Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:336/20.4BELLE
Secção:CA
Data do Acordão:07/28/2021
Relator:LINA COSTA
Descritores:TAXA DE JUSTIÇA
REMANESCENTE
DISPENSA
EXTEMPORANEIDADE
Sumário:O pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça deve ser considerado extemporâneo se efectuado posteriormente ao trânsito em julgado da última decisão prolatada.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em sessão do Tribunal Central Administrativo Sul:

A....., S.A., Autora, nos autos de acção de contencioso pré-contratual instaurados contra a A..... S.A. e O....., S.A., T....., S.A. e B..... Lda., na qualidade de contra-interessadas, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida em 21.1.2021, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que decidiu absolver da presente instância as contra-interessadas O....., S.A.; T....., S.A., e B..... Lda., por serem partes ilegítimas e julgar improcedente a presente acção, mantendo o acto de adjudicação de 30.7.2020, veio, após notificação do acórdão deste Tribunal de 17.6.2021 que negou provimento ao recurso, requerer:
a) A dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos artigo 6º, nº 7 do RCP e correspondentes princípios constitucionais;
b) Subsidiariamente, caso assim não se entenda, a redução do montante do remanescente da taxa de justiça devida, de acordo com os critérios de proporcionalidade em função do serviço efectivamente prestado.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, emitiu parecer no sentido do deferimento do pedido de dispensa.

Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente, o processo vem à sessão para julgamento.

As questões que cumpre apreciar consistem em saber se:
i) Se se encontram preenchidos os pressupostos para dispensar ou reduzir o pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo nº 7 do mesmo artigo 6º;
ii) A título prévio, se o requerimento para o efeito foi tempestivamente apresentado.

Com interesse para a decisão a proferir é de atender ao seguinte circunstancialismo processual:

1. A A. instaurou junto do TAF de Loulé a presente acção administrativa de contencioso pré-contratual contra a A..... e as contra-interessadas O....., S.A., T....., S.A. e B..... Lda., pedindo a anulação da decisão de adjudicação da empreitada de obra pública denominada “Aproveitamento Hidroagrícola do Alvor – Reabilitação do Distribuidor do Vale do Lama” tomada pela Direcção da Associação Ré, bem como o contrato objecto de adjudicação, caso o mesmo já tenha sido outorgado, e condenar-se a Associação Ré a adjudicar a empreitada à Autora;

2. Por sentença, de 21.1.2021, o referido Tribunal decidiu absolver da presente instância as contra-interessadas O....., S.A.; T....., S.A., e B..... Lda., por serem partes ilegítimas e julgar improcedente a presente acção, mantendo o acto de adjudicação de 30.7.2020;

3. Na mesma sentença foi fixado o valor da causa de €1 181 997,95;

4. A A. interpôs recurso da sentença que antecede;

5. Por acórdão deste Tribunal, de 17.6.2021, foi negado provimento ao recurso;

6. Este acórdão foi notificado as partes por notificação electrónica de 18.6.2021;

7. Por requerimento, remetido via site em 12.7.2021, a Recorrente veio expor e requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do nº 7 do artigo 6º do RCP ou a redução do respectivo montante.

Da questão prévia da tempestividade dos requerimentos:

Está aqui em causa saber de que modo e em que momento pode a parte interessada pedir a dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça a que se refere o nº 7 do artigo 6º do RCP.
A jurisprudência emanada pelo Supremo Tribunal Administrativo tem vindo, de forma reiterada e pacífica, a decidir que esse pedido deve ser considerado extemporâneo se tiver sido apresentado posteriormente ao trânsito em julgado da última decisão proferida e que, se essa dispensa não tiver sido decidida anteriormente, deverá ser requerida em sede de reforma dessa última decisão quanto a custas.
Nesse sentido v., a título de exemplo, os acórdãos do STA, consultáveis em www.dgsi.pt:
- De 20.10.2015, Proc. nº 0468/15, com o seguinte sumário: «I - Não é possível, após a elaboração da conta, deduzir requerimento de dispensa ou redução do remanescente da taxa de justiça devendo antes o mesmo ser requerido em sede de reforma de custas. II - Pelo que, o trânsito em julgado da decisão final no processo engloba a decisão sobre custas e concreto montante que da mesma resulta quanto à taxa de justiça a pagar. III - Tal interpretação não é inconstitucional por a mesma não contender com a tutela efetiva de um direito mas antes com o momento e meio adequado ao seu exercício.»;
- De 10.1.2019, Proc. nº 617/14.6BELSB: «O pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça deve ser considerado extemporâneo se, não obstante requerido antes da elaboração da conta, o tenha sido posteriormente ao trânsito em julgado da última decisão prolatada.»;
- De 10.1.2019, Proc. nº 01051/16.9BELSB: «I - A reclamação da conta de custas não é o meio processualmente adequado à dedução da pretensão de dispensa da taxa de justiça remanescente ao abrigo do nº7 do artigo 6º do RCP, tendo em conta que essa reclamação constitui, tão só, e como o próprio nome indica, uma reacção contra um erro de contagem, com vista a que esta seja alterada em conformidade com a lei; // II - Caso tal dispensa não tenha sido decidida anteriormente, deverá solicitada pela parte interessada em sede de reforma de custas; // III - Esta interpretação não é inconstitucional, por a mesma não contender com a tutela efectiva de um direito, mas antes com o momento e meio adequado ao seu exercício.»;
- De 25.9.2019, Proc. nº 02332/10.2BELRS: «I - O direito a reiterar perante o juiz a justificabilidade da dispensa do remanescente deverá ser exercitado durante o processo, nomeadamente mediante pedido de reforma do segmento da sentença que se refere sem excepções à responsabilidade das partes pelas custas da acção, não podendo aguardar-se pela elaboração da conta para reiterar perante o juiz da causa a justificabilidade da dispensa: na verdade, tal incidente destina-se a reformar a conta que "não estiver de harmonia com as disposições legais" (art.º 31° n° 2 do RCP) ou a corrigir erros materiais ou a elaboração de conta efectuada pela secretaria sem obedecer aos critérios definidos no art. ° 30° n° 3. (…)»;
- E mais recentemente o de 24.9.2020, Proc. nº 02908/18.8BEBRG: «Não é de admitir a revista do acórdão que, fundando-se na jurisprudência deste Supremo, indeferiu o pedido, da ora recorrente, de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, porque tudo desde já indica que a revista é inviável e porque as questões de inconstitucionalidade, nela suscitadas, não constituem objecto próprio deste tipo de recursos.».
O mesmo entendimento perfilha o Supremo Tribunal de Justiça, como resulta, designadamente, dos acórdãos, também in www.dgsi.pt:
- De 4.7.2019, Proc. nº 314/07.9TBALR-E.E1.S1: «É intempestiva a apresentação do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do art. 6.º, n.º 7, do RCP, formulado após o trânsito em julgado do acórdão que condenou a parte requerente em custas.»;
- De 2.12.2020, Proc. nº 767/14.9TBALQ-C.L1.S2: «I - O STJ, com base no princípio da economia e utilidade dos atos processuais (art. 130.º do CPC), tem entendido que o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça deve ser feito em momento anterior à elaboração da conta de custas. // II - Via de regra, a prática de actos processuais, incluindo a daqueles previstos no RCP, está sujeita a prazos. A segurança, que é uma das exigências feitas ao Direito, pode conflituar com a ideia de justiça. Para a segurança jurídica concorrem, inter alia, as normas que fixam prazos. Esses prazos têm a natureza preclusiva prevista no art. 139.º, n.º 3, do CPC. // III - A reclamação da conta de custas não é o mecanismo adequado para o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça. Esse mecanismo é o recurso, quando couber recurso da decisão, ou a reforma da mesma decisão quanto a custas, nos termos do art. 616.º, n.ºs 1 e 3, do CPC. // IV - A parte, notificada da decisão que põe termo ao processo, está em condições, por dispor de todos os elementos necessários, de solicitar a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, pois que sabe, de antemão, qual a taxa de justiça que será devida e incluída na conta de custas, uma vez que essa taxa de justiça tem necessariamente por referência o valor da ação e a tabela I-A anexa ao RCP.».
Por sua vez, o Tribunal Constitucional, no acórdão nº 527/2016, de 4.10.2016, Proc. nº 113/16, pronunciando-se em sede de fiscalização concreta sucessiva, não julgou inconstitucional a norma contida do nº 7 do artigo 6º do RCP, introduzida pela Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, na interpretação segundo a qual é extemporâneo o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça apresentado no processo, pela parte que dele pretende beneficiar, após a elaboração da conta de custas [disponível in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20160527.html], de cujo teor se extrai: «(…) // Ao contrário do que a Recorrente procurou sustentar, não se reconhece particular dificuldade na satisfação do ónus de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça em momento anterior ao da elaboração da conta, nem a parte vê negado o acesso ao juiz, pois pode – em tempo – suscitar a apreciação jurisdicional da sua pretensão. // Não causa dúvida que a interpretação afirmada na decisão recorrida é, genericamente, coerente com a sucessão de atos do processo: a decisão final é proferida; depois transita em julgado; após o trânsito em julgado, o processo é contado; a conta é notificada às partes, que dela podem reclamar. Independentemente de qual seja a melhor interpretação do direito infraconstitucional (matéria sobre a qual não cabe ao Tribunal Constitucional emitir pronúncia), a fixação do apontado efeito preclusivo no momento em que o processo é contado tem coerência lógica com o processado (na medida em que a conta deverá refletir a referida dispensa), ou seja – para o que ora interessa apreciar – não se trata de um efeito que surpreenda pelo seu posicionamento na marcha processual. // Por outro lado, respeitando a interpretação afirmada na decisão recorrida, a parte dispõe de um prazo indiscutivelmente razoável para exercer a faculdade de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça (que se exprime através de uma declaração que não carece de fundamentação complexa – v., in casu, fls. 78): desde a prolação da decisão final até ao respetivo trânsito em julgado, ou seja, e por referência ao processo civil, nunca menos do que quinze dias (artigo 638.º, n.º 1, do CPC). A este propósito – como, aliás, o Ministério Público sublinha – não é correto afirmar-se que a só após a notificação da conta a parte tem conhecimento dos montantes eventualmente excessivos que lhe são imputados a título de taxa de justiça. Na verdade, pelo menos após a prolação da decisão final, a parte dispõe de todos os dados de facto necessários ao exato conhecimento prévio das quantias em causa: sabe o valor da causa, a repartição das custas e o valor da taxa de justiça previsto na tabela I do RCP, por referência ao valor da ação. Assim, ressalvada a ocorrência de situações anómalas excecionais – que, no caso, não se verificaram e também não resultam do sentido normativo oportunamente enunciado como objeto do presente recurso –, a parte não pode afirmar-se surpreendida pelo valor da taxa de justiça refletido na conta: esta joga com dados quantitativos à partida conhecidos. // Acresce que a gravidade da consequência do incumprimento do ónus – que consiste na elaboração da conta sem a redução ou dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça – é ajustada ao comportamento omitido. Não se vê, aliás, que pudesse ser outra: se a parte não deduziu o pedido correspondente, a conta é elaborada nos termos gerais decorrentes da tabela legal. // (…)».

No caso em apreciação, estando em causa um processo de natureza urgente, notificadas as partes do acórdão proferido por este Tribunal em sede de recurso, por notificação electrónica de 17.11.2019, decorrida a dilação de três dias, dispunha a aqui Requerente do prazo de 15 dias, previsto no nº 1 do artigo 247º do CPTA para dele interpor recurso ou para requerer a sua reforma quanto a custas, expondo e requerendo a dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no nº 7 do artigo 6º do RCP.
Não o tendo feito, o acórdão em referência transitou em julgado em 6.7.2021 e, consequentemente, é manifestamente extemporânea a apresentação em 12.7.2021 do requerimento em apreciação, que, com esse fundamento, deve, sem contraditório por manifesta desnecessidade (cfr. o disposto no nº 3 do artigo 3º do CPC ex vi artigo 1º do CPTA), ser indeferido.

Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul, em indeferir o pedido formulado, por extemporâneo.

Custas pela Requerente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 28 de Julho de 2021.

(Lina Costa – relatora que consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes integrantes da formação de julgamento, em turno, os Desembargadores Jorge Martins Pelicano e António Patkoczy).