.º 04023132, relativa ao período de 0010, no montante de € 1.776,88, n.º 04023133, relativa ao período de 0011, no montante de € 2.190,28 e n.º 04023134, relativa ao período de 0012, no montante de € 7.764,49, com datas limite de pagamento voluntário a 31.03.2004 (cfr. docs. 3 a 13 e 15 a 26 juntos com a p.i., a fls. 48 a 59 e 61 a 72 dos autos);

O. Por despacho de 23.05.2005, do Director de Finanças Adjunto de Lisboa as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, referidas nas alíneas antecedentes, foram parcialmente revogadas, porquanto o IVA deduzido pela Impugnante foi de 48.195.457$00, em 1999, e de 50.602.809$00, em 2000 (cfr. despacho e informação, a fls. 138 a 152 dos autos).
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FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provaram outros factos que importe registar como não provados.
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MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

A decisão da matéria de facto baseou-se nos documentos juntos aos autos e ao PAT apenso, não impugnados, conforme remissão feita em cada alínea do probatório.»

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Conforme resulta dos autos, a Meritíssima Juíza do TAF de Sintra julgou procedente a Impugnação judicial de IVA do ano de 1999 e 2000, entendendo, em síntese, que as obras de infraestruturas em causa são uma contrapartida direta do alvará e que se encontram diretamente relacionadas com a atividade económica exercida pela Impugnante, pelo que devem ser qualificadas como prestações de serviço, ao abrigo do art. 4.º do CIVA, e conferirem o direito à dedução, nos termos previstos no art. 20.º, n.º 1, a) do CIVA.

A Recorrente Fazenda Pública invoca, desde logo, não se conforma com o decidido, invocando nulidade da sentença (art. 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC) por não ter analisado a questão do enquadramento em sede de IVA das operações em questão (cf. conclusão V) e VI das alegações de recurso). Mais invoca erro de julgamento de facto e de direito, porquanto o IVA referente a trabalhos de construção de infraestruturas que foram transferidas para o domínio público, na sequência do alvará emitido, não podem ser consideradas prestações de serviços, nos termos do art. 4.º do CIVA, e consequentemente, não confere o direito à dedução do IVA ao abrigo da alínea a), do n.º 1, do art. 20.º do CIVA. O tribunal deveria ter apreciado o enquadramento da atividade da Impugnante no n.º 30, do art. 9.º do CIVA, e, portanto, isenta de IVA (isenção incompleta), porque as operações de realização de infraestruturas de loteamento estavam relacionadas com a sua atividade. Invoca que para beneficiar do direito à dedução deveria ter renunciado à isenção, pelo violou-se o disposto no art. 12.º, n.º 1, alínea b) do CIVA, e art. 23.º do CIVA, e ainda o art. 19.º do CIVA.

Apreciando.

A Recorrente invoca a nulidade da sentença por o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (alínea d), do art. 615.º do CPC).

Vejamos.

Estabelece o art. 125.º do CPPT o seguinte (sublinhado nosso):

“1- Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.
2 - A falta da assinatura do juiz pode ser suprida oficiosamente ou a requerimento dos interessados, enquanto for possível obtê-la, devendo o juiz declarar a data em que assina.”

Ou seja, ocorre nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões a que esteja obrigado a pronunciar-se.

Nesta matéria, a jurisprudência tem reiteradamente afirmado que “só pode ocorrer omissão de pronúncia quando o juiz não toma posição sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento, e da sentença também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio” (cf. Acórdão do STA de 19/09/2012, processo n.º 0862/12).

Por conseguinte, só há omissão de pronúncia “quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões” (cf. Ac. do STA de 28/05/2014, proc. 0514/14).

Ora, é manifesto que, in casu, não se verifica qualquer omissão de pronúncia, uma vez que a Fazenda Pública não colocou qualquer questão ao Tribunal, desde logo porque nem sequer apresentou contestação nos autos, e prescindiu da apresentação de alegações escritas, e nessa medida, não se verifica a nulidade arguida.

Pelo exposto, e sem mais considerações por desnecessárias, não se verifica nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Prosseguindo.

Invoca ainda a Recorrente erro de julgamento de facto e de direito, entendendo-se que se violou vários normativos do CIVA.

Resulta do relatório de inspeção que a Impugnante se encontra enquadrada no regime normal de IVA, periodicidade mensal. A sua atividade principal, nos períodos em causa nos autos, consistiu na aquisição de terrenos de matriz rústica, que converte em terrenos urbanos junto da autarquia competente, através de projetos de urbanização, vendendo posteriormente lotes de terreno.

Nessa atividade de loteamento, a Impugnante realiza infraestruturas que passam posteriormente para o domínio público, por imposição do art. 44.º, n.º 1, do DL 555/99, de 16 de dezembro que prevê que o proprietário do prédio a lotear cede gratuitamente ao município as parcelas para implantação de espaços verdes públicos e equipamentos de utilização coletiva e as infraestruturas que, de acordo com a lei e a licença ou comunicação prévia, devam integrar o domínio municipal.

Uma vez que as infraestruturas passam posteriormente para o domínio público, a Impugnante considerou essa operação com enquadramento na verba 2.17 da Lista I anexa ao CIVA (IVA a 5%, sobre uma base tributável correspondente ao valor caução prestada à Câmara para garantir a boa e regular execução das obras de urbanização), e, portanto, efetuou a tributação em sede de IVA no momento da entrega das infraestruturas ao Município. Ou seja, a Impugnante tratou a operação como uma operação tributável em sede de IVA, e nessa medida, deduziu o IVA suportado na realização dessas infraestruturas.

Por outro lado, esse IVA liquidado foi considerado pela Impugnante como um custo do exercício, uma vez que não receberam da Câmara qualquer contrapartida financeira dessa operação, uma vez que a transferência do terreno para o domínio público para o Município é gratuita.


Em sede de ação de inspeção corrigiu-se o IVA deduzido pela Impugnante nos anos de 1999 e 2000, uma vez que se entendeu que não conferia direito à dedução o IVA suportado com a execução das infraestruturas relativas às obras de loteamento, que posteriormente passariam para o domínio público, situação que se entendeu enquadrável no art. 9.º, n.º 31 do CIVA, ou seja, por a atividade da Impugnante ser a venda de lotes, e portanto, por estarmos perante operações isentas de IVA, e nessa medida, sem direito de dedução nos termos do art. 20.º, n.º 1, alínea a) do CIVA.

Posteriormente, ainda em sede de ação de inspeção, a AT pronunciando-se sobre o direito de audição prévia exercido pela Impugnante, vem a entender que as operações em causa não configuram transmissões de bens ou prestações de serviços que possam integrar os conceitos de sujeição a IVA, uma vez que se traduzem numa cedência gratuita de parcelas de terreno, não elencadas nos artigos 1.º, 3.º e 4.º do CIVA, e, portanto, estão fora do âmbito de incidência do imposto. Uma vez que nos termos da alínea a) do n.º 1, do art. 20.º do CIVA o direito a dedução do IVA apenas pode ser exercido quando incida sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas, as operações em causa não estão abrangidas pelas regras da dedução do imposto suportado a montante.

Portanto, o que está em causa nos presentes autos é saber se a cedência gratuita das infraestruturas ao Município que foram realizadas pelo proprietário do prédio a lotear (a Impugnante) consubstancia uma prestação de serviços sujeita a IVA, tal como a Impugnante a tratou liquidando IVA, e consequentemente, se a Impugnante pode deduzir o IVA suportado a montante com a realização dessas infraestruturas, tal como o fez.

Na verdade, a Impugnante defende que essa operação constitui uma prestação de serviços sujeita IVA, enquadrável no art. 4.º, n.º 2, alínea b) do CIVA, e por essa razão liquidou o respetivo imposto, tratando a operação a jusante como tributável, e nessa medida, entende tem o direito de deduzir o imposto suportado a montante que tenha incidido sobre os bens e serviços adquiridos ou utilizados para a realização das infraestruturas.

Vejamos.

A questão de saber se estamos perante uma prestação de serviços sujeita a IVA é pertinente, pois nos termos do n.º 1 do art. 20.º do CIVA, dispõe que só se pode deduzir o imposto que tenha incidido sobre bens e serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para realização de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas.

Considerado que está em causa nos autos os anos de 1999 e 2000, cumpre referir, a título preliminar, que o CIVA resulta da transposição para a nossa ordem jurídica interna da Sexta Diretiva do Conselho de 17 de maio de 1977. Ora, a Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2007, revogou a Sexta Diretiva sem introduzir alterações de fundo em relação a esta. Daqui resulta que, tendo as disposições pertinentes da Sexta Diretiva um alcance em substância idêntico às da Diretiva 2006/112, a jurisprudência do TJUE relativa a esta diretiva também é aplicável à Sexta Diretiva (v. acórdão de 17 de outubro de 2018, Ryanair, C-249/17, n.º 14).

Conforme o TJUE tem afirmado, o direito à dedução previsto no artigo 17.º, n.º 2, alínea a), da Sexta Diretiva, faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado, e é exercido imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efetuadas a montante. O regime das deduções visa aliviar totalmente do empresário do ónus do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas, pelo que o sistema comum do IVA garante a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente de quais sejam os seus fins ou resultados, desde que as referidas atividades estejam, em princípio, elas próprias sujeitas a IVA (Acórdão de 14 de setembro de 2017, Iberdrola Inmobiliaria Real Estate Investments, C-132/16, n.º 25 e 26 e jurisprudência referida).

Conforme o TJUE tem afirmado, quando os bens ou os serviços adquiridos por um sujeito passivo estão relacionados com operações isentas ou não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação do IVA, não pode haver cobrança do imposto a jusante nem dedução deste a montante (v., neste sentido, designadamente, acórdão de 29 de outubro de 2009, SKF, C-29/08, n.º 59, e acórdão de 14 de setembro de 2017, Iberdrol Inmobiliária Real Estate Investiments, C-132/16, n.º 30). Com efeito, nestes dois casos, não existe uma relação direta e imediata entre as despesas incorridas a montante e as atividades económicas realizadas de seguida pelo sujeito passivo (v. nesse sentido, acórdão de 22/10/2015, Sveda, C-126/14, n.º 32).

Vejamos, então, antes de mais, se a operação em causa se poder qualificar como prestação de serviços sujeita a IVA, porque se assim não for, estamos perante operação isenta de IVA, e nessa medida, não confere direito à dedução.

Nos termos do disposto no art. 1.º, alínea a), do CIVA na redação aplicável à época, e que resulta da transposição da Sexta Diretiva do Conselho de 17 de maio de 1977, estão sujeitas a IVA, para além do mais, as prestações de serviços efetuadas em território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal.

Como o TJUE tem reiterado, uma prestação de serviços só é efetuada «a título oneroso», na aceção do artigo 2.º, ponto 1, da Sexta Diretiva, e só é, portanto, tributável, se entre o prestador e o beneficiário existir uma relação jurídica no âmbito da qual são realizadas prestações recíprocas, sendo a retribuição recebida pelo prestador o contravalor efetivo de um serviço prestado ao beneficiário. É isso que se verifica se existir um nexo direto entre o serviço prestado e o contravalor recebido (v., neste sentido, acórdão do TJUE de 11/03/2020, SAN DOMENICO VETRARIA, C-94/19, parágrafo 21).

In casu, é pacífico que a Impugnante é um sujeito passivo e que agiu como tal na realização das infraestruturas que foram cedidas ao Município, contudo, não estamos perante prestações de serviço a título oneroso.

Na verdade, o TJUE já decidiu que “a Sexta Diretiva, nomeadamente o seu artigo 2.º n.º 1, deve ser interpretada no sentido de que a licença de exploração de uma pedreira concedida unilateralmente por uma administração de um Estado-Membro não constitui a contrapartida obtida por um sujeito passivo que efetuou, sem contrapartida em dinheiro, obras de alargamento de uma estrada que pertence a um município, pelo que estas obras não constituem uma operação efetuada a título oneroso, na aceção desta diretiva.” - (v., neste sentido, Acórdão de 16 de setembro de 2020, MITTELDEUTSCHE HARTSTEIN-INDUSTRIE, C-528/19, n.ºs 54).

In casu, à semelhança do acórdão MITTELDEUTSCHE HARTSTEIN-INDUSTRIE, a decisão do Município em conceder à Impugnante o alvará de loteamento é uma decisão unilateral da administração, e nessa medida, não pode, em princípio, criar uma relação jurídica em cujo âmbito são trocadas prestações recíprocas. A realização das obras de infraestruturas não constitui uma contrapartida da concessão do alvará de loteamento, mas antes uma condição sine qua non para a sua obtenção. Ora, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um ato unilateral de autoridade pública não pode, em princípio, criar uma relação jurídica em cujo âmbito são trocadas prestações recíprocas (v., neste sentido, Acórdão de 16 de setembro de 2020, MITTELDEUTSCHE HARTSTEIN-INDUSTRIE, C-528/19, n.ºs 49 e 51).

Por conseguinte, in casu, não estamos perante uma prestação de serviços a título oneroso, na aceção do artigo 2.º n.º 1 da Sexta Diretiva, por não haver uma contrapartida, mas antes uma decisão unilateral do Município na concessão do alvará de loteamento, sujeita à condição de realização de infraestruturas.

Ainda no que diz respeito às prestações de serviços, o art. 4.º, n.º 2, alínea b) do CIVA, que foi transposto para a nossa ordem jurídica a partir do artigo 6.º, n.º 2, alínea b) da Sexta Diretiva, prevê que se consideram ainda prestações de serviços a título oneroso as prestações de serviços a título gratuito efetuadas pela própria empresa com vista às necessidades particulares do seu titular, do pessoal ou em geral a fins alheios à mesma.

Contudo, in casu, as obras de infraestruturas realizadas a título gratuito pela Impugnante e que foram cedidas gratuitamente ao Município não consubstanciam prestações de serviços a título gratuito efetuadas pela própria empresa com vista às necessidades particulares do seu titular, do pessoal ou em geral a fins alheios à mesma, subsumível no art. 4.º, n.º 2, alínea b) do CIVA, e, portanto, na aceção do artigo 6.º, n.º 2, alínea b) da Sexta Diretiva. In casu, tais obras visaram a obtenção do alvará de loteamento, que com a finalidade de lotear o terreno e posteriormente proceder à venda dos respetivos lotes no âmbito do exercício da sua atividade.

Ou seja, realização das obras de infraestruturas enquanto condição sine qua non para a concessão do alvará de loteamento, consubstanciam obras com vista às necessidades e fins empresarias da Impugnante, que é a venda de lotes de terrenos.

Ademais, o TJUE já afirmou, num caso de obras de alargamento de uma estrada municipal aberta ao público, efetuadas, a título gratuito, por um sujeito passivo em benefício de um município, que “tendo as obras sido entregues ao município em causa, é facto assente que está excluída a hipótese de um consumo para seu uso privado ou do pessoal da empresa, bem como a hipótese relativa à afetação do bem para fins estranhos aos da empresa, uma vez que estas obras foram efetuadas atendendo aos fins da recorrente no processo principal” - (v., Acórdão de 16 de setembro de 2020, MITTELDEUTSCHE HARTSTEIN-INDUSTRIE, C-528/19, n.ºs 55 e 64).

Portanto, em substância, importa concluir que as obras de infraestrutura, efetuadas pela Impugnante em benefício do Município, não constitui uma contrapartida do alvará de loteamento, mas antes uma condição sine qua non para a sua obtenção. Assim sendo, não estamos perante uma transmissão de serviços a título oneroso, na aceção do artigo 2.º n.º 1 da Sexta Diretiva, por não haver uma contrapartida, mas antes uma decisão unilateral do Município na concessão do alvará de loteamento, sujeita à condição de realização de infraestruturas.

Por outro lado, as obras de infraestruturas realizadas a título gratuito pela Impugnante não se destinaram às necessidades particulares do seu titular, do pessoal ou em geral a fins alheios à mesma, pois visaram a satisfação de uma condição sine qua non para a obtenção do alvará de loteamento, que lhe permite lotear o terreno e exercer a sua atividade de venda de lotes. Nessa medida, tais obras têm em vista às necessidades e fins empresarias da Impugnante, e nessa medida não constitui uma operação que deva ser equiparada a uma prestação de serviço efetuada a título oneroso, na aceção do art. 6.º, n.º 2 da diretiva.

Em suma as obras de infraestruturas realizadas a título gratuito pela Impugnante não se encontram sujeitas a IVA, nos termos do art. 4.º, n.º 2, alínea b) do CIVA conforme a Impugnante alega, e nessa medida, não pode ser deduzido o IVA suportado a montante com a realização dessas obras de infraestrutura, pois estamos perante uma operação isenta de IVA que não confere o direito à dedução, nos termos da alínea a) do n.º 1, do art. 20.º do CIVA.

Pelo exposto, não merece censura o entendimento da AT de que a execução das infraestruturas, que posteriormente passariam para o domínio público, não conferem direito à dedução do imposto nos termos do art. 20.º, n.º 1, alínea a) do CIVA, pois não estamos perante uma transmissão de bens ou prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas, na medida em que essa operação está relacionada com a atividade isenta do sujeito passivo, ou seja, a venda de lotes de terreno para construção, constituem operações isentas de IVA nos termos do n.º 30 do art.º 9.º do CIVA, sendo que a impugnante não renunciou à isenção de IVA, nos termos do n.º 1, do art. 12.º do CIVA.

Efetivamente, como vimos, a realização de obras de infraestruturas constitui condição sine qua non para a obtenção do alvará de loteamento, sem a qual a Impugnante não poderia exercer a sua atividade de venda de lotes de terrenos, porém, essa atividade é isenta de IVA, não tendo havido renúncia à isenção, e nessa medida, não confere direito à dedução, nos termos do art. 20.º, n.º 1, alínea a) do CIVA.

Na verdade, in casu, estamos perante uma situação em que os bens ou os serviços adquiridos por um sujeito passivo estão relacionados com operações isentas ou não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação do IVA, e, portanto, não pode haver cobrança do imposto a jusante nem dedução deste a montante (v., neste sentido, designadamente, acórdão de 29 de outubro de 2009, SKF, C-29/08, n.º 59, e acórdão de 14 de setembro de 2017, Iberdrol Inmobiliária Real Estate Investiments, C-132/16, n.º 30). Conforme já referimos supra, e aqui se reitera, nestes dois casos, não existe uma relação direta e imediata entre as despesas incorridas a montante e as atividades económicas realizadas de seguida pelo sujeito passivo (v. nesse sentido, acórdão de 22/10/2015, Sveda, C-126/14, n.º 32).

Pelo exposto, importa concluir que estamos perante uma operação que não confere direito à dedução do imposto nos termos do art. 20.º, n.º 1, alínea a) do CIVA, pois não estamos perante uma transmissão de bens ou prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas.

A sentença que assim não decidiu, deve, então, ser revogada, e julgar-se improcedente a impugnação judicial.

Em matéria de custas o artigo 527.º do CPC consagra o princípio da causalidade, de acordo com o qual paga custas a parte que lhes deu causa. Vencida na presente causa a Recorrida, esta deu causa às custas do presente processo (n.º 2), e, portanto, deve ser condenada nas respetivas custas (n.º 1, 1.ª parte).

Contudo, nesta instância de recurso, a recorrida não tendo apresentado contra-alegações não é responsável pelo pagamento da taxa de justiça – cf. acórdão do STA de 13/12/2017: “I - As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (artigos 529.º n.º 1, do CPC, e 3º, nvc v º 1, do RCP). II – A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente (artigos 529º, nº 2, e 6º, nº 1, do CPC) e apenas é devida no seu pagamento pela parte que demande (artigo 530.º n. 1, do CPC).

Considerando que o valor da presente causa é superior a 275.000,00€, e que a questão da dispensa do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no art. 6.º, n.º 7 do RCP é de conhecimento oficioso (cf. Ac. do STA de 07/05/2014, proc. n.º 01953/13), sempre se dirá que se encontram reunidos os pressupostos do n.º 7 do art. 6.º do RCP.

Ponderado o montante da taxa de justiça que será devida, face ao concreto serviço prestado, revela-se adequado e necessário face ao princípio da proporcionalidade, dispensar o remanescente da taxa de justiça, verificando-se os pressupostos do n.º 7 do art. 6.º do RCP.

Com efeito, a questão suscitada no presente se revelou de complexidade inferior à normal face às conclusões sucintas, claras e com pouca complexidade que foi apresentada pela Recorrente Fazenda Pública, e não tendo havido contra-alegações, e considerando ainda que a conduta processual das partes foi a normal e adequada, verificam-se os pressupostos do art. 6.º, n.º 7 do RCP, para a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo presente recurso.

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Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC)

As obras de infraestrutura efetuadas pela Impugnante em benefício do Município ao abrigo do DL 555/99, de 16 de dezembro, não constitui uma contrapartida do alvará de loteamento, mas antes uma condição sine qua non para a sua obtenção, pelo que não estamos perante uma transmissão de serviços a título oneroso, na aceção do artigo 2.º n.º 1 da Sexta Diretiva, por não haver uma contrapartida, mas antes uma decisão unilateral do Município na concessão do alvará de loteamento, sujeita à condição de realização de infraestruturas.

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, julgando-se improcedente a impugnação judicial.
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Custas pela Recorrida, que não é responsável pelo pagamento da taxa de justiça no presente recurso, porque não contra-alegou, dispensando-se do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
D.n.
Lisboa, 25 de março de 2021.


A Juíza Desembargadora Relatora

Cristina Flora



A Juíza Desembargadora Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo art. 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Juízes Desembargadores Tânia Meireles da Cunha e Susana Barreto.