Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:67/04.2 BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:10/28/2021
Relator:SUSANA BARRETO
Descritores:IRC
CUSTOS
INDISPENSABILIDADE
Sumário:I. Nos termos do art.º 23° do CIRC, consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para manutenção da fonte produtora.
II. Serão, assim, indispensáveis, os custos que apresentem conexão com a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto (critério do fim) ou, em alternativa os custos que apresentem conexão com a fonte produtora (critério da fonte).
III. Se a Autoridade Tributária e Aduaneira questionar a indispensabilidade do gasto cabe à contribuinte o ónus da prova da sua qualificação como custo dedutível.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


I - Relatório

A Autoridade Tributária e Aduaneira, não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por L. M. , S.A, contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 1995, n° 1999 8310019246, e respetivos juros compensatórios, no valor total de € 265.218,20, dela veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul.

Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente formula as seguintes conclusões:

A) Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que declarou parcialmente procedente a Impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IRC n° 19998310019246, do exercício de 1995, no montante de € 265.218,20, emitida pela Administração Fiscal nos segmentos das correções efetuadas decorrentes da não aceitação de gastos contabilizados como fornecimentos e serviços externos (artigos de oferta, publicidade e propaganda) e despesas com pessoal referentes a deslocações e estadas no estrangeiro de alguns do seus trabalhadores, por não serem comprovadamente indispensáveis à realização dos proveitos.
B) Relativamente ao segmento da correção referente à Conta 62 - Fornecimentos e Serviços Externos (Ofertas, Publicidade Propaganda) os SIT, no que tange às ofertas desconsideraram os gastos suportados em dois fundamentos, a saber:
- Por um lado (cfr. negrito, expressão que revela um segundo fundamento) na proibição legal vigente à data dos factos e que decorre do disposto nos arts. 9° e 10°, n° 1, do DL 10/1994 de 19 de abril.
- Por outro lado, na não identificação dos destinatários dessas ofertas de modo a comprovar a indispensabilidade do gasto (art. 23° do CIRC) - fundamento que o tribunal a quo simplesmente se dispensou de apreciar.
C) Discordamos da apreciação jurídica que a sentença recorrida fez quando entende que que ofertas realizadas, em 1995, ou seja, há 23 anos atrás, são objetos de valor intrínseco insignificante e que a douta decisão recorrida equiparou de forma ilegal ao conceito de pequeno valor que, à data dos factos (não agora) já custavam em termos absolutos € 15 euros, € 50 e € 75, respectivamente, susceptíveis de valorização tratando-se de serigrafias
D) Não estabelecendo na fundamentação sufragada pelo tribunal a quo uma diferença entre o conceito de pequeno valor e de valor insignificante, pelo que não afastando a aplicabilidade do diploma (pelo contrário) tende a interpretar o conceito de pequeno valor, ao conceito de valor insignificante que o legislador pretende ali aplicar naquele regime legal. Se o legislador pretendesse aplicar o conceito de pequeno valor tê-lo-ia feito, por obediência quanto mais não fosse ao disposto no art. 9°, n° 3, do C.C.
E) A AT não coloca em causa que um gasto foi produzido, as faturas são disso prova. Simplesmente para efeitos fiscais esses mesmos gastos só podem ser considerados se forem indispensáveis no sentido em que, como bem refere o tribunal a quo quando cita o acórdão do Colendo STA, de 29-03-2006 no processo 01236/2005 e a doutrina de António Moura Portugal, o critério da indispensabilidade foi criado pelo legislador para impedir a consideração fiscal de gastos que, ainda que contabilizados como tal, não se inscrevem no âmbito da actividade da empresa tendo sido incorridos não na prossecução daquela mas para interesses alheios.
F) Afirmou-se que “Não estão identificados os destinatários das referidas ofertas, cujos documentos de suporte não contêm a identificação dos destinatários de modo a comprovar a indispensabilidade de tais custos para a formação dos proveitos, de acordo com o estipulado no artigo 23° do CIRC”
G) Sob este prisma a Administração Fiscal está indelevelmente legitimada a corrigir. Sem a identificação dos destinatários não é possível determinar se se trata de uma oferta a um colaborador no âmbito da alegada motivação dos trabalhadores, ou, aos profissionais de saúde no seio da estratégia comercial de divulgação da empresa, ou, se, afinal, estes gastos não terão sido produzidos, por exemplo, para oferta a familiares ou amigos - no que constitui evidente prossecução de outros interesses alheios.
H) A não identificação dos interlocutores conduz-nos até à própria impossibilidade de determinar a própria motivação que está na base do gasto em que se incorreu, se foi no seio da alegada motivação dos trabalhadores ou na estratégia de divulgação da empresa junto dos clínicos. Em consciência, não sabemos
I) Semelhante justificação foi dada relativamente com os gastos contabilizados com a comparticipação em congressos e jornadas médicas, pois que, como foi levado ao probatório, para além de não haver documentação dos participantes a Impugnante entendeu também não apresentar documentação promocional dos eventos (o que naturalmente se estranha à luz do propalado profissionalismo dos quadros com que os autos foram brindados em termos testemunhais), como também não foi disponibilizada documentação que tivesse por objeto trabalhos ou relatórios publicados na sequência desses eventos.
J) Não obstante reconhecer que as faturas indicavam o nome daqueles que presumidamente iriam ser os participantes tendo as mesmas sido emitidas antes das datas dos eventos mais uma vez se fica sem saber quem é que viajou e sobretudo quem participou. E, para participar tinha de ter viajado e logrado apresentar um trabalho ou relatório sobre as matérias aí versadas.
K) Sobre as ofertas está também em causa a impossibilidade de determinar essa indispensabilidade embora neste caso as mesmas estivessem disciplinadas por um regime que as proibia conquanto não fosse para além da noção de valor insignificante.
L) A motivação desnorteada em que assenta a posição sufragada pela Impugnante sobre a indispensabilidade do gasto é cristalina e algo caricata, porquanto depois de em sede inspetiva se ter afirmado que esses congressos e formações são do interesse do próprio participante, o que também coloca em causa a indispensabilidade do gasto - é a própria Impugnante quem vem reconhecer em sede de Reclamação Graciosa de forma perfeitamente impressiva que “Como é óbvio, se as ações não fossem do interesse dos participantes, não teriam comparecido”
M) Ou seja, a Impugnante reconheceu que o interesse era alheio à sua própria actividade, constituindo um interesse de terceiros, nomeadamente, do médico participante, da saúde nacional ou dos portugueses (§ 45, 47 e 48 do articulado apresentado em R.G.), de todos menos daquele que deveria ser em primeira mão o interesse que em termos fiscais suporta a sua dedutibilidade á luz do art. 23° do CIRC, isto é, o interesse da própria Impugnante, o qual não podia passar apenas pela valorização profissional da classe médica
N) Até à apresentação da presente Impugnação Judicial nenhum motivo foi sequer alegado pela contribuinte sobre o interesse da realização deste gasto que suportasse a indispensabilidade, e, se afirma agora a Impugnante que esses eventos eram locais próprios para fazer o lançamento de novos produtos, forçosamente se reforçam as razões não só que legitimaram a correção por parte da AT mas também as razões pelas quais recaía sobre a Impugnante o ónus de provar a indispensabilidade do gasto
O) Nem por isso à Impugnante estavam vedadas as hipóteses de vir contrariar o sentido tomado pelos SIT, bastando que, não o tendo realizado em sede inspetiva, o fizesse no âmbito da Reclamação Graciosa ou mesmo na presente Impugnação Judicial - logrando, assim, colocar em crise os pressupostos da correção.
P) Em termos documentais, a Impugnante nenhuma prova da indispensabilidade desses gastos trouxe. Relativamente às ofertas nenhum colaborador ou clínico foi identificado que as tivesse recebido sendo que a identificação dos eventuais adquirentes nem era tão difícil assim. A quantidade de objetos, apesar de numerosos, ficava longe da impossibilidade da sua identificação. E estranha-se que não tenha sido criada uma lista dos beneficiários destas ofertas, tratando-se de uma Impugnante que se assume como metódica.
Q) Não seria despiciendo que na decisão recorrida se ousasse apreciar a indispensabilidade de gastos com específicos tomos ou volumes da Enciclopédia Luso Brasileira ou da História de Portugal de valor não inexpressivo e sem que os seus destinatários se mostrem identificados. Parece-nos que alguém não identificado andaria a tentar completar a colecção....
R) No que concerne aos congressos e jornadas nenhum clínico foi identificado que neles tivesse viajado e participado, e, nenhuma prova documental das promoções e divulgação de novos produtos foi trazida aos autos e, para o efeito, bastava um documento interno;
S) A Impugnante embandeira a relevância do gasto como contributo para a melhoria da saúde dos portugueses mas depois revela-se incapaz de juntar um relatório técnico do evento que confirme o seu relevo, sequer, um flyer dos eventos.
T) A Fazenda Pública tem vindo a notar uma certa displicência no modo como são apreciados e aceites os depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelos Impugnantes, de que os presentes autos são mais um exemplo, geralmente associados a liquidações adicionais resultantes de um número plural de segmentos da correcção sempre assentes em vários e nem sempre coincidentes fundamentos - quase fazendo acreditar a Ré de que alguém terá trocado os registos fonográficos tão evidente é para este Representante a divergência que retira do teor das declarações que ouviu e a factualidade assente no probatório.
U) Não desconhecemos o labor exaustivo que este tipo de correções provoca na prolação de uma sentença, mas se o que está em causa é a justiça material essa penosidade acrescida não pode ser motivo para aceitar depoimentos prestados de forma abstrata, promovidos pelo próprio mandatário que inicia a sua instância em todos essas declarações desde logo alertando o tribunal para desnecessidade de confrontar a parte e as testemunhas com a prova documental sob o pretexto de que tal torna demasiado fastidiosa a própria inquirição de testemunhas, mas que, das duas, uma: Ou esconde uma inquirição mal preparada, ou, mais grave ainda, procurar camuflar um tipo de depoimentos que de antemão se sabe não terem conhecimento direto dos factos e que impede a busca pela verdade material e o esclarecimento concreto dos autos.
V) A razão de ciência que está por detrás de um depoimento manifesta-se no teor deste - nomeadamente, na convicção de que aquilo que a testemunha relata decorre de algo que viu ou experienciou daí resultando, com naturalidade, uma descrição circunstanciada, concreta e direta dos factos que estão, in casu, na base da sua indispensabilidade, e não da situação que presume ou supõe ter acontecido porque assim era habitual.
W) Não há uma única descrição circunstanciada dos factos prestada em audiência.
X) Valha-nos o facto de, em nosso abono, vermos isso revelado na extensa Motivação da Decisão de Facto enunciada pelo Tribunal a quo, e que sem surpresa constatamos que também ela não alude a um único facto concreto relevante para a questão que aqui cumpria decidir.
Y) A motivação do tribunal a quo neste particular é expressiva, a testemunha J. R., limita-se a dizer que era responsável pela realização de algumas acções de formação para a Impugnante nunca referindo se as mesmas diziam respeito a 1995 ou outro ano qualquer, não há registo sequer que tenha lá estado nessas ações de formação e não identifica uma que em concreto tenha abordado um tema que se recorde - para aquilatar dos destinatários desses eventos
Z) Relativamente às ofertas, o tribunal a quo está convencido que as mesmas foram atribuídas por que a testemunha afirmou que era habitual neste setor de actividade. Trata-se de uma testemunha que afirma não ser colaborador da M. pelo que desconhece a realidade da Impugnante, mas relativamente a ofertas aos trabalhadores ou clínicos que não identifica afirma que "em termos gerais é normal no Natal que as empresas o façam". (cassete 1, lado A, a 130 a 177)
AA) A habitualidade conduz-nos a uma suposição não à prova do facto. O que gostaríamos de saber para efeitos de fixação do probatório era se o foram efetivamente naquele ano e a quem. Não nos interessam as outras empresas, interessava-nos esta em particular. Por outro lado, uma testemunha que não é colaborador da Impugnante não tem o conhecimento mínimo e circunstanciado da sua actividade e das suas práticas motivo pelo qual estamos perante um depoimento prestado de forma geral. Se a testemunha parte de uma presunção naturalmente a sua razão de ciência está inquinada. Não foi com base no que viu, mas no que presume tenha acontecido porque era habitual.
BB) A testemunha M. M. (que aliás a própria sentença o relata como membro da A. no exercício em causa cargo que seguramente terá consumido muito da sua disponibilidade para a tarefa de selecionar os congressos e os médicos a patrocinar) em momento algum relata circunstanciadamente um único congresso que tenha realizado naquele ano. Sequer identifica também aqui o tema. E em momento algum identifica um único clínico participante nesses eventos.
CC) Ora, reportando-nos ao aos congressos e jornadas, forçoso é que nos debrucemos sobre o facto dado por provado em D), questionando a amplitude dada àquele facto porquanto das faturas outra asserção não se retira senão a realização de um gasto naquele montante sem que possamos ter a certeza que alguns dos nomes ali indicados faturas tivesse efetivamente participado nesses eventos, sem certeza da sua deslocação
DD) Os docs. 20, 22, 24, 26, 28 não indicam sequer quem se pressupunha ser o participante; nos doc 21, 27, 30, 33, 35, 37, 38 (composto por 3 documentos/despesas); 39, 41, 42, 43, 49, 51, 54, 55, 56, 58, 59 não há identificação do tema do evento e/ou identificação do próprio congresso e/ou identificação da sua localização. Nos documentos 25 e 53 (2a despesa) falham todos esses elementos.
EE) A primeira despesa do documento 29 causa de resto, perplexidade, pois que apesar de emitida pela agência de viagens (T. T.) respeita não a uma deslocação, mas à mera inscrição do clínico como membro da Academia Europeia de Dermatologia. Ou seja, nem está em causa sequer o gasto com a ida um qualquer evento ou congresso. Não, a própria agência de viagens já passa faturas de quotas para associações europeias sem que isso tenha levantado evidentes suspeitas ao próprio tribunal a quo da indispensabilidade do gasto.
FF) No que concerne ao doc 31 alude-se a um congresso de 05 a 10 de outubro mas a viagem, afirma-se, tem a sua partida a 10 de outubro. Calculamos que o participante já não fosse a tempo do evento. Se é lapso a prova testemunhal poderia ter esclarecido esse facto se lograsse ter conhecimento concreto deste evento, que não tem.
GG) Relativamente ao doc 40 não há sequer evidência de que aquelas despesas tivessem como objeto idas a congressos. O que a fatura demonstra são meras viagens. E a Impugnante entendeu que a prova testemunhal não tinha de esclarecer esta despesa pois que tal se tornaria entediante.
HH) No que concerne às despesas dos doc 54, 56; 60 e 61 nem se alude a um congresso, por sinal a viagem até podia ser pessoal, e a prova testemunhal não logrou esclarecer a justificação deste gasto pois que se optou por não confrontá-la.
II) No que respeita ao doc 58 para além de não se mostrar indicado o eventual motivo da viagem prefigurada não alcançamos sequer de que modo o seguro da viagem constitui um gasto indispensável. Ao douto tribunal a quo nada disto faz espécie.
JJ) Desconhecemos quais os produtos, desconhecemos se efetivamente essa divulgação ocorreu, na maior parte das vezes desconhecemos as datas desses eventos. Porquê? Porque, por um lado, da prova documental que indicámos supra nada resulta, por outro, estando em causa a indispensabilidade da despesa e tratando-se de facto por si alegado impunha-se naturalmente à Impugnante apresentar prova testemunhal que com conhecimento direto lograsse demonstrar o facto que está na base dessa motivação, desse interesse da sociedade. Ora, tal também não aconteceu em virtude do tipo de depoimentos gerais e abstratos prestados pela testemunha M. M. e/ou pelo Legal Representante J. M. com que temos vindo reiteradamente a afirmar.
KK) Sobre os stands de publicidade, de que apenas temos a realização do gasto não houve um único elemento testemunhal que fosse que, com conhecimento direto lograsse confirmar que naquele certame X se recorda de ver lá o colaborados Y a promover produtos Z. Era habitual, supõe-se, pois que era assim.
LL) Sob este prisma as faturas que consubstanciam os docs 23, 29 (na parte referente à ida a Bruxelas), 31, 32, 34, 36, 44, 45, 46, 47, 48, 50, 52, 53 (1a despesa), 62, 63 e 64 (na parte referente às inscrições) a 71, são insuficientes para se dar por provada a indispensabilidade do gasto
MM) Não estará a provada motivação dos trabalhadores, dependente da oferta dos presentes? Não estará a indispensabilidade do gasto em termos promocionais dependente da identificação daqueles determinados elementos? Ou, mais uma vez, basta que o gasto se materialize na fatura para que se presuma a sua indispensabilidade?
NN) Não pode o douto tribunal a quo dar por provado os factos D) e H) se não há uma única testemunha que concreta e circunstanciadamente tenha confirmado ou assegurado que as ofertas foram distribuídas aos funcionários ou aos médicos. Se não há uma testemunha que confirme a existência circunstanciada desses stands promocionais num determinado congresso referente a um determinado tema, ocorrido naquela determinada data, com aquele determinado especialista para promoção daquele determinado produto.
OO) Não pode o tribunal a quo dar por provado que os bens identificados em E) se destinavam aos diversos profissionais de saúde a partir apenas da fatura de fls. 133 dos autos. A fatura quando muito prova o gasto, mas não prova que os bens tivessem aqueles destinatários pois que nem estão identificados.
PP) O douto tribunal não pode estabelecer um nexo causal entre este gasto pois que se desconhece se os mesmos se destinaram aos colaboradores, clínicos ou no âmbito de supostas acções de formação ou divulgação dos produtos não provadas e a eventual subida de ranking da impugnante das empresas nacionais ou o volume de negócios dado por provado (facto K) inexistindo peritagem económica nos autos para além das infindáveis variáveis que terão contribuído para o resultado. Para este efeito não basta as mod 22. Ou as declarações de parte.
QQ) Enuncia o tribunal a quo na sua motivação de facto que a testemunha em relação à formação dos seus delegados de informação médica referiu que a realização da formação fora da empresa tem um forte impacto na motivação. Logrou, porém, apurar se teve? A utilização do tempo verbal presente convoca-nos mais uma vez para a tal habitualidade sem que, concretamente e no tocante a este exercício haja referência a uma única ação de formação, a um tema, a uma data, a um participante identificado, nada.
RR) Quanto à escolha das ofertas refere que a sua escolha era feita por serem marcas nacionais. Mas em 1995 foi assim? Todos estes factos distam sensivelmente 14 anos!!!
SS) J. M., legal representante da Impugnante afirma que a empresa incorreu em gastos com ofertas/brindes e malas destinados aos seus trabalhadores ou clientes. E que as serigrafias foram oferecidas a todos os trabalhadores por ocasião do Natal por haver tradição de oferta de presentes nessa data.
TT) O facto G) também não podia ser dado por provado naqueles termos. Desde logo porque como temos vindo a dizer não há prova direta produzida pela testemunha M. M. ou por J. M. de que os bens ali identificados tivessem sido recebidos pelos funcionários, o que coloca em causa a prova da indispensabilidade do gasto. Semelhante posição sufragamos relativamente ao facto dado por provado F), o qual, também aqui, só podemos dar por provada a realização do gasto em virtude da prova documental recolhida (fatura) nada se provando, mais uma vez, do recebimento dos objetos por parte dos colaboradores, de que depende no entender da Fazenda Pública, a indispensabilidade do gasto, mais uma vez em virtude da ausência da prova direta produzida por J. M. de que os bens ali identificados tivessem sido recebidos pelos funcionários
UU) No que concerne à conta 64 - Despesas com o pessoal, subconta 64706 - Excursões viagens ao Brasil os SIT constataram a existência de uma divergência. Porquê? Porque o gasto contabilizado pela Impugnante com a viagem ao Brasil constitui invariavelmente um rendimento em espécie produzido na esfera patrimonial dos colaboradores que nela participaram. Isto é um facto indesmentível.
VV) Gasto que não teve reflexo na situação tributária dos colaboradores e que, em princípio, se deveria extrair das Mod 3 dos mesmos, relativamente a 1995, desconhecendo-se inclusivamente quem tenham sido os beneficiários desta vantagem e os motivos que estiveram na base da realização do gasto
WW) Os SIT corrigiram este segmento assente na evidência de um gasto, uma viagem ao Brasil para 94 dos seus não identificados colaboradores, sem que lhe tenha sido demonstrado no âmbito daquele procedimento que essa viagem tivesse uma componente de formação.
XX) É certo que a Impugnante alega, sem juntar prova, que a referida viagem visava uma participação alargada na discussão e formação dos seus Recursos Humanos na definição de estratégias e lançamentos de novos produtos, sobre as vendas anuais a atingir e na disponibilização de conteúdos que fomentassem o conhecimento científico indispensável à promoção dos produtos.
YY) Se era assim tão evidente a indispensabilidade do gasto, tantos foram os objetivos, não teria sido difícil, também aqui, que a Impugnante lograsse apresentar o roteiro do evento ou mesmo algum do material didático disponibilizado aos participantes. Note-se que em momento algum durante aquele procedimento a Impugnante logrou enquadrar este gasto como um prémio de produtividade.
ZZ) A Administração Fiscal mais do que legitimada estava obrigada legalmente a corrigir pois que nada lhe foi apresentado que permitisse aceitar o gasto em termos fiscais e saber se a interpretação feita pela Administração Tributária carece em absoluto de fundamento, dependerá de duas premissas fundamentais que a douta 1a instância se dispensou de ponderar.
AAA) Por um lado, colocar-se na posição do inspetor tributário que veste a pele de uma das partes na contenda, e, perante a não demonstração de elementos que justificassem a indispensabilidade do gasto, decidir mediante um juízo de prognose póstuma se teria sido possível seguir o percurso inverso
BBB) A importância que a este tipo de eventos tem sobre o empenho e dedicação dos seus colaboradores nunca foi uma questão alegada em sede inspetiva. Na altura e como já aqui citámos o evento tinha como escopo o fomento do conhecimento científico, a divulgação e lançamento de novos produtos, a definição sobre as performances anuais - nessa altura nunca se alegou sequer que a medida visava motivar ou potenciar a dedicação dos respetivos trabalhadores.
CCC) Não alcançamos sequer donde retira o tribunal a quo a partir da fundamentação do RIT a convicção de que foi a localização do evento o fiel da balança que determinou a desconsideração do gasto.
DDD) Quem pela primeira vez refere que a mencionada viagem não se reduziu a proporcionar uma vantagem patrimonial aos colaboradores foi a Impugnante e é ela quem está onerada com a prova da indispensabilidade daquele gasto.
EEE) Aparentemente o abandono daqueles três objetivos (por via da ausência de prova cabal) e a introdução deste novo motivo em sede de Impugnação Judicial não despertou dúvidas naquele que deve ser o comportamento processual da parte.
FFF) Está pois dado o mote para apreciarmos a segunda premissa a que aludimos em § 107., ou seja, legitimada que está a Administração Fiscal a corrigir nos termos em que o fez impõe-se agora determinar se por parte da Impugnante foi cumprido o ónus de provar a indispensabilidade do gasto.
GGG) O facto I) nos termos em que foi dado por provado foi impugnado pela Administração Fiscal pois que os SIT nunca se convenceram que o gasto incorrido com a viagem ao Brasil se destinasse a uma ação de formação até porque nenhuma prova documental ou outra lhe foi apresentada nesse sentido.
HHH) O que a Administração Fiscal não impugna é que o gasto tenha sido produzido naquele ano com uma viagem ao Brasil. Precisamente porque não viu a despesa como uma ação de formação, mas como uma mera viagem sem motivo justificável - corrigiu-a como sendo um rendimento em espécie proporcionado pelo empregador na sua contabilidade.
III) Bom, mas se o Tribunal a quo parte da premissa e dá por provado que a despesa decorre de uma ação de formação então impõe-se que indique o suporte probatório apresentado pela Impugnante que o logrou convencer-se desse facto. A ação de formação é a pedra de toque que, uma vez provada, permite extrair a indispensabilidade do gasto.
JJJ) Que divulgação ou conhecimento científico foi transmitido àqueles 94 colaboradores naquele evento? Também não sabemos, porquê? Porque mais uma vez nenhum elemento documental foi reunido, e prova testemunhal arrolada pela Impugnante e as declarações de parte por si produzidas caracterizaram-se pela generalidade e abstração.
KKK) A lógica resultante da experiência comum não pode valer, só por si, sobretudo se conduz a um resultado que é desmentido por ausência de prova direta. O tribunal a quo não tem como dar por provada a realização da ação de formação.
LLL) O mesmo se diga do facto dado por provado em J), pois que já não bastava que os depoimentos se mostrassem desprovidos de circunstancialismo e concretização, subimos um degrau e até já o próprio probatório o é.
MMM) Por outro lado este facto J) dá conta desta vez de plurais ações de formação no estrangeiro sem que haja elementos probatórios que o demonstrem, seja no âmbito da ida ao Brasil ou de qualquer outro país, desconhecendo-se se estaremos a abordar o ano 1995, os anos anteriores ou posteriores, tanto mais que relativamente alegadas acções de formação no estrangeiro, só se apurou uma
NNN) Inexistindo elementos probatórios que suportem no que se refere aos factos I) e J) a realização da ação de formação, forçosamente a alegada indispensabilidade do gasto está inquinada, e, impendendo sobre a Impugnante o ónus da prova - o seu não cumprimento contra si reverterá
OOO) Finalmente, e na esteira do que temos vindo a expor entende a Fazenda Pública que os factos E); F) e G) levados ao probatório enunciando-se que as ofertas se destinavam a distribuir, fosse pelos clínicos ou pelos colaboradores exige inclusivamente correcção - pois que não se está a fixar um facto mas a levar ao probatório uma presunção.
PPP) No que tange aos factos E), F) e G) a redação dada a estas alíneas enunciando que as ofertas se destinavam a trabalhadores ou profissionais de saúde introduziu um elemento presuntivo, uma prova suportada na suposição e não na certeza jurídica, brigando com a natureza objetiva que se pretende do próprio probatório.
QQQ) É que se o tribunal presume que as ofertas se destinassem a, mas não apura se efetivamente foram recebidas não há como dar por demonstrada a indispensabilidade do gasto.
RRR) Estamos, pois, no que concerne a este segmento julgado procedente pela decisão recorrida, perante os seguintes erros de julgamento manifestos:
1. - Por um lado incorreta apreciação jurídica resultante do inadmissível recurso ao conceito de pequeno valor pois que aceitando-se, como se aceitou, a aplicação do regime previsto no DL 100/94 de 19 de abril e que constituiu um dos fundamentos da correção o juízo normativo tinha forçosamente de ser realizado à luz do conceito de valor insignificante - pois que foi esse que o legislador previu. E que tendo o mesmo sido largamente ultrapassado bem andaram os SIT ao desconsiderar o gasto, fruto do impedimento legal vigente que impendia sobre a indústria farmacêutica de que aqueles serviços não se podiam alhear à luz do princípio da legalidade.
Pelo que, ofertas e brindes naqueles montantes não poderiam ser considerados gastos dedutíveis quanto mais não fosse pela vigência de um diploma legal que impedia a oferta destes objetos daquele montante. E só por aqui este segmento da correção deve-se manter.
2. Má apreciação do facto dado por provado em D), pois que os factos não podia figurar no probatório nos termos em que o foram, suportados em prova testemunhal e declarações de parte cuja razão de ciência decorre de meras presunções não tendo as mesmas assegurado, com conhecimento direto, que os clínicos que figuram nas faturas de viagens tenham a participado nesses eventos (congressos) ou que as ofertas tenham sido entregues aos destinatários que, aliás, mantém-se não identificados, inexistindo, por outro lado, outro tipo de prova do seu recebimento - ficando por provar a indispensabilidade do gasto, que onerava, nos termos do art. 74° da LGT a Impugnante.
3. - Evidente má apreciação do facto E) porquanto suportado apenas na fatura de fls. 133 dos autos não podia o tribunal a quo dar por provado que os objetos aí identificados se destinavam a ser distribuídos pelos profissionais de saúde. O único facto que em E) se logra demonstrar é a realização do gasto, não o seu destino.
4. - Má apreciação dos factos dados por provados em F) e G) que também não podiam figurar no probatório nos termos em que o foram, pois que os mesmos suportaram-se também aqui em prova testemunhal e declarações de parte cuja razão de ciência decorre de meras presunções não tendo as mesmas assegurado com conhecimento direto que as ofertas tenham sido entregues aos destinatários (colaboradores) que, aliás, mantém-se não identificados, inexistindo, por outro lado, outro tipo de prova do seu recebimento - ficando por provar a indispensabilidade do gasto, que onerava, nos termos do art. 74° da LGT a Impugnante. Também aqui único facto que em F) e G) se logra provar nos autos, por via da fatura de fls. 126 é a realização do gasto, não o seu destino.
5. - Má apreciação do facto dados por provado em H) que não podia figurar no probatório, pois que o mesmo suportou-se mais uma vez em prova testemunhal e declarações de parte cuja razão de ciência decorre de meras presunções não tendo as mesmas assegurado com conhecimento direto que as ofertas foram entregues aos destinatários (colaboradores e clínicos) que, aliás, mantém-se não identificados, inexistindo, por outro lado, outro tipo de prova do seu recebimento - ficando por provar a indispensabilidade do gasto, que onerava, nos termos do art. 74° da LGT a Impugnante.
6. - Má apreciação do facto dado por provado em I) porquanto como decorre dos factos dados por provados nos autos, a AT nunca deixou de impugnar que a viagem ao Brasil tivesse sido realizada no âmbito de uma acção de formação proporcionada a um número plural de colaboradores sem um motivo que comprovadamente justificasse a indispensabilidade da despesa. Precisamente porque não a viu como despesa realizada no seio de uma ação de formação, mas como uma mera viagem sem motivo justificável - corrigiu-a como sendo um rendimento em espécie proporcionado pelo empregador na sua contabilidade.
7. - Má apreciação da prova por ter sido levado ao probatório o facto J), o qual à semelhança dos próprios depoimentos que o suportam mostra-se desprovido de circunstancialismo e concretização bastante donde possa resultar um facto dado por provado.
8. - Má apreciação da prova dos factos E), F) e G) porquanto a redação dada a estas alíneas enuncia que as ofertas se destinavam a trabalhadores ou profissionais de saúde introduzindo um elemento presuntivo, suportado na suposição e não da certeza jurídica, brigando com a natureza objetiva que se pretende do próprio probatório, impondo-se também por este motivo a sua correcção
SSS) A douta sentença ao considerar desconforme à legalidade tributária a correção levada a efeito no RIT nos dois segmentos que enunciámos violou frontalmente o disposto, nos arts. 9° e 10° do DL 100/94 de 19 de abril; do art. 74.° da LGT, e do 23° do CIRC pelo que não pode a sentença deixar de ser revogada e substituída por acórdão que nestes segmentos reconheça a legalidade da correcção julgando parcialmente procedente a presente impugnação judicial, nos termos das conclusões que seguem, aceitando-se a anulação da parte da correcção referente a custos e perdas extraordinárias. Com a reposição dos respetivos juros compensatórios na sua proporcionalidade.

Termos em que, deverá ser considerado totalmente procedente o recurso e revogada a douta sentença na parte em que se recorre, julgando parcialmente procedente a presente Impugnação Judicial.
V/Exas, porém, decidindo, não deixarão de fazer habitual e sã justiça.


A Recorrida, L. M. , S.A, devidamente notificada para o efeito, apresentou contra-alegações, tendo formulado as conclusões seguintes:

A) A Recorrida apresentou, em tempo, impugnação judicial contra o acto tributário de liquidação adicional n.° 1999 8310019246, em sede de IRC, e respectivos juros compensatórios, respeitantes ao exercício de 1995;
B) No âmbito da impugnação judicial, contestou a Recorrida as seguintes correcções técnicas meramente aritméticas:
a. Despesas relativas a Fornecimentos e Serviços Externos, no montante total de Esc. 43.131.373$00, i.e. € 215.138,38;
b. Despesas com Pessoal, no montante total de Esc. 28.959.540$00, i.e. € 144.449,58;
c. Custos e Perdas Financeiros, no montante total de Esc. 952.558$00, i.e., € 4.751,34; e,
d. Custos e Perdas Extraordinários, no montante total de Esc. 18.950.000$00, i.e. € 94.522,20.
C) A Sentença recorrida concluiu pela improcedência da impugnação relativamente às correcções efectuadas pela Administração Fiscal referentes a “Custos e Perdas Financeiros”, no montante total de Esc. 952.558$00, i.e., € 4.751,34;
D) Pelo contrário, decidiu a Sentença recorrida pela procedência da impugnação judicial relativamente às seguintes correcções:
a. Despesas relativas a Fornecimentos e Serviços Externos, no montante total de Esc. 43.131.373$00, i.e. € 215.138,38;
b. Despesas com Pessoal, no montante total de Esc. 28.959.540$00, i.e. € 144.449,58; e,
c. Custos e Perdas Extraordinários, no montante total de Esc. 18.950.000$00, i.e. € 94.522,20.
E) O recurso apresentado pela Fazenda Pública recai exclusivamente sobre a parte da Sentença recorrida que determinou a anulação da liquidação em crise na parte referente às rubricas “Despesas relativas a Fornecimentos e Serviços Externos”, no montante total de Esc. 43.131.373$00, i.e. € 215.138,38, e “Despesas com Pessoal”, no montante total de Esc. 28.959.540$00, i.e. € 144.449,58.
F) Sucede, porém, que o recurso interposto não poderá proceder, desde logo porque a Sentença recorrida não padece dos vícios que vêm imputados pela Recorrente Fazenda Pública, o que obsta à determinação da respectiva revogação;
G) No que se refere às correcções referentes a artigos para oferta, resulta, face à motivação da decisão de facto vertida na Sentença recorrida, na análise das informações e documentação constantes dos autos e do processo administrativo apenso, bem como no depoimento das testemunhas inquiridas, que determinou a matéria de facto levada ao probatório pela Sentença recorrida, nomeadamente nos factos E), F), G) e H) do probatório, que não podia a Sentença recorrida ter decidido de outra forma, pelo que qualificou, e bem, as despesas em questão como custos fiscalmente dedutíveis nos termos do art.° 23.° do Código do IRC e, em consequência, declarou como ilegais as correcções promovidas pela Administração Fiscal;
H) Os serviços de inspecção tributária desconsideraram estes gastos suportados pela Recorrida unicamente com base em dois fundamentos:
a. Não identificação dos destinatários das ofertas de modo a comprovara indispensabilidade do gasto; e,
b. Proibição legal vigente à data dos factos e que decorre do disposto nos artigos 9.° e 10.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 100/94, de 19 de Abril.
I) Sucede que, no que se refere ao primeiro motivo justificativo, omite a Recorrente qualquer referência ao descritivo da documentação de suporte junta aos autos (designadamente os Documentos 8 e 10 da p.i.), considerada pela Sentença recorrida conjuntamente com a prova testemunhal e depoimento de parte, como resulta dos factos F) e G) do probatório, sendo que, ao contrário do que alega a Recorrente, tal documentação de suporte não prova apenas a realização do gasto, mas contém importantes indicadores que, conjugados com a prova testemunhal e depoimento de parte, permitem, com segurança, demonstrar que os artigos em questão foram oferecidos aos trabalhadores por ocasião do Natal de 1995;
J) As ofertas relacionadas com “serigrafias”, bem como os “40 cinzeiros” foram atribuídos aos trabalhadores da Recorrida no Natal de 1995, o que foi confirmado em depoimento de parte por J. B. M., que atestou, com conhecimento directo dos factos, e não com base em meras “presunções” como alega a Recorrente, a ocasião, motivo e os beneficiários das ofertas em questão (cfr. depoimento gravado na cassete áudio n.° 2, lado A, n° 1 a 481);
K) Note-se que, a propósito do desprezo valorativo das declarações de parte, manifestado pela Recorrente, refira-se que esta não apresenta, nas suas alegações de recurso, quaisquer evidências que permitam questionar a imparcialidade, isenção, correcção, serenidade ou ausência de contradições ou hesitações de vulto no depoimento de parte, pelo que não vem questionada a apreciação por parte do Tribunal o quo quando refere, expressamente, que o depoimento de parte mostrou-se credível e esclarecedor no que toca à prática e objectivos comerciais da Recorrida (vide Douto Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 19 de Outubro de 2017 no âmbito do processo de recurso n.° 985/16.5BEALM);
L) A modificabilidade da matéria de facto pelo Tribunal ad quem apenas poderia suceder no caso de as provas produzidas na 1.ª instância imporem decisiva e forçosamente outra decisão diversa da aí tomada (cfr. art.° 662.° do CPC), no entanto, desde logo, a Recorrente não indica as passagens da gravação da prova em que funda essa parte das suas alegações de recurso, nem tão-pouco indica as passagens mais relevantes desses depoimentos que infirmam o entendimento do Tribunal o quo, o que, forçosamente, implica a rejeição da impugnação da matéria de facto, à luz do disposto no art.° 640.°, n.° 2, alínea a), do CPC;
M) Resultando provado que as ofertas foram atribuídas aos trabalhadores, torna-se irrelevante apurar se a oferta foi atribuída ao trabalhador A ou B, revelando-se completamente irrazoável e desproporcional a exigência adicional, por parte da Recorrente, e não acompanhada pelos serviços de inspecção tributária, de prova do recebimento efectivo de tais ofertas pelos trabalhadores (a qual sempre implicaria a necessidade de obtenção, por cada beneficiário, de uma declaração a atestar que recebeu a oferta em questão);
N) Tudo o acima exposto é inteiramente aplicável, sem necessidade de considerações adicionais, à oferta de 11 malas aos delegados médicos da Recorrida para transportarem os produtos para divulgação, sendo que, neste caso, tais artigos consubstanciavam mesmo instrumentos de trabalho, tal como resulta provado através do depoimento de parte (cfr. depoimento gravado na cassete áudio n.° 2, lado A, n° 1 a 481);
O) Assim, revelando-se que as despesas em questão estão devidamente documentadas, e que se traduzem em artigos destinados a serem ofertados aos colaboradores da Recorrida, tal corresponde a um “comportamento, senão generalizado ao menos comum, nas empresas e de que, notoriamente e recorrentemente, dão conta os meios de informação, uma função de cativação/motivação dos respectivos beneficiários, tendo em vista uma melhor e maior rentabilidade da empresa, por via da actuação dos mesmos” (vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 3 de Novembro de 2010, no âmbito do processo de recurso n.° 4014/10);
P) Face ao exposto, não se pode deixar de acompanhar a Sentença recorrida, ancorada na Jurisprudência e doutrina dominante, quando decide que as despesas em questão têm enquadramento no art.º 23.°, n.° 1 do Código do IRC, na medida em que o conceito de “necessidade” e/ou “indispensabilidade” encontra-se preenchido por reporte ao interesse societário do sujeito passivo que pretende qualificar as (determinadas) despesas como custos fiscalmente relevantes;
Q) Igual entendimento deverá recair sobre o facto E) do probatório, relativamente a “ofertas” atribuídas a diversos profissionais da área médica, tendo sido tais ofertas confirmadas também em sede de depoimento de parte, pelo que, ao contrário do que sustenta a Recorrente, tal facto não se deu por provado apenas em virtude da existência da factura que comprova a realização do gasto (cfr. depoimento de parte gravado na cassete áudio n.° 2, lado A, n° 1 a 481);
R) De resto, também a testemunha M. M. M. confirmou que todas as ofertas a profissionais médicos eram por si aprovadas (cfr. depoimento gravado na cassete áudio n.° 1, lado B, n°s 329 a 2148), o que permite concluir que as ofertas ora em análise não foram excepção;
S) Os serviços de inspecção tributária desconsideraram ainda os gastos em questão, com ofertas a trabalhadores e profissionais da área médica, com base num segundo fundamento — i.e., na alegada proibição legal vigente à data dos factos que decorreria do disposto nos artigos 9.° e 10.°, n.° 1 do Decreto-Lei n.° 100/94, de 19 de Abril, no entanto, adere-se integralmente ao entendimento vertido na Sentença recorrida quando afirma que “No caso dos autos, estão em causa ofertas destinadas aos trabalhadores da impugnante (em particular, serigrafias, cinzeiros e 11 malas de trabalho — cfr. alíneas F. e G. dos factos assentes), a que não se aplica a restrição anteriormente referida prevista no Decreto-Lei n° 100/94” (destaque nosso);
T) Assim, quanto muito, apenas aos artigos ofertados levados ao probatório pela Sentença recorrida através do facto E) poderia ser, em abstracto, aplicável a limitação prevista no art.° 10.°, n.° 1, do referido Decreto-Lei n.° 100/94, de 19 de Abril (na redacção original), no entanto, também relativamente a este ponto, resulta evidente o equívoco da Recorrente;
U) Desde logo, improcede o erro de julgamento que vem imputado à Sentença recorrida, na medida em que, ao contrário do que sustenta a Recorrente, o juízo normativo pelo Tribunal o quo sobre o valor das ofertas aos profissionais da área médica foi realizado à luz do conceito de “valor insignificante”;
V) De resto, num primeiro momento, i.e., no relatório da acção inspectiva que fundamenta a liquidação em crise, e, num segundo momento, i.e., em sede de alegações de recurso, a Recorrente nunca se digna a concretizar o que entende por oferta de “valor insignificante”, não se compreendendo qual o juízo ou raciocínio que a leva a concluir que tal valor, indeterminado, foi “largamente ultrapassado” pela Recorrida;
W) Concluindo, não se verifica o erro de julgamento que vem imputado no artigo 153.º, n.° 1 das alegações de recurso da Recorrente, nem tão pouco se verificou uma má apreciação” dos factos dados por provados em E), F), G) e H) do probatório, uma vez que tal matéria de facto foi correctamente julgada em virtude da prova produzida nos autos, devendo, em consequência, ser a Douta Sentença recorrida mantida na integralidade quando julga ilegal a correcção ao gasto suportado pela Recorrida com artigos objecto de oferta;
X) No que se refere às correcções referentes aos custos com a comparticipação em congressos, seminários e jornadas médicas, é possível concluir, face ao relatório de inspecção tributária (cfr. Documento 3 da p.i.), que fundamenta a liquidação em crise, que a Administração Fiscal não colocou em questão que todos os custos foram suportados pela Recorrida com comparticipações em congressos, seminários e jornadas médicas, questionando apenas a essencialidade dos mesmos para a formação dos proveitos nos termos do art.° 23.° do Código do IRC;
Y) Partindo do acima exposto, e bem delimitada a fundamentação subjacente à liquidação em crise, única legalmente admissível, por ser contextual e contemporânea ao acto tributário, bem se compreende que a Recorrida, no âmbito da sua p.i. (artigos 90.° a 129.° da p.i.), tenha, por um lado, contestado as correcções fundadas na exigência formal de apresentação de documentação que não vinha exigida na lei fiscal, e, por outro lado, tenha sustentado a essencialidade dos custos para a formação dos proveitos (artigos 130.° a 141.° da p.i.);
Z) Neste prisma, a afirmação levada ao probatório da Sentença recorrida, no facto D), no sentido de que “Durante o exercício de 2005, a Impugnante suportou custos com viagens e inscrições em congressos e jornadas médicas”, constitui, face ao relatório da acção de inspecção, matéria não controvertida, pelo que bem se compreende que a Sentença recorrida tenha começado por analisar a possibilidade legal de a Recorrida suportar os custos em questão à luz do art.° 9.° do Decreto-Lei n.° 100/94, de 19 de Abril, alterado pelo Decreto-Lei n° 48/99, de 16 de Fevereiro, concluindo no sentido de que devem “as despesas referidas na alínea D. do probatório ser consideradas custos de acolhimento, nos termos previstos nos artigos 9.- e 10.- do Decreto-Lei n.o 100/94”;
AA) Conjugando, por um lado, o facto de a Administração Fiscal, em sede inspectiva, ter reconhecido que todos os custos foram suportados pela Recorrida com comparticipações em congressos, seminários e jornadas médicas, e, por outro lado, considerando o testemunho de M. M. M. (cfr. depoimento gravado na cassete áudio n.° 1, lado B, n°s 329 a 2148), no sentido de que “tinha a seu cargo a selecção de congressos e de médicos a patrocinar. Os congressos eram patrocinados em função dos produtos que a Impugnante produz/comercializa e (...) em todos os congressos tinham stands de vendas de produtos específicos que são objecto de divulgação e promoção”, resulta evidente que bem andou a Sentença recorrida ao considerar que o custo respeita o art.° 23.° do Código do IRC;
BB) O próprio facto de os serviços de inspecção terem reconhecido que estamos perante custos suportados com comparticipações no âmbito de congressos, seminários, jornadas médicas, etc., já seria, por si só, suficiente para estabelecer um juízo de indispensabilidade dos custos em questão nos termos do art.° 23º do Código do IRC, na medida em que estamos perante custos que se integram no circuito económico da Recorrida e relacionam-se com o desenvolvimento da sua actividade, o que se revela ainda mais evidente quando a Recorrente reconhece que a Administração Fiscal, em sede inspectiva, reconheceu que as facturas indicavam inclusivamente o nome dos beneficiários;
CC) Não se revela razoável ou necessário, ao contrário do que sustenta a Recorrente, que a Testemunha M. M. M. tivesse identificado o nome de todos os profissionais (que já constava da maioria dos documentos de suporte dos custos) que participaram nos eventos em questão, bem como os próprios eventos, na medida em que o próprio reconheceu que tinha a seu cargo a selecção dos congressos e médicos a patrocinar, pelo que, necessariamente, a comparticipação dos custos com os eventos realizados em 1995 foram por si aprovados (cfr. depoimento gravado na cassete áudio n.° 1, lado B, nºs 329 a 2148);
DD) Precisamente por considerar que a comparticipação dos custos em questão nestes eventos constituía matéria incontrovertida, a Recorrida limitou a sua impugnação judicial e arrolou prova testemunhal no sentido de demonstrar a essencialidade dos custos em questão nos termos e para os efeitos do art.° 23.° do Código do IRC;
EE) Assim, no que se refere em concreto ao facto D) levado ao probatório, que a Recorrente considera ter sido mal apreciado, haverá que concluir o seguinte:
a. “Durante o exercício de 1995, a Impugnante suportou custos com viagens e inscrições em congressos e jornadas médicas”: tal facto foi reconhecido pela própria Administração Fiscal no âmbito do relatório de inspecção que fundamenta a liquidação em crise (cfr. Documento 3 da p.i.), estando os custos em questão suportados documentalmente;
b. “estando identificados os respectivos eventos e/ou beneficiários das ofertas”: tal resulta da prova documental que, em certos casos, identifica o evento em concreto e, noutros casos, identifica os beneficiários, tendo sido comprovado pela testemunha M. M. M. que todos os eventos patrocinados pela Recorrida foram por si aprovados, tendo procedido igualmente à selecção dos profissionais médicos (cfr. depoimento gravado na cassete áudio n.° 1, lado B, n°s 329 a 2148);
c. Os eventos estavam “relacionados com produtos que comercializa ou produz”: tal resulta comprovado pela testemunha M. M. M., que confirmou que em todos os congressos existiam stands da Recorrida para divulgação e promoção dos produtos (cfr. depoimento gravado na cassete áudio n.° 1, lado B, n° 329 a 2148);
FF) O “novo exercício inspectivo”, ilegal e a posteriori, que a Recorrente realiza em sede de alegações de recurso, não coloca em causa o julgamento de facto e de Direito da Sentença recorrida: do conjunto total de toda a documentação junta à p.i., apenas o Documento 25 não identifica, em concreto, o beneficiário e o evento comparticipado, embora refira que se tratou da comparticipação de congresso em “Hong-Kong”. Neste sentido, face à totalidade das correcções promovidas pela Administração Fiscal, apenas relativamente ao Documento 25, cuja despesa totaliza apenas 100.000$00, i.e. € 498,80, não se identifica o beneficiário e o evento comparticipado, embora se indique o local do congresso;
GG) Acresce ainda que, relativamente às despesas constantes dos Documentos 23, 29 (na parte referente à ida a Bruxelas), 31, 32, 34, 36, 44, 45, 46, 47, 48, 50, 52, 53, 57 e 62, não vem questionado pela Recorrente o facto de a documentação de suporte conter todas as referências que, no seu entendimento, deveriam constar da mesmas no entanto, omite tal facto nas suas alegações de recurso, procurando que, também sobre estas despesas, recaia um juízo de legalidade sobre as correcções efectuadas pela Administração Fiscal;
HH) Como bem se vê, não se verifica qualquer incorrecção no facto D) do probatório quando dá por provado que estão “identificados os respectivos eventos e os beneficiários das ofertas” (destaque e sublinhado nosso);
II) Só perante uma situação de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão é que haverá erro de julgamento; situação essa que, in casu, nunca poderia ocorrer na medida em que não estamos sequer na presença de elementos de prova contraditórios, na medida em que as correcções formuladas pela Administração Fiscal tiveram como fundamento exclusivo a alegada falta de demonstração da essencialidade dos custos em questão, o que, no entanto, foi demonstrado através da produção de prova testemunhal, relevada pelo Tribunal o quo, inexistindo qualquer incorrecção ou erro de julgamento da matéria de facto, em particular do facto D), e, por este motivo, também nenhum erro pode ser imputado à Sentença recorrida quando julga ilegais as correcções promovidas pela Administração Fiscal;
JJ) In casu, atendendo a que o custo em causa teve fins promocionais, o mesmo enquadra-se no conceito de custos nos termos e para os efeitos do art.° 23°, n° 1, do Código do IRC, pelo que neste segmento se deve confirmar a Sentença recorrida, inexistindo qualquer erro de julgamento na fixação bem como na respectiva valoração do probatório assente nos autos;
KK) Por fim, no que se refere às correcções aos “custos com despesas de pessoal”, resulta que, face à matéria de facto dada como provada, e bem, na Sentença recorrida, e considerando especialmente a fundamentação apresentada pela Administração Fiscal no relatório de inspecção tributária, não podia a Sentença recorrida ter decidido de outra forma, pelo que qualificou, e bem, as despesas em questão como custos fiscalmente dedutíveis nos termos do art.° 23° do Código do IRC e, em consequência, declarou como ilegais as correcções promovidas pela Administração Fiscal;
LL) O relatório de inspecção tributária (cfr. Documento 3 da p.i.), que fundamenta a liquidação em crise, determinou que o custo suportado pela Recorrida não poderia alegadamente ser aceite nos termos e para os efeitos do art.° 23º do Código do IRC apenas porque:
a. O custo em questão constituía um rendimento em espécie dos trabalhadores, que deveria ter sido englobado nos seus rendimentos para efeitos de IRS; e,
b. Tal benefício foi em função do vínculo de trabalho existente (nada mais resulta do relatório de inspecção tributária).
MM) Neste sentido, em nenhum momento, em sede inspectiva, colocou a Administração Fiscal em causa que estaríamos perante uma viagem ao Brasil relacionada com uma acção de formação dos colaboradores em questão, limitando-se a afirmar que tal viagem se trataria de um benefício — sem concretizar o porquê (a existência de um vínculo de trabalho não poderá ser considerada justificação suficiente) — que deveria ter sido tributado em sede de IRS, pelo que não o tendo sido o custo não seria aceite nos termos do art.° 23.° do Código do IRC;
NN) Em virtude do exposto, não descortina a Recorrida como poderia o Tribunal a quo ter deixado de considerar, como considerou, e bem, como não controvertido o facto de que “No exercício de 1995, a Impugnante suportou custos com uma acção de formação dos seus delegados de informação médica, no Brasil, no valor de Esc. 28.959.540$00 (€ 144.449,58) (facto não controvertido)” (cfr. facto I) do probatório);
OO) Aliás, se atentarmos à contestação apresentada pela Fazenda Pública a fls. 533 e seguintes dos autos, resulta, de forma cristalina, no artigo 5.°, que a própria Fazenda Pública considerou, em 1.ª instância, que apenas seria controvertida a essencialidade ou indispensabilidade do custo em questão para a formação dos proveitos, não questionando que os custos se referiam a uma acção de formação no Brasil, isto embora, no âmbito do relatório de inspecção, tão-pouco tenha manifestado uma qualquer motivação de facto no sentido de que a correcção era justificada pela falta de demonstração da essencialidade do custo (limitou-se a indicar o art.° 23.° do Código do IRC);
PP) Em nenhum momento das suas alegações de recurso a Recorrente convoca elementos de prova produzidos nos autos que permitam concluir em sentido contrário - e não o faz porque, simplesmente, inexiste qualquer prova produzida nos autos nesse sentido;
QQ) Independentemente da forma da sua contabilização, o que releva, para efeitos do imposto em causa — IRC — é a substância da operação económica, na medida em que foi efectivamente concretizada, no sentido de aferir, a final e para efeitos da consideração enquanto custo fiscal de exercício, se foi indispensável ao exercício da actividade da Recorrida, sendo certo que a demonstração, in casu, de que o custo suportado pela Recorrida consubstanciou, afinal de contas, um complemento remuneratório — remunerações acessórias — sempre impendia sobre a Administração Fiscal, demonstração essa que, como se tem por inequívoco, não foi concretizada;
RR) Sem prejuízo, e como a Recorrida sempre sustentou, ainda que se considerasse que o custo suportado pela Recorrida consubstanciou um “benefício” que deveria ter sido englobado pelos trabalhadores para efeitos de IRS, tal não é motivo legal para a desconsideração do custo nos termos e para os efeitos do art.° 23.° do Código do IRC, pelo que sempre haveria que concluir pela ilegalidade da correcção efectuada pela Administração Fiscal motivada pelo facto de tal alegado “benefício” não ter sido tributado em sede de IRS na esfera dos trabalhadores;
SS) Com efeito, nos termos e para os efeitos do art.° 23° do Código do IRC, o custo em questão apenas poderia ter sido desconsiderado se a Administração Fiscal tivesse alegado, e demonstrado, que o mesmo não se revelava essencial para a formação dos proveitos da Recorrida — o que, em algum momento, em sede inspectiva, logrou alegar ou demonstrar;
TT) Sem prejuízo, a verdade é que a Douta Sentença recorrida não deixou de analisar se, in casu, o requisito da indispensabilidade previsto no art.° 23° do Código do IRC foi demonstrado, concluindo, como não poderia deixar de ser, que “o custo visou o prosseguimento do objecto social da empresa e a manutenção da fonte produtora, pelo que os custos deverão [sic] fiscalmente aceites”;
UU) Com efeito, na medida em que a decisão de suportar tais gastos visou, como reconhece a Sentença recorrida, a formação e motivação dos respectivos trabalhadores da Recorrida, desde logo haverá que reconhecer o “impacto necessário na formação dos proveitos” da Recorrida;
VV) Neste sentido, quando a prova testemunhal, em particular a testemunha M. M. M., atestou, de forma bastante exaustiva e precisa, a importância que todas as acções de formação desenvolvidas pela Recorrida têm no desenvolvimento da sua actividade, é por demais evidente que, ao pronunciar-se sobre todas as acções de formação, pronunciou-se, forçosamente, sobre a acção de formação ora em discussão (cfr. depoimento gravado na cassete áudio n.° 1, lado B, n°s 329 a 2148);
WW) Em função do exposto, entende a Recorrida que inexistiu qualquer erro de apreciação do facto dado por provado em I);
XX) Assim, não merece igualmente censura a Sentença recorrida na parte em que julga procedente, por provada, a impugnação judicial relativamente à rubrica “despesas com pessoal”, em virtude da ilegalidade das correcções promovidas pela Administração Fiscal.

Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, sempre com o mui Douto suprimento de Vossas Excelências, Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Sul, deverá o presente recurso jurisdicional ser julgado improcedente e, em consequência, ser mantida in totum a Douta Sentença recorrida.
Assim se fazendo JUSTIÇA!


O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso jurisdicional.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


II – Fundamentação

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso, sendo as de saber: se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de facto e na aplicação do direito ao considerar parcialmente procedente a impugnação, o que equivale a responder sobre legalidade das correções dos custos (gastos) contabilizados pela impugnante com ofertas, publicidade e propaganda, deslocações e estadas e ações de formação aos trabalhadores e colaboradores.


II.1- Dos Factos

O Tribunal recorrido considerou como provada a seguinte factualidade:

A. A Impugnante, L. M., S.A., tem por objecto o comércio, importação, exportação, expansão, fabrico e armazenagem de produtos químicos, farmacêuticos, cosméticos, produtos dietéticos e produtos de limpeza e conservação - cfr. certidão da Conservatória do Registo Comercial, a fls. 599 dos autos;
B. A Impugnante é também sócia da sociedade "H. – A., Lda.”, sendo esta locadora da quase totalidade das viaturas afectas à actividade comercial da Impugnante - cfr. certidão da Conservatória do Registo Comercial, a fls. 340 a 345 dos autos, conjugado com o contrato de aluguer de automóvel sem condutor, a fls. 359 dos autos, e com o depoimento de parte de B. M.;
C. Na sequência de um processo judicial instaurado pela M. & Co. Inc. contra a Impugnante, em 18.01.1995, as Partes celebraram um "acordo comercial”, com obrigação de a Impugnante suportar, em contrapartida dos lucros cessantes sofridos por aquela, a importância de Esc. 18.950.000$00 (€ 94.522,20), tendo a transacção sido homologada por sentença de 26.01.1995 - cfr. certidão das peças processuais, a fls. 473 a 529 dos autos; acordo comercial, a fls. 441 a 445 dos autos e sentença homologatória, a fls. 530 dos autos, conjugado com os depoimentos da testemunha L. M. G. V. e de parte;
D. Durante o exercício de 1995, a Impugnante suportou custos com viagens e inscrições em congressos e jornadas médicos, estando identificados os respectivos eventos e/ou beneficiários das ofertas, relacionados com produtos que comercializa ou produz (cfr. docs. 20 a 71 juntos aos autos com a p.i., a fls. 199 a 335 dos autos, que se dão por reproduzidos, conjugado com os depoimentos da testemunha M. M. e de parte);
E. Em Maio de 1995, a Impugnante adquiriu à O. R. 3 caixas pena "D. Fernando”, no valor unitário de 3.500$00, 40 caixas lobo "D. Fernando”, no valor unitário de 15.000$00, e 40 frascos ourique "D. Fernando”, no valor unitário de 10.100$00, destinadas a distribuir por diversos profissionais da área médica (cfr. factura, a fls. 133 dos autos, que se dá por reproduzida);
F. Em Outubro de 1995, a Impugnante adquiriu 11 malas/pastas, no valor de 119.850$00, destinadas aos delegados de informação médica que se deslocavam às farmácias, para transporte dos medicamentos ou produtos objecto de divulgação (cfr. factura, a fls. 126 dos autos, que se dá por reproduzida, conjugado com o depoimento de parte);
G. No Natal de 1995, a Impugnante adquiriu 200 serigrafias, no valor unitário de 4.950$00, e 40 cinzeiros, no valor unitário de 6.850$00, para celebrar a meta de 1 milhão de contos de facturação, destinados a oferta aos respectivos funcionários (cfr. facturas e fotografias das peças, a fls. 121, 124, 128 e 131 dos autos, que se dão por reproduzidas, conjugados com os depoimentos da testemunha M. M. e de parte);
H. A oferta dos presentes, referidos nas alíneas E. e G. supra, visava motivar os trabalhadores (cfr. depoimento da testemunha M. M. e de parte);
I. No exercício de 1995, a Impugnante suportou custos com uma acção de formação dos seus delegados de informação médica, no Brasil, no valor de Esc. 28.959.540$00 (€ 144.449,58) (facto não controvertido);
J. A realização das acções de formação no estrangeiro visa reforçar o sentido de trabalho em equipa e a valorização dos recursos humanos da Impugnante (cfr. depoimentos das testemunhas J. R. e M. M. e de parte);
K. Nos anos de 1992 a 1998, a evolução dos investimentos em publicidade e propaganda e do volume de negócios da Impugnante foi de:

(cfr. modelos 22 dos respectivos exercícios, juntas como docs. 14 a 19 dos autos, a fls. 145 a 198 dos autos, que se dão por reproduzidas; facto não impugnado);

L. Em cumprimento da ordem de serviço n.° 29021, emitida em 20.07.1999, os Serviços de Inspecção Tributária (SIT) da Direcção de Finanças (DF) de Lisboa realizaram uma análise interna à Mod. 22 de IRC, relativa ao exercício de 1995, da qual resultaram correcções aritméticas ao resultado fiscal declarado, no valor de 91.993.471$00 - cfr. ordem de serviço, a fls. 661, e ofício, a fls. 663 do PAT apenso;
M. Na sequência da análise efectuada, os SIT concluíram, nomeadamente, o seguinte:





Imagens: original nos autos

- cfr. conclusões da acção inspectiva, a fls. 84 a 104 dos autos, que se dão por reproduzidas;

N. Em 19.11.1999, foi emitida a liquidação adicional de IRC n.° 1999 8310019246, relativa ao exercício de 1995, no valor de 33.117.650$00, acrescida de 16.742.061$00, de juros compensatórios - cfr. nota de liquidação, a fls. 106 dos autos;
O. Em 28.03.2000, a Impugnante deduziu reclamação graciosa contra a liquidação adicional de IRC referida na alínea antecedente, invocando, em suma, que os custos incorridos foram indispensáveis à formação dos respectivos proveitos e juntou documentos - cfr. reclamação, a fls. 2 a 210 do PRG apenso;
P. Por despacho do Director de Finanças Adjunto da DF de Lisboa, de 04.12.2003, foi indeferida a reclamação graciosa apresentada, essencialmente, com os fundamentos seguintes: falta de indicação de quem foram os beneficiários das ofertas; falta de prova da indispensabilidade dos custos; falta de aceitação de custos não devidamente documentados; e falta de credibilidade do documento que titula a despesa no valor de 18.950.000$00, referente ao acordo com a M. (cfr. despacho e informação, a fls. 234 a 241 do PRG apenso, que se dão por reproduzidos).


Quanto a factos não provados, na sentença exarou-se o seguinte:

Não se provou que:
- A Impugnante, no ano de 1995, efectuou suprimentos à sociedade "H.-, Lda.”.

E quanto à Motivação da Decisão de Facto, consignou-se:

A decisão da matéria de facto foi realizada com base na análise das informações e dos documentos, constantes dos autos e do PAT apenso, não impugnados, e no depoimento das testemunhas inquiridas, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.
J. R., professor universitário responsável pela realização de algumas acções de formação para a Impugnante, referiu que, para efeitos de formação, a mudança de ambiente é positiva e que as ofertas que a Impugnante atribuiu aos seus clientes ou trabalhadores eram habituais neste sector de actividade.
A testemunha M. M. M., médico, director médico da Impugnante desde 1990, e membro da A., entre 1994 e 1999, frisou que tinha a seu cargo a selecção de congressos e de médicos a patrocinar. os congressos eram patrocinados em função dos produtos que a Impugnante produz/comercializa e afirmou que, em todos os congressos, tinham stands de vendas de produtos específicos que são objecto de divulgação e promoção. Realçou igualmente que, não só em Portugal, mas mesmo a nível internacional, a formação pós-graduada médica tem ficado a cargo da indústria farmacêutica. Em relação à importância desta estratégia empresarial, sublinhou que, quando entrou na empresa, a mesma ocupava o 93.° lugar no ranking das empresas nacionais e hoje ocupa o 13.° lugar (sendo o 2.° maior laboratório nacional) e, durante mais de 10 anos, foi das empresas com maior índice de crescimento, tendo a realização destas despesas uma clara relação com o crescimento da sua actividade comercial. Em relação à formação dos seus delegados de informação médica referiu que a realização de formação fora da empresa tem um forte impacto na motivação.
Quanto às ofertas, disse que a sua escolha era feita por serem marcas nacionais de referência.
J. B. M., no seu depoimento de parte, esclareceu que, à data, a empresa tinha uma facturação de aproximadamente 2.700.000.000$00 e que a Impugnante investiu 2.200.000$00, em ofertas/brindes destinados aos seus trabalhadores ou clientes, ou seja, inferior a 1/1000 do rácio de negócio. Referiu que as serigrafias foram oferecidas a todos os trabalhadores, por ocasião do Natal, por haver a tradição de oferta de presentes nessa data, e que foram oferecidos cinzeiros, quando se atingiu um marco histórico na facturação da empresa, e que essa oferta se destinou aos trabalhadores responsáveis por essa área de negócio. Em relação às malas, afirmou que eram malas de trabalho destinadas aos delegados que se deslocavam às farmácias, sendo as mesmas um instrumento de trabalho, considerou que as mesmas deviam estar classificadas como material de consumo corrente e não como oferta. Frisou ainda que estas ofertas visavam motivar os trabalhadores e contribuíram para os melhores resultados da empresa, tendo esta multiplicado o volume de negócios 6 vezes. Explicou também o contexto do acordo comercial com a M. e a razão pela qual foi contabilizado como custo o valor acordado como compensação.
A testemunha, L. M.. G. V., na qualidade de advogado que elaborou a oposição à providência cautelar instaurada pela M. contra a Impugnante, esclareceu que o acordo comercial, para além do reconhecimento da violação da patente e do acordo comercial, consagrava o pagamento de uma indemnização e que este acordo não foi junto à transacção homologada em Tribunal para protecção do segredo comercial.
Os depoimentos das testemunhas inquiridas e de parte mostraram-se credíveis e esclarecedores no que toca à prática e objectivos comerciais da Impugnante, sendo o último depoimento da testemunha consistente quanto à matéria da relevância do acordo comercial com a M.
No que se refere à matéria de facto não provada: Não ficou provado que a Impugnante tenha realizado suprimentos à H., uma vez que o extracto de conta, junto como doc. 72 com a p.i. (a fls. 337 dos autos), não comprova esse movimento. Note-se que no seu depoimento de parte, J. B. M., referiu que as instituições bancárias preferiam conceder empréstimos à M., uma vez que a H. não tinha o mesmo nível de facturação, mas não tendo sido evidenciado, através de documentos da contabilidade, a realização de suprimentos e o seu montante, não pode a convicção do Tribunal, quanto à falta de prova desse facto, ser alterada.


II.2 Do Direito

A ora Recorrida veio impugnar junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra a liquidação adicional nº 19998310019246, de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) e respetivos juros compensatórios, respeitantes ao exercício de 1995.

Alega a Recorrente que a sentença recorrida, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial, incorreu em erro de julgamento na apreciação da matéria de facto e de direito, por a Autoridade Tributária e Aduaneira ter reunido indícios a seu ver suficientes para se concluir que os custos incorridos e relativos a fornecimentos e serviços externos, despesas com pessoal e custos e perdas extraordinários não eram indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Na verdade, quando impugna a matéria de facto, a Recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição do recurso [artigo 640º, n.º 1, alíneas a) a c) e n.º 2, alínea a) do CPC, aplicável ex vi artigo 281º CPPT], cabendo à Recorrente especificar:

a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas quanto aos indicados pontos da matéria de facto.

Todavia, quando os meios de prova invocados como fundamento do erro na apreciação das provas que tenham sido gravadas, incumbe à Recorrente, transcrevê-las ou indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso [artigo 640/2.a) CPC].

Contudo, lidas as alegações e conclusões de recurso apresentadas pela Recorrente, apenas no ponto 56 e na conclusão Z) é que a Recorrente indica a passagem da gravação em que funda a sua discordância.

Em contraponto, a Recorrida, nas contra-alegações e em defesa da sentença recorrida nos pontos 35º, 57º, 64º, 65º, 117º, 119º, 146º, 148º, 155º, 163º, 168º, 176º, 178º e 260º e nas conclusões J), N), Q), R), AA), CC), EE) e VV) identifica concretamente as passagens da gravação dos depoimentos ouvidos.

Atentas as alegações de recurso, verifica-se que a FP se insurge contra os factos D), E), F), G), H), I) e J).

Destes, à exceção dos factos E) e I), todos se fundam em prova testemunhal e, em alguns casos, simultaneamente em prova documental.

Com efeito, o facto levado ao probatório sob a alínea D), relativo aos custos suportados pela Impugnante, ora Recorrida, com viagens e inscrições em congressos médicos, remete para os juntos aos autos com a pi (docs. 20 a 71 a fls. 199 a 335 dos autos) que foram dados por reproduzidos, conjugado com os depoimentos da testemunha M. M. e de parte.

Nas conclusões CC) e NN) das alegações de recurso, a Recorrente não indica as passagens da gravação em que se funda o seu recurso.

Ao invés, nas conclusões das contra-alegações a Recorrida, na conclusão AA) CC), EE) e VV) remete para o depoimento gravado na cassete áudio n.° 1, lado B, nºs 329 a 2148.

Na alínea F) dos factos provados, respeitante à aquisição de malas/pastas, destinadas aos delegados de informação médica que se deslocavam às farmácias, para transporte dos medicamentos ou produtos objeto de divulgação, remete para a fatura a fls. 126 dos autos, conjugado com o depoimento de parte.

Nas alíneas G) e H) dos factos provados, conferidas com as faturas e fotografias das peças, a fls. 121, 124, 128 e 131 dos autos, que se dão por reproduzidas, conjugados com os depoimentos da testemunha M. M. e de parte.

Das alegações e conclusões TT), OOO), PPP) e QQQ) do recurso, verifica-se que a Recorrente não cumpriu o ónus probatório que sobre si recaía, não identificando as passagens da gravação em que se funda o seu recurso.

Enquanto nas conclusões J), N), Q), R) das contra-alegações de recurso, a Recorrida identifica as passagens do depoimento: gravado na cassete áudio n.° 2, lado A, n° 1 a 481.

Relativamente à alínea J) em que foi dado como provado com base nos depoimentos das testemunhas J. R. e M. M. e de parte [cf. conclusões de recurso GGG), MMM) e NNN)], a Recorrente procura abalar a credibilidade do testemunho mas não indica as passagens da gravação que pretende ver analisadas.

Conclui-se que assim, que a Recorrente não cumpriu o ónus probatório que sobre si recaía, limitando-se a remeter, em bloco, para o depoimento das referidas testemunhas.

Assim, não tendo sido cumpridos os ónus que sobre a Recorrente mais não resta que rejeitar o recurso da Recorrente nesta parte, com a exceção anotada.

Como vimos, o tribunal a quo, na sua apreciação, baseou a sua convicção nos documentos juntos e nos depoimentos das testemunhas.

E, desde já adiantaremos que o reexame das provas produzidas não conduz a qualquer outro resultado que não o apurado, quando analisadas em conjunto com a demais prova.

Insurge-se a Recorrente com a valoração que foi feita da prova testemunhal, mas são argumentos de mera discordância em relação ao que foi decidido, e que não são, por si só, suficientes para abalar o julgamento da matéria de facto feito na sentença recorrida.

Aliás, os factos dados como provados com base na prova testemunhal são, quase todos eles, atinentes às estratégias e opções empresariais da Impugnante, ora Recorrida, enquadrada com os documentos juntos aos autos.

Relativamente às declarações de parte, que têm que apreciadas com sentido crítico e algum cuidado, por serem prestadas por quem tem interesse no desfecho da ação, esta foi atendida com o auxílio aos demais meios probatórios, no caso documental.

O mesmo se diga, mutatis mutantis, sobre os depoimentos indiretos, porquanto relativos às práticas empresariais habituais naquele setor de atividade. Não se destinaram a comprovar um facto direta e pessoalmente apreendido pela testemunha, nem como tal foram valorados.

Diz a Recorrente na conclusão Z): relativamente às ofertas, o tribunal a quo está convencido que as mesmas foram atribuídas por que a testemunha afirmou que era habitual neste setor de actividade. Trata-se de uma testemunha que afirma não ser colaborador da M. pelo que desconhece a realidade da Impugnante, mas relativamente a ofertas aos trabalhadores ou clínicos que não identifica afirma que "em termos gerais é normal no Natal que as empresas o façam".

Aliás, rigorosamente, não identifica a que facto se refere, quando, em termos de fundamentação, o depoimento da referida testemunha apenas foi indicado pelo tribunal a quo relativamente ao facto J), facto que nada tem a ver com a questão das ofertas.

Por fim, quando a Recorrente se insurge contra os factos dados como provados e enumera os documentos olvida que na motivação da matéria de facto o tribunal remete para o depoimento das testemunhas, cuja impugnação foi já rejeitada por incumprimento dos ónus que sobre si impendiam, com exceção dos factos levados ao probatório sob as alíneas E) e I).

Todavia, quanto a este a Recorrida, nas contra-alegações faz referência ao depoimento das testemunhas, com eficácia e suficiência, indicando concretamente as passagens da gravação dos depoimentos ouvidos que permitem concluir que as caixas e os frascos adquiridos se destinaram a distribuir por profissionais da área médica.

Ou seja, atenta a prova documental, complementada pela prova testemunhal, indefere-se o requerido quanto ao facto E).

Quanto ao facto I), refere a Recorrente: os SIT nunca se convenceram que o gasto incorrido com a viagem ao Brasil se destinasse a uma ação de formação até porque nenhuma prova documental ou outra lhe foi apresentada nesse sentido.

O referido facto contém a seguinte formulação:

No exercício de 1995, a Impugnante suportou custos com uma ação de formação dos seus delegados de informação médica, no Brasil, no valor de Esc. 28.959.540$00 (€ 144.449,58) (facto não controvertido).

Ora, como resulta do RIT, não é questionado que os custos foram suportados, questionando-se apenas a respetiva indispensabilidade.

Como tal, também nesta parte se indefere o requerido.

Em face do exposto, improcede também o recurso de impugnação da demais matéria de facto.

Estabilizada a matéria de facto, passemos agora à apreciação do erro de julgamento.


Em causa nos presentes autos está a liquidação adicional de IRC, emitida na sequência de procedimento de inspeção externa, que corrigiu o lucro tributário declarado no exercício de 1995.

A Recorrente não se conforma com a sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial, relativamente aos gastos relativos a ofertas, publicidade e propaganda, deslocações e estadas e ações de formação aos trabalhadores e colaboradores da empresa por, no seu entendimento, não se verificar relativamente a eles o requisito da indispensabilidade e ainda por os encargos não estarem devidamente documentados. Considera, em suma que a sentença errou quanto ao ónus da prova das partes, em matéria de desconsideração fiscal de custos.

A Impugnante, ora Recorrida, dedica-se ao comércio de importação, exportação, expansão, fabrico e armazenagem de produtos químicos, farmacêuticos, cosméticos, produtos dietéticos e produtos de limpeza e conservação [cf. alínea a) dos factos provados].

O artigo 23º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) dizia: consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para manutenção da fonte produtora (…).

Define, assim, de forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efetuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva e procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo.

Serão, assim, indispensáveis, os custos que apresentem conexão com a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto (critério do fim) ou, em alternativa os custos que apresentem conexão com a fonte produtora (critério da fonte).

Sobre o conceito de indispensabilidade transcrevemos o seguinte excerto tirado do Acórdão do Pleno da Seção do CT, de 2018.06.27, Proc. nº 01402/17, disponível em www.dgsi.pt, com o qual concordamos:

Como ficou exarado no Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 28.06.2017, proferido no recurso 627/16, «no entendimento que a doutrina e a jurisprudência têm vindo a adoptar para efeito de averiguar da indispensabilidade de um custo (cfr. art. 23.º do CIRC na redação em vigor em 2001), a AT não pode sindicar a bondade e oportunidade das decisões económicas da gestão da empresa, sob pena de se intrometer na liberdade e autonomia de gestão da sociedade.
Assim, um custo ou perda será aceite fiscalmente caso, num juízo reportado ao momento em que foi efetuado, seja adequado à estrutura produtiva da empresa e à obtenção de lucros, ainda que se venha a revelar uma operação económica infrutífera ou economicamente ruinosa, e a AT apenas pode desconsiderar os que não se inscrevem no âmbito da atividade do contribuinte e foram contraídos, não no interesse deste, mas para a prossecução de objetivos alheios (quando for de concluir, à face das regras da experiência comum que não tinha potencialidade para gerar proveitos)» - neste sentido vide também os Acórdãos Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo de 30 de Novembro de 2011, recurso n.º 107/11, e de 24.09.2014, recurso 779/12.

Assim e como tem sido decidido por este TCAS, o juízo de comprovada indispensabilidade é um juízo casuístico que deve ser efetuado subjetivamente, pois só analisando em concreto cada gasto poder-se-á aferir da respetiva indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora – cf. nomeadamente Ac. TCAS de 2021.07.08, Proc nº 311/03.3BTLRS, de 2020.12.16 e de 2016.03.17, Proc nº 07451/14.

Vejamos, pois, no caso em análise e no que respeita às correções relativas a despesas ou gastos com ofertas e publicidade e propaganda.

Anote-se que a Recorrente não colocou em causa a efetividade do gasto, mas defende, em suma, não se verificar, quanto a eles, o requisito da indispensabilidade e ainda que não sendo possível identificar os beneficiários das ofertas estes gastos não podem ser aceites, e não devem ser considerados.

Relativamente ao primeiro dos temas indicados, verifica-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira, ora Recorrente, entendeu, em suma, que uma vez que não foi possível identificar os beneficiários das ofertas, não poderão os gastos em questão ser aceites, nos termos do artigo 23.º do CIRC.

Ora, tendo em conta o objeto social da Impugnante, ora Recorrente, afigura-se-nos em abstrato inquestionável que as despesas efetuadas com ofertas – deslocações a Congressos e com bens ofertados a médicos constituem atos típicos da atividade empresarial desenvolvida e potencialmente geradora de proveitos – nesse sentido v.g. acórdãos TCAS de 2021.10.14, Proc. nº 09792/16.4BCLSB.

Estes custos, no montante global de PTE 43 131 373$00, foram contabilizados pela Impugnante, ora Recorrida, na conta 62, nas rúbricas 62218 – ofertas e 62233 – Publicidade e Propaganda [cf. alínea M) dos factos provados].

Nas conclusões DD), EE), FF), GG) HH) e II) defende a Recorrente que os documentos juntos pela Impugnante, ora Recorrida, não deveriam ter sido aceites sem crítica na decisão recorrida. Assim:

- Os doc. juntos sob os nº 20, 22, 24, 25, 26 e 53 não identificam o participante, ou o congresso ou jornada médicos (doc. nº 39, 41, 42, 43, 49, 51, 54, 55, 56, 58, 59).
- O doc. junto sob o nº 29, diz respeito à mera inscrição do clínico como membro como membro da Academia Europeia de Dermatologia.
- O doc. junto sob o nº 31 refere como data de partida o último dia de duração do evento;
- Os doc. juntos sob os nº 40, 54, 56, apenas referem os gastos com viagens, não referenciando qualquer congresso ou jornada;
- O doc. junto sob o nº 58 para além de não se mostrar indicado o eventual motivo da viagem prefigurada não alcançamos sequer de que modo o seguro da viagem constitui um gasto indispensável.

Efetivamente, e como alega, os documentos juntos pela Impugnante sob os números 20, 22, 24, 25, 26, 39, ou não identificam o participante e seriam, por si só, insuficientes para comprovar o respetivo custo, mas tal falta/omissão foi complementada pela prova testemunhal, que não foi impugnada com eficiência.

No caso do pagamento do seguro de viagem por não se relacionar diretamente com o conceito de participação em congressos realizados no estrangeiro, seminários, viagens e despesas com alojamento, defende a Recorrente que não deve ser admitido como custo do exercício. Não estamos tão certos que assim seja, pois algumas destas viagens estão condicionadas à subscrição do seguro de viagem pelo participante.

Depois, este argumento não consta do relatório de inspeção tributária para desconsiderar o gasto e não pode agora ser considerado.

Quanto aos demais está identificado o beneficiário, a data da viagem ou de que se trata de participação em congresso ou jornada médicas.

Já relativamente aos documentos juntos sob o nº 29, considerados globalmente, referem efetivamente uma inscrição, mas além de identificar o beneficiário indicam também o evento: Congresso da EADV em Bruxelas.

Anote-se aqui que se trata de empresa obrigada a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial (cf. artigos 29 a 31º do Código Comercial) e fiscal (cf. artigo 98 do CIRC), a qual permita o controlo do lucro tributável. E é sobre o contribuinte impende o dever de documentação das despesas ou gastos e da sua apresentação quando exigido.

Ora, se é certo que a Impugnante, ora Recorrida goza da presunção de veracidade da contabilidade (artigo 75/1 da LGT), também é verdade que se a Autoridade Tributária e Aduaneira questionar essa indispensabilidade passa a caber ao contribuinte o ónus da prova da sua qualificação como custo dedutível.

Improcede, pois, o recurso, nesta parte.


Já quanto aos custos suportados com ofertas, desde já adiantaremos que não tem razão a Recorrente.

Apesar de não estarem perfeitamente identificados os beneficiários das ofertas a Impugnante, ora Recorrida, convenceu sobre os fins a que se destinavam, devendo as despesas constantes das referidas alíneas do probatório ser consideradas custo de acolhimento, nos termos previstos nos artigos 9.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 100/94, na redação do Decreto-Lei n.º 48/99, citados e transcritos na decisão recorrida.

Com efeito, além do referido pelas testemunhas que ouvimos, o próprio relatório dos SIT refere que se trata de brindes, acompanhados de folhetos e etiquetas.

Relativamente às serigrafias que foram oferecidas aos trabalhadores e colaboradores da empresa por altura do Natal e da aquisição de malas que se destinavam aos delegados de propaganda médica para transportarem o material promocional dos produtos que comercializa, discorda a Recorrente da contabilização que foi feita, por em seu entender não se tratar de objetos de pequeno valor, não pondo, porém, em causa que correspondam a ofertas de acordo com os usos comerciais.

Relativamente ao valor das serigrafias, não alega que no momento da compra não correspondessem a objetos de pequeno valor, mas pondo antes a tónica numa possível, hipotética e futura valorização, insuficientes para, por si só, afastarem a dedutibilidade do gasto. Aliás, o relatório de inspeção elaborado não especifica o que se deve entender por objetos de valor insignificante.

Ora, estes custos têm que ser havidos numa perspetiva de estimulo aos trabalhadores e para aumentar a produtividade da empresa e no caso das malas, liga-se diretamente com a imagem comercial e promocional da empresa, por se relacionarem diretamente com a representação e o prestígio que projetam os trabalhadores ao seu serviço e porque serviam para transportar os folhetos e amostras dos produtos por esta comercializados.

Por se relacionar diretamente com a imagem que a empresa pretende projetar junto do seu público alvo consideramos que a despesa com a aquisição de malas tem de ser havida como custos de marketing inerentes ao normal desenvolvimento da sua atividade principal.

Agora, quanto ao custo suportado com ações de formação dos trabalhadores e colaboradores da empresa.

Em abono da sua tese defende a Recorrente, em suma, que se trata de gasto que constitui um rendimento em espécie produzido na esfera patrimonial dos trabalhadores e colaboradores que nele participaram e que a Impugnante, ora Recorrida, não fez prova que essa viagem tivesse uma componente de formação.

Todavia, mesmo a acolher-se a tese da Recorrente, de se trata antes de um prémio de produtividade aos trabalhadores e colaboradores, não poderia, ainda assim, ser desconsiderado como custo da empresa dado tratar-se de custos relativos à mão-de–obra ou com regalias adicionais aos trabalhadores da empresa, que não podem, sem mais ser desconsideradas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, por ser uma opção livre do empresário Ac. STA, 2ª Secção, de 2006.03.06, Proc. nº 01236/05 (Rel. Conselheiro Baeta de Queirós) disponível em www. dgsi.pt:
I – Constituem custos fiscalmente dedutíveis, para efeitos do disposto no artigo 23º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, os pagamentos feitos a restaurantes por uma empresa de construção civil como contrapartida do fornecimento de refeições tomadas por trabalhadores seus que desloca para obras situadas em vários locais.
II – O facto de a empresa pagar aos mesmos trabalhadores subsídio de refeição não configura uma duplicação de custos capaz de afastar a dedutibilidade das despesas feitas nos restaurantes.. Do Ac. STA, 2ª Secção, de 2006.03.06, Proc. nº 01236/05, transcreve-se o seguinte excerto:

Assegurar a estabilidade da relação de emprego; prestigiar-se perante a clientela e a concorrência … para isso, [oferecendo] melhores condições de trabalho e retribuição do que aquelas a que está imperiosamente obrigado …, se o empresário fizer esta opção, [age por motivos] atinentes à remuneração do fator produtivo trabalho… como assim, assente a sua qualificação como gasto incorrido para a realização dos proveitos e para a manutenção da fonte produtora, de acordo com o explanado, impõe-se a sua dedução: as despesas em causa foram suportadas pela impugnante, no seu interesse, desde logo porque na aquisição de um fator de produção, sem que se evidencie que a sua assunção configure um ato de gestão desajustado à obtenção dos ganhos Id..


Assim sendo, não tendo sido colocado em causa que se trata de custo efetivamente suportado pela empresa, para desconsiderar o custo não bastava, como se verteu no relatório dos SIT, que o rendimento em causa não foi tributado na esfera dos trabalhadores que dele beneficiaram.

A Recorrente nada provou em sentido contrário, sendo certo que a contabilidade da Recorrida, como vimos já, goza da presunção de veracidade que não foi abalada.

Considerando a importância que reveste para as empresas, de acordo com as regras de experiência comum, o investimento em formação profissional, não é, pois, por si argumento bastante para o desconsiderar como custo fiscal o não ter sido tributado em sede de IRS.

Não há, pois, razão para não aceitar fiscalmente tais custos.

Em face do exposto, a sentença recorrida não merece, pois, a censura que lhe foi feita e fez uma correta apreciação dos factos e do direito.

Improcede, pois, o recurso.


Sumário/Conclusões:

I. Nos termos do art.º 23° do CIRC, consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para manutenção da fonte produtora.
II. Serão, assim, indispensáveis, os custos que apresentem conexão com a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto (critério do fim) ou, em alternativa os custos que apresentem conexão com a fonte produtora (critério da fonte).
III. Se a Autoridade Tributária e Aduaneira questionar a indispensabilidade do gasto cabe à contribuinte o ónus da prova da sua qualificação como custo dedutível.


III - Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da 2ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente, que decaiu.

Lisboa, 28 de outubro de 2021

Susana Barreto


Tânia Meireles da Cunha


Cristina Flora