Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1488/08.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:12/07/2021
Relator:VITAL LOPES
Descritores:CONTRIBUIÇÃO ESPECIAL; FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:1. A avaliação para efeitos da contribuição especial criada pelo Dec-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, que aprovou o respectivo Regulamento, deve ser devidamente fundamentada (art.º 4.º, n.º 3 do Regulamento).
2. Tal avaliação encontra-se sujeita a uma fundamentação com as características específicas constantes no mesmo Regulamento, como seja a da localização do prédio, o seu ambiente envolvente e os índices de ocupação do solo, de molde a justificar os valores encontrados pela comissão de avaliação.
3. Não preenche as exigências legais de fundamentação, o termo de avaliação em que se refere que os peritos acordaram “por maioria” não mencionando sobre que características recaiu a falta de acordo e por que razões, e na ponderação da envolvente ambiental recorre a conceitos vagos e indeterminados como “zona razoavelmente servida de transportes públicos”, “área com algum comércio, serviços e restauração”, “zona de expansão urbana”.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1 – RELATÓRIO


O Exmo. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por “A.L.S. E., Lda.” da avaliação efectuada nos termos da Contribuição Especial a que se reporta o Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março.

O Recorrente conclui as doutas alegações assim:
«
Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou a impugnação judicial procedente, determinando a anulação da "...avaliação efectuada nos termos da contribuição especial a que reporta o Decreto-lei n.0 43198 de 03/03,…"..

li. Examinadas as questões suscitadas pela Impugnante, veio o Tribunal a quo a considerar que todas elas deveriam improceder com a excepção da alegada falta de fundamentação, pelo que assim determinou a procedência da impugnação, e originou o presente recurso.

Ili. Não se conformando com tal decisão, é entendimento da AT que a sentença recorrida, mormente a parte que origina o presente recurso, padece de (i) vício de nulidade assim como de (ii) erro na apreciação da prova produzida nos autos.

IV. No que a nulidade da sentença diz respeito, é nosso entendimento que tendo o decisor declarado em relação a parte da sentença que examina a alegada falta de fundamentação do acto tomado pela AT que "Procede o argumento de falta de fundamentação do ato e erro de facto enunciado pelo Impugnante" sublinhado nosso, e não tendo ao longo de toda a analise de tal matéria referido qualquer facto, alias tal como não o faz, em relação a esta alegação, a impugnante, fez incorrer a sentença, nos termos da alínea b) do art.º 615.º do Código de Processo Civil, no vicio de nulidade.

V. E assim o entendemos porquanto toda a análise da questão da alegada falta de fundamentação do acto da AT se efectuou por análise literal tendente à consideração de que a justificação do acto impugnado se fez com recurso a conceitos indeterminados, não se referido na fundamentação da sentença qualquer facto que justifique, ou possibilite, que a decisão vá no sentido de considerar a existência de "...erro de facto enunciado pelo impugnante.".

VI. Ora assim se verificando, e à luz do já mencionado artigo 615.º do CPC constata-se que a sentença padece de nulidade, porquanto não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão de se verificar a procedência de "erro de facto" referido no teor da decisão, o que desde já se invoca pedido acórdão que confirme a existência de tal vicio, com todas as consequências legais.

VIL Aliás, mesmo que assim não se entenda, isto é, mesmo que se admita que haveria nesta parte da sentença referências a factos que justifique a decisão declarada, sempre se haveria de aqui admitir, pelo menos em nossa opinião, que a decisão de considerar procedente o argumento de "...erro de facto enunciado pelo impugnante.", tal como já se referiu, e como consta na folha n.º 6 da sentença, é contraditado com o que se refere, na pagina seguinte,

VIII. ou seja, existindo somente uma alegação do impugnante referente a erro de facto, a decisão tomada na parte a que respeita a fundamentação do acto impugnado, é contraria à tomada na parte final da decisão, em que se afirma que "Quanto ao erro da matéria de facto quer da decisão da administração quer do referido pelas testemunhas no caso estamos perante 4 assoalhadas e mais uma recuada o que não difere se referirmos cinco assoalhadas sendo uma recuada. Improcede a impugnação quanto a este fundamento.'' (Sublinhado nosso).

IX. Acresce ainda que, em nossa opinião, o decisor errou ainda na apreciação da prova produzida nos autos.

X E assim o consideramos, porquanto defendemos que na análise efectuada à alegada falta de fundamentação do acto impugnado, impunha-se ao Tribunal a quo ter ido para além da análise, simples e directa, do significado dos conceitos utilizados.

XI Isto é, na fundamentação da sua decisão, o decisor bastou-se pela referência a supra mencionada jurisprudência acrescendo a ela, somente, as seguintes considerações "Do probatório resulta que tal fundamentação não cumpre cabalmente o desiderato que com a mesma se visa atingir, isto é de dar a conhecer ao contribuinte porque em tal avaliação se logrou alcançar tal resultado e não qualquer outro, diferente. A razão de se apurar aquele valor e não outro.
Os conceitos referentes à envolvente ambiental, são indeterminados, nomeadamente "Zona "razoavelmente servida de transportes públicos, local sossegado, área com algum comércio, serviços de restauração, em zona de expansão urbana".
Do exposto resulta que a fundamentação do ato se socorre de conceito indeterminados. Tal fundamentação, segundo cremos, não atinge os pressupostos de decisão devidamente fundamentada, não enuncia de forma concreta os motivos da atribuição daqueles valores e não de outros, pelo que o mesmo padece do vício consistente na sua insuficiência, o que equivale à sua falta - art.º 125.º, n.º 2 do CPA - conducente à sua anulação.
Procede o argumento de falta de fundamentação do ato e erro de facto enunciado pelo Impugnante."

XII. Ora, é nossa convicção que se impunha ao Tribunal a quo a análise do acto impugnado levando em consideração aquilo que é o conhecimento das circunstâncias concretas do imóvel que são exigíveis ao destinatário do acto.

XIII. Isto é, em nossa opinião, a fundamentação apresentada pelos serviços da AT foi, como deve ser, suficiente, clara e expressa para que o seu destinatário, mediante aquilo que se deve admitir que esta obrigado a conhecer, entenda quais os factores que influenciaram a avaliação do imóvel, e não, como parece resultar da decisão de que ora se recorre, saber se o seu teor possui elementos que podem ser ou não determinados por alguém que não conheça de todo a situação concreta alvo da avaliação.
XIV. E assim sendo impunha-se que o Tribunal a quo, pelo menos em nossa opinião, ter considerado que a fundamentação apresentada possibilita ao seu destinatário, ou seja, ao impugnante, reitera-se, conhecedor que é, necessariamente, da zona em que se situa o imóvel de que é proprietário entender o itinerário cognoscitivo e as razões concretas que tiveram na base na decisão tomada pelos serviços da AT.

XV. Acresce ainda que em nossa opinião, a referência a "Zona "razoavelmente servida de transportes públicos, local sossegado, área com algum comércio, serviços de restauração, em zona de expansão urbana" comunicada ao impugnante, em nossa opinião, não consubstancia referência a conceitos indeterminados, porquanto entendemos que o destinatário do acto, conhecedor que necessariamente é, das circunstâncias locais em que o imóvel se situa, tem facilmente ao seu alcance a possibilidade de entender qual o factor que influenciou a tomada da decisão.

XVI. Ora, tendo o tribunal a quo olvidado tal exame, porquanto se bastou por uma analise directa aos vocábulos utilizados, sem que tenha cuidado de observar se era ou não possível, e ate exigível, ao destinatário o entendimento dos factos que lhe eram comunicados e qual a sua relevância na avaliação efectuada ao imóvel, incorreu em erro de apreciação da prova produzida nos autos.

XVII. Mas mais, mesmo que se entenda que a fundamentação não tem que ter em consideração as circunstâncias e conhecimentos do destinatário da decisão, sempre se haveria de considerar, pelo menos em nossa opinião, que a referencia a que o imóvel avaliado se situa junto a uma zona razoavelmente servida de transportes públicos possibilita ao impugnante, assim como a qualquer homem médio, entender que a avaliação do seu imóvel teve em consideração que a localidade em que o imóvel se situa é servida de transportes públicos em numero razoável, devendo-se entender como qualificável como "razoável" a existência de carreias de autocarros, eléctrico, táxis e até comboio, como alias resulta dos elementos juntos aos autos.

XVIII. De igual forma, também a menção a "local sossegado" não se nos afigura como passível de consubstanciar um conceito indeterminado, porquanto qualquer "Bonus pater familiae" colocado perante tal classificação, consegue entender o conteúdo do conceito.

XIX.E o mesmo se diga para os conceitos de "área com algum comércio, serviços de restauração, em zona de expansão urbana".

XX. Ora, perante o que se deixa dito, forçoso é, salvo melhor entendimento, concluir que a sentença não só incorre em vício de nulidade como em erro de apreciação da prova produzida.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão recorrida ser declarada nula, nos termos do art.º 615.º do Código de Processo Civil, ou caso assim não se entenda, substituída, na parte recorrida, por acórdão que declare a impugnação improcedente, por verificação de erro na apreciação da prova, porém, V. Exas. decidindo, farão a costumada JUSTIÇA.».

A Recorrida apresentou Contra-alegações, que culmina com as seguintes e doutas conclusões:
«
1 . No caso em apreço a sentença específica expressamente e de forma separada a parte dos fatos e a parte do direito, não padece qualquer nulidade.
2. 'Para que a sentença padeça do vício que consubstancia a nulidade prevista no art. 615, n.º1 , al. b) do CPC é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente.
3. Face ao exposto é manifesto que não existe a nulidade invocada.
4. Não obstante, mesmo lendo apenas a parte onde é apreciada a falta de fundamentação do ato impugnado, a sentença indica expressamente os factos enunciados pelo impugnante e que revelam um erro de fato, nesta parte.
5. O erro de fato resulta da análise da área envolvente do imóvel, que aliás está expressamente indicada nesta parte da sentença (vide pág.6, linha 17) e resulta dos fatos provados identificados em m), n), o) e p).
6. Não há qualquer contradição na sentença porque os fatos em apreciação e julgados nos dois momentos (pág. 6 e pag.7) da sentença são distintos.
7. Quanto aos elementos da área envolvente, o Tribunal julgou existir um erro de fato e decidiu em conformidade.
8. Quanto ao número de pisos do prédio, o Tribunal julgou improcedente o vício de erro de fato alegado pela impugnante.
9. Não há qualquer contradição porque estão em apreciação fatos diferentes que mereceram juízos distintos pelo Mmo. Juiz.
10. A sentença não padece de qualquer nulidade, devendo a mesma ser interpretada em conjunto e não de forma compartilhada como se cada um dos seus elementos não tivessem interligados e uns resultantes dos outros.
11 .Acerca de falta de fundamentação do ato sub judice não podemos deixar de referir, para reforçar a correção da decisão judicial, que a douta sentença foi no mesmo sentido de outras decisões já proferidas pelos tribunais superiores em apreciação de atos e fatos semelhantes aos dos autos (Ac. do TCAS de 04.06.2013, proc. n.º 05826/12 e Ac do TCAS, de 19/06/2012, proc. n.º 03096/09).
12. A fundamentação dos atos tributários é um dever da AT e não dos Tribunais.
13. O dever de fundamentação é uma obrigação da AT e resulta do disposto no art.º 77.º da LGT e art. 268.º, n.º 3 da CRP.
14. Transferir essa obrigação para os Tribunais constitui em primeiro lugar, uma violação do art.º 77.º da LGT e, em segundo lugar constitui uma violação do princípio da separação de poderes previsto no art.º 2.º e art.º 111.º da CRP.
15.Mais, admitir tal interpretação constituiria também uma violação do princípio da igualdade (art. 13º da CRP) e do contraditório (ar CPC, ex vi art. 2º, al. e) do CPPT) porque a Recorrida organizou a sua defesa perante uma ato agressivo da AT em função do ato de que foi notificada.
16.A Recorrente recorre ao conceito do destinatário concreto para aferir da suficiência, ou não, da fundamentação o ato sindicado.
17.A conceção adotada pela generalidade dos Tribunais ( Ac. do 12.03.201 4, proc. n.º 1674/1 3, Ac. do STA de 23.04.2014, proc. 1690/13, Ac. do TCAN de 25.06.2015, proc. n.º 601/05.0 BEVIS) e da doutrina (Vieira de Andrade, Ob. Cit., pág. 247) corresponde à conceção do destinatário normal, sendo por isso de afastar a interpretação proposta pela recorrente, a qual é contrária aos arts 77.º LGT, 268º, n.º3 da CRP e 153º, n.º l do CPA.
18.Contrariamente ao alegado pela Recorrente, os termos “zona razoavelmente servida de transportes, em local sossegado, área com algum comércio, serviços de restauração e em zona de expansão urbana” são indeterminados.
19. A indeterminação não resulta do apuramento do destinatário do ato, mas sim da dificuldade hermenêutica em apurar o sentido dos termos.
20. A fundamentação com base em conceitos imprecisos, sem concretização, é inadmissível.
21. Embora a falta de fundamentação do ato impugnado persista, a Recorrente, nas suas alegações de recurso, tenta fundamentar a decisão de que recorre e aduz novos argumentos, nomeadamente quando vem explicar o conceito de zona razoavelmente servida de transportes.
22. Não é admissível a fundamentação "a posteriori", que em regra se mostra suscetível de colidir com a estabilidade dos interesses particulares.
23. Admitir esta fundamentação subsequente, como pretende a AT configura uma violação dos direitos de defesa do impugnante (art.º 2 e art. 268º, n.º4 da CRP), do princípio do contraditório (art. 2º, CRP e art. 3º do CPC ex vi art. 2º, al. e) do CPPT ) do princípio da igualdade (art. 13º da CRP, art. 6º da CEDH, art. 3ºA do CPC e art. 98º da LGT) e do próprio dever de fundamentação (art. 268º, n.º3 da CRP).
24. Por fim não podemos deixar de referir que o ato em apreciação está sujeito a um dever acrescido de fundamentação, o qual resulta do legislador não se ter bastado com a norma geral (art. 77º da LGT) e ter previsto uma norma especial de fundamentação (art. 4º, n.º3 do n.º43/98 de 03.03).
25. .Face ao exposto, tal como é explicado na sentença, não tendo a AT no ato impugnado indicado em concreto:
· A exata localização do prédio;
· As características arquitectónicas do prédio;
· Se é ou não servido de zonas de comércio;
· O valor do m2 em 1994 e em 2006
É imperativo concluir que o ato padece de falta de fundamentação.
26. Nos termos do que se dispõe no art.º 77.º da LGT, art.º 268º n.º 3 da CRP e art.º 4.º, n.º 3 do DL n.º 43/98 de 03.03, a AT está obrigada a fundamentar as decisões emitidas, o que no caso em apreço manifestamente não faz.
Nestes termos e nos demais de direito, deve a sentença recorrida ser mantida, fazendo-se assim a costumada justiça.».

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto parecer concluindo que a decisão recorrida deverá ser revista.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), a questão que importa dirimir reconduz-se a indagar se o acto impugnado contém a fundamentação legal.

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:
«
Compulsados os autos, analisada a prova documental não contestada, da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com interesse para a decisão da mesma;

a. Pela Câmara municipal de Oeiras foi emitido o alvará de obras de construção nº 1../2007RJUE em nome da impugnante que se dá por reproduzido (fl. 22 dos autos);

b. Em 2/06/2008 foi pelo serviço de finanças de Oeiras - Algés - 3 o termo de contribuição especial (termo de avaliação) no qual estiveram presentes a adjunto do serviço de finanças, os 3 peritos indicados no referido termo de avaliação, um deles nomeado pelo Impugnante (fl. 23 dos autos e facto confessado);

c. Foi emitida a notificação da avaliação da ficha 001827241 referente ao terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 2500 freguesia 111009 Algés (fl. 30 dos autos);

d. Na notificação referida no ponto anterior constam os seguintes elementos:
i. Elementos declarados;
1. Área total do terreno 540.9400m2
2. Área de implantação do prédio 540.9400m2
3. Área bruta de construção 2.347,6000m2
4. Área bruta dependente 393,1000m2
5. Data da passagem a urbano 2007-06-01
ii -Avaliação
1. Área total do terreno 540.9400m2
2. Área de implantação do prédio 494, 100m2
3. Área bruta de construção 1.810, 7000m2
4. Área bruta dependente 1.214,200m2
5. Data da passagem a urbano 2007-06-01
iii Final
1. Área total do terreno 540.9400m2
2. Área de implantação do prédio 494, 100m2
3. Área bruta de construção 1.810, 7000m2
4. Área bruta dependente 1.214,200m2
5. Data da passagem a urbano 2007-06-01

e) O valor patrimonial tributário foi fixado de acordo com os seguintes parâmetros Vtx (282.480, 00) = VC (615,00) X (A 960. 7600 x % 28, 00 + (Ac 1.1700 +Ad 0,000)) X CI 1, 70X Ca 1,00 X Cq 1,00 (fl. 30 dos autos);

f) Os símbolos referidos no ponto anterior vêm explicitados na notificação de avaliação, correspondendo VT ao valor patrimonial; Wc valor de base dos prédios edificados- A área bruta de construção mais área excedente à área de implantação, Ca coeficiente de localização, Cq, coeficiente de qualidade e conforto, Cv coeficiente de vetustez, sendo A = Aa + Ab +Ac + Ad, em que Aa representa a área bruta privativa, Ab representa as áreas brutas dependentes, Ac representa a área do terreno livre até ao limite de duas vezes a área de implantação. Tratando-se de terrenos para construção, A = Área bruta de construção integrada de Ab valor em euros, arredondado nos termos do nº 2 do artº 38º do CIMI (fl. 30 dos autos)

g) Na avaliação do prédio foi tido em conta o alvará junto aos autos e que se dá por reproduzido (fl. 58 do processo administrativo);
h) Na avaliação reportada a 1994 foi "tomado como referência os parâmetros ( .) discriminados, designadamente o tipo de construção, de ocupação dos preços correntes para produtos idênticos e o peso do terreno no valor de construção" (fl. 64 do processo administrativo)

i) Tendo em conta o facto referido no ponto anterior foi apurado o Vert 1
=2.783,84m2 x 0,71x € 500/m2 x 0,25 = 247.066€ (fl. 64 do processo administrativo);

j) Tendo em conta a avaliação reportada à data do pedido de licenciamento foi obtido o valor do terreno nos seguintes termos Vtr2 = 2.783,84 m2 x 0,71 x €800/m2 x 0,28 -= €442.742 (fl. 64 do processo administrativo);

k) Na avaliação quanto à envolvente ambiental foi considerado que "com frente ao acesso para um arruamento de dois sentidos, pavimentado a betuminoso em passeios empedrados; arruamento com ligação às redes de água, eletricidade e esgotos, telecomunicações, sem gás e com pluviais, zona razoavelmente servida de transportes públicos, local sossegado, área com algum comércio e serviço de restauração, em zona de expansão urbana (fl. 63 do processo administrativo);

1) O critério de avaliação teve em conta que na data do pedido de licenciamento em 2006 "o terreno será avaliado, a preços de época, em função como não podia deixar de ser, das capacidades construtivas autorizadas ou efetivamente verificadas, tendo em consideração: Segundo o PDMO em vigor versus Planta de Ordenamento a área do prédio em avaliação, situa-se em zona classificada como Espaço Urbano/Urbanizável; O regulamento, em vigor, especifica que as normas urbanísticas a adotar são as constantes do respetivo Anexo 1 (UOPG 's - Aglomerados Urbanos) sem o " índice de utilização bruta máximo" (lub) = 72. Dado existir o Alvará de construção nº 117/207 o critério de avaliação terá em consideração a capacidade construtiva que é definida neste documento" (fl. 63 do processo administrativo);

m) O prédio sito na Rua P. nº .. e .. só tem uma via num sentido (depoimento das testemunhas);

n) O prédio referido no ponto anterior tem um r/c mais três frações e outra que é recuada (depoimento da testemunha);

o) Existem carros estacionados em cima do passeio frente ao prédio que só estacionam numa via (depoimento da testemunha);

p) Para ter acesso à rua em causa tem que se percorrer cerca de 600m e 400m até ter acesso ao comércio (depoimento da testemunha).
*
No tocante aos factos provados, a convicção do Tribunal sustentou-se na prova documental junta aos autos, em concreto no teor dos documentos indicados em cada uma das alíneas supra. Foi tido em conta o depoimento das testemunha que mostraram ter conhecimento direto dos factos. A primeira testemunha (engenheiro) conhece a impugnante com quem tem uma relação de comércio e amizade. A segunda testemunha (arquiteto), também tem um conhecimento direto com a impugnante com quem tem relações comerciais. Ambos visitaram o prédio e acompanharam a construção do mesmo.
*
Não se provaram outros factos que, em face das possíveis soluções de direito, importe
registar como não provados.».

4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

O Recorrente aponta à sentença vicio de nulidade por falta de fundamentação quanto ao “erro de facto” que enuncia.
Nos termos do art.º 615º, n.º 1, al. b) do CPC, a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.

Como refere Teixeira de Sousa, “esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, CRP; art. 158º, n.º 1)” (corresponde ao actual art.º 154.º do CPC).

E acrescenta o mesmo autor: “o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível” [In “Estudos sobre o Processo Civil”, pág. 221].

Ou, como refere Lebre de Freitas, “há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação” [In CPC, pág. 297].

No mesmo sentido diz o Conselheiro Rodrigues Bastos, que “a falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º 1 é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença” [in "Notas ao Código de Processo Civil", III, 194].

E como advertia o Professor Alberto dos Reis “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.

Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade do n.º 2.° do art. 668.°” [in "Código de Processo Civil Anotado", V, 140].

Assim compreendido o vício de falta de fundamentação, atentemos nas seguintes passagens da sentença.

Logo no relatório, ao destacar as passagens mais impressivas do douto parecer do Ministério Público na 1.ª instância, escreveu-se na sentença: “Quanto ao erro nos pressupostos de facto defende que não há diferença entre quatro mais 1 recuado e cinco, um é recuado”.

Em sede factual, deixou-se vertido no ponto n) da matéria assente: “O prédio referido no ponto anterior tem um r/c mais três fracções e outra que é recuada (depoimento das testemunhas)”.

A final, em sede de apreciação de direito, a sentença consignou: “Quanto ao erro da matéria de facto quer da decisão da administração, quer do referido pelas testemunhas, no caso estamos perante 4 assoalhadas e mais uma recuada, o que não difere se referirmos cinco assoalhadas, sendo uma recuada.
Improcede a impugnação quanto a este fundamento»

Ou seja, a sentença resolveu a questão factual controvertida do número de fracções do prédio, explicando que a controvérsia era meramente semântica, expressando, todavia, a mesma realidade factual: que o prédio tinha cinco fracções.

Não colhe, portanto, o argumento de que a decisão sobre a questão factual não está fundamentada, pois tal fundamentação resulta contextualmente apreensível e, contrariamente ao que alega o recorrente, o erro de facto apontado pela impugnante ao termo de avaliação quanto ao número de fracções foi julgado improcedente.

Improcede a arguida nulidade da sentença por falta de fundamentação.

Insurge-se outrossim o recorrente com o decidido na sentença quanto à falta de fundamentação do termo de avaliação que está na base da impugnada liquidação de Contribuição Especial.

O tributo em causa foi criado pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, que “Aprova o Regulamento da Contribuição Especial, devida pela valorização dos imóveis beneficiados com a realização da CRIL, CREL, CRIP, CREP, travessia ferroviária do Tejo, troços ferroviários complementares, extensões do metropolitano de Lisboa e outros investimentos”.

Dispõe o art.º 6.º do referido Regulamento da CE:
«Artigo 6.º


1 - Na determinação dos valores, a comissão terá em consideração a natureza e o destino económico do prédio.


2 - Para efeitos do número anterior, atender-se-á:


a) À localização, ao ambiente envolvente e ao desenvolvimento urbanístico da zona;


b) Às infra-estruturas existentes;


c) À caracterização física e topográfica;


d) Aos índices de ocupação e volumetria;


e) Às características agrárias, aos tipos de cultura e à disponibilidade de águas;
f) Ao valor das construções rurais e dependências agrícolas;


g) A quaisquer outros elementos susceptíveis de influírem no valor dos prédios».

Dispõe o n.º 3 do art.º 4.º do Regulamento da CE que «A avaliação será efectuada com precedência de vistoria, devendo as decisões ser devidamente fundamentadas».

Analisando o termo de avaliação (junto com a P.I., a fls.23 dos autos), constata-se destacadamente que os peritos acordaram na avaliação “por maioria” e não por unanimidade; que na avaliação da “envolvente ambiental” se recorreu a conceitos vagos e indeterminados como “zona razoavelmente servida de transportes públicos”, “local sossegado”, “área com algum comércio, serviços e restauração”, “em zona de expansão urbana”, conceitos cuja densificação se impunha fazer, tanto mais que a avaliação não foi acordada com unanimidade, não se tendo deixado expressado no termo de avaliação, que elementos de avaliação não mereceram acordo e quais as razões subjacentes.

Na verdade, ninguém sustentará que a avaliação mereça igual ponderação consoante a zona seja servida por transportes públicos colectivos (metro, autocarro, comboio…) ou unicamente por táxis; ou tenha comércio, serviços e restauração na própria rua ou distando 400 ou 600 metros do local do imóvel.

O argumento do recorrente segundo o qual, a imprecisão conceitual se resolve com o conhecimento concreto da zona que o contribuinte alegadamente tem, não tem respaldo. A fundamentação tem de ser objectivada e expressada de modo a ser apreensível pelo homem comum (homem médio) e em termos de poder ser sindicada pelo tribunal caso o contribuinte com ela se não conforme.

A fundamentação externada no termo de avaliação não preenche as exigências de fundamentação decorrentes do art.º 77.º da Lei Geral Tributária e 4.º do Decreto-Lei n.º 43/98 de 3 de Março, porquanto, não tendo embora a comissão de justificar exaustivamente todas as características enumeradas no art.º 6.º do Regulamento da CE, sempre deveria ter densificado e precisado suficientemente aquelas que referiu e ponderou em termos de possibilitar ao destinatário aquilatar da justeza do valor atribuído.

A sentença não incorreu no apontado erro de julgamento, merecendo ser confirmada.

O recurso não merece provimento.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Condena-se o recorrente em custas.

Lisboa, 07 de Dezembro de 2021



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Vital Lopes




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Luísa Soares




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Tânia Meireles da Cunha