Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06589/10
Secção:2º JUÍZO – SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO
Data do Acordão:09/14/2010
Relator:RUI PEREIRA
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR
NULIDADE DA SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
“PERICULUM IN MORA”
Sumário:I – A concessão de qualquer providência cautelar conservatória no âmbito do contencioso administrativo depende da evidente procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal [artigo 120º, nº 1, alínea a) do CPTA] ou, não sendo caso de evidente ou manifesta procedência da pretensão a formular, desde que a falta de fundamento da mesma não seja manifesta ou não se verifiquem circunstâncias que obstem ao conhecimento do respectivo mérito, e exista fundado receio de constituição duma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente da providência visa assegurar no processo principal [artigo 120º, nº 1, alínea b) do CPTA].
II – Nos restantes casos previstos na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, depois de demonstrado que não é manifesta a falta de fundamento da pretensão ou que não se verificam circunstâncias que obstem ao conhecimento do respectivo mérito e que existe fundado receio de constituição duma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal, é ainda necessário proceder à ponderação dos interesses públicos e privados em presença, sendo de recusar a concessão da providência sempre que os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que resultariam da sua recusa [cfr. artigo 120º, nº 2 do CPTA].
III – Essa ponderação só será de efectuar quando os demais requisitos de que depende a providência estejam verificados, ficando prejudicada pela falta de demonstração de um deles, pelo que ao não proceder a tal ponderação a decisão recorrida não incorreu em omissão de pronúncia e, como tal, não é nula, de acordo com a alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPCivil.
IV – O artigo 685º-B, nº 1 do CPCivil impõe que quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
V – Se a audiência de julgamento da providência foi objecto de gravação, incumbia ao recorrente indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda para concluir ter ocorrido o apontado erro de apreciação, o que este manifestamente omitiu, pelo que se impõe a imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto vertida nas alíneas V) e X) do probatório.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO
A..., com os sinais dos autos, intentou no TAF de Leiria uma Providência Cautelar de Suspensão de Eficácia contra o Município de Constância, pedindo a suspensão do Despacho do Presidente daquele município, datado de 17-11-2009, que o designou para executar o projecto de modernização da biblioteca municipal Alexandre O’Neill e que determinou que o seu posto de trabalho passasse a ser no edifício da biblioteca, “em local que reúna condições para o desenvolvimento das tarefas inerentes”, voltando o mesmo a retomar as funções que vinha desempenhando como Técnico de Informática, nos exactos termos e condições em que o vinha fazendo até à prolação do aludido despacho.
Por sentença datada de 27-5-2010, foi a providência requerida julgada improcedente [cfr. fls. 174/204 dos autos].
Inconformado, veio o requerente interpor recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões:
a) O ora recorrente pretendeu com o procedimento cautelar suspender os efeitos do Despacho proferido pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal de Constância datado de 17 de Novembro de 2009;
b) O supra citado despacho implicou, para o requerente, o abandono repentino das funções de Técnico Informático que vinha desempenhando na Câmara Municipal há mais de vinte anos, atribuindo-lhe outras funções de menor relevância e maioritariamente de natureza administrativa;
c) A sentença proferida no âmbito do processo cautelar e que é objecto do presente recurso veio a considerar como provados a totalidade dos factos invocados pelo requerente, nomeadamente:
a. Que a decisão de transferir o requerente das suas funções para a Biblioteca colheu de surpresa não só o próprio requerente como todos os que com ele trabalhavam.
b. Que ao fim de alguns dias de serviço ao requerente foi concedida baixa psicológica;
c. O que implicou que o mesmo tivesse que se submeter a terapêutica medicamentosa bem como a acompanhamento psiquiátrico regular, que ainda se mantém na presente data.
d. Tendo passado a revelar-se uma pessoa triste e ansiosa que se isolou do meio em que se encontrava inserido devido a sentimentos de vergonha.
d) A sentença recorrida não espelha de forma correcta e adequada a factualidade apurada em sede de audiência de julgamento.
e) Desde logo porque, contrariamente ao que parece pretender demonstrar a sentença, o requerente foi o único trabalhador da Câmara que teve que deixar o seu posto de trabalho no espaço de vinte e quatro horas após a comunicação da mudança, bem como o único cujo local de trabalho foi mudado.
f) Por outro lado, cotejando-se as funções anteriormente desempenhadas com as que lhe foram posteriormente atribuídas, facilmente se constata que, contrariamente ao sucedido com todos os demais trabalhadores, houve um retrocesso na complexidade e especificidade das funções de que ficou responsável, o que consubstanciou um retrocesso no plano de carreira do requerente.
g) No que toca aos pontos V) e X) da matéria assente, o tribunal "a quo" não apreciou correctamente os mesmos, pelo que incorreu numa situação de erro de apreciação, prevista no artigo....
h) Igual situação se verifica no que se reporta ao ponto Z-o) da matéria assente;
i) A sentença ora recorrida não se pronunciou sobre um dos pressupostos da providência cautelar – a ponderação dos interesses públicos e privados em litígio – prevista no nº 2 do artigo 120º do CPTA.
j) Tal omissão encerra em si, não só a violação do preceito constante do nº 2 do artigo 120º do CPTA como também uma omissão de pronúncia, prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPCivil.
k) O que leva a concluir pela nulidade da sentença;
l) Caso a sentença recorrida tivesse operado a uma ponderação dos interesses em litígio, certamente teria alcançado solução distinta da que aplicou, pois que estão em causa, da banda do requerente a dignidade e honra deste enquanto trabalhador bem como a sua saúde e da banda do requerido a execução de um projecto de modernização da biblioteca que permanecera desconhecido perante todos até á data e que não merece acolhimento próprio nos elementos contabilísticos do município.
m) De onde facilmente deveria ter concluído a sentença que seria de dar prevalência ao interesse do requerente em detrimento daqueles pelos quais pugnava o requerido.
n) Realce-se ainda que a sentença recorrida fez tábua rasa da possibilidade de se adoptar uma solução compromissória que permitisse acautelar de forma justa e equilibrada os interesses de ambas as partes;
o) Isto porque sendo possível a aplicação de uma contra-providência, no caso em apreço, a cumulação de funções pelo requerente – funções anteriores ao despacho recorrido e projecto da biblioteca – não logrou operar de tal forma a sentença.
p) Omitindo, por completo tal questão e com isso violando de forma clara o nº 2 do artigo 120º do CPTA, onde encontra consagração expressa o princípio da proporcionalidade.
q) O requerente não contesta a mudança de funções ou de posto de trabalho mas a forma como tais mudanças operaram e o facto das mesmas terem significado para si, em termos curriculares, um retrocesso na carreira.
r) O local onde o requerente viu instalado o seu posto de trabalho não reúne quaisquer condições para o desempenho das suas funções, até porque se situa numa zona de atendimento ao público;
s) Os motivos que levaram o Senhor Presidente a tomar a decisão de alterar as funções e local de trabalho do requerente não se encontram devidamente explicitados e tem vindo a afectar de forma grave e notória a saúde do requerente que, em ultima instância, poderá redundar num estado depressivo crónico e a adopção de comportamentos anti-sociais;
t) Os factos alegados em sede de requerimento inicial foram causa directa, única e adequada para o actual quadro clínico do requerente.
u) O requisito do justo receio encontra-se preenchido pelo facto de a não ser tomada qualquer medida que altere o actual cenário poderá vir a revelar-se manifestamente inócua qualquer decisão proferida em sede de acção principal: ou porque o estado de saúde do requerente estará de tal forma debilitado que o impedirá de regressar ao exercício de quaisquer funções ou porque, derivado do processo de concurso que se encontra a correr termos para recrutamento de técnico de informática, o Município prescindirá do requerente.
v) O despacho objecto dos presentes autos não aponta quaisquer factos que permitam conhecer a motivação que preside a escolha do requerente como executante do projecto;
w) O acto em questão contende com direitos e interesses do requerente, impondo-lhe igualmente uma serie de deveres, nomeadamente o de abandonar o seu posto de trabalho, pelo que carece de fundamentação.
x) Na ausência de fundamentação, o acto objecto dos presentes autos é nulo por violação do disposto no nº 1 do artigo 133º, 123º, 124º e 125º, todos do CPA, bem como do artigo 59º, nº 2 da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
y) O requerente não pode conformar-se com a tese que classifica como insindicável pelo tribunal o acto administrativo até porque o mesmo produz efeitos que se reflectem directamente nos direitos e interesses do requerente.
z) A sentença não cumpriu o disposto nos artigos 71º, nº 2, 168º, nº 2 e 179º, nº 1 do CPTA, uma vez que não explicitou as vinculações a observar pela administração na emissão do acto devido.
aa) Obrigação que se acharia acautelada caso tivesse operado à ponderação de interesses constante do nº 2 do artigo 120º do CPTA.
bb) A sentença viola os nºs 1 e 4 do artigo 61º da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, na medida em que não só não comunicou atempadamente a mudança ao requerente como não obteve prévio acordo do mesmo.
cc) Consentimento esse que seria prestado em sede de audiência prévia do requerente e que não teve lugar.
dd) Os requisitos para efeitos de decretação da providência cautelar, nomeadamente o fundado receio e a probabilidade de produção de prejuízos de difícil reparação, verificam-se no caso em apreço”.
A entidade recorrida não contra-alegou.
O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste TCA Sul emitiu douto parecer, no qual defende que o recurso não merece provimento [cfr. fls. 291/293].
Sem vistos, vêm os autos à conferência para julgamento.

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A sentença recorrida considerou assentes os seguintes factos:
A) No dia 27 de Junho de 1989 o requerente tomou posse como 3º oficial administrativo de nomeação provisória da Câmara Municipal de Constância – fls. 132 do processo administrativo (PA) apensado aos autos e doc. 1 junto com o requerimento inicial (RI);
B) Em 28 de Dezembro de 1995 o requerente foi nomeado, a título definitivo, operador de sistemas informáticos de 2ª classe da Câmara Municipal de Constância – fls. 83 do PA e doe. 2 junto com o RI;
C) Com a entrada em vigor da Lei nº 59/2008, de 11 de Setembro, o requerente transitou, a partir de 1 de Janeiro de 2009, para a situação de técnico de informática com contrato de trabalho por tempo indeterminado – doc. 3 junto com o requerimento inicial;
D) O requerente exerceu de forma contínua, durante mais de vinte anos, as funções que lhe foram cometidas – alegação não impugnada;
E) O que sempre fez de forma eficiente, diligente e meritória – alegação não impugnada; v. também fls. 67, verso, do PA;
F) Com bons resultados nas avaliações de desempenho e progressão na carreira – alegação não impugnada; v. também fls. 67, verso, do PA;
G) Nunca tendo sido alvo de qualquer repreensão ou procedimento disciplinar – alegação não impugnada;
H) Mantendo um óptimo relacionamento com todos os demais funcionários da Câmara Municipal – alegação não impugnada;
I) Sendo por todos eles querido e admirado – alegação não impugnada;
J) O requerente sempre manteve um relacionamento próximo, mesmo de amizade, com os munícipes – alegação não impugnada;
K) O requerente sempre exerceu as suas funções com dedicação e profissionalismo – alegação não impugnada;
L) Tendo igualmente ficado responsável pela formação dos estagiários do Departamento em que se encontra inserido – alegação não impugnada;
M) O requerente é militante do Partido Socialista – alegação não impugnada;
N) Facto que sempre foi conhecido de todos, incluindo no seu local de trabalho – alegação não impugnada;
O) Jamais tendo tal actividade impedido o requerente de exercer as suas funções na Câmara de forma isenta e desligada das lides e quadrantes partidários – depoimento de Maria Adelaide do Vale Quaresma Ferreira;
P) Nas últimas eleições autárquicas, que tiveram lugar em 11 de Outubro de 2009, o requerente desempenhou funções como mandatário das listas do Partido Socialista, concorrentes à Câmara Municipal de Constância – alegação não impugnada; depoimentos de Rui José da Silva Pires, Vereador da Câmara Municipal de Constância, e de Margarida Maria da Costa Alves Veríssimo, Vereadora da Câmara Municipal de Constância, eleita na mesma lista que o requerente integrou e que convidou o requerente para ser mandatário nas últimas eleições autárquicas;
Q) Tendo participado activamente na campanha eleitoral – alegação não impugnada;
R) O requerente foi subscritor da comunicação escrita ao Tribunal Judicial de Abrantes, que deu origem ao procedimento eleitoral nº 944/09.4TBABT e pela qual se denunciava a situação de inelegibilidade do candidato da CDU a presidente da Câmara Municipal de Constância, Máximo Ferreira – doc. 4 junto com o requerimento inicial, cujo teor se dá por reproduzido;
S) A supra mencionada acção foi declarada improcedente – alegação não impugnada;
T) Tendo o candidato da CDU, Máximo Ferreira, vencido as eleições – alegação não impugnada;
U) O novo executivo tomou posse no dia 31 de Outubro de 2009 – alegação não impugnada;
V) A partir do início do mês de Novembro de 2009 foram aprovadas diversas mudanças internas de forma a adaptar os serviços às exigências resultantes de um novo mandato autárquico, as quais abrangeram diversos trabalhadores, como sucedeu, por exemplo, com os que estavam adstritos ao Gabinete de Apoio ao Presidente da Câmara Municipal, ao Gabinete de Informação e Relações Públicas e à Divisão Financeira – depoimentos de Francisco José Caipirra Covas, Chefe da Divisão Administrativa e Financeira, Sandra Isabel Luís dos Santos, funcionária da Associação "Os Quatro Cantos do Cisne", que presta serviços à Câmara Municipal de Constância há três anos e Maria Adelaide do Vale Quaresma Ferreira, Técnica Superior da área financeira na Câmara Municipal de Constância;
X) Sendo que, quanto à Divisão Financeira, procedeu-se à alteração das funções que cada trabalhador desempenhava, abrangendo a mudança do respectivo local de trabalho – fls. 5 e 6 do PA e docs. 1 e 2 juntos com a contestação da entidade requerida;
Y) Em 17 de Novembro de 2009 o Presidente da Câmara Municipal de Constância exarou na Informação nº 15/2009 do Chefe da Divisão Administrativa que consubstancia o relatório sobre a "informatização da Biblioteca Municipal Alexandre O'Neill, em Constância", o seguinte despacho:
Aprovo o presente Relatório que, para além de sugerir o objectivo de modernizar a Biblioteca Municipal Alexandre O'Neill, indica estratégias para sua concretização.
Designo o Técnico de Informática A... para executar o Projecto, devendo, para o efeito, instalar-se o seu posto de trabalho no próprio edifício da Biblioteca, em local que reúna condições para o desenvolvimento das tarefas inerentes.
A coordenação do Projecto será exercida pelo Chefe da Divisão Administrativa/Financeira, em articulação com a Técnica Superior responsável pela Biblioteca e com a supervisão da Vereadora responsável pelo Pelouro da Educação/Cul” – fls. 1 a 4 do PA;
Z) Deixaram de ser atribuídas ao requerente as seguintes funções que vinha exercendo há mais de 20 anos:
- Gestão de todo o sistema informático da Câmara;
- Gestão das aplicações informáticas da AIRC [Associação Informática da Região Centro];
- Administração do domínio da Câmara Municipal;
- Formação e tutela dos estágios;
- Acompanhamento do Projecto Médio Tejo Digital, pelo qual era responsável – alegação não impugnada;
Z-a) Tendo o requerente passado a estar incumbido, além das discriminadas no relatório sobre que foi proferido pelo Presidente da Câmara o despacho de 17 de Novembro de 2009, das seguintes tarefas:
- Requisições de material para implementação do projecto de modernização da Biblioteca;
- Envio de mails e contacto com os intervenientes no projecto;
- Manutenção de todos os computadores instalados na Biblioteca Municipal;
- Apoio aos técnicos que foram incumbidos de proceder à informatização bibliográfica – depoimentos de Francisco José Caipirra Covas, Júlia Maria Gonçalves Lopes de Amorim, Vereadora pela área da Animação Cultural, na qual se integra a Biblioteca, Virgílio Marques Quintino, Técnico de Informática, e Anabela Conceição da Silva Alves Cardoso, Bibliotecária responsável pela Biblioteca da Câmara Municipal;
Z-b) Tarefas essas que foram clarificadas na Informação elaborada pela Vereadora Júlia Amorim em 15 de Janeiro de 2010, na sequência da reunião realizada em 13 de Janeiro de 2010, e cujo teor se dá por reproduzido – fls. 10 a 12 do PA, a que corresponde o doc. 3 junto com a contestação da entidade requerida;
Z-c) A supra mencionada decisão colheu de surpresa não só o requerente como todos os que com ele trabalhavam – alegação não impugnada;
Z-d) Foram vedados ao requerente os acessos a todas as aplicações informáticas com que trabalhava bem como modificada a password de várias pastas contendo documentação e ficheiros a que, até então, sempre fora dos poucos com autorização para aceder – alegação não impugnada;
Z-e) A modificação das palavras-chave foi uma medida que atingiu os vários possuidores de acesso ao servidor principal – depoimentos de Francisco Caipirra e Virgílio Quintino já referidos;
Z-f) Que se revelou necessária em face das mudanças entretanto ocorridas – depoimentos de Francisco Caipirra e Virgílio Quintino já referidos;
Z-g) E que, face a um novo mandato, visava garantir o controlo do sistema informático, o qual deverá garantir a absoluta privacidade dos dados e estar sujeito a medidas de segurança rigorosas – depoimentos de Francisco Caipirra e Virgílio Quintino já referidos;
Z-h) Na reunião de 26 de Novembro de 2009 os Vereadores da Câmara Municipal Margarida Veríssimo e Rui Pires apresentaram o "pedido de informação número um" consignado na Acta nº 27/2009, junta com o requerimento inicial como doc. 7 e que nessa parte [transcrita no artigo 32º do requerimento inicial] se dá por reproduzido – alegação não impugnada;
Z-i) Pedido que teve a seguinte resposta por parte do Presidente na reunião da Câmara Municipal de 28 de Dezembro de 2009:
Por último esclareceu os motivos que originaram a mudança do local do posto de trabalho do Técnico de Informática Carlos Alves. Referiu que a informatização da Biblioteca Municipal é um projecto de extrema importância para a Autarquia, e que, por motivos diversos ainda não tinha sido operacionalizada. Depois de ter conhecimento da situação e de ter solicitado as informações que considerou pertinentes para tomada de decisão, entendeu que deveria criar todas as condições técnicas e humanas para que o projecto tivesse sucesso, e, neste contexto, entendeu colocar um técnico de informática totalmente dedicado ao projecto de informatização da Biblioteca. Era importante que esse Técnico conhecesse o ambiente organizacional para melhor enquadrar todas as decisões a tomar, e, por esse motivo, optou pelo Técnico Carlos Alves. Em relação ao tempo em que essa mudança se operou, disse que tudo resultou da oportunidade que foi entendida pelos serviços, tendo em conta que as instruções que tinham sido dadas, apontavam o projecto como de execução urgente. Por último referiu que o sistema informático existente nos Paços do concelho ficou a cargo de outro Técnico de Informática, com relação jurídica de trabalho por tempo determinado, o qual garante a prestação do serviço com elevados níveis de eficiência, eficácia e qualidade, não só pelo conhecimento que tem de todo o sistema municipal como pelos conhecimentos científicos de que dispõe.” – Acta nº 29/2009 que, na parte relevante, faz fls. 7 a 9 do PA e doc. junto com a contestação da entidade requerida como doc. 4;
Z-j) Na tentativa de perceber os motivos em que assentara tal decisão, o requerente enviou ao Presidente da Câmara Municipal de Constância, em 29 de Dezembro de 2009, o mail junto com o requerimento inicial como doc. 8, cujo teor se dá por reproduzido;
Z-k) O qual não obteve resposta – alegação não impugnada;
Z-l) Sem resposta até à data ficou igualmente a carta que, em 15 de Dezembro de 2009, o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado enviou ao Presidente da Câmara a solicitar explicações acerca da motivação que esteve na base do despacho que determinou que o requerente passaria a exercer funções na Biblioteca – alegação não impugnada; doc. 9 junto com o requerimento inicial;
Z-m) Em 18 de Novembro de 2009 o requerente instalou-se no edifício da Biblioteca – alegação não impugnada;
Z-n) Conforme lhe havia sido ordenado pelo Chefe de Divisão Francisco Caipirra – alegação não impugnada;
Z-o) Em Informação posterior à reunião convocada pela Vereadora Júlia Amorim para o dia 13 de Janeiro de 2010, e em que participaram o Chefe da Divisão Administrativa, Francisco Caipirra, a Técnica Superior, Anabela Cardoso, a Assistente Técnica, Sílvia Brota, e o próprio requerente registou-se o seguinte:
- Que a aplicação informática não estava a funcionar;
- Que não foram efectuadas as diligências necessárias no sentido de se proceder à aquisição de hardware e software – doc. 3 junto com a contestação da entidade requerida;
Z-p) E foram explicitadas várias tarefas a que o requerente deveria dar prioridade, para concretização dos objectivos definidos para a informatização do funcionamento da Biblioteca Municipal – doc. 3 citado;
Z-q) O requerente continua a ser técnico de informática – depoimentos de Maria Adelaide Quaresma e Francisco Caipirra já referidos;
Z-r) O requerente permaneceu ao serviço no edifício da Biblioteca apenas alguns dias e até que lhe foi atribuída baixa médica psicológica – alegação não impugnada;
Z-s) O requerente passou a ser uma pessoa profundamente triste e ansiosa – depoimento de Rui Hipólito Martins, que disse conhecer o requerente há 10 anos e ambos frequentarem a casa um do outro; "relatório médico" protestado juntar no artigo 54º do requerimento inicial e efectivamente junto na sessão de produção de prova testemunhal com o nº 11 e cujo teor se dá por reproduzido;
Z-t) Padecendo de fortes insónias – relatório médico referido em Z-m);
Z-u) Isola-se – depoimento de Rui Hipólito Martins já referido;
Z-v) Teve necessidade de recorrer a acompanhamento psiquiátrico – vd. "relatório médico" citado;
Z-x) O que se mantém até à data – vd. "relatório médico" citado;
Z-y) Tendo-se revelado necessária a aplicação de terapêutica medicamentosa, nomeadamente os medicamentos mencionados na receita médica junta com o requerimento inicial como doc. 9 e no "relatório médico" citado;
Z-z) Nos últimos dias já pouco tem saído de casa, com receio de se cruzar com pessoas conhecidas – depoimento de Rui Hipólito Martins já referido;
Z-z-a) O facto é conhecido entre a população de Constância – depoimento das testemunhas Rui Pires e Margarida Veríssimo, já referidas.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Sendo esta a factualidade dada como assente pela decisão recorrida cumpre, antes de mais, apreciar a invocada nulidade da mesma.
Nas conclusões i) a p) da sua alegação sustenta o recorrente que a sentença recorrida não se pronunciou sobre um dos pressupostos do decretamento da providência cautelar – a ponderação dos interesses públicos e privados em litígio – prevista no nº 2 do artigo 120º do CPTA, sendo que tal omissão encerra em si, não só a violação do preceito constante daquele artigo como também uma omissão de pronúncia, prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPCivil, o que o leva a concluir pela nulidade da sentença.
Vejamos o que dizer.
A concessão de qualquer providência cautelar conservatória no âmbito do contencioso administrativo depende da evidente procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal [artigo 120º, nº 1, alínea a) do CPTA] ou, não sendo caso de evidente ou manifesta procedência da pretensão a formular, desde que a falta de fundamento da mesma não seja manifesta ou não se verifiquem circunstâncias que obstem ao conhecimento do respectivo mérito, e exista fundado receio de constituição duma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente da providência visa assegurar no processo principal [artigo 120º, nº 1, alínea b) do CPTA].
Excluídos os casos de evidente ou manifesta procedência da pretensão a formular, previstos na alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, em que a providência requerida é concedida sem mais, nos restantes casos previstos na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, depois do requerente demonstrar que não é manifesta a falta de fundamento da sua pretensão ou que não se verificam circunstâncias que obstem ao conhecimento do respectivo mérito e que existe fundado receio de constituição duma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que aquele visa assegurar no processo principal, é ainda necessário proceder à ponderação dos interesses públicos e privados em presença, sendo de recusar a concessão da providência sempre que os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que resultariam da sua recusa [cfr. artigo 120º, nº 2 do CPTA].
Porém, como é evidente, essa ponderação só será de efectuar quando os demais requisitos de que depende a providência estejam verificados. Ora, no caso presente, a decisão recorrida concluiu que não estava demonstrado o “periculum in mora”, isto é, entendeu que não ocorria o fundado receio de constituição duma situação de facto consumado ou de produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente e ora recorrente visa assegurar no processo principal. E, sendo assim, não havia necessidade de proceder à ponderação dos interesses públicos e privados em presença.
Em suma, a necessidade de ponderação dos interesses ficou prejudicada pela falta de demonstração de um dos requisitos previstos na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, ou seja, do “periculum in mora”, pelo que ao não proceder a tal ponderação a decisão recorrida não incorreu em omissão de pronúncia e, como tal, não é nula, de acordo com a alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPCivil.
Improcedem, deste modo, as conclusões i) a p) da alegação do recorrente.
* * * * * *
Na conclusão g) da sua alegação defende o recorrente que no tocante aos pontos V) e X) da matéria assente, o tribunal “a quo” não apreciou correctamente os mesmos, pelo que incorreu numa situação de erro de apreciação, sem contudo indicar a norma jurídica que suporta essa alegação.
Porém, e sem prejuízo dessa omissão, sempre se dirá que o artigo 685º-B, nº 1 do CPCivil impõe que quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. Ora, tendo a audiência de julgamento da providência sido objecto de gravação, incumbia ao recorrente indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda para concluir ter ocorrido o apontado erro de apreciação, o que este manifestamente omitiu, pelo que se impõe a imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto vertida nas alíneas V) e X) do probatório.
Improcede, deste modo, a conclusão g) da alegação do recorrente.
* * * * * *
Isto dito, analisemos os demais vícios apontados à decisão recorrida.
Esta considerou que a pretensão do recorrente não era de todo evidente ou manifesta, nomeadamente por considerar que o acto suspendendo não era nulo, como aquele sustentara, por carência de fundamentação ou por preterição da audiência prévia.
Sem esquecer que aqueles concretos vícios apontados ao acto suspendendo não são geradores da respectiva nulidade, mas de mera anulabilidade, não se nos afigura que a decisão recorrida tivesse incorrido em erro de julgamento.
Por um lado, não corresponde à verdade que o despacho suspendendo não estivesse fundamentado. Com efeito, como decorre da matéria de facto dada como assente, o despacho cuja suspensão de eficácia vem requerida foi exarado sobre a Informação nº 15/2009, da autoria do Chefe da Divisão Administrativa da Câmara Municipal de Constância, que consubstancia o relatório sobre a “informatização da Biblioteca Municipal Alexandre O'Neill, em Constância”, no qual se propõe a modernização da aludida biblioteca e se indicam as estratégias para a concretização dessa modernização.
É certo que o despacho suspendendo não explicita porque razão a escolha da pessoa para executar o projecto recaiu no recorrente; porém, não é menos certo – e seguramente o recorrente não o nega – que aquele reunia as qualificações e as competências para levar a cabo tal desiderato: o recorrente era técnico de informática da Câmara Municipal de Constança, com contrato de trabalho por tempo indeterminado e, após a prolação do despacho suspendendo, continuou a ser técnico de informática, com a única diferença que passou a exercer as suas funções noutro local – a biblioteca municipal Alexandre O’Neill –, o qual não deixa de constituir um departamento ou serviço daquela autarquia.
Acresce que também não é evidente a ilegalidade do despacho suspendendo, por não ter ouvido o recorrente antes de ter decidido colocá-lo à frente do projecto de modernização daquele serviço da Câmara Municipal de Constança. Com efeito, como refere a decisão recorrida, o nº 1 do artigo 59º da Lei nº 12-A/2008, de 27/2, que aprovou o regime de vinculação, carreiras e remunerações da função pública, refere que “quando haja conveniência para o interesse público, designadamente quando a economia, a eficácia e a eficiência dos órgãos ou serviços o imponham, os trabalhadores podem ser sujeitos a mobilidade interna, a qual pode ser mobilidade na categoria ou mobilidade intercarreiras ou intercategorias” [cfr. o nº 1 do artigo 60º do RVCR], acrescentando o nº 2 do citado artigo que “a mobilidade na categoria opera-se para o exercício de funções inerentes à categoria de que o trabalhador é titular, na mesma actividade ou em diferente actividade para que detenha habilitação adequada, dentro do mesmo órgão ou serviço ou entre dois órgãos ou serviços” [alínea b) do nº 2 do artigo 59º], e deve ser “sempre devidamente fundamentada” [proémio do nº 2 do artigo 59º] e dispensa o acordo do trabalhador quando “se opere para órgão, serviço ou unidade orgânica situados no concelho do seu órgão, serviço ou unidade orgânica de origem ou no da sua residência” [cfr. alínea a) do nº 2 do artigo 61º do RVCR].
Ora, como resultou indiciariamente provado, a mudança do recorrente deu-se de um serviço da Câmara Municipal para outro serviço da mesma Câmara Municipal, não implicou a mudança de categoria do requerente, que continuou a ser técnico de informática e foi exercer funções que não nega que são funções informáticas [cfr. alíneas Y), Z-a), Z-m), Z-p) e Z-q) do probatório] e que são adequadas à sua categoria.
Para além disso, a decisão recorrida reconheceu ainda que a partir do início do mês de Novembro de 2009 foram aprovadas diversas mudanças internas que visaram adaptar os serviços às exigências resultantes de um novo mandato autárquico. Daí que, no que respeita ao recorrente, as mudanças de que foi destinatário não tinham a virtualidade de lhe causar qualquer prejuízo, já que não interferiram no conteúdo funcional da carreira e categoria em que se encontrava inserido nem tiveram reflexos a nível remuneratório.
O recorrente ficou convencido que tal despacho foi motivado apenas razões de revanchismo político, por ter sido mandatário das listas do Partido Socialista concorrentes à Câmara Municipal de Constância nas eleições autárquicas que vieram a ser ganhas pela lista da CDU e por ter sido o subscritor da comunicação escrita ao Tribunal Judicial de Abrantes, que deu origem ao procedimento eleitoral nº 944/09.4TBABT, e pela qual se denunciava a situação de inelegibilidade do candidato da CDU a presidente da Câmara Municipal de Constância, a qual veio a ser julgada improcedente.
Porém, os factos dados como provados não suportam tal conclusão.
E, não a suportando, nunca a decisão recorrida poderia ter concluído pela existência de fundado receio de constituição duma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente da providência visa assegurar no processo principal [artigo 120º, nº 1, alínea b) do CPTA].
Aliás, é importante sublinhar que ficou indiciariamente provado que o recorrente permaneceu ao serviço no edifício da Biblioteca apenas alguns dias, até que entrou de baixa médica psicológica, o que reforça a ideia de que não existiu nexo de causalidade entre a mudança operada pelo despacho suspendendo e os prejuízos que invoca.
Improcedem, assim, todas as conclusões da alegação da recorrente.

IV. DECISÃO
Nestes termos, e pelo exposto, acordam em conferência os Juízes do 2º Juízo do TCA Sul em negar provimento ao presente recurso jurisdicional, confirmando a decisão recorrida.
Custas a cargo do recorrente.
Lisboa, 14 de Setembro de 2010

[Rui Belfo Pereira – Relator]
[António Coelho da Cunha]
[Fonseca da Paz]