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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08086/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:12/18/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:EXECUÇÃO DE JULGADO. ARTº.100, DA L. G. TRIBUTÁRIA.
TEORIA DA RECONSTITUIÇÃO DA SITUAÇÃO ACTUAL HIPOTÉTICA.
INDEMNIZAÇÃO POR PRESTAÇÃO DE GARANTIA BANCÁRIA INDEVIDA.
ARTº.53, DA L.G.T.
ARTº.171, DO C.P.P.T.
POSSIBILIDADE DE DEDUÇÃO DO PEDIDO EM SEDE DE EXECUÇÃO DE JULGADO ANULATÓRIO.
Sumário:1. Nos termos do artº.100, da L.G.Tributária, em virtude da procedência total ou parcial de impugnação a favor do sujeito passivo, a A. Fiscal está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, tal dever compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, computados a partir do termo do prazo da execução da decisão. Em face de tal postulado, a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética.
2. A reconstituição da situação hipotética actual justifica a obrigação de restituição do imposto que houver sido pago, tal como do pagamento de juros indemnizatórios, cuja atribuição ao sujeito passivo, nos termos da lei, não está dependente da formulação de pedido nesse sentido, posição esta que está de acordo com os efeitos consequentes que decorrem da anulação do acto tributário, tal como do facto do pagamento de juros não estar dependente de pedido (cfr.artº.100, da L.G.Tributária; artº.61, nº.3, do C.P.P. Tributário).
3. Ainda como decorrência da anulação judicial do acto tributário ilícito e do desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, surge-nos a norma que consagra a possibilidade de pagamento de uma indemnização quando se conclua que o sujeito passivo prestou uma garantia no âmbito de processo de execução fiscal, visando a sua suspensão, sendo esta indevidamente prestada (cfr.artº.53, da L.G.T.; artº.171, do C.P.P.T.).
4. O artº.53, da L.G.T., atribui ao devedor que, para suspender a execução, tenha oferecido garantia bancária ou equivalente, o direito a ser indemnizado, total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação. A indemnização será total ou parcial conforme o vencimento que o interessado obtenha em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida (cfr.artº.53, nº.1, da L.G.T.). Se se comprovar que houve erro imputável aos serviços, essa indemnização será devida independentemente do período de tempo durante o qual a garantia tiver sido mantida (cfr.artº.53, nº.2, da L.G.T.). Se a anulação, total ou parcial, não tem por fundamento um erro daquele tipo (v.g.liquidação é anulada por erro imputável ao próprio contribuinte ou por vício de forma ou incompetência) a indemnização só é devida se a garantia tiver sido mantida por mais de três anos (cfr.nº.1 do preceito). O prejuízo consagrado no artº.53, nº.1, da L.G.T., pode englobar não só o custo da garantia prestada, como qualquer outro lucro cessante ou dano emergente, tudo dentro dos limites previstos no nº.3 do mesmo preceito.
5. À face do referido artº.53, da L.G.T., não é reconhecido o direito de indemnização por prejuízo resultante da prestação de garantia quando não houver vencimento, total ou parcial, no processo administrativo ou judicial que tiver sido utilizado e, por isso, não se poderá saber se é de reconhecer direito a indemnização antes do momento em for proferida a decisão final do mesmo processo.
6. O direito do contribuinte a uma indemnização está garantido pelo artº.22, da C.R.Portuguesa, e, por isso, não poderá a lei ordinária eliminá-lo. Por outro lado, deve vincar-se a supremacia da L.G.T. sobre o C.P.P.T., vector do qual se conclui que o legislador não pretendeu excluir a possibilidade de ser pedida, autonomamente, a indemnização por garantia indevidamente prestada, como se retira da parte final do artº.53, nº.3, da L.G.T., assim sendo de defender, contrariamente ao que parece consagrar o artº.171, do C.P.P.T., a faculdade de ele ser formulado no único outro meio processual potencialmente adequado para o efeito, que será o de execução de julgados.
7. Mais se deve recordar que esta posição é a que melhor se compagina com o teor do aludido artº.100, da L.G.T., e o citado dever de plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio. Na verdade, se é certo que a indemnização por garantia indevida não se insere no âmbito do dever de execução espontânea (designadamente, porque a A. Fiscal nem saberá, exactamente, o que o impugnante despendeu com a prestação de garantia), também é certo que o acto anulado constitui uma condição sem a qual não teria sido prestada a garantia e está ligado a esta por um nexo de causalidade adequada, pelo que a indemnização se insere no âmbito do dever de reconstituição que existiria se não tivesse sido praticado o acto ilegal, em que se consubstancia a execução de julgado anulatório de acto administrativo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.139 a 148 do presente processo, através da qual julgou procedente a execução de julgado de sentença exarada em processo de impugnação apenso, visando o reembolso das quantias suportadas com a prestação de garantia com vista à suspensão do processo de execução fiscal instaurado para cobrança coerciva das liquidações impugnadas, I.R.C. de 1995 e 1996.
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.165 a 170 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida no processo em referência, que julgou procedente a execução de julgado, reconhecendo o direito da exequente ao recebimento da quantia relativa a encargos com a prestação de garantia, no montante de € 53.462,51, condenando a AT a pagar à requerente/exequente, no prazo de 30 dias, a predita quantia, com fundamento em que o "contribuinte tem direito a ser indemnizado, total ou parcialmente, pelos prejuízos resultantes da prestação de garantia bancária ou equivalente para obter a suspensão do processo de execução fiscal, no caso de esta vir a revelar-se indevida por força do vencimento em processo judicial, como foi o caso dos autos, ou em procedimento tributário, pelo que se conclui que se encontra preenchido o pressuposto previsto no n°2 do artigo 53 da LGT", e com a qual não concordamos;
2-No caso em apreço está em discussão saber se existiu caducidade do direito de peticionar indemnização dos encargos suportados com a prestação de garantia;
3-Decidiu o Tribunal "a quo" «(...) por força do art. 53 da LGT, o recorrido tem direito a ser indemnizado, total ou parcialmente, pelos prejuízos resultantes da prestação da garantia bancária ou equivalente para obter a suspensão do processo de execução fiscal, no caso de esta vir a revelar-se indevida por força do vencimento em processo judicial, como foi o caso dos autos, ou em procedimento tributário, pelo que se conclui que se encontra preenchido o pressuposto previsto no n°2 do art. 53 da LGT»;
4-A Fazenda Pública não se conforma com o decidido, porquanto, prescreve o n°3 da predita norma «A indemnização referida no n°1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente»;
5-Regulamentando o art.º171, n°2 do CPPT «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência»;
6-A intenção do legislador foi que esta indemnização pudesse ser requerida e definida logo no procedimento ou processo tributário onde se discute a legalidade da dívida garantida, sem prejuízo da parte poder formular essa pretensão em processo autónomo, pois só esta leitura permite compatibilizar o direito expressamente consagrado no art.53 da LGT com a norma ínsita no artigo 171 do CPPT;
7-Ora no caso em apreço o ora recorrido apresentou impugnação judicial em 21.OUT.1999, e prestou garantia bancária em 16.DEZ.1999, pelo que, dispunha de 30 dias após a prestação da garantia para apresentar o requerimento do pedido de indemnização, a fim de ser apreciado e decidido em sede de impugnação judicial;
8-Contudo, o ora recorrido só requereu a predita indemnização em 25.FEV.2009, ou seja, muitos anos decorridos do prazo que a lei impõe;
9-Salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública concordar com a decisão ora recorrida e insiste que existem, pelo menos, dois prazos que o ora recorrido deixou precludir, nomeadamente a data em que a garantia devia ter sido prestada e, o prazo para requerer o competente reembolso com os encargos suportados;
10-Resta, então concluir que, no caso em apreço, estamos perante regras gerais sobre interpretação e aplicação da lei, nessa medida deve a douta Sentença ser revogada e substituída por outra que considere que o pedido de indemnização com os encargos suportados com a prestação da garantia é extemporâneo;
11-A manter-se na ordem jurídica, a douta sentença ora recorrida revela uma inadequada interpretação e aplicação do art.53, n°3 da LGT e art.171, n°2 do CPPT;
12-Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência ser revogada a sentença ora sindicada, assim se fazendo por Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.181 e 182 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.140 e 141 dos autos - numeração nossa):
1-Pelo 2º. Serviço de Finanças de Lisboa foi instaurada a execução fiscal n° ............, contra a ora exequente, para cobrança coerciva das liquidações adicionais de IRC referente aos exercícios de 1995 e 1996, no montante de € 559.535,79 (cfr. documento junto a fls.73 dos presentes autos);
2-Em 20/12/1999 foi apresentada no mesmo Serviço de Finanças, com data de 16/12/1999, a garantia bancária nº. ..........., no valor de € 699.115,59, emitida pelo Banco ............. com vista à suspensão da execução fiscal identificada no nº.1 (cfr. documento junto a fls.32 dos presentes autos);
3-Em 21/10/1999, a exequente apresentou impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRC referente aos exercícios de 1995 e 1996, no montante de € 559.535,79 que correu termos neste Tribunal com o nº.1162/04-91/03.3.1 (cfr.processo de impugnação apenso);
4-Por sentença transitada em julgado, proferida em 18 de Novembro de 2008, no processo identificado no nº.3, foi julgada prescrita a liquidação adicional de IRC referente a 1995 e julgada procedente a impugnação judicial deduzida e anulado o acto de liquidação adicional de IRC relativo a 1996, por ilegalidade verificada nas correcções contestadas (cfr.sentença exarada a fls.595 a 608 do processo de impugnação apenso);
5-Com vista à suspensão da execução fiscal referida no nº.1 a exequente pagou pela prestação e manutenção da garantia bancária indicada no nº.2, entre 16/12/1999 até 16/03/2009 a quantia global de € 53.462,51 relativos a encargos com Imposto de Selo e a comissões de garantia (cfr.documentos juntos a fls.33 a 70 dos presentes autos);
6-Em 25/2/2009 a exequente requereu ao 2º. Serviço de Finanças de Lisboa, o reembolso dos encargos em que incorreu com a prestação e manutenção da garantia bancária identificados no nº.5 (cfr.documento junto a fls.71 e 72 dos presentes autos);
7-A presente execução de julgados foi enviada ao Tribunal Tributário de Lisboa através de correio registado em 18/09/2009 (cfr.documento junto a fls.74 dos presentes autos);
8-Em 25/2/2011 foi elaborado projecto de despacho de indeferimento da pretensão da exequente identificada no nº.6 (cfr.documentos juntos a fls.128 a 131 dos presentes autos).
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…a decisão da causa, com base nos documentos existentes nos autos e no processo administrativo…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou procedente a execução de julgado da sentença exarada no processo de impugnação judicial apenso, sendo relativa ao reembolso das quantias suportadas com a prestação de garantia com vista à suspensão do processo de execução fiscal instaurado para cobrança coerciva das liquidações impugnadas, no montante de € 53.462,51 (cfr.nº.5 do probatório).
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Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em síntese e como supra se alude, que decidiu o Tribunal "a quo" que por força do artº.53, da L.G.T., o recorrido tem direito a ser indemnizado, total ou parcialmente, pelos prejuízos resultantes da prestação da garantia bancária ou equivalente para obter a suspensão do processo de execução fiscal, no caso de esta vir a revelar-se indevida por força do vencimento em processo judicial, como foi o caso dos autos, ou em procedimento tributário, pelo que se conclui que se encontra preenchido o pressuposto previsto no nº.2, da citada norma. Que o recorrente não se conforma com o decidido, porquanto, o pedido de indemnização formulado é manifestamente extemporâneo, nos termos do artº.171, nº.2, do C.P.P.T. Que no caso concreto o ora recorrido apresentou impugnação judicial em 21.OUT.1999, prestou garantia bancária em 16.DEZ.1999, pelo que, dispunha de 30 dias após a prestação da garantia para apresentar o requerimento do pedido de indemnização, a fim de ser apreciado e decidido em sede de impugnação judicial. Contudo, o ora recorrido só requereu a predita indemnização em 25.FEV.2009. Que o pedido de indemnização com os encargos suportados com a prestação da garantia é extemporâneo. Que a sentença ora recorrida revela uma inadequada interpretação e aplicação do artº.53, nº.3, da L.G.T., e artº.171, nº.2, do C.P.P.T. (cfr.conclusões 1 a 11 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal pecha.
Deve vincar-se que objecto do presente recurso se circunscreve ao exame da tempestividade do pedido de indemnização com os encargos suportados com a prestação da garantia, face ao disposto no artº.171, nº.2, do C.P.P.T., assim sendo de afastar a análise do "quantum" indemnizatório, o qual não é posto em causa pelo recorrente.
Nos termos do artº.100, da L.G.Tributária, em virtude da procedência total ou parcial de impugnação a favor do sujeito passivo, a A. Fiscal está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, tal dever compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, computados a partir do termo do prazo da execução da decisão (cfr.artº.43, da L.G.T.).
Em face de tal postulado, a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/1/2012, proc.5110/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/9/2013, proc.6718/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/10/2014, proc.7714/14; Diogo Freitas do Amaral, A execução das sentenças dos Tribunais Administrativos, 2ª. edição, Almedina, 1997, pág.70; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.868 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, 6ª. edição, 2011, pág.526 e seg.).
A A. Fiscal está, assim, obrigada a reconstituir a situação legal que hipoteticamente existiria se não houvera sido objecto de um acto lesivo ou de uma ofensa por si cometida contra os direitos e interesses protegidos dos administrados. Tal constitui uma simples explicitação do princípio geral de direito que nos diz que devem ser apagados todos os efeitos jurídico-práticos consequentes de um acto ilícito (cfr.artº.562, do C.Civil).
A reconstituição da situação hipotética actual justifica a obrigação de restituição do imposto que houver sido pago, tal como do pagamento de juros indemnizatórios, cuja atribuição ao sujeito passivo, nos termos da lei, não está dependente da formulação de pedido nesse sentido, posição esta que está de acordo com os efeitos consequentes que decorrem da anulação do acto tributário, tal como do facto do pagamento de juros não estar dependente de pedido (cfr.artº.100, da L.G.Tributária; artº.61, nº.3, do C.P.P. Tributário; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/2/2009, rec.1003/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/7/2006, proc.1258/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/1/2007, proc.205/04; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/10/2014, proc.7714/14; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.869).
No caso "sub judice", haverá que saber se o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida foi formulado em tempo e dentro dos parâmetros da lei, como entendeu o Tribunal “a quo” ou, pelo contrário, está manifestamente fora de prazo como defende o apelante.
Ainda como decorrência da anulação judicial do acto tributário ilícito e do desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, surge-nos a norma que consagra a possibilidade de pagamento de uma indemnização quando se conclua que o sujeito passivo prestou uma garantia no âmbito de processo de execução fiscal, visando a sua suspensão, sendo esta indevidamente prestada (cfr.artº.53, da L.G.T.; artº.171, do C.P.P.T.).
O artº.53, da L.G.T.( (diferente deste direito de indemnização é o reconhecido pelo artº.183-A, do C.P.P.T., porque derivado da mera caducidade da garantia prestada).), atribui ao devedor que, para suspender a execução, tenha oferecido garantia bancária ou equivalente, o direito a ser indemnizado, total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação. A indemnização será total ou parcial conforme o vencimento que o interessado obtenha em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida (cfr.artº.53, nº.1, da L.G.T.). Se se comprovar que houve erro imputável aos serviços, essa indemnização será devida independentemente do período de tempo durante o qual a garantia tiver sido mantida (cfr.artº.53, nº.2, da L.G.T.). Se a anulação, total ou parcial, não tem por fundamento um erro daquele tipo (v.g.liquidação é anulada por erro imputável ao próprio contribuinte ou por vício de forma ou incompetência) a indemnização só é devida se a garantia tiver sido mantida por mais de três anos (cfr.nº.1 do preceito; no caso, tal prazo superior a três anos resulta do nº.5 do probatório). O prejuízo consagrado no artº.53, nº.1, da L.G.T., pode englobar não só o custo da garantia prestada, como qualquer outro lucro cessante ou dano emergente, tudo dentro dos limites previstos no nº.3 do mesmo preceito.
Mais se dirá que à face do referido artº.53, da L.G.T., não é reconhecido o direito de indemnização por prejuízo resultante da prestação de garantia quando não houver vencimento, total ou parcial, no processo administrativo ou judicial que tiver sido utilizado e, por isso, não se poderá saber se é de reconhecer direito a indemnização antes do momento em for proferida a decisão final do mesmo processo (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.433 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, 6ª. edição, 2011, pág.237 e seg.).
Haverá, agora, que saber se o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida pode ser formulado em processo de execução de julgado, como no caso "sub judice" e contrariamente ao que defende o apelante.
Recorde-se, desde logo, que o direito do contribuinte a uma indemnização está garantido pelo artº.22, da C.R.Portuguesa, e, por isso, não poderá a lei ordinária eliminá-lo. Consequentemente, se estas situações não fossem abrangidas pela previsão do artº.171, do C.P.P.T., teria de reconhecer-se ao interessado outra via para assegurar o seu direito de indemnização, em última hipótese através de uma acção por responsabilidade civil extracontratual, a formular nos termos do artº.37, nº.2, al.f), do C.P.T.A.
Por outro lado, deve vincar-se a supremacia da L.G.T. sobre o C.P.P.T., vector do qual se conclui que o legislador não pretendeu excluir a possibilidade de ser pedida, autonomamente, a indemnização por garantia indevidamente prestada, como se retira da parte final do artº.53, nº.3, da L.G.T., assim sendo de defender, contrariamente ao que parece consagrar o artº.171, do C.P.P.T., a faculdade de ele ser formulado no único outro meio processual potencialmente adequado para o efeito, que será o de execução de julgados.
Por último, recorde-se que esta posição é a que melhor se compagina com o teor do aludido artº.100, da L.G.T., e o citado dever de plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio. Na verdade, se é certo que a indemnização por garantia indevida não se insere no âmbito do dever de execução espontânea (designadamente, porque a A. Fiscal nem saberá, exactamente, o que o impugnante despendeu com a prestação de garantia), também é certo que o acto anulado constitui uma condição sem a qual não teria sido prestada a garantia e está ligado a esta por um nexo de causalidade adequada, pelo que a indemnização se insere no âmbito do dever de reconstituição que existiria se não tivesse sido praticado o acto ilegal, em que se consubstancia a execução de julgado anulatório de acto administrativo (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Responsabilidade Civil da Administração Tributária por Actos llegais, Áreas Editora, 2010, pág.157 e seg.).
Em conclusão, atento tudo o referido, o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida pode ser formulado em processo de execução do julgado anulatório, de resto, conforme defende a jurisprudência maioritária do S.T.A., com a qual concordamos (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 24/11/2010, rec.1103/09; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/6/2011, rec. 216/11; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/6/2014, rec.1062/12; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/10/2014, rec.1016/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, 6ª. edição, 2011, pág.239 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, tendo o pedido de indemnização sido formulado, precisamente, em execução de julgado anulatório e por apenso ao processo de impugnação respectivo, deve considerar-se o mesmo tempestivo, contrariamente ao defendido pelo recorrente, assim não sendo de aplicar a restrição temporal prevista no artº.171, nº.2, do C.P.P.T.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, embora com a presente fundamentação, a qual se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 18 de Dezembro de 2014



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)