Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2100/20.1BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:09/09/2021
Relator:PEDRO NUNO FIGUEIREDO
Descritores:ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO ESPECIFICADA;
CONTRATAÇÃO PÚBLICA;
CRITÉRIOS DE ADJUDICAÇÃO;
DISCRICIONARIEDADE;
PRINCÍPIO DA COMPARABILIDADE DAS PROPOSTAS
Sumário:I. Com a referência expressa na contestação aos artigos da petição inicial que se consideram impugnados, é de afastar a sua admissão por acordo, nos termos previstos no artigo 574.º, n.º 2, do CPC.

II. A entidade adjudicante goza de uma margem ampla de discricionariedade na escolha entre as modalidades de critério de adjudicação previstas no artigo 74.º, n.º 1, do CCP, assim como na escolha e ordenação dos fatores de avaliação, e dos respetivos coeficientes de ponderação, que permitam determinar a proposta economicamente mais vantajosa.

III. Se fica por demonstrar que a opção da entidade adjudicante seja carecida de razoabilidade, não pode o tribunal substituir-se a esta na escolha tida por mais adequada à satisfação do interesse público.

IV. Resultando da factualidade dada como assente que os concorrentes responderam aos mesmos quesitos e requisitos do concurso, inexiste ofensa ao princípio da comparabilidade das propostas.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO
V... Portugal – C..., S.A., instaurou ação de contencioso pré-contratual contra o Ministério da Justiça, pedindo i) a anulação do ato de adjudicação da proposta da contrainteressada N…; ii) a anulação, por invalidade consequente, do contrato celebrado em sua execução; iii) a anulação de todo o procedimento por ilegalidade congénita; iv) a condenação da entidade adjudicante a abrir novo procedimento sem incorrer na mesma ilegalidade, de forma a que nele seja escolhida a proposta economicamente mais vantajosa.
Indicou como contrainteressadas N..., S.A., e M..., S.A.
Por decisão de 28/02/2021, o TAC de Lisboa - Juízo de Contratos Públicos julgou a ação improcedente.
Inconformada, a autora interpôs recurso daquela decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
I – DO OBJECTO DO PRESENTE RECURSO
A. A sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou improcedente a acção proposta pela Autora V..., e, consequentemente, absolveu a Entidade Demandada e a Contra-interessada do pedido de anulação do acto de adjudicação adoptado, em 20.10.2020, por Despacho de Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, ao abrigo do Acordo-Quadro SMT-2019 da Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, I.P. (ESPAP), para aquisição de Serviços Móveis de Voz e Dados (referência PAQ/01/2020/UCMJ), bem como, por invalidade consequente, do Contrato respectivo se este tivesse sido entretanto celebrado ou o fosse, na pendência da acção.
B. Pedia-se, ainda, a anulação de todo o procedimento por ilegalidade congénita, a condenação da Entidade Adjudicante a abrir novo procedimento sem incorrer na mesma ilegalidade, de forma a que nele seja escolhida a proposta economicamente mais vantajosa.
II – IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
C. O Tribunal a quo errou na decisão da matéria de facto, ao dar como não provados os factos referidos em 1), 2) e 3) da matéria de facto.
D. Na motivação, o Tribunal limitou-se a referir que esses factos resultaram da “tomada de posição definida pela ED, em concreto, no artigo 3.º da sua contestação, sobre os factos articulados pela Autora na petição inicial, na qual afirmou, de forma explicita, que “apenas se consideram admitidos os factos descritos na petição inicial (p.i.) e elencados nos seus artigos 2.º a 4.º, 6.º a 8.º, 12.º, 13.º, 16.º, 17.º, 19.º, 28.º, 29.º e 39.º a 41.º, impugnando-se todos os demais”.
E. Tal decisão corresponde a manifesto erro de julgamento sobre a matéria de facto, por errada apreciação da prova produzida, uma vez que, independentemente da posição tomada pela Entidade Demandada – que mais não foi do que uma impugnação não especificada, sem remissão para qualquer elemento probatório, sem justificação, meramente conclusiva e, pior, que em nada contradiz a restante posição assumida pela Entidade Demandada e Contra-interessada relativamente aos factos –, os documentos juntos aos autos imporiam que aqueles factos fossem dados como provados.
F. No que respeita ao facto não provado referido no n.º 1), relativo ao ciclo de vida útil dos equipamentos cujo fornecimento constitui o objeto do contrato em apreço, a Entidade Demandada impugnou – embora não especificadamente – o facto de que os equipamentos a adquirir no âmbito do contrato tivessem tipicamente um ciclo útil de vida de 3 anos.
G. Todavia, é facto público e notório, decorre da experiência comum que este tipo de equipamentos não dura muito mais do que 3 anos, excepto alguns equipamentos topo de gama (que não é o caso dos que se forneceriam pela adjudicatária) seja porque se tornam rapidamente obsoletos em virtude do aparecimento permanente de novas aplicações e software, seja porque os próprios materiais não resistem muito mais do que esse período de tempo, devido ao uso intensivo e permanente destes equipamentos.
H. Por outro lado, a prova documental produzida também revela claramente que é esse o período de vida útil estimado para o uso destes equipamentos, designadamente o próprio Caderno de Encargos, que estabelece como período de vigência do contrato 36 meses, e reconhece que um prazo de garantia superior a 24 meses é já uma vantagem considerável para este tipo de equipamentos, sendo que se atribuía pontuação máxima (100 pontos), caso os candidatos tivessem oferecido prazos de garantia de 3 anos.
I. Por último, a duração do contrato (de 36 meses, com exceção do contrato a celebrar pelo Supremo Tribunal Administrativo, cuja duração é de 24 meses) é também fixado, no sentido de corresponder a esse prazo de vida útil.
J. Nestes termos, deverá ser modificada a decisão sobre a matéria de facto e ser dado como provado o facto referido em 1) dos factos não provados.
K. Em segundo lugar, o Tribunal a quo deu também como não provado que “2) A maior parte, se não a totalidade, das quantidades previstas para fornecimento de equipamentos será executada logo no princípio do Contrato, o que determinará que se venham a aplicar os referidos consumos mínimos - facto invocado no artigo 10.º da petição inicial; impugnado pela ED no artigo 3.º da sua contestação”.
L. Tal decisão é contraditória com a motivação expendida na sentença recorrida, relativamente a este ponto: “Saliente-se aqui, a propósito do facto descrito em 2), que o que resulta provado nos autos, na decorrência dos esclarecimentos prestados pelo júri no procedimento é que “2 – Os equipamentos a solicitar, serão essencialmente no início do contrato, sendo que apenas pontualmente e em algum caso excecional, poderão ser solicitados equipamentos posteriormente”, mas do qual não é possível inferir sobre a efetivação da “maior parte” ou “totalidade” das quantidades previstas para o fornecimento”.
M. De facto, não se compreende como o Tribunal tenha lido e citado o esclarecimento do júri de que os equipamentos a solicitar só o seriam “posteriormente” ao início do contrato “apenas pontualmente e em algum caso excecional”, para depois concluir que não é “não é possível inferir sobre a efetivação da “maior parte” ou “totalidade” das quantidades previstas para o fornecimento”, sobretudo porque deu como provado, na alínea E) da matéria de facto dada como provada que “consta do Anexo A do Convite…” as estimativas de fornecimento de cerca de dois mil [!!!] equipamentos.
N. Pelo que, face à prova produzida e ao que estava estabelecido no art.º 16.º, n.º 6, do Caderno de Encargos do Acordo Quadro e na Cláusula 9.ª, n.º 4, do Caderno de Encargos, o Tribunal a quo teria de ter dado como provado que os equipamentos a fornecer ao abrigo do contrato, estimados 2.341 seriam fornecidos logo no início do contrato, salvo casos pontuais e excepcionais:
O. Assim, da conjugação dos factos provados nas alíneas C) e E) da matéria de facto, com os esclarecimentos prestados pelo júri e na Cláusula 9.ª, n.º 4, do Caderno de Encargos, deverá ser modificada a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, no sentido de dar como provado que:
[NOVO PONTO DA MATÉRIA DE FACTO]: O Convite à apresentação de propostas previa que o adjudicatário fornecesse 2.241 (dois mil trezentos e quarenta e um) equipamentos, que deveriam ser entregues logo no início do contrato, salvo em casos pontuais e excecionais, sendo que, por tais fornecimentos, a entidade adjudicante ficaria obrigada a pagar os consumos mínimos previstos na proposta.
P. Na sentença recorrida, mais uma vez motivada pela impugnação genérica, constante do artigo 3.º da contestação, deu-se também como não provado que “3) – Tendo em conta as quantidades de consumos estimadas e que serviram de critério a este procedimento, e as quantidades de equipamentos a fornecer com o consumo mínimo associado, o valor global a pagar no final do Contrato corresponderá ao valor de ambas as rubricas: tarifário e equipamentos/consumo mínimo - facto invocado no artigo 11.º da petição inicial; impugnado pela ED no artigo 3.º da sua contestação”.
Q. Todavia, este facto resulta também inevitavelmente da restante matéria de facto dada como provada, pelo que não podia esta matéria ser dada como não provada.
R. Com efeito, se ficou patente nas peças do procedimento acima referidas que a adjudicatária teria de fornecer equipamentos, que ficariam sujeitos ao pagamento de um consumo mínimo, e que, excedido esse consumo mínimo haverá sempre de pagar o preço fixado no tarifário, é de meridiana conclusão que os montantes que serão gastos, a final, pela entidade adjudicante serão calculados pela conjugação do preço do tarifário com os valores de consumos mínimos.
S. Mais: a cláusula 10.ª, n.º 2, do Convite (e 4.ª, n.º 2, do Caderno de Encargos) – referida no facto provado E) – estabelece que “o preço total proposto resulta do somatório obtido entre o montante total proposto para o ‘Tarifário Proposto’ (TP) e o valor total proposto para o ‘Consumo mínimo associado à disponibilização de terminais (CM)”.
T. Pelo que a decisão sobre a matéria de facto deverá também ser alterada, aditando-se à matéria de facto provada o facto não provado 3), com base nos meios probatórios acima referidos e em conjugação com o facto provado E).
III – OS ERROS DE JULGAMENTO DA SENTENÇA RECORRIDA
U. O cerne da questão decidenda consiste em saber se a Entidade Adjudicante usou legitimamente, ou não, dos seus poderes discricionários na determinação de critérios de adjudicação, no caso no que respeita ao peso de ponderação dos coeficientes relativos à avaliação do “tarifário” (que valeria 70%) e aos consumos mínimos decorrentes da substituição de terminais (que valeria 25%).
V. A sentença recorrida enferma de diversos erros de julgamento, por aplicando erradamente uma série de normas jurídicas.
W. A sentença recorrida erradamente julgou improcedente a acção, por entender que a Entidade Adjudicante se louvou “num discurso que se mostra plausível”, por os critérios definidos terem-no sido “de forma a garantir a escolha da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante, tendo em consideração que o contrato visa essencialmente a prestação de serviços de telecomunicações. Considerou-se que a pontuação do tarifário/comunicações deveria ter um peso preponderante (70%) sobre os outros fatores (25% consumo mínimo + 5% garantia = 30%), uma vez que o cerne do contrato são comunicações”.
X. Acrescentou-se ainda, citando palavras do Relatório Final, “‘Com a ponderação de 25% do consumo mínimo pretendeu-se que os concorrentes não optassem por consumos mínimos mais elevados. O consumo mínimo apenas se aplica nos caos em que forem disponibilizados pelo adjudicatário terminais móveis, caso contrário apenas se aplica o preço das comunicações”.
Y. Conclui, por isso, o Tribunal a quo: “Assim, tendo presente a discricionariedade regulamentar conferida pelo CCP nesta matéria, olhando para o cerne do objeto do contrato, articulando com as regras do referido Acordo Quadro e concatenando com as exigências de execução do contrato definidas no CE deste procedimento pré-contratual impostas ao prestador de serviços, não se vislumbra ocorrer, no caso, a tal «falta de racionalidade» ou a dita escolha por uma «solução irrazoável» que a Autora aponta à opção tomada quanto ao peso relativo atribuído a cada um fatores de avaliação em crise, não sendo tal ponderação arbitrária ou desadequada, tendo em vista a finalidade do procedimento e a prossecução do interesse público”.
Z. É que se é certo que não cabe aos Tribunais sindicar o exercício da margem de livre apreciação da administração, na vertente da discricionariedade técnica, não é menos certo que têm o grave dever de sindicar a conformidade desse exercício com os princípios que regem a actividade administrativa, precisamente em âmbitos que extrapolam o da legalidade estrita, sob pena de comprometer a salvaguarda do Estado de Direito.
AA. Ora, basta ler com um mínimo de atenção as passagens do Relatório Final e da sentença recorrida acima aludidas para se surpreender o arbítrio e a irrazoabilidade kafkiana das decisões – administrativas e judicial – aqui em questão.
BB. É que sendo indiscutível que o “cerne” do contrato são serviços de telecomunicações, é inegável que não podemos afastar desse “cerne” a própria existência e operacionalidade de equipamentos de suporte – os terminais –, sem os quais não é possível telecomunicar.
CC. Por outro lado, se a razão que justifica um maior peso de ponderação no valor dos tarifários é o facto de o “cerne” do contrato ser os serviços de telecomunicações, então não faz qualquer sentido que a entidade adjudicante pague mais pelos equipamentos do que pelas telecomunicações em si, que é o que acontecerá, caso esse Venerando Tribunal ad quem não revogar a sentença recorrida.
DD. Ora, o resultado da aplicação do critério definido foi precisamente o contrário daquilo que se pretendia e que supostamente justificava aquela escolha: os concorrentes (N… e M…) que apresentaram preços mais baixos no tarifário tiveram de se compensar, optando por consumos mínimos exorbitantes, mais de 16 vezes mais caros do que o concorrente (V...) que ofereceu consumos mínimos mais modestos – que era afinal o que se pretendia!
EE. Portanto, daqui se vê o quão irrazoável, irracional e desadequado é o critério que determinou a adjudicação à proposta da N…: esse critério conduziu à escolha de uma proposta que o próprio júri confessou querer evitar, que era o de “consumos mínimos mais elevados”!
FF. Tal irrazoabilidade e irracionalidade resultaram ainda num acto de adjudicação que preteriu a proposta manifestamente mais barata, que era a da V... – metade do preço da proposta vencedora, como se pode verificar:
V... Preço Total Proposto de €233 861,24;
N… Preço Total Proposto de €458 684,78;
GG. Deste modo, o Tribunal a quo deveria ter anulado o acto de adjudicação impugnado e, bem assim, todo o procedimento por ilegalidade congénita, por violação do princípio geral da boa administração, consagrado no art.º 5.º do CPA.
HH. O gasto público tem de ser justificável e justificado, o que não acontece no presente caso, sendo muito provável que o contrato não sobreviverá a controlos financeiros a que venha a estar sujeito e aos quais inexoravelmente se virá a recorrer caso se mantenha a decisão impugnada.
II. Compulsadas as propostas em todos os seus termos e atributos, não se vê que as pontuações finais atribuídas reflictam o que a Entidade Adjudicante pretendia alcançar através deste procedimento, sendo insofismável que se vê absolutamente defraudado o propósito deste procedimento de contratação.
JJ. Lembre-se que dizer que o critério de adjudicação é, apenas, o da proposta economicamente mais vantajosa quer hoje dizer pouco, pois os dois tipos de critérios possíveis são ambos o da proposta economicamente mais vantajosa, seja no caso em que o critério de avaliação se limite à comparação do preço oferecido, ganhando o que propuser o preço mais baixo, seja quando esteja em causa uma avaliação da melhor relação qualidade-preço.
KK. Neste caso, atendendo a que se fixam 3 factores de avaliação, sendo que um deles não tinha que ver com o preço, pareceria, à primeira vista, que se teria optado pelo critério de adjudicação previsto no art.º 74.º, n.º 1, alínea a), do CCP, ou seja, aquele que atende à “melhor relação qualidade-preço, na qual o critério de adjudicação é composto por um conjunto de fatores, e eventuais subfactores, relacionados com diversos aspetos da execução do contrato a celebrar”.
LL. Todavia, se bem se olhar ao que realmente importa à Entidade Adjudicante avaliar, verifica-se que o preço dos serviços a contratar absorvem praticamente toda a ponderação: 95%.
MM. Nesse sentido, parece insofismável que se tenha de concluir que o que realmente importa à Entidade Adjudicante aferir se limita ao preço de cada proposta, e à comparação deste preço dentre as várias que foram apresentadas.
NN. Acresce que para aferir o real preço de cada proposta, tanto concorre o tarifário proposto como o consumo mínimo a facturar no caso de virem a ser fornecidos os equipamentos/terminais necessários para as comunicações de voz e dados.
OO. E caso se venha a consumir todas as quantidades previstas, seja nos tarifários propriamente ditos, seja nos equipamentos a fornecer, então não se compreende a razão pela qual se fez uma distinção de ponderação na avaliação destes dois factores, pelo menos com uma margem tão distanciada.
PP. Pelo que os critérios determinados para a apreciação da proposta violam o disposto no art.º 74.º, n.º 1, al. a), do CCP, pelo que, mais uma vez errou o Tribunal a quo ao não ter anulado o acto de adjudicação, bem como de todo o procedimento por ilegalidade congénita, como o determina aquela disposição legal.
QQ. Neste contexto, saliente-se também que carece de qualquer sentido o contra-argumento, aventado a dada altura pela N…, na sua contestação, e subliminarmente acolhido na sentença recorrida, de que os dois preços – de tarifário e de consumo mínimo – não se somam porque se consomem mutuamente – na medida em que dentro dos consumos mínimos serão imputados os valores de tarifário que sejam de facto consumidos pelas entidades do Ministério da Justiça.
RR. É que, bem feitas as contas, esse efeito o que faz é encarecer o preço médio das telecomunicações a cobrar pela N… que, no cômputo geral, ficarão muitíssimo mais caras do que o que está previsto no seu supostamente módico tarifário.
SS. Com efeito, o custo efectivo das telecomunicações, de acordo com a proposta da N… que recebeu a adjudicação aqui impugnada, não será o que resulta da aplicação do tarifário, mas quociente das quantidades de comunicações que venham a ser efectivamente utilizadas pelo Ministério da Justiça pelos custos com consumos mínimos a suportar.
TT. Além disso, está provado que, pelo menos os equipamentos vão ser necessários, e, portanto, o respectivo consumo mínimo vai ser gasto quase desde o princípio do Contrato.
UU. Pelo que a distribuição do peso dos factores de avaliação que se encontra no Convite, como aliás se veio a verificar nos resultados obtidos, radica num lapso manifesto que urge corrigir.
VV. Ora, ainda que se saiba que a definição do critério de adjudicação cabe nos poderes discricionários da Entidade Adjudicante, é evidente que tal poder, como é regra geral de Direito Administrativo, não pode resultar numa arbitrariedade ou na definição de uma solução irrazoável.
WW. Assim, cumpre aferir qual era a intenção da Entidade Adjudicante neste procedimento, o que facilmente se retira pelos fatores de avaliação fixados no Convite como já acima demonstrado: o da proposta economicamente mais vantajosa focando-se nitidamente no menor preço a pagar pelas prestações em concurso.
XX. Aliás, vistas as coisas com o rigor exigível, acaba por ter de se concluir que foi estabelecido um critério de adjudicação – por força do peso dado aos dois primeiros factores de avaliação – que impede a correcta e verdadeira comparação das propostas, o que é bem demonstrativo do lapso cometido.
YY. Com efeito, pode-se afirmar que a forma como foi fixado o critério de adjudicação face aos dois primeiros factores de avaliação, não permite que as propostas sejam avaliadas por um padrão comum, que permita a sua real e objectiva comparação, o que acaba por subverter o princípio da concorrência e, neste caso, a prossecução do interesse público financeiro em causa.
ZZ. De facto, face à forma como foi fixado o critério de adjudicação, há duas propostas que podem ser consideradas as economicamente mais vantajosas, dependendo, contudo, do que venha a suceder em sede de execução do contrato.
AAA. Se a Entidade Adjudicante acabar por não adquirir novos terminais, será a da N….
BBB. Mas se a Entidade Adjudicante adquirir novos terminais, como pretende de acordo com as peças do procedimento – caso contrário não se vislumbra a razão de ali terem sido consideradas aquelas quantidades, e sabemos já que eles são realmente necessários -, a proposta economicamente mais vantajosa é, de longe, a da V....
CCC. O que significa que, apesar das necessidades da Entidade Adjudicante, expressas nas peças do Concurso, a N… só poderá ser considerada como adjudicatária se, afinal, não forem fornecidos novos terminais, pois se o forem o contrato é financeiramente ruinoso.
DDD. E assim oblitera-se uma parte fundamental do Contrato, pois neste não apenas se pretende contratar comunicações, mas igualmente adquirir os respectivos terminais – necessários para que possa haver comunicações.
EEE. A exposta factualidade demonstra que o presente modelo de avaliação desvalorizou, ainda que inadvertidamente, a economia de custos como objectivo principal a atingir, frustrando-se, pois, o que nos parece ser o verdadeiro objectivo deste procedimento: o de conseguir a proposta mais barata para a obtenção das prestações e equipamentos a adquirir.
FFF. A proposta adjudicada constitui praticamente o dobro da que foi oferecida pela V..., frustrando em absoluto um dos objectivos primaciais – se não mesmo o mais importante - posto que, como demonstrado, o que realmente importa apurar é o preço -, que é, no fundo, o “objetivo primário ou inicial da regulamentação da contratação pública: a racionalidade económica”.
GGG. Como sabemos, os modelos de avaliação das propostas deverão constituir não só meios de estimulação do funcionamento da concorrência, como também, e, naturalmente, vias de encontro de escolhas assentes em critérios de economicidade e de boa gestão.
HHH. A Entidade Adjudicante quando define um modelo de avaliação das propostas descrevendo a forma como serão avaliados os vários aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência, não pode deixar de o fazer com e respeitando o objetivo de escolher a proposta que lhe seja economicamente mais vantajosa.
III. E assim, só assim, se satisfazem as necessidades directas da Entidade Adjduciante – um plano de tarifários competitivo e o fornecimento dos respectivos terminais a bom preço -, como se vai ao encontro das políticas governativas de contenção orçamental e de diminuição da despesa pública que, ainda mais no grave momento que atravessamos e que se vai agudizar, urge promover.
JJJ. É o que resulta do disposto nos artigos 42.º, n.ºs 3 e 4, 74.º, 75.º, 132.º, n.º 1, alínea n), e 139.º, todos do CCP, que acabam por ser, admitimos que inadvertidamente, violados no procedimento em apreço.
KKK. O modelo em causa violou, pois, o estabelecido no artigo 74.º do CCP que protege o interesse financeiro de escolha das propostas que melhor e mais económica e eficientemente se ajustam às necessidades públicas, dessa forma acautelando a adequada utilização da despesa pública.
LLL. Deste modo, a proposta adjudicada, por força da aplicação de um critério de adjudicação que se revela errado, não se afigura como a proposta economicamente mais vantajosa, pelo errou o Tribunal a quo, ao não a ter revogado e anulado todo o procedimento, em cumprimento do princípio da prossecução do interesse público.
MMM. Mais se deve condenar o Ministério da Justiça a lançar novo procedimento sem que incorra na mesma ilegalidade, devendo fixar um critério de adjudicação que atenda às reais necessidades e respectivos custos, de forma a que a proposta a adjudicar seja, efectivamente, a economicamente mais vantajosa.”
O Ministério da Justiça apresentou contra-alegações, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“(…)
A. A modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 74.º do CCP, na qual o critério de adjudicação é composto por um conjunto de fatores e eventuais subfactores, relacionados com os diversos aspetos da execução do contrato a celebrar, nos termos especificados no artigo 75.º do CCP, como é o caso do procedimento nos presentes autos, pode conduzir a um resultado em que a proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante não é a que tem um preço mais baixo, nem tão pouco um custo mais baixo, mas aquela que, na conjugação de vários fatores de avaliação, apresenta um melhor resultado global;
B. Ou seja, nas situações em que é definido o critério da proposta economicamente mais vantajosa, na modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 74.º do CCP, há uma opção da entidade adjudicante que não implica necessariamente a escolha da proposta com o mais baixo preço, como, neste caso, pretende fazer crer a Recorrente;
C. Tendo presente o critério de adjudicação fixado, a larga margem de discricionariedade de que goza a Administração, quer na enunciação e ordenação dos fatores e subfactores de avaliação das propostas quer na ponderação que lhes é atribuída, só poderá considerar-se que não assiste qualquer razão à Recorrente quando alega que o critério de adjudicação é errado por força do peso dado aos dois primeiros fatores e que o modelo de avaliação das propostas é inadequado à escolha da proposta economicamente mais vantajosa, uma vez que a proposta que figura em primeiro lugar, independentemente de ter um preço superior ao da Recorrente, é aquela que, em função do objeto do contrato a celebrar e em face da aplicação do critério de adjudicação, melhor acautela os interesses que a entidade adjudicante pretendeu salvaguardar;
D. O critério de adjudicação foi claramente divulgado nas peças do procedimento e no ficheiro proposta, permitindo aos concorrentes não só verificar a pontuação final da sua proposta, como também ajustá-la aos interesses da entidade acordo com as exigências legais impostas pelo CCP, pelo que nenhuma ilegalidade lhe pode ser assacada, como bem se decidiu na sentença recorrida que passamos a citar:
E. No caso, a definição do critério de adjudicação, mormente no que toca ao peso atribuído aos coeficientes de ponderação relativos aos fatores de avaliação «tarifário» - 70% - e «consumo mínimo terminais A e B» - 25%, não evidencia a existência de desconformidade no tocante aos seus pressupostos, nem entre o conteúdo e o fim que o mesmo visa no concernente à enunciação e ordenação dos fatores e subfactores que irão determinar a proposta economicamente mais vantajosa, e respetiva ponderação, ou seja, dito de outro modo, a opção tomada no procedimento quanto ao peso/ponderação atribuído aos fatores de avaliação não se mostra eivada de desvio de poder, nem se mostra arbitrária ou manifestamente desajustada à prossecução do interesse público;
F. E em juízo de sindicabilidade, diga-se, o Tribunal não é admitido a avançar para além deste juízo sobre a conformação da legalidade da definição do critério de adjudicação e do modelo de avaliação das propostas, pois que o juiz não pode substituir-se à Administração para julgar da racionalidade das valorações teleológicas efetuadas no quadro da prossecução do interesse público, a não ser através de um juízo negativo de proporcionalidade (…);
G. Assim, tendo presente a discricionariedade regulamentar conferida pelo CCP nesta matéria, olhando para o cerne do objeto do contrato, articulando com as regras do referido Acordo Quadro e concatenando com as exigências de execução do contrato definidas no CE deste procedimento pré-contratual impostas ao prestador de serviços, não se vislumbra ocorrer, no caso, a tal «falta de racionalidade» ou a dita escolha por uma «solução irrazoável» que a Autora aponta à opção tomada quanto ao peso relativo atribuído a cada um fatores de avaliação em crise, não sendo tal ponderação arbitrária ou desadequada, tendo em vista a finalidade do procedimento e a prossecução do interesse público;
H. (…) «O conceito interesse público é fortemente eivado pela indeterminabilidade, por isso se cometendo à Administração uma ampla margem de livre apreciação quanto à sua densificação podendo, conforme ensinam Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos, “Direito Administrativo Geral”, vol. I, 3ª ed., Lisboa, 2008, página 209, um ato ser judicialmente anulado por ele definir um interesse público ilegal, obviamente por referência aos seus momentos vinculados e a princípios legais e/ou constitucionais, mas já não o podendo ser por o tribunal entender que ele não prossegue da melhor maneira o interesse público»;
I. O argumento esgrimido pela Autora no sentido de que a proposta que surge classificada em 1.º lugar (a da N…) custa praticamente o dobro da proposta classificada em 3.º lugar (a da V...), sem qualquer razão que o justifique, com a intenção de demonstrar que a solução adotada pela Entidade Adjudicante é, nas suas palavras, irrazoável, na verdade, não tem razão de ser e não belisca as conclusões acima alcançadas;
J. (…) o que foi submetido à concorrência, e que, portanto, constitui(em) atributo(s) da proposta (sujeito(s), portanto, a avaliação em sede de critério de adjudicação), não foi o preço total proposto para a execução do contrato, enquanto resultado da soma do (fator) preço/custo do tarifário proposto com o (fator) preço/custo do consumo mínimo proposto, mas sim, por um lado, o preço/custo do tarifário proposto, com uma ponderação de 70%, e, por outro lado, o preço/custo do consumo mínimo proposto, com uma ponderação de 25%;
K. O que é bem diferente do que a Autora sugere ao longo de toda a petição inicial, quando coloca a tónica de que a sua proposta é aquela que, globalmente considerada, «melhor satisfaz o interesse público financeiro», quando se é certo que é aquela que oferece o melhor preço/custo no fator «CM Consumo mínimo terminais A e B», já não o oferece no fator «TP pontuação do tarifário proposto», que é o fator preponderante; (…)
L. A decisão de adjudicação posta em crise nestes autos é, pois, para manter. De resto, não se vislumbra em que medida é que, seguindo a perspetiva da Autora, o critério de adjudicação “por força do peso dado aos dois primeiros fatores de avaliação (…) impede a correta e verdadeira comparação das propostas; (…)
M. Nesta conformidade, não se verificando as ilegalidades apontadas pela Autora ao critério de adjudicação definido no Convite e, bem assim, ao ato de adjudicação impugnado, a presente ação terá de improceder totalmente;
N. E quanto ao pedido formulado pela Recorrente, no sentido de a Entidade Recorrida ser condenada a abrir novo procedimento sem incorrer na mesma ilegalidade por forma a que nele seja escolhida a proposta economicamente mais vantajosa, reitera-se o decidido na sentença em recurso, ou seja, “(…) que de uma eventual sentença anulatória (…) emergiria, quando muito, apenas um dever de reconstituir o próprio procedimento, expurgando-o das ilegalidades detetadas. Isto porque a decisão de abertura, ou não, de um novo procedimento é sempre uma decisão discricionária da entidade adjudicante, não podendo resultar dos efeitos de uma eventual sentença anulatória qualquer dever jurídico com tal conteúdo. Pelo que este pedido, em qualquer caso, não poderia proceder”;
O. Pelas razões expostas nos n.ºs. 44 a 46 desta peça, entende o Recorrido que deverão manter-se como não provados os factos 1), 2) e 3) constantes da sentença em recurso;
P. Face ao exposto e nomeadamente à argumentação expendida na sentença recorrida, constata-se que esta não incorreu em qualquer erro de julgamento, conforme pretende fazer crer a Recorrente, muito pelo contrário, fez uma correta aplicação do quadro legal aplicável e está bem fundamentada, não merecendo, por isso, ser revogada.”
A contrainteressada N..., S.A., apresentou as suas contra-alegações, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“(…)
A. No âmbito do presente recurso, a Recorrente pede a revogação da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, alegando que ato de adjudicação deve ser anulado com o único (pretenso) fundamento de que o mesmo é ilegal por redundar “num negócio absolutamente prejudicial para o Ministério da Justiça e, com isso, para o interesse público”.
B. Por outras palavras, o presente Recurso assenta exclusivamente no pressuposto, que não procede juridicamente, de que a melhor proposta tem de ser, sempre e necessariamente, a proposta com o mais baixo preço.
C. Em causa não está – nem a Recorrente sequer o alega –, a prática de um ato ilegal ou sequer motivado por qualquer erro na aplicação do critério de adjudicação ou, no limite, por qualquer ilegalidade na formulação do modelo de avaliação.
D. A Recorrente não coloca em causa que a sua proposta tenha ficado graduada em último lugar, nem coloca em causa a graduação das demais propostas.
E. A Recorrente reconhece expressamente que, à luz do modelo de avaliação adotado, a proposta da N… sempre ficaria em 1.º lugar.
F. Assim, em rigor, está apenas em causa saber se a opção, legítima, da Entidade Adjudicante quanto à definição do modelo de avaliação das propostas é, ou não, aquela que a Recorrente teria adotado.
G. Mas não é só: por um lado, afigura-se evidente que a Recorrente não compreendeu o modelo de avaliação; por outro, não é sequer verdade que a proposta da Recorrente fosse a mais vantajosa para o “erário público”, o que também evidencia que a mesma não compreendeu a correlação existente entre os preços apresentados pelos concorrentes.
H. Em primeiro lugar, a Entidade Adjudicante limitou-se, e bem, a definir o modelo de avaliação das propostas em conformidade com o objeto do contrato: “prestação de serviços de comunicações móveis de voz e dados”, evitando que os concorrentes privilegiassem os consumos mínimos móveis em detrimento do preço das comunicações.
I. No cômputo do cálculo da pontuação final, cada um dos respetivos fatores (“Tarifário Proposto” e “Consumos mínimos”) traduzia uma importância de 70% e 25%, respetivamente.
J. Pelo que, a diferença de pontuação entre as propostas da N… e a da Recorrente deve-se precisamente ao facto de a primeira ter privilegiado a apresentação de preços competitivos no fator “Tarifário Proposto”, enquanto a segunda (a Recorrente) optou por privilegiar a apresentação de preços mais competitivos no fator “Consumos mínimos”.
K. Insiste-se, no que se refere ao Fator “Tarifário Proposto” (que é o fator que a Entidade Adjudicante privilegiou no critério de adjudicação adotado), a proposta de preço da N… é 189% inferior ao preço da proposta da Recorrente.
L. Se a Recorrente concorda, ou não, com a opção (legítima) da SGMJ quanto à distribuição deste “peso relativo” a cada um dos fatores é, uma vez mais, uma questão juridicamente irrelevante, resultando, de resto, do exercício de um poder discricionário próprio e no contexto da própria gestão daquela.
M. Em segundo lugar, toda a tese da Recorrente assenta numa premissa que nem sequer existe: os preços dos contratos não correspondem ao somatórios dos preços apresentados para cada um dos fatores de avaliação.
N. Ao contrário do que a Recorrente pretende sustentar, os preços apresentados em cada um desses fatores não se “somam”, dando lugar ao “preço contratual global” da proposta. Ou seja, os aludidos valores concorrem entre si e excluem-se mutuamente.
O. Assim, quanto maior for o valor associado à disponibilização de equipamentos, menos comunicações adicionais terá de haver; por sua vez, quanto menor for o consumo mínimo, mais comunicações adicionais serão faturadas.
P. Logo, quando a Recorrente optou por apresentar preços unitários superiores e consumos mínimos inferiores, o que faria com que, automaticamente, as comunicações abrangidas pelos consumos mínimos fossem ínfimas, passando-se à aplicação dos preços de tarifário quase de imediato (cujos preços unitários são superiores), demonstrou que a sua proposta não conduz, em termos reais, a uma “melhor salvaguarda do erário público”.
Q. A N…, por sua vez, optou por apresentar um tarifário com valores muito inferiores que compensarão, na prática, a apresentação de preços superiores associados aos consumos mínimos, já que se permite que mais comunicações estejam abrangidas pelos consumos mínimos propostos, não sendo o valor superior destes fonte de prejuízo para as entidades abrangidas pelo presente procedimento.
R. As opções em termos de racional financeiro são efetivamente distintas, do que resultou, em face das ponderações aplicáveis em causa, e dos preços unitários propostos, ter sido a proposta da N… a proposta economicamente mais vantajosa.
S. A terminar, é por demais evidente que a SGMJ sabia perfeitamente qual o critério de avaliação que pretendia fixar, assim como sabia não pretender privilegiar indistintamente o fator “preço global da proposta”; caso contrário o critério de avaliação adotado teria sido, sem necessidade de mais, o do “mais baixo preço”.
T. Na verdade, compreende-se perfeitamente a intenção da SGMJ ao construir o modelo de avaliação: privilegiar o mais baixo preço da principal componente (e com mais expressão) do objeto do contrato.
U. Decisão que, a par de legítima, válida e legal, se encontra perfeitamente compreendida dentro dos poderes atribuídos por lei às entidades adjudicantes. Conforme, aliás, resulta da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo citada pela N… (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12.04.2012, proferido no âmbito do Proc. n. º 0857/12).
V. Considerando o exposto, assim como a argumentação expendida na Sentença recorrida, verifica-se que esta não incorreu em qualquer erro de julgamento, nos termos alegados pela Recorrente. Em sentido precisamente contrário, subsumiu corretamente o quadro legal aplicável à questão objeto da decisão, não devendo, por essa razão, merecer qualquer reparo.”
Perante as conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir:
- do erro de julgamento de facto;
- do erro de julgamento de direito, ao considerar-se que a entidade adjudicante usou legitimamente dos seus poderes discricionários na determinação de critérios de adjudicação, no caso no que respeita ao peso de ponderação dos coeficientes relativos à avaliação do “tarifário” (que valeria 70%) e aos consumos mínimos decorrentes da substituição de terminais (que valeria 25%).

Dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.
*
II. FUNDAMENTOS
II.1 DECISÃO DE FACTO
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
A) – Por despacho de 07-08-2020, o Secretário de Estado Adjunto e da Justiça “nos termos e com os fundamentos da Informação n.º UCMJ/2020/320, de 10/07/2020, da Unidade de Compras do Ministério da Justiça, proferida no âmbito do procedimento de aquisição de serviços móveis de voz e dados”, autorizou, entre o mais, a abertura de um procedimento para celebração de contratos ao abrigo de acordo quadro, previsto no artigo 259.º do CCP, para a aquisição dos serviços móveis de voz e dados, aprovou as respetivas peças do procedimento, e determinou que fossem convidados a apresentar proposta os cocontratantes do referido acordo quadro que reúnam as condições necessárias para a execução do objeto do contrato a celebrar - cf. PA apenso, inserto a fls. 216-221 dos autos;
B) - Consta do Caderno de Encargos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, que o objeto do contrato a celebrar na decorrência do procedimento identificado em A), consiste na «prestação de serviços de comunicações móveis de voz e dados, para os vários organismos do Ministério da Justiça e entidades voluntárias identificadas no Anexo A» do Convite - cf. Caderno de Encargos constante do PA apenso, inserto a fls. 235 e ss. dos autos;
C) - Consta ainda do Caderno de Encargos, designadamente, o seguinte:
“(…)
Cláusula 2.ª – Prazo de vigência do contrato
1. Os contratos de prestação de serviços celebrados ao abrigo do presente procedimento terão uma duração máxima de 36 meses, com exceção do contrato a celebrar pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA), cuja duração será de 24 meses.
(…)
Cláusula 4.ª – Preço base
1. Os preços base unitários definidos por classe de tráfego encontram-se mencionados no Anexo B ao Convite.
2. O preço total proposto resulta do somatório obtido entre o montante total proposto para o “Tarifário proposto” (TP) e o valor total proposto para o “Consumo mínimo associado à disponibilização de terminais” (CM).
(…)
Cláusula 9.ª - Requisitos e especificações da prestação de serviços
1. O prestador de serviços deve cumprir os requisitos funcionais e técnicos mínimos definidos na Lei das Comunicações eletrónicas (Lei n.° 5/2004, de 10 de fevereiro, na sua redação atual) e demais legislação aplicável.
2. O prestador de serviços não pode, em caso algum, estabelecer o pagamento de componentes fixas, designadamente a título de assinaturas, para qualquer dos serviços a prestar, exceto consumos mínimos referido no número 4.
3. A tarifação do trafego de Voz “intra-conta” (Origem Rede Móvel - Terminação Rede Móvel) e no tráfego SMS e MMS “intra-conta” (Origem Rede Móvel - Terminação Rede Móvel) é de 0,00€
4. Os equipamentos necessários para usufruir do serviço contratado (terminais do Tipo A e do Tipo B) devem ser disponibilizados às entidades adquirentes sem qualquer custo, à exceção dos consumos mínimos mensais da proposta adjudicada.
5. Os consumos mínimos mensais associados à disponibilização dos equipamentos terminais tipo A e B, diluem-se nas comunicações efetuadas.
6. O prestador de serviços obriga-se a cumprir os seguintes requisitos técnicos e funcionais mínimos:
a) Discriminar nos planos de preços as chamadas de voz efetuadas e recebidas, mensagens enviadas e recebidas e transmissão de dados por zonas geográficas;
b) Garantir a portabilidade de numeração para todos os serviços existentes no universo das entidades adquirentes que o solicitem sem qualquer custo;
c) Garantir o transporte das classes de tráfego definidas;
d) Garantir o acesso aos serviços discriminados.
e) Faturação ao segundo a partir do 30.° segundo no que diz respeito ao serviço Móvel de Voz;
f) Unidade de faturação de dados: 10 KB;
g) Garantir a possibilidade de barramento de chamadas, sem qualquer custo, nos seguintes termos:
i) Aos números (cartões) ativos definidos pela entidade adquirente, no caso em que esta tenha solicitado para os mesmos a disponibilização de equipamentos terminais;
ii) A um máximo de 30% da totalidade dos números (cartões) ativos, no caso em que para os mesmos não seja solicitada pela entidade adquirente a disponibilização de equipamentos terminais.
h) Garantir a possibilidade de a entidade adquirente estabelecer um valor máximo de comunicações a atribuir a cada utilizador;
i) Garantir a possibilidade de, por opção da entidade adquirente, após se ter atingido o valor máximo a que se refere a alínea anterior, os custos subsequentes serem suportados pelo utilizador, originando a emissão de uma fatura adicional em formato eletrónico;
j) As soluções devem fornecer funcionalidades de limitador ou avisador de que o valor máximo de comunicações estabelecido pela entidade adquirente está a ser atingido e de que já foi atingido ou ultrapassado;
k) Garantir que a gestão de plafonds seja efetuada com periodicidade mensal, trimestral, semestral ou anual;
l) Fornecer, caso solicitado pela entidade adquirente, terminais com as opções em termos de marcas e modelos para as seguintes tipologias:
i) Terminais tipo A: os terminais a disponibilizar a cada entidade adquirente devem possuir, no mínimo, as seguintes características:
(...)
ii) Terminais Tipo B: para além das características definidas para os terminais do tipo A os terminais do Tipo B, devem, ainda, possuir, no mínimo, as seguintes características:
(…)
n) Os equipamentos deverão possuir uma garantia mínima de 24 meses;
(…)
Cláusula 13.ª – Perfil de Consumo
O número de utilizadores identificados pelas entidades adquirentes, mencionados no Anexo A, bem como o volume de tráfego associado são meramente indicativas, podendo ser ajustadas de acordo com as necessidades das entidades adjudicantes, sem que isso implique alterações nas condições contratuais, nomeadamente nos preços unitários propostos por classe de tráfego.
- cf. Caderno de Encargos constante do PA apenso, inserto a fls. 235 e ss. dos autos;
D) - Do Convite referente ao procedimento mencionado em A) e, que aqui se dá por integralmente reproduzido, extrai-se, entre o mais, o seguinte:
“(…)
Cláusula 5.ª - Documentos da proposta
A proposta deverá ser constituída pelos seguintes documentos:
1. Declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante no Anexo I do Código dos Contratos Públicos, assinada eletronicamente pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
2. Ficheiro “Proposta”, devidamente preenchido, que se encontra disponível na plataforma eletrónica, assinado eletronicamente, no qual o concorrente deverá indicar os seguintes elementos:
a) Equipamentos Terminais Tipo A e Tipo B para os quais os concorrentes devem indicar duas opções para cada Tipo, marca e modelo do equipamento ;
b) Plano de preços a praticar no âmbito do contrato a apresentar por classe de tráfego;
c) Proposta de consumo mínimo associado à disponibilização de terminais por tipologia de equipamentos;
d) Garantia associada aos equipamentos Terminais do tipo A e Tipo B.
(...)
Cláusula 9.ª - Critério de adjudicação
1. A adjudicação será feita, por lote, segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa, tendo em conta os seguintes fatores, por ordem decrescente de importância:

PF- Pontuação Final
Ponderação
TP
Pontuação de tarifário proposto
70%
CM
Consumo Mínimo Terminais A e B
25%
G
Garantia
5%

2. A adjudicação será assim feita, por lote, à proposta que obtiver a maior pontuação final (PF), obtida do seguinte modo:
PF = TP X 0, 70 + CM X 0, 25 + G X 0, 05
Em que:
• PF: Pontuação Final a atribuir à proposta em análise em função dos fatores de avaliação definidos;
• TP: Pontuação a atribuir ao tarifário em análise no que se refere ao fator Preço, calculada de acordo com o estabelecido no n.°3;
• CM: Pontuação a atribuir ao consumo mínimo associado à disponibilização de terminais do tipo A e B conforme n.°4;
• G: Pontuação a atribuir aos meses de garantia dos equipamentos terminais A e B conforme n.°5
3. A avaliação do tarifário proposto (TP) será efetuada com o resultado da multiplicação dos tarifários propostos para cada posição pelos respetivos volumes de tráfego previstos.
A pontuação de cada proposta no fator (TP) será obtida do seguinte modo:
a) Se o Preço da Proposta for igual ou inferior a 0,05 X Preço Base:
PP = 100 pontos
b) Se o Preço da Proposta for superior a 0,05 X Preço Base:



Onde:
i. Preço Base: Preço base do Tarifário estabelecido pela entidade adjudicante, conforme cláusula 9.ª considerando no entanto o preço base unitário de cada posição, que não poderá ser ultrapassado;
ii. Preco da Proposta: Preço do Tarifário da proposta em análise, para o período de máximo de 36 meses, calculado através multiplicação do consumo estimado pelo preço proposto em cada posição.
L A avaliação do consumo mínimo associado à disponibilização de terminais (CM) será efetuada com base no consumo mínimo de referência (preço base unitário), atribuído a cada tipologia de terminais, com base nos consumos mínimos propostos pelo concorrente para cada tipologia.
A pontuação relativa ao consumo mínimo associado à disponibilização de terminais será obtida, por tipologia de equipamento, do seguinte modo:
a) Se o Preço CM for igual ou inferior a 0,05 X Preço Base:
CM = 50 pontos
b) Se o valor proposto for superior ao consumo mínimo associado à disponibilização de terminais definido por tipologia, a proposta é excluída;
c) Se o valor proposto for igual ou inferior ao consumo mínimo associado à disponibilização de terminais definido por tipologia, a fórmula para avaliação da pontuação, para cada Tipo de Terminal é a seguinte:

Em que:
i. CRi: Consumo mínimo de referência associado à disponibilização de terminais para os equipamentos do tipo i;
|ii. CPi: Consumo mínimo associado à disponibilização de terminais proposto pelo concorrente para os equipamentos do tipo i. iii. Sendo a soma da pontuação atribuída aos Terminais Tipo A e Tipo B, a pontuação final.
5. A avaliação do fator garantia (G) pontuará os meses de garantia dos equipamentos terminais. Se o concorrente apenas garantir os 2 anos obrigatórios por lei a pontuação será 0, caso a garantia seja igual ou superior a 3 anos terá 100 pontos.
6. Em caso de empate na pontuação final das propostas apresentadas:
a) Será adjudicada a proposta com maior pontuação no Tarifário Proposto;
b) Será adjudicada a proposta com maior pontuação no Consumo Mínimo associado à disponibilização de terminais;
c) Será adjudicada a proposta com maior pontuação no fator Garantia.
d) Subsistindo o empate será adjudicada a proposta que apresente menor preço nos subfactores P11 a P13; P117; P18; P19; P14 do Tarifário Proposto.
e) Se ainda assim subsistir o empate será utilizado o sorteio como forma de desempate.
Cláusula 10.ª - Preço base
1. Os preços base unitários definidos por classe de tráfego encontram-se mencionados no Anexo B.
2. O preço total proposto resulta do somatório obtido entre o montante total proposto para o “Tarifário proposto” (TP) e o valor total proposto para o “Consumo mínimo associado à disponibilização de terminais” (CM).
- cf. Convite constante do PA apenso, inserto a fls. 222 e ss. dos autos;
E) - Consta do Anexo A do Convite, designado por «— Entidades Adquirentes —», o seguinte:
Estimativa de equipamentos
Entidades AdquirentesEstimativa de valorTipo ATipo B
Gabinete da Ministra da Justiça
20 995,53 €
311
Gabinete do Secretário de Estado Adjunto e da Justiça
24 205,07 €
513
Gabinete da Secretária de Estado da Justiça
19 363,71 €
28
Secretaria-Geral do Ministério da Justiça
15 551,50 €
1223
Inspeção-Geral dos Serviços de Justiça
10 242,28 €
210
Direção-Geral da Política de Justiça
27 682,31 €
155
Direção-Geral da Administração da Justiça
130 204,76 €
17130
Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais
155 406,81 €
500100
Polícia Judiciária
288 000,00 €
800200
Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P.
72 749,69 €
13525
Instituto dos Registos e do Notariado, I.P.
55 492,14 €
090
Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, I.P.
13 278,98 €
335
Instituto Nacional da Propriedade Industrial, I.P.
33 137,87 €
018
Centro de Estudos Judiciários
1 615,35€
00
Supremo Tribunal de Justiça
14 850,65 €
1010
Supremo Tribunal Administrativo
6 766,68 €
196
Conselho Superior da Magistratura
19 604,70 €
105
Procuradoria-Geral da República
18 689,16 €
438
Tribunal da Relação de Évora
1 094,96 €
05

- cf. Convite constante do PA apenso, inserto a fls. 222 e ss. dos autos;
F) – Do Caderno de Encargos referente ao Acordo Quadro de serviço móvel terrestre, ao abrigo do qual a abertura do procedimento identificado em A) foi autorizada, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, extrai-se, designadamente, o seguinte:
“(...)
Artigo 16.º
Requisitos e especificações da prestação de serviços
1- O prestador de serviços deve cumprir os requisitos funcionais e técnicos mínimos definidos na Lei das Comunicações eletrónicas (Lei n.2 5/2004, de 10 de fevereiro) e demais legislação aplicável.
2- O prestador de serviços não pode, em caso algum, estabelecer o pagamento de componentes fixas, designadamente a título de assinaturas, para qualquer dos serviços a prestar.
3 - Atarifação no tráfego de Voz "intra-conta" (Origem Rede Móvel — Terminação Rede Móvel e Origem Rede Móvel — Terminação PPCA) e no tráfego SMS "intra-conta" (Origem Rede Móvel — Terminação Rede Móvel) é de 0,00€.
4- Para os lotes 1 e 3, os equipamentos necessários para usufruir do serviço contratado (terminais do Tipo A e do Tipo B) devem ser disponibilizados às entidades adquirentes sem qualquer custo, à exceção dos consumos mínimos mensais da proposta adjudicada.
5 - Os equipamentos a que se refere o número anterior devem ser solicitados e disponibilizados à entidade adquirente nos primeiros três meses de vigência do contrato de prestação de serviços.
(...)
Artigo 19.º
Critério de adjudicação nos procedimentos ao abrigo do acordo quadro
1 - Nos procedimentos ao abrigo do acordo quadro a adjudicação é feita ao nível do lote.
2 - As entidades adquirentes podem optar por um dos seguintes critérios de adjudicação:
a) O da proposta de mais baixo preço; ou
b) O da proposta economicamente mais vantajosa.
3 - Na avaliação do fator preço a entidade adquirente aplicará aos preços (Pll a P180) e aos valores para consumos mínimos (Cll a C32) ponderadores de acordo com os seus perfis de consumo.
4 - As entidades adquirentes devem prever critérios de desempate das propostas que possam estar relacionados com as ponderações atribuídas aos fatores que densificam o critério de adjudicação.
5- Para efeitos de análise das propostas, a entidade adquirente poderá solicitar aos concorrentes documentos comprovativos das especificações indicadas nas suas propostas.
- cf. Caderno de Encargos constante do PA apenso, inserto a fls. 248 e ss. dos autos;
G) - Em 13-08-2020, o procedimento identificado em A), que assumiu a designação de PAQ/01/2020/UCMJ – Aquisição de Serviços Móveis de Voz e Dados (AQ–SMT-2020 — ESPAP) foi lançado na respetiva plataforma de realização de procedimento, tendo sido dirigido Convite à Apresentação de Propostas às empresas N…, M… e V..., que haviam sido selecionadas como prestadoras dos serviços incluídos no Acordo-Quadro de Serviço Móvel Terrestre promovido pela ESPAP - ENTIDADE DE SERVIÇOS PARTILHADOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, I.P. - cf. PA apenso, inserto a fls. 273 e ss. dos autos;
H) – A N…, a M… e a V... solicitaram esclarecimentos às peças do procedimento, tendo, a 21-08-2020, o júri prestado os esclarecimentos solicitados, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, de que se extrai, entre o mais, em resposta à V..., que “a Cláusula 9.ª, Ponto 7 do Caderno de Encargos é retirada por impossibilidade de avaliação”; e, em resposta à N…, que “2 – Os equipamentos a solicitar, serão essencialmente no inicio do contrato, sendo que apenas pontualmente e em algum caso excecional, poderão ser solicitados equipamentos posteriormente” - cf. PA apenso, inserto a fls. 271 e ss. dos autos;
I) - Apresentaram proposta ao procedimento mencionado na alínea A) os concorrentes N…, M… e V..., cujos teores se dão por integralmente reproduzidos - cf. PA apenso, inserto a fls. 273 e ss. dos autos; quanto às propostas cf. fls. 350 e ss.;
J) – A Concorrente M… apresentou a seguinte proposta:

- cf. PA apenso, inserto a fls. 350-357 dos autos;
K) – A Concorrente N… apresentou a seguinte proposta:

- cf. PA apenso, inserto a fls. 358-365 dos autos;
L) – A Concorrente V... apresentou a seguinte proposta:

- cf. PA apenso, inserto a fls. 366-373 dos autos;
M) – Em 07-09-2020, o Júri elaborou o Relatório Preliminar de análise e de apreciação das propostas, no qual, após a aplicação do critério de adjudicação, as propostas ficaram pontuadas da seguinte forma:
Posição
Cocontratantes
PP
1
N..., S.A.
73,08
2
M…, S.A.
72,11
3
V..., S.A
68,66
- cf. PA apenso, inserto a fls. 273-274 dos autos;
N) – A ora Autora apresentou pronúncia escrita em sede de audiência dos interessados, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, na qual requereu “a anulação do presente procedimento, nos termos conjugados da citada alínea c) do n.º 1 do art.º 79.º e do n.º 1 do art.º 80.º, ambos do CCP, revogando-se a decisão de contratar tomada nos termos refletidos nas peças deste procedimento, sendo lançado um novo procedimento que não reincida no vício acima indicado ao critério de adjudicação” - cf. PA apenso, inserto a fls. 275 e ss. dos autos;
O) – Em 06-10-2020, a ora Autora apresentou impugnação administrativa dirigida ao Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, cujo teor se dá por integralmente reproduzido - cf. PA apenso, inserto a fls. 279 e ss. dos autos;
P) - Em 19-10-2020, o Secretário de Estado Adjunto e da Justiça decidiu não conceder provimento à referida impugnação administrativa, com base nos fundamentos constantes da Informação n.º I-SGMJ/2020/564, de 14/10/2020, da Secretaria-Geral do Ministério da Justiça, cujo teor se dá por integralmente reproduzido - cf. PA apenso, inserto a fls. 289-302 dos autos;
Q) – Em 20-10-2020, o Júri elaborou o Relatório Final, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, no qual apreciou a pronúncia escrita apresentada pela Autora e manteve a ordenação de propostas constante do Relatório Preliminar - cf. PA apenso, inserto a fls. 303-310 dos autos;
R) - Por despacho proferido pelo Secretário de Estado Adjunto e da Justiça de 20-10-2020, foi decidido adjudicar os serviços móveis de voz e dados à concorrente N… - cf. PA apenso, inserto a fls. 311 dos autos;
S) – Em 28-10-2020, a ora Autora apresentou impugnação administrativa, dirigida ao Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, contra o ato identificado na alínea antecedente, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, na qual pediu que “revogue a decisão de adjudicação tomada em favor da N… e, de seguida, promova a anulação do presente procedimento, nos termos conjugados da citada alínea c) do n.º 1 do art.º 79.º e do n.º 1 do art.º 80.º, ambos do CCP, revogando-se a decisão de contratar tomada nos termos refletidos nas peças deste procedimento, sendo lançado um novo procedimento que não reincida no vício acima indicado ao critério de adjudicação” - cf. PA apenso, inserto a fls. 321e ss. dos autos;
T) – Em 18-11-2020, o Secretário de Estado Adjunto e da Justiça decidiu não conceder provimento à referida impugnação administrativa, com base nos fundamentos constantes da Informação n.º I-SGMJ/2020/657, de 9/11/2020, da Secretaria-Geral do Ministério da Justiça, cujo teor se dá por integralmente reproduzido - cf. PA apenso, inserto a fls. 336-348 dos autos;
U) – Em 26-11-2020, foi celebrado entre a Direção-Geral da Administração da Justiça e a N… o instrumento designado por «Contrato Prestação de Serviços Móveis de Voz e Dados - PAQ/01/2020/UCMJ dezembro 2020 a novembro de 2023 (36 Meses)», cujo teor se dá por integralmente reproduzido – cf. PA apenso, inserto a fls. 374-381 dos autos;
V) – Em 03-12-2020, foi celebrado entre o Supremo Tribunal de Justiça e a N… o instrumento designado por «Contrato Prestação de Serviços Móveis de Voz e Dados - PAQ/01/2020/UCMJ», cujo teor se dá por integralmente reproduzido – cf. PA apenso, inserto a fls. 382-386 dos autos;
W) – Em 04-12-2020, foi celebrado entre o Estado, através de Instituto dos Registos e do Notariado, IP (IRN), e a N… o instrumento designado por «Contrato Prestação de Serviços Móveis de Voz e Dados - PAQ/01/2020/UCMJ», cujo teor se dá por integralmente reproduzido – cf. PA apenso, inserto a fls. 387-391 dos autos;
X) – A presente ação urgente de contencioso pré-contratual foi instaurada em 19-11-2020 - cf. fls. 1 e ss. dos autos”
Quanto a factos não provados, consta da decisão recorrida o seguinte:
“Com interesse para a decisão, não se provaram os seguintes factos:
1) – Os equipamentos/terminais em uso nos serviços abrangidos por este novo procedimento, fornecidos ao abrigo do procedimento anterior, pela sua antiguidade, carecem de ser substituídos posto que já têm 3 anos ou mais de vida, o que para este tipo de equipamentos é o limite - facto invocado no artigo 9.º da petição inicial; impugnado pela ED no artigo 3.º da sua contestação;
2) – A maior parte, se não a totalidade, das quantidades previstas para fornecimento de equipamentos será executada logo no princípio do Contrato, o que determinará que se venham a aplicar os referidos consumos mínimos - facto invocado no artigo 10.º da petição inicial; impugnado pela ED no artigo 3.º da sua contestação;
3) – Tendo em conta as quantidades de consumos estimadas e que serviram de critério a este procedimento, e as quantidades de equipamentos a fornecer com o consumo mínimo associado, o valor global a pagar no final do Contrato corresponderá ao valor de ambas as rubricas: tarifário e equipamentos/consumo mínimo - facto invocado no artigo 11.º da petição inicial; impugnado pela ED no artigo 3.º da sua contestação.”
*

II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Conforme supra enunciado, as questões a decidir cingem-se a saber se:
- ocorre erro de julgamento de facto;
- ocorre erro de julgamento de direito, ao considerar-se que a entidade adjudicante usou legitimamente dos seus poderes discricionários na determinação de critérios de adjudicação, no caso no que respeita ao peso de ponderação dos coeficientes relativos à avaliação do “tarifário” (que valeria 70%) e aos consumos mínimos decorrentes da substituição de terminais (que valeria 25%).


a) do erro de julgamento de facto

Sustenta nesta sede a recorrente que o Tribunal a quo errou na decisão da matéria de facto, ao dar como não provados os factos referidos em 1), 2) e 3) da matéria de facto, porquanto, em síntese:
- a entidade demandada não impugnou especificadamente tais factos;
- ademais, quanto ao facto não provado referido em 1), é facto público e notório que este tipo de equipamentos não dura muito mais do que 3 anos, sendo certo que tal decorre do caderno de encargos ao estabelecer como período de vigência do contrato 36 meses e ao reconhecer que um prazo de garantia superior a 24 meses é uma vantagem considerável;
- quanto ao facto não provado referido em 2), resulta da conjugação dos factos provados nas alíneas C) e E) da matéria de facto, com os esclarecimentos prestados pelo júri e na Cláusula 9.ª, n.º 4, do Caderno de Encargos;
- quanto ao facto não provado referido em 3), resulta das peças do procedimento que os montantes gastos, a final, serão calculados pela conjugação do preço do tarifário com os valores de consumos mínimos, assim como das cláusulas 10.ª, n.º 2, do convite, e 4.ª, n.º 2, do caderno de encargos.
Vejamos se assiste razão ao recorrente.
Dispõe como segue o artigo 640.º do CPC, sob a epígrafe ‘ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto’:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”.
Daqui decorre que, ao impugnar a matéria de facto em sede de recurso, recai sobre o recorrente o ónus de indicar (i) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e (ii) os concretos meios probatórios que impõem decisão distinta, mais devendo identificar precisa e separadamente os depoimentos caso se trate de meios probatórios gravados.
E cabe-lhe alegar o motivo pelo qual os meios probatórios que indica impõem decisão diversa e também porque motivo os meios probatórios tidos em conta pelo tribunal não permitem se considere provado determinado facto.
Há que ter ainda em consideração que é em função da definição do objeto do processo e das questões a resolver nos autos que deve ser apreciada a relevância da matéria fáctica alegada pelas partes. Assim, nem toda a matéria fáctica que se possa considerar provada deve ser levada, sem mais, ao probatório.
E como é consabido, os factos respeitam à ocorrência de acontecimentos históricos, afastando-se de tal qualificação os juízos de natureza valorativa, que comportam antes conclusões sobre factos.
Vejamos então.
Consta da sentença objeto de recurso a seguinte motivação, quanto à decisão relativa aos factos não provados:
Quanto aos factos considerados não provados, identificados sob o n.º 1), 2) e 3), tal resultou da tomada de posição definida pela ED, em concreto, no artigo 3.º da sua contestação, sobre os factos articulados pela Autora na petição inicial, na qual afirmou, de forma explicita, que “apenas se consideram admitidos os factos descritos na petição inicial (p.i.) e elencados nos seus artigos 2.º a 4.º, 6.º a 8.º, 12.º, 13.º, 16.º, 17.º, 19.º, 28.º, 29.º e 39.º a 41.º, impugnando-se todos os demais”. Pelo que, ao contrário do entendimento manifestado pela Autora nas suas alegações finais, a factualidade invocada nos artigos 9.º a 11.º da petição inicial foi contestada pela ED. Saliente-se aqui, a propósito do facto descrito em 2), que o que resulta provado nos autos, na decorrência dos esclarecimentos prestados pelo júri no procedimento é que “2 – Os equipamentos a solicitar, serão essencialmente no início do contrato, sendo que apenas pontualmente e em algum caso excecional, poderão ser solicitados equipamentos posteriormente”, mas do qual não é possível inferir sobre a efetivação da “maior parte” ou “totalidade” das quantidades previstas para o fornecimento.
Tal decisão é de manter.
É verdade que tem aplicação ao caso dos autos a norma geral constante do artigo 574.º, n.º 2, do CPC, segundo o qual “[c]onsideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou se só puderem ser provados por documento escrito; a admissão de factos instrumentais pode ser afastada por prova posterior.”
Como se salientou na aludida motivação, a entidade recorrida indicou expressamente na contestação que artigos da petição inicial considerava admitidos e quais impugnava, nestes se integrando os aludidos três factos.
Daí que inexiste admissão destes factos.
No mais, quanto ao facto não provado em 1), invoca a recorrente tratar-se de facto notório.
Não se vê que assim seja.
Factos notórios são aqueles que sejam do conhecimento geral, ou seja, do conhecimento do comum dos cidadãos com acesso aos meios normais de informação (Alberto dos Reis, CPC Anotado, vol. III, pág. 261), pelo que não carecem de prova nem de alegação, como se estatui no artigo 412.º, n.º 1, do CPC.
Conforme decorre do artigo 662.º, n.º 1, do CPC, o tribunal de segunda instância “deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Assim, ainda que os factos notórios se enquadrem na determinação dos factos relevantes da ação, quedam fora do âmbito da modificabilidade da decisão de facto ali definida.
De todo o modo, não se vislumbra ser do conhecimento geral a invocada necessidade imperiosa de substituição dos equipamentos com 3 anos, nem tal decorre do período de vigência do contrato de 36 meses, pois que aí não está apenas em causa o fornecimento de tais equipamentos.
No que concerne ao facto não provado indicado no ponto 2), igualmente carece de razão a recorrente. E isto porque o pretendido aditamento relativo aos consumos mínimos se afigura, à evidência, supérfluo, pois nada acrescenta relativamente aos factos já dados como assentes, considerando o que consta do caderno de encargos quanto ao consumo mínimo associado à disponibilização de terminais.
Quanto ao facto não provado indicado no ponto 3), trata-se de uma clara extrapolação assente na defesa jurídica que a recorrente apresenta na ação quanto ao valor global a pagar no final do contrato, encerrando, pois, um juízo de natureza valorativa, que comporta uma conclusão sobre factos, que como tal será de manter arredada da matéria de facto dada como assente.
Pelo que desde logo fica votada ao insucesso a pretensão da recorrente, quanto ao aditamento ao probatório da factualidade que aqui invocou.
Improcede, assim, na totalidade, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.


b) do erro de julgamento de direito

Invoca a recorrente, em síntese:
- cabe ao tribunal sindicar a conformidade do exercício da margem de livre apreciação da administração com os princípios que regem a atividade administrativa;
- no caso, o critério da entidade adjudicante levou a preterir a proposta que apresentava metade do preço da proposta vencedora, assim violando o princípio geral da boa administração;
- para aferir o real preço de cada proposta tanto concorre o tarifário proposto como o consumo mínimo a faturar no caso de virem a ser fornecidos os equipamentos/terminais necessários para as comunicações de voz e dados, pelo que os critérios determinados para a apreciação da proposta violam o disposto no artigo 74.º, n.º 1, al. a), do CCP;
- o critério de adjudicação impede a correta e verdadeira comparação das propostas, pois não podem ser avaliadas por um padrão comum, o que subverte o princípio da concorrência e a prossecução do interesse público financeiro em causa;
- as necessidades de novos terminais da entidade adjudicante constam das peças do concurso, pelo que o critério adotado oblitera uma parte fundamental do contrato, pois neste não apenas se pretende contratar comunicações, mas adquirir os terminais;
- o modelo de avaliação definido não satisfaz as necessidades da entidade adjudicante, um plano de tarifários competitivo e o fornecimento dos respetivos terminais a bom preço, assim incorrendo em violação dos artigos 42.º, n.os 3 e 4, 74.º, 75.º, 132.º, n.º 1, al. n), e 139.º do CCP.
Vejamos então.
Movemo-nos no âmbito de procedimento para celebração de contratos ao abrigo de acordo quadro, previsto no artigo 259.º do CCP, para a aquisição dos serviços móveis de voz e dados.
Mais concretamente, disputa a recorrente a determinação dos critérios de adjudicação adotados pela entidade adjudicante e plasmados no caderno de encargos.
Aí assentando os pedidos formulados na presente ação de contencioso pré-contratual: a anulação de todo o procedimento, mormente do ato de adjudicação ali realizado e do consequente contrato celebrado em sua execução, assim como a condenação da entidade adjudicante a abrir novo procedimento sem incorrer na mesma ilegalidade, de forma a que nele seja escolhida a proposta economicamente mais vantajosa.
O artigo 42.º do Código dos Contratos Públicos (CCP), sob a epígrafe ‘caderno de encargos’, prevê o seguinte, para o que aqui releva:
“1 - O caderno de encargos é a peça do procedimento que contém as cláusulas a incluir no contrato a celebrar.
(…)
3 - As cláusulas do caderno de encargos relativas aos aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência podem fixar os respetivos parâmetros base a que as propostas estão vinculadas.
4 - Os parâmetros base referidos no número anterior podem dizer respeito a quaisquer aspetos da execução do contrato, tais como o preço a pagar ou a receber pela entidade adjudicante, a sua revisão, o prazo de execução das prestações objeto do contrato ou as suas características técnicas ou funcionais, bem como às condições da modificação do contrato, devendo ser definidos através de limites mínimos ou máximos, consoante os casos, sem prejuízo dos limites resultantes das vinculações legais ou regulamentares aplicáveis.
5 - O caderno de encargos pode também descrever aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência, nomeadamente mediante a fixação de limites mínimos ou máximos a que as propostas estão vinculadas.
(…)
11 - Para efeito do disposto nos n.os 3 e 5, consideram-se aspetos submetidos à concorrência aqueles que correspondam a fatores ou subfatores que densificam o critério de adjudicação, e aspetos não submetidos à concorrência todos os demais.”
No artigo 74.º do CCP encontram-se definidas as regras do critério de adjudicação, conforme segue:
“1 - A adjudicação é feita de acordo com o critério da proposta economicamente mais vantajosa, determinada através de uma das seguintes modalidades:
a) Multifator, de acordo com a qual o critério de adjudicação é densificado por um conjunto de fatores, e eventuais subfatores, correspondentes a diversos aspetos da execução do contrato a celebrar;
b) Monofator, de acordo com a qual o critério de adjudicação é densificado por um fator correspondente a um único aspeto da execução do contrato a celebrar, designadamente o preço.
2 - Quando seja adotada a modalidade multifator deve ser elaborado um modelo de avaliação das propostas nos termos do artigo 139.º, sem prejuízo do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 115.º
3 - Quando seja adotada a modalidade monofator e o aspeto da execução do contrato a celebrar submetido à concorrência não possua natureza quantitativa, deve ser elaborada uma grelha de avaliação das propostas com base num conjunto ordenado de diferentes atributos suscetíveis de serem propostos, sem prejuízo do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 115.º
4 - O convite ou o programa do procedimento deve definir o critério de desempate na avaliação das propostas.
5 - Para efeitos do disposto no número anterior:
a) É vedada a utilização do critério do momento de entrega das propostas;
b) Quando seja adotada a modalidade multifator devem ser preferencialmente utilizados os respetivos fatores e subfatores densificadores, por ordem decrescente de ponderação relativa, sem prejuízo de outros que, nos termos do artigo seguinte, estejam ligados ao objeto do contrato a celebrar;
c) Quando seja adotada a modalidade monofator, ou quando seja adotada a modalidade multifator e o critério previsto na alínea anterior não permita desempatar as propostas, pode recorrer-se ao sorteio.”
Já o artigo 75.º, sob a epígrafe ‘fatores e subfactores’, prevê o seguinte:
“1 - Os fatores e eventuais subfatores que densificam o critério de adjudicação e o critério de desempate devem estar ligados ao objeto do contrato a celebrar.
2 - Os fatores e os eventuais subfatores podem ser, em função dos objetivos e das necessidades da entidade adjudicante, designadamente os seguintes:
a) Qualidade, designadamente valor técnico, características estéticas e funcionais, acessibilidade, conceção para todos os utilizadores, características sociais, ambientais e inovadoras e condições de fornecimento;
b) Organização, qualificações e experiência do pessoal encarregado da execução do contrato em questão, caso a qualidade do pessoal empregue tenha um impacto significativo no nível de execução do contrato, designadamente, em contratos de serviços de natureza intelectual, tais como a consultoria ou os serviços de projeto de obras;
c) Serviço e assistência técnica pós-venda e condições de entrega, designadamente a data de entrega, o processo de entrega, o prazo de entrega ou de execução e o tempo de prestação de assistência;
d) Sustentabilidade ambiental ou social do modo de execução do contrato, designadamente no que respeita ao tempo de transporte e de disponibilização do produto ou serviço, em especial no caso de produtos perecíveis, à denominação de origem ou indicação geográfica, no caso de produtos certificados, à eficiência energética, em especial no fornecimento de energia, e à utilização de produtos de origem local ou regional, de produção biológica, bem como de produtos provenientes de detentores do Estatuto de Agricultura Familiar;
e) Circularidade, designadamente a utilização de produtos e serviços circulares, a opção por circuitos curtos de distribuição, a eficiência no uso de materiais e a redução de impactos ambientais;
f) Grau de inovação de processos, produtos ou materiais utilizados na execução do contrato;
g) Promoção da inovação ou de emprego científico ou qualificado na execução do contrato;
h) Promoção de atividades culturais e dinamização de património cultural;
i) Promoção do cumprimento do disposto no Código do Trabalho e convenções coletivas de trabalho, quando aplicáveis.
3 - Sem prejuízo do disposto na alínea b) do número anterior, os fatores e subfatores não podem dizer respeito, direta ou indiretamente, a situações, qualidades, características ou outros elementos de facto relativos aos concorrentes.
4 - Para os efeitos previstos no n.º 1, os fatores e subfatores consideram-se ligados ao objeto do contrato quando estiverem relacionados com as obras, bens ou serviços a executar ou fornecer ao abrigo desse contrato, sob qualquer aspeto e em qualquer fase do seu ciclo de vida.
5 - Ainda que não façam parte da sua substância material, consideram-se relacionados com o objeto do contrato os fatores envolvidos no processo específico de produção ou fornecimento das obras, bens ou serviços ou num processo específico em relação a outra fase do seu ciclo de vida.
6 - Quando a organização, qualificações e experiência do pessoal encarregado da execução do contrato tenham sido adotados como fatores de avaliação da relação qualidade-preço, o contrato deve garantir que o pessoal empregue cumpre efetivamente as especificações de qualidade especificadas no caderno de encargos e nos requisitos propostos, prevendo expressamente que o pessoal proposto pelo adjudicatário só pode ser substituído com o expresso e prévio consentimento da entidade adjudicante, após verificação de que essa substituição proporciona um nível de qualidade equivalente.
7 - Quando o custo seja calculado com base no ciclo de vida, o modelo de avaliação das propostas pode abranger custos suportados ou não pela própria entidade adjudicante, como sejam:
a) Custos relacionados com a aquisição propriamente dita;
b) Custos de utilização, tais como consumo de energia, de consumíveis e de outros recursos;
c) Custos de manutenção e assistência técnica;
d) Custos de fim de vida, tais como custos de recolha e reciclagem;
e) Custos imputados a externalidades ambientais ligadas ao bem, serviço ou obra durante o seu ciclo de vida, desde que seja possível determinar e confirmar o seu valor monetário, os quais podem incluir o custo das emissões de gases com efeito de estufa e de outras emissões poluentes, assim como outros custos de atenuação das alterações climáticas.
8 - Quando o caderno de encargos submeter à concorrência os custos do ciclo de vida do objeto do contrato a celebrar, o programa do procedimento ou convite deve indicar a metodologia que será utilizada para os calcular.
9 - A metodologia referida no número anterior, quando for aplicada para o cálculo dos custos referidos na alínea e) do n.º 7, deve basear-se também em regras objetivamente verificáveis e não discriminatórias, permitindo que os dados a fornecer pelos concorrentes sejam por estes obtidos mediante esforço razoável.
10 - Caso seja obrigatória, por força do Direito da União Europeia, a utilização de uma metodologia comum para o cálculo dos custos do ciclo de vida, a mesma deve ser aplicada.”
Invoca a recorrente ter sido violada a norma constante do artigo 132.º, n.º 1, al. n), do CCP, que prevê dever indicar o programa do concurso público a modalidade do critério de adjudicação, bem como, se necessário, o modelo ou a grelha de avaliação das propostas, nos termos dos n.os 2 e 3 do artigo 74.º, respetivamente.
Assim como invoca a violação do artigo 139.º do mesmo diploma legal que, sob a epígrafe ‘modelo de avaliação das propostas’, dispõe como segue:
“1 - Nos casos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 74.º, deve ser elaborado um modelo de avaliação das propostas que explicite claramente os fatores e os eventuais subfatores relativos aos aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos.
2 - A pontuação global de cada proposta, expressa numericamente, corresponde ao resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada fator ou subfator elementar, multiplicadas pelos valores dos respetivos coeficientes de ponderação.
3 - Para cada fator ou subfator elementar deve ser definida uma escala de pontuação através de uma expressão matemática ou em função de um conjunto ordenado de diferentes atributos suscetíveis de serem propostos para o aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos respeitante a esse fator ou subfator.
4 - Na elaboração do modelo de avaliação das propostas não podem ser utilizados quaisquer dados que dependam, direta ou indiretamente, dos atributos das propostas a apresentar, com exceção dos da proposta a avaliar.
5 - As pontuações parciais de cada proposta são atribuídas pelo júri através da aplicação da expressão matemática referida no n.º 3 ou, quando esta não existir, através de um juízo de comparação do respetivo atributo com o conjunto ordenado referido no mesmo número.”
No caso vertente, a entidade adjudicante definiu como critério de adjudicação o da proposta economicamente mais vantajosa, cláusula 9.ª do programa do procedimento, equacionando três fatores de avaliação, a que fez corresponder os respetivos coeficientes de ponderação, da seguinte forma:

Decorre dos preceitos legais supra citados, mormente do artigo 74.º do CCP, que a lei confere à entidade adjudicante uma margem ampla de discricionariedade entre as duas modalidades de critério de adjudicação.
De tal forma que, nas palavras de Pedro Fernández Sánchez, “o afastamento de uma escolha discricionária da entidade adjudicante quanto ao critério de adjudicação a adotar só pode ser admitido nos casos em que a própria lei impôs uma solução obrigatória quanto a um dado critério que considerou mais adequado em face do tipo de procedimento a adotar ou do tipo de contrato a formar” (Direito da Contratação Pública, vol. II, 2020, pág. 315).
Mais, como se reconhece na decisão objeto de recurso, o que não disputa a recorrente, a lei confere igualmente à entidade adjudicante uma larga margem de discricionariedade na escolha e ordenação dos fatores de avaliação, assim como dos respetivos coeficientes de ponderação, que permitam determinar a proposta economicamente mais vantajosa.
Sem que tal signifique estarmos perante um espaço de livre escolha extrajurídica insuscetível de fiscalização judicial.
Com efeito, a margem de discricionariedade nesta sede atribuída à entidade adjudicante não lhe confere um livre passe para decidir conforme entendam, devendo a fiscalização judicial “ser dirigida, sob uma perspetiva negativa, à eliminação das opções desadequadas ou desrazoáveis, sem que o juiz se possa substituir ao decisor administrativo quanto à escolha, sob uma perspetiva positiva, das opções que considera mais convenientes ou apropriadas para a satisfação do interesse público” (op.cit., pág. 316).
O dissídio reside, já se sublinhou, na atribuição de um coeficiente de ponderação de 70% ao fator ‘pontuação do tarifário proposto’ e de um coeficiente de ponderação de 25% ao fator ‘consumo mínimo terminais A e B’.
Invoca a recorrente que esta ponderação levou a preterir a proposta que apresentava metade do preço da proposta vencedora, sustentando que para aferir o real preço de cada proposta tanto concorre o tarifário proposto como o consumo mínimo a faturar no caso de virem a ser fornecidos os terminais necessários para as comunicações de voz e dados.
Sustenta, mas não o consegue demonstrar.
Pois como se evidencia na decisão objeto de recurso, a justificação apresentada pela entidade adjudicante quanto à diferenciação daqueles coeficientes, afigura-se sustentada e plausível: “o critério de adjudicação foi definido de forma a garantir a escolha da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante, tendo em consideração que o contrato visa essencialmente a prestação de serviços de telecomunicações. Considerou-se que a pontuação do tarifário/comunicações deveria ter um peso preponderante (70%) sobre os outros fatores (25% consumo mínimo + 5% garantia =30%), uma vez que o cerne do contrato são comunicações. Com a ponderação de 25% do consumo mínimo pretendeu-se que os concorrentes não optassem por consumos mínimos mais elevados. O consumo mínimo apenas se aplica nos casos em que forem disponibilizados pelo adjudicatário terminais móveis, caso contrário apenas se aplica o preço das comunicações”.
Mais se afigura igualmente sustentado e plausível o que consta do relatório final do júri, em resposta à questão suscitada pela aqui recorrente: “está salvaguardado o interesse público da contratação ao melhor preço atendendo a que o preço dos consumos mínimos se encontra dentro das estimativas da entidade adjudicante e que os mais baixos preços das comunicações que os enformam permitirão às entidades adjudicantes ao longo do contrato eventuais poupanças que não ocorreriam com a adjudicação da proposta da V... com um preço de tarifário cerca de 189% mais alto”.
É clara a opção administrativa em privilegiar o preço das comunicações face aos consumos mínimos associados ao fornecimento de equipamentos.
Já claro não é o que vem propugnado pela recorrente, da soma dos dois fatores determinar de forma precisa os custos em que vai incorrer a Administração.
Daí que se afigure inevitável a conclusão de não estarmos perante uma opção despida de razoabilidade, e nessa medida não pode o tribunal substituir-se à entidade adjudicante na escolha da opção tida por mais adequada à satisfação do interesse público.
Como se refere na decisão recorrida, de forma clara e objetiva, o que a recorrente pretende é “conformar o critério de adjudicação e o peso dos fatores enunciados, desde logo, considerando os seus próprios interesses comerciais, em face da proposta de preço(s) que apresentou, conhecidas as propostas de preço(s) apresentadas pelos restantes concorrentes, olvidando que os aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência, o critério de adjudicação e o respetivo peso atribuído a cada um dos fatores para os avaliar, são aqueles que concretamente foram definidos pela Entidade Adjudicante nas peças do procedimento, dentro da sua larga margem de discricionariedade nesta matéria, de acordo com a sua vontade adjudicatória, e não quaisquer outros, como os que aqui defende nos autos.”
Esta pretensão da recorrente, como é evidente, não pode proceder.
No mais, igualmente não encontra sustento a alegação de que o critério de adjudicação impede a correta e verdadeira comparação das propostas, por não poderem ser avaliadas por um padrão comum.
A comparabilidade das propostas configura-se como subprincípio do princípio da concorrência, cuja observância não se logrará “sem possibilidade de confronto entre as candidaturas ou entre as propostas (entre si e com o processo patenteado), isto é, sem possibilidade de fazer funcionar a concorrência nos termos em que esta foi suscitada fica prejudicada a própria finalidade ou função do concurso”; e para assegurar uma concorrência real e efetiva é necessário “que todos os concorrentes respondam aos mesmos quesitos e requisitos do concurso (ou a um núcleo básico dele) de modo a possibilitar a plena comparação das propostas, a possibilidade de confrontá-las enquanto propostas contratuais a quesitos idênticos, para saber, objetiva e imparcialmente, a final, qual o melhor concorrente ou a melhor proposta que o mercado forneceu” (Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos de adjudicação administrativa – das fontes às garantias, 1998, pág.103).
Resulta de forma inequívoca da factualidade dada como assente que os três concorrentes responderam aos mesmos quesitos e requisitos do concurso, apresentando preços para os dois fatores de avaliação, assim como indicando o prazo de garantia dos equipamentos a fornecer. Dois dos concorrentes optaram por privilegiar a apresentação de preço mais baixo para os tarifários e mais alto para os consumos mínimos, optando a recorrente por estratégia diversa.
À evidência, inexiste qualquer obstáculo à plena comparação das propostas, conforme bem decidido na sentença.
Improcedem, pois, todas as questões suscitadas pela recorrente.
Em suma, impõe-se negar provimento ao presente recurso.
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III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao presente recurso.
Custas pela recorrente.

Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio, o relator consigna e atesta que as Juízas Desembargadoras Ana Cristina Lameira e Catarina Vasconcelos têm voto de conformidade com o presente acórdão.

Lisboa, 9 de setembro de 2021

(Pedro Nuno Figueiredo)