Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:763/08.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/17/2019
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IVA
ALÍNEA B) DO N.º1 DO ARTIGO 9º DO CIVA
ISENÇÃO
Sumário:I. As isenções constituem derrogações ao princípio geral enunciado no artigo 2.° da Sexta Directiva, segundo o qual o IVA é cobrado sobre cada prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito passivo,
III. A isenção prevista no artigo 9.° n°1 al. b) do CIVA implica que a actividade seja prestada por determinados profissionais devidamente habilitados para o efeito.
IV. Para o exercício de actividades paramédicas é exigida a titularidade de um curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais - alínea a) do n° 1 do artigo 2° do Decreto - Lei n.º 261/93 de 24 de Julho.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDÃO


I.RELATÓRIO
MARIA .......... (adiante recorrente ou impugnante), recorre para este Tribunal Central Administrativo da sentença prolatada pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra as liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios que lhe foi efectuada com referência aos anos de 2003 a 2005.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões (por nós numeradas):
«1.Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão. Ora,
2.É manifesto, pois, que a intenção do legislador, ao consagrar, expressamente, o direito de audição prévia em processo tributário, não visa somente dar a conhecer ao sujeito passivo o projecto de decisão e sua fundamentação, como também suscitar a colaboração e participação dele nessa decisão, donde, tal instinto, se destina essencialmente a contribuir para um mais cabal esclarecimento dos factos e uma mais adequada e justa decisão, permitindo ao mesmo tempo ao interessado a defesa dos seus direitos e legítimos interesses.
3.A falta de audiência prévia dos interessados constitui vício insuprível que se traduz na preterição de uma formalidade essencial definida na Lei Geral Tributária. Deste vício só pode resultar a invalidade do acto tributário de liquidação.
4.Na sequência da notificação recebida em 1 de Agosto de 2007 sobre o Projecto de Correcções do Relatório de Inspecção, em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado ("IVA"), relativo aos anos de 2003, 2004 e 2005, a Impugnante exerceu o competente direito de audição, cfr. doc n.° 1, aqui junto. Na verdade,
5.As correcções propostas pelos Serviços de Inspecção Tributária baseiam-se no facto de na análise da documentação que pelo sujeito passivo lhes foi remetida, ainda antes de iniciada a presente acção de inspecção não permitir, alegadamente, concluir que a actividade exercida é, de facto, enquadrável no artigo 9.° do Código do IVA, com fundamento na sua formação académica como assistente social, a qual não se mostra em conformidade com a descrição feita nos documentos.
6.Procedendo, os Serviços de Inspecção Tributária, em consequência, à alteração oficiosa do enquadramento em sede de IVA com efeitos a partir 1 de Fevereiro de 2003 e liquidando IVA para os exercícios em causa.
7."A análise da documentação remetida não nos permite concluir que a actividade exercida é, de facto, enquadrável no art.º 9º do CIVA, porque a formação académica do sujeito passivo, como assistente social, não se mostra em conformidade, com a descrição feita nos documentos remetidos. Face ao disposto no ponto anterior, vamos proceder às seguintes alterações: Alteração oficiosa do enquadramento reportado a 1.2.2003 para o regime normal trimestral, liquidação de IVA para os exercícios em causa..."
Tais conclusões não merecem sequer acolhimento na lei, pois não tem subjacente uma isenção subjectiva, mas sim objectiva, i.é,
8.É o serviço que é prestado que se encontra isento e não a pessoa que o presta, alínea b) do n.° 1, do art.° 9º, que mais não é do que a transposição da alínea b), do n.° 1, do art.° 13°A da Sexta Directiva.
9."As prestações de serviços de assistência efectuadas no âmbito do exercido de actividades médicas e paramédicas, bem como as entregas de órgãos, sangue e leite humanos, encontram-se isentas ao abrigo do disposto no art.° 13° A, n.° 1, alíneas c) e d), da Sexta Directiva, respectivamente. As Isenções relativas a serviços médicos e sanitários previstas nas alíneas b) e c) do citado art.° 13° A visam reduzir os custos dos cuidados de saúde e torná-los mais acessíveis a particulares" - cf. Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias d'Ambrumenil, cons. 59.
10.Não faz, pois, qualquer sentido que a formação académica de base do sujeito passivo de assistente social, obtida até há mais de 30 anos, concatenada com uma experiência prática acumulada ao longo de mais de trinta anos ao serviço da ARS - Administração Regional de Saúde (Centros de Saúde), que permitiu adquirir os conhecimentos necessários ao desempenho das actividades paramédicas efectuada no âmbito da colaboração com a clínica médica A.........., Lda, esteja fora da isenção prevista no art.º 9º do CIVA.
11.A clínica médica A.........., Lda. presta estritamente serviços de ginecologia e obstetrícia às suas pacientes.
12.A colaboração do sujeito passivo com a clínica médica A.........., Lda., sempre se limitou, naturalmente, a actividades paramédicas em saúde materno-infantil, tal como melhor explicitado no doc n.° 2 aqui junto, o qual foi, igualmente junto com o direito de audição.
13.O currículo do sujeito passivo, já junto, que foi sendo construído com muita dedicação à ARS - Administração Regional de Saúde (Centros de Saúde) durante mais de trinta anos, atesta que possuo as aptidões necessárias para o desempenho qualificado das actividades paramédicas em saúde materno-infantil, desde que sob a coordenação e direcção de médicos qualificados, o que sempre se verificou no âmbito da colaboração mantida com a clínica médica A.........., Lda.
14.A colaboração com a clínica médica A.........., Lda. é um testemunho da actividade efectivamente desenvolvida, e se dúvidas subsistirem, poderá o responsável técnico da clínica médica A.........., Lda. faze-lo, bem como as inúmeras parturientes a quem assistiu e ajudou na gravidez e na preparação para o parto, minimizando os efeitos designados de síndroma pós-parto e prevenindo situações de ansiedade durante a gravidez.
15.Sendo esta colaboração estendida também ao nível da ajuda das parturientes nas áreas nutricionais, dietéticas, de higiene e de terapêutica ocupacional.
16.Alias, como é do domínio público, na grande maioria dos casos de desempenho de actividades médicas e paramédicas, os técnicos nem sequer apresentam uma licenciatura, baseando as suas aptidões na experiência acumulada ao longo da sua vida profissional e alguns cursos profissionais.
17.Outros elementos que justificam a actividade efectivamente desenvolvida são as notas de honorários que emiti à clínica médica A.........., Lda. Entre Janeiro de 2003 e Dezembro de 2005. Estas notas de honorários/recibos, cuja cópia já se encontra junta ao processo administrativo, referem expressamente que as actividades desenvolvidas eram do foro clínico.
18.Estas mesmas notas de honorários/recibos estão certamente registadas junto da contabilidade da clínica médica A.........., Lda. Pelo que as mesmas poderão também ser reconfirmadas pelo Serviços de Inspecção Tributária;
19.De facto não é a formação académica de base que determina o enquadramento fiscal dos serviços prestados, mas sim a actividade em concreto que é exercida.
20.A sua actividade no sector da saúde, alicerçada em mais de 30 anos de experiência na ARS - Administração Regional de Saúde (Centros de Saúde), onde sempre integrou equipas de terreno materno-infantis, foram, a par da formação teórica continuada que foi acumulando, a base da sua habilitação pratica no âmbito da saúde materno-infantil.
21.E que, não obstante devidamente subordinada e complementar no acto médico, o exercício da mesma foi prestado de forma autónoma, com programa, horários e amplitude técnica igualmente autónomos;
22.A formação académica de base sujeito passivo é, neste contexto, irrelevante, face à natureza e finalidade dos serviços prestados, elemento que, invocando o artigo 13.° - A, alíneas c) e d), da Sexta Directiva (transposto para o ordenamento jurídico nacional através do artigo 9.° do Código do IVA), determina a isenção. Os serviços em causa prosseguiram objectivos terapêuticos, com efeitos também de prevenção e reabilitação, enquadrados no conjunto de "actividades de assistência medica e paramédica", cuja isenção estará seguramente na génese do n.° 1 do artigo 9.° do Código do IVA e embutida no espírito de já citado artigo 13.° da Sexta Directiva - "As prestações de serviços de assistência efectuadas no âmbito de exercício das actividades paramédicas" são isentas e visam reduzir os custos dos cuidados de saúde e torná-los mais acessíveis aos particulares - cf. citado acórdão d' Ambrumenil, cons. 59
23.As actividades terapêuticas desenvolvidas pelo sujeito passivo na A.........., Lda. são complementares do trabalho médico de obstetrícia e desenvolve-se pelas áreas de:
a) Preparação psicológica para o parto, geralmente iniciado a partir da 28ª semana de gestação sendo as sessões práticas complementadas com sessões teóricas e esclarecimento de dúvidas;
b) Preparação para o momento do parto com incidência no padrão respiratório através de sessões práticas;
c) Prevenção da depressão durante a gravidez e pós parto.
24.Caindo, pois na previsão do citado art.° 9º n.° 1, alínea b), a que corresponde a alínea b) do n.° 1, do art.° 13° A da Sexta Directiva, tudo em conformidade com o citado acórdão d'Ambrumenil, o qual acrescenta que o enquadramento de tais actos e ainda das prestações conexas visa reduzir os custos dos cuidados de saúde e tomá-los mais acessíveis aos particulares, como aliás no acórdão Comissão c. França proferido no processo G76/99 (cons. 30), onde o Tribunal de Justiça aplicou o conceito de prestações conexas enunciado no acórdão Card Protection Plan, para concluir que o acto de colheita e a transmissão da colheita de um laboratório especializado, constituíam prestações estreitamente conexas com a análise efectuada, e portanto isentas de IVA.
25.O sujeito passivo, bem como a sociedade para a qual prestou as actividades que agora a administração tributária pretende tributar, contrataram a realização da sua contabilidade com a sociedade V.......... Lda, com sede na A.........., n.° 41, 5º dto., em Lisboa...

26.A qual havia entregue, entretanto, e para os períodos em causa a elaboração ao TOC Romano .........., com domicílio profissional na A.........., n.° 41, 5º dto., em Lisboa.
27.Pelo exposto e atento quer o Estatuto dos TOC's, quer mesmo a Lei Geral Tributária, deverão ser estes, caso V. Exa. entenda que o enquadramento legal da prestação de serviços em causa não é o correcto à luz do CIVA, os responsabilizados pelo errado enquadramento...
28.Até porque se soubesse o sujeito passivo que teria de cobrar IVA, porque se trata de um imposto neutro, o qual deduziria, não teria qualquer prejuízo e nesta conformidade não teria qualquer inconveniente em fazê-lo, já que se repercute sempre ao consumidor final.

Termos em que, e nos demais de Direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá ser revogada a sentença revidenda e substituída por acórdão que decida:
a) Considerar a liquidação controvertida de IVA e respectivos Juros Compensatórios, ilegal, consubstanciando-se a ilegalidade em violação de lei, por se encontrar isenta ao abrigo do art.° 9, n.° 1, alínea b) do CIVA, a actividade paramédica levada a cabo pelo sujeito passivo, devendo ser anulados os actos tributários controvertidos; ou à cautela, sem conceder,
b) Considerar que os actos tributários controvertidos são inválidos, enfermando de vício de forma, por preterição de formalidades essenciais, porque preterida indevidamente a audição dos interessados. Ou ainda que assim não seja,
c) Imputar-se tal responsabilidade ao técnico oficial de contas Romano .......... e/ou ao gabinete de contabilidade V.......... Lda, todos com domicílio na A.........., n.° 41, 5º dto., em Lisboa, por se tratarem dos responsáveis técnicos, quer da contabilidade do aqui sujeito passivo quer da A.......... Lda., entidade para quem foram emitidos os recibos em causa.»

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A recorrida não apresentou contra-alegações.
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A Exmª. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações as questões decidendas traduzem-se nas seguintes:
(i)se a sentença fez errado julgamento quando considerou que não foi preterido o direito de audiência prévia às liquidações impugnadas;
(ii)se a sentença fez errado julgamento quando não reconheceu à recorrente o regime de isenção consagrado na alínea b) do n.º1 do no artigo 9º do CIVA;
(iii)caso se entenda que a sentença não incorreu nos erros de julgamento identificados em (i) e (ii), importa apurar se a responsabilidade do errado enquadramento fiscal da recorrente deve recair sobre o Técnico Oficial de Contas e da sociedade de contabilidade.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:
« A) Pelas Ordens de Serviços n°s OI2007....., OI2007....., OI 2007..... e OI2007....., de 24-07-2007, Maria .......... (ou impugnante) foi objecto de uma inspecção interna, de âmbito parcial, realizada entre Julho e Setembro de 2007, relativo a IVA dos períodos de 2005 a 2006 (PA apenso);
B) Pelo ofício n° ....., de 30-07-2007 a impugnante foi notificada para exercer direito de audição sobre o projecto de relatório de inspecção tributária;
C) Em 09-08-2007 a impugnante exerceu direito de audição e argumenta que, apesar de ter uma licenciatura em assistente social desenvolve actividades paramédicas com conhecimentos obtidos empiricamente;
D) Em 18-09-2007 foi elaborado o relatório de inspecção tributária, junto ao pa apenso, cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais, onde consta, nomeadamente no ponto III - Descrição dos Factos e Fundamentos das correcções Meramente Aritméticas à Matéria Tributável e VIII - Direito de Audição:
(...).
Com o objectivo de que o sujeito passivo regularizasse voluntariamente a(s) sua(s) infracção(ões) foi-lhe enviada sob registo em 27-03-2007 um notificação (ofício .....).
O sujeito passivo respondeu à notificação (...) argumentando que a actividade desenvolvida era "paramédica" e que por esse motivo se considerava numa situação de isenção ao abrigo do art° 9° do CIVA. Acrescentou que iria proceder à alteração do enquadramento.
Consultado o sistema informático constatámos que o sujeito passivo procedeu à alteração do enquadramento para efeitos de IVA reportado a 2001/02/01, para o regime de isenção ao abrigo do art° 9° do CIVA.
A análise da documentação remetida não nos permite concluir que a actividade é, de facto enquadrável no art° 9° do CIVA, porque a formação académica do sujeito passivo, como assistente social, não se mostra em conformidade com a descrição feitas nos documentos remetidos.
Face ao exposto vamos proceder às seguintes regularizações.
- Alteração Oficiosa do enquadramento reportada a 1/2/2003, para o Regime Normal Trimestral.
- Liquidação do IVA para os exercícios em causa, recorrendo aos dados constantes no nosso Sistema Informático, recolhidos das Declarações Modelo 3 por si apresentadas, sendo sempre o IVA a pagar imputado ao último trimestre do exercício.
(...).
VIII - Direito de Audição
Com o objectivo do Sujeito Passivo exercer o direito previsto no art° 60° da LGT e 60° do RCPIT foi enviada sob registo a informação necessária para esse efeito, através do ofícios n° ....., de 30-07-2007, fixando-se o prazo em 10 dias para se manifestar sobre o Projecto de Conclusões de Relatório.
O Sujeito Passivo exerceu o direito de audição, informando discordar das correcções propostas, informando discordar das correcções propostas no Projecto de Relatório e dos respectivos fundamentos. Argumenta que apesar de possuir uma formação académica como assistente social, desenvolve actividades paramédicas com conhecimentos obtidos empiricamente.
As actividades designadas por paramédicas são reguladas pelo DL n° 261/93, de 24-07, e são as constantes da lista anexa ao aludido diploma.
(...).
Na listagem apresentada não identificamos a actividade desenvolvida pelo sujeito passivo, designadamente na actividade de Terapia Ocupacional, que é descrita em pormenor na lista anexa e que se mostra distinta da descrição efectuada da declaração da sociedade A.........., Lda. Na descrição do diploma legal Terapia Ocupacional é "Avaliação, tratamento e habilitação de indivíduos com disfunção física, mental, de desenvolvimento social ou outras, utilizando técnicas integradas em actividades seleccionadas consoante o objectivo pretendido...".
Na descrição emitida pela sociedade A.........., Lda é referida Terapia Ocupacional, mas num contexto completamente distinto do indicado na legislação referida, sem situações de qualquer tipo de disfunção.
No art° 2° do diploma que regula as actividades paramédicas, são estipuladas as condições de exercício profissional destas actividades, designadamente, a titularidade do curso, diploma, certificado ou carteira profissional, requisito que não foi comprovado pelo sujeito passivo.
No n° 2 do art° 4° do mesmo diploma estipula que o Ministério da Saúde procede ao registo dos profissionais abrangidos pelo presente diploma, requisito que não foi comprovado pelo sujeito passivo.
Os argumentos expressos pelo sujeito passivo, não comprovam o cumprimentos dos requisitos necessários para ser considerado profissional paramédico, pelo que, não se considera correcto o enquadramento no regime de isenção do IVA, ao abrigo da al a) do n° 1 do art° 9° do CIVA, pelo que foi elaborado o Boletim de Alteração Oficioso.
(...).
E) Em 17-11-2007 a Administração Tributária emitiu as liquidações de IVA e juros compensatórios, que totalizam €29.770,38, assim descriminadas:
- liquidação adicional de IVA n° 0.....46, referente ao 4° trimestres de 2003, no montante de €6.982,50 (fls 86 e 88, do pa);
- liquidação adicional de IVA n° 0.....48, referente ao 4° trimestres de 2004, no montante de €7.600,00 (fls 86, do pa);
- liquidação adicional de IVA n° 0.....50, referente ao 4° trimestre de 2005, no montante de €12.600,00 (fls 86, do pa);
- liquidação de juros compensatórios n° 0.....47, referente ao 4° trimestre de 2003, no montante de €1.002,42 (fls 87, do pa);
- liquidação de juros compensatórios n° 0.....49, referente ao 4° trimestre de2004, no montante de €788,73;
- liquidação de juros compensatórios n° 0.....51, referente ao 4° trimestre de 2005, no montante de €796,73
F) Em 03-12-2007 a impugnante foi notificada para pagamento das liquidações de IVA e juros compensatórios (A/R);
G) A petição inicial de impugnação deu entrada em 31-04-2008.

A convicção do tribunal formou-se no teor dos documentos identificados em cada ponto dos factos provados.»

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B. DO DIREITO
Para decidir pela improcedência da impugnação judicial considerou a sentença recorrida, que os actos de liquidação sindicados não enfermam do vício de forma decorrente da violação do direito de audiência prévia, por um lado, e, por outro lado, não violam o regime de isenção consagrado na alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º do CIVA relativamente às operações corrigidas pela Administração Tributária.
A primeira questão que importa decidir, atentos os limites que as conclusões de recurso nos impõem, é relativa a saber se ocorreu a preterição de formalidade legal do direito de audição prévia.
Vejamos, então.
Da leitura conjugada dos pontos 1 a 8 das alegações e respectivas conclusões verifica-se que a recorrente continua a sustentar que deveria ter sido dada a oportunidade de ser ouvida antes da emissão dos actos de liquidação sindicados.
Mas sem razão.
Compulsada a decisão proferida sobre a matéria de facto, verifica-se que as liquidações sindicadas foram efectuadas com base no relatório dos serviços de fiscalização inscrito na al. D) da matéria assente.
Como tem reiteradamente decidido a jurisprudência dos nossos tribunais superiores a audição do contribuinte ou qualquer outro sujeito passivo da obrigação tributária previamente a qualquer decisão administrativa que lhe pode vir a ser parcial ou totalmente desfavorável é um direito constitucionalmente consagrado (cfr. n.º 5 do artigo 267.º da Lei Fundamental). Compreende-se que assim seja uma vez que, para além de constituir uma importante garantia de defesa dos direitos do administrado constitui também uma manifestação do princípio do contraditório, pois que lhe possibilita a participação na formação da vontade da Administração.
A lei ordinária, concretizou, inicialmente, este direito no artigo 100.º do CPA, estando actualmente tal direito expressamente previsto no artigo 60.º da LGT, que sob a epígrafe «Princípio da participação» dispõe ( na parte que aqui releva) :
«1 - A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:
a) Direito de audição antes da liquidação;
(…)
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.
2 - É dispensada a audição:
(…)
3 - Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais se não tenha pronunciado.
(…)
7 - Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão. (…)»
Da leitura do normativo transcrito resulta bastante claro que tendo o contribuinte, no âmbito de uma acção de inspecção, sido notificado, nos termos do artigo 60.º da LGT, do projecto de conclusões do relatório de inspecção, tendo assim sido ouvido numa das fases do procedimento inspectivo, não tem que ser de novo ouvido antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos em relação aos quais ainda não tenha tido oportunidade de se pronunciar.
Dito isto, vejamos então se pode ser concedida razão à recorrente.
Conforme resulta do probatório, (e tal como vem reconhecido nas conclusões de recurso), foi a recorrente notificada do projecto de relatório para o exercício do direito de audição prévia [ponto B)] nos termos do artigo 60.º da LGT tendo, exercido tal direito [ponto C)].
Nestas circunstâncias fácticas inexiste qualquer preterição do direito de audição prévia, por a recorrente ter sido notificada para exercer esse direito relativamente às correcções propostas no Relatório da Inspecção antes das liquidações adicionais impugnadas ( cfr. n.º3 do artigo 60.º da LGT).
Acresce que não pode ser deixado passar em claro que não alegou nem demonstrou a recorrente o preenchimento da previsão contida no n.ºs 1, alínea e), e 3 do artigo 60.º da LGT, isto é, que tivessem sido invocados factos novos sobre os quais ainda não se tenha pronunciado.
Por outro lado, saber se a decisão final tomada Administração Tributária e retratada o Relatório de Inspecção (usando as palavras constantes nas conclusões de recurso) « não merecem sequer acolhimento na lei, pois não tem subjacente uma isenção subjectiva, mas sim objectiva» é já um problema de validade substancial ou material dos actos de liquidação e não de validade formal.
Improcede nesta parte o recurso.
Entendeu a sentença sob recurso que a actividade de assistente social exercida pela recorrente, em clínicas, não reúne as características legalmente exigidas para o exercício de actividades desenvolvidas pelos profissionais de saúde (médicos e paramédicos).
E entendeu-se ainda, com interesse para a questão colocada neste recurso, que sempre seria de exigir a titularidade de um curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais - alínea a) do n°1 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.º 261/93 de 24 de Julho.
Na óptica da recorrente « É o serviço que é prestado que se encontra isento e não a pessoa que o presta, alínea b) do n.° 1, do art.° 9º, que mais não é do que a transposição da alínea b), do n.° 1, do art.° 13°A da Sexta Directiva.» e por isso « A formação académica de base sujeito passivo é, neste contexto, irrelevante, face à natureza e finalidade dos serviços prestados, elemento que, invocando o artigo 13.° - A, alíneas c) e d), da Sexta Directiva (transposto para o ordenamento jurídico nacional através do artigo 9.° do Código do IVA), determina a isenção.»
Dito de outro modo, na perspectiva da recorrente uma vez que no exercício da sua actividade desenvolve actividades terapêuticas complementares do trabalho médico de obstetrícia e nas áreas de «preparação psicológica para o parto, preparação para o momento do parto com incidência no padrão respiratórios e prevenção da depressão durante a gravidez e pós parto», mostra-se preenchida a previsão contida na alínea b) do n° 1 do artigo 9° do CIVA.
Coloca-se então a questão de aferir da possibilidade de enquadramento da actividade desenvolvida pela recorrente no âmbito da isenção a que alude o artigo 9º, nº1, alínea b) do CIVA.
E, sobre questão idêntica aquela que aqui se discute, já este Tribunal Central Administrativo se pronunciou por acórdãos de 06.07.2010 e 10.07.2015, proferidos nos processos n.º 04087/10 e 04129/10 (este último, do qual foi Relatora a aqui Relatora) cuja fundamentação se acolhe inteiramente por corresponder à melhor interpretação e aplicação das normas jurídicas atinentes (em conformidade com o artigo 8.º, nº 3 do CC), e, por isso, com a devida vénia, se passa a seguir adaptando-a ao caso concreto.
Assim:
« O artº 9° n°1 al. b) do CIVA refere "As prestações de serviços efectuadas no exercícios das (...) profissões de "Médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas", falando o nº 2 do mesmo preceito legal que "As prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estritamente conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares.".
Assim, o CIVA refere expressamente as actividades paramédicas, como subsumíveis na isenção consagrada na alínea b) do n°1 do art°9°.
Todavia, aquele lei não delimita o respectivo conceito, pelo que, como bem se refere na sentença, há que recorrer ao DL n°261/93 de 24/07, diploma regulador do exercício das actividades profissionais de saúde designadas por paramédicas, e que estão elencadas na Lista Anexa do referido diploma.
Neste contexto, há que chamar à colação o art. 13°-A nº1 da 6ª Directiva que estabelece que "Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados Membros isentará, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:(...)
b) A hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente conexas, asseguradas por organismos de direito público ou, em condições sociais análogas às que vigoram para estes últimos, por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos;
c) As prestações de serviços de assistência efectuadas no âmbito do exercício das actividades médicas e paramédicas, tal como são definidas pelo Estado - Membro em causa."
De tal normação decorre que, teleologicamente, o seu objectivo é isentar de imposto aquelas actividades desde esteja em causa a prestação de serviços de assistência e que esta seja fornecida por uma pessoa que possua as qualificações profissionais exigidas para uma actividade médica e paramédica.
Assim, é pacífico que a isenção nos termos do art° 9° do CIVA abrange o exercício da actividade de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas.
Mas, já no que se refere às situações sobre que incidiram as correcções em apreço e que envolvem técnicos massagistas e massagistas esteticistas são profissionais, a AT considerou que estes não se encontram contemplados na lista das actividades paramédicas definidas pelo DL nº 261/93 de 24/07,por isso não podendo beneficiar da isenção do art° 9° n°1 al. b) do CIVA.
É aqui que reside o dissídio entre as partes, inclinando-se o MP para o lado da Fazenda.
De acordo com a sentença, a interpretação adoptada pela AT não é a mais consentânea com o direito interno e comunitário.
Isso porque, em primeiro lugar, a actividade da impugnante é exercida através de clínicas, e situa-se na área da nutrição, fisioterapia, estética e cirurgia estética, sendo que as consultas na área da nutrição são conduzidas por médicos ou nutricionistas e a execução dos tratamentos disponibilizados pela impugnante, depois de prescritos pelo médico é levada a cabo por massagistas, massagistas esteticistas e auxiliares de fisioterapia, directamente supervisionadas por médico ou paramédico, uma vez que a prova testemunhal foi esclarecedora a esse respeito.
Depois, porque as prestações de serviços são efectivadas por um ente colectivo e as pessoas a quem incumbe a direcção técnica e a directa supervisão das prestações realizadas terem a habilitação que permite o exercício das actividades médicas e paramédicas, pelo que se enquadram nas prestações de serviços de assistência, subsumindo-se na isenção prevista na alínea b) do nº1 do artº9° do CIVA.
Quanto ao facto de os serviços de inspecção terem considerado que os técnicos auxiliares de fisioterapia não reuniam as condições enumeradas no art° 2° do DL n° 261/93 de 24/07 em virtude de os cursos não estarem reconhecidos por entidades oficiais, conforme a declaração emitida pela "A.......... Lda" quando da inspecção aos exercícios de 2001 e 2002, sendo que sobre o reconhecimento dos cursos, os serviços de inspecção foram informados, que não existem, em, Portugal cursos para técnicos auxiliares de fisioterapia reconhecidos, sendo este o motivo da não passagem aos formandos e carteira profissional que os habilite para o exercício de actividade de fisioterapia.
Por assim ser, os serviços de inspecção consideraram que pelo facto de os auxiliares terem apresentado o curso mas o mesmo não estar reconhecido, era suficiente para que a isenção deixasse de operar.
E, então, a solução do litígio passa por saber se, como considerou a sentença recorrida, as correcções efectuadas com tal fundamento não devem subsistir, pois, uma coisa é não ter qualquer curso que os habilite outra é ter os cursos mas estes não serem reconhecidos em Portugal, devendo entender-se que estão reunidas as condições para a impugnante beneficiar da isenção prevista na alínea b) do n°1 do art°9º, até porque a isenção referida no artigo 13°, A, n°1, alínea c) da Sexta Directiva não depende de forma jurídica do sujeito passivo que fornece as prestações médicas ou paramédicas nele mencionadas, nesse sentido, vide Ac. do TJCE, de 10/09/2002, Kugler, C-141/00.
Conforme declaração de princípios ínsita neste diploma legal, “A protecção da saúde dos cidadãos, constitucionalmente consagrada como um direito social, impõe ao Estado a adopção das medidas indispensáveis à sua efectiva realização, nas diversas vertentes que com ele se prendem.
Neste domínio, assume, sem dúvida, relevância o conhecimento de que aquele bem jurídico essencial deve ser protegido contra possíveis lesões praticadas por causa do exercício inqualificado de certas funções.
De tal conhecimento decorre, directamente, a necessidade de condicionar o exercício de actividades ligadas à prestação de cuidados de saúde, por forma a conseguir-se aquela protecção.
E esta necessidade é tanto mais sentida quanto é certo que a evolução científica e tecnológica, com reflexos na área das ciências médicas, funciona como factor determinante de maiores exigências ao nível da formação e da diferenciação de profissionais de saúde.
No âmbito dos serviços públicos de saúde, aquele objectivo encontra-se, de algum modo, reflectido na disciplina que, para os técnicos de diagnóstico e terapêutica, foi criada pelo Decreto-Lei n.º 384-B/85, de 30 de Setembro, bem como em diversa legislação que lhe é complementar.
Outro é, porém, o panorama fora dos serviços públicos. Aí, na verdade, por ausência de enquadramento legal específico, nos domínios da formação e do exercício profissional, não se encontra devidamente assegurada a protecção da saúde.
Impõe-se, por isso, a intervenção do Estado, em obediência aos imperativos constitucionais relativos à saúde, promovendo as medidas que garantam a maior qualidade dos cuidados a prestar, pela adequada formação técnica dos agentes de saúde e pela sua dignificação do ponto de vista deontológico.
O Governo, reconhecendo a urgência de tomar medidas disciplinadoras neste sector, decidiu solicitar autorização para legislar na matéria, tendo sido publicada a
Lei n.º 31/92, de 30 de Dezembro.

O presente diploma condiciona desde já, genericamente, o exercício de actividades profissionais de saúde, condicionando igualmente a criação de cursos de formação profissional de saúde e perspectivando os elementos que deverão consubstanciar a regulamentação das profissões, a aprovar por decreto regulamentar.
Finalmente, importa referir que não se optou, nesta matéria, pela sujeição automática ao regime jurídico das carteiras profissionais, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 358/84, de 13 de Novembro, porquanto se admitiu que, em sede da regulamentação profissional específica, venha a considerar-se não ser aquele regime o mais adequado, tendo em vista, designadamente, que ele poderá comportar normas de carácter deontológico com um elevado nível de exigibilidade.”

Com base nessa principiologia, o artº 1º desse diploma, definindo o respectivo âmbito estabelece que o mesmo regula o exercício das actividades profissionais de saúde, adiante designadas por actividades paramédicas, que compreendem a utilização de técnicas de base científica com fins de promoção da saúde e de prevenção, diagnóstico e tratamento da doença, ou de reabilitação (nº 1), não ficando põe ele abrangidas as actividades exercidas, no âmbito de competências próprias, por profissionais com inscrição obrigatória em associação de natureza pública e ainda por odontologistas, enfermeiros e parteiras (nº2), sendo as actividades paramédicas a que se refere o n.º 1 são as constantes da lista anexa ao diploma, do qual faz parte integrante (nº 3).
Dispondo sobre as condições de exercício profissional o artº 2º determina que, sem prejuízo de regulamentação específica de profissões abrangidas pelo artigo anterior, o exercício de actividades paramédicas depende da verificação das seguintes condições:
a) Titularidade de curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais;
b) Titularidade de diploma ou certificado reconhecido como equivalente aos referidos na alínea anterior por despacho conjunto dos Ministros da Educação e da Saúde;
c) Titularidade de carteira profissional, ou título equivalente, emitido ou validado por entidade pública.
E nº 2 do mesmo preceito legal estatui que o grau de autonomia específico do exercício de cada uma das actividades paramédicas, bem como as normas específicas das profissões, incluindo as regras deontológicas, constam de decreto regulamentar.
Por fim, o artº 3º do dito diploma legal comina que o contrato pelo qual alguém se obriga a exercer actividades paramédicas mediante retribuição, sem observância do disposto no artigo anterior, é nulo (nº 1) sendo que o regime previsto no presente diploma não pode ser afastado por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
Extrai-se do regime legal exposto, como enfatiza a E..... no seu douto parecer, que os profissionais que exerciam ao serviço da recorrida, as funções de "técnico massagista " e "auxiliar de fisioterapia", não preenchiam os requisitos previstos no n°1 do art. 2° do DL 261/93 de 24 de Julho pois para o exercício de actividades paramédicas foi fixada na legislação aplicável ao caso dos autos, a necessidade/obrigatoriedade da verificação das condições referidas naquele preceito legal; esta necessidade inscreve-se na salvaguarda dos superiores interesses constitucionais de protecção da saúde dos cidadãos quando são assistidos por profissionais que exercem essas actividades paramédicas.
Daí que seja exigida a titularidade de um curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais - al. a) do n°1 do art. 2° do DL 261/93 de 24 de Julho.
De igual modo o ensino da actividade da medicina ou da enfermagem mostra-se devidamente regulamentado e os respectivos cursos têm de ser oficialmente reconhecidos para que os diplomas possam ser aceites e os profissionais que os utilizam possam preencher os requisitos impostos por lei.
A essa luz, é errónea a hermenêutica feita na sentença recorrida daquele preceito legal e a sua adequação à análise do caso dos autos, pois não podia a actividade de fisioterapia e a sua execução ser entregue a profissionais não habilitados com cursos que obedeçam aos requisitos fixados por lei.
Os objectivos da regulação do exercício das actividades profissionais de saúde designadas por "paramédicas" encontram-se perspectivados no art. 1° do referido diploma, mostrando-se no respectivo anexo a explicitação da actividade de "fisioterapia" sendo certo que dos autos resulta que a recorrida nos anos de 2003 a 2005 não tinha ao seu serviço profissionais que preenchessem os requisitos do art. 2° do DL 261/93 de 24.07.
Donde se conclui pela legalidade do acto tributário impugnado porquanto o regime a que estão sujeitas asa actividades abarcadas pelo diploma legal em referência, impõe que, ao oferecer aos clientes serviços que pretende ser de "fisioterapia", tinha a recorrida de contratar profissionais habilitados com diplomas que preenchessem os requisitos exigidos por lei. Não o tendo feito, não pode vir pretender usar da isenção de IVA nos termos referidos nos autos.».
Dir-se-á, ainda, como reforço desta posição, que o n.º1 do artigo 9º do CIVA tem por base a alínea c) do nº1 da parte A do artigo 13º da Directiva 77/388/CEE, de 17 de Maio de 1977 (Sexta Directiva - relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme) a respeito da qual, o acórdão de 27 de Abril de 2006, proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia -TJUE- (então Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia -TJCE-) nos processos C-443/03 (caso H. A. Solleveld/ Staatssecretaris van Financiën) e C-444/04 (caso J. E. van den Hout-van Eijnsbergen/ Staatssecretaris van Financiën) afirmou: « (…) no que respeita, em primeiro lugar, ao objectivo prosseguido pelo artigo 13.º, A, n.º 1, alínea c), da Sexta Directiva, há que assinalar que o requisito previsto por esta disposição, segundo o qual as prestações de serviços de assistência devem ser efectuadas no âmbito do exercício das actividades paramédicas, tal com são definidas pelo Estado-Membro em causa, visa garantir que a isenção se aplica apenas às prestações de serviços de assistência efectuadas por prestadores com as qualificações profissionais exigidas (acórdão Kügler, já referido, n.º 27). Por conseguinte, nem todas as prestações de serviços de assistência beneficiam de tal isenção, pois esta abrange unicamente as prestações que apresentam um nível de qualidade suficiente tendo em conta a formação profissional dos prestadores.
Daqui resulta que a exclusão de uma determinada profissão ou de uma actividade específica de assistência da definição de profissões paramédicas prevista pela legislação nacional para efeitos da isenção do IVA prevista no artigo 13.º, A, n.º 1, alínea c), da Sexta Directiva deve poder ser justificada por razões objectivas fundadas nas qualificações profissionais dos prestadores de assistência e, portanto, por considerações relativas à qualidade dos serviços prestados.
No que respeita, em segundo lugar, ao princípio da neutralidade fiscal, que é inerente ao sistema comum de IVA, importa recordar que, segundo a jurisprudência, este princípio se opõe a que prestações de serviços semelhantes, que estão, portanto, em concorrência entre si, sejam tratadas de maneira diferente do ponto de vista do IVA (acórdãos de 23 de Outubro de 2003, Comissão/Alemanha, C-109/02, Colect., p. I-12691, n.º 20, e Kingscrest Associates e Montecello, já referido, n.º 54).» (disponível no endereço http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf;jsessionid=9ea7d0f130deaefe9b31914144289000a8a3dc0a06b9.e34KaxiLc3eQc40LaxqMbN4ObN0Pe0?text=&docid=56254&pageIndex=0&doclang=PT&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=187709).»
Este juízo é inteiramente transponível para o presente caso. Assim, também aqui se deve considerar as actividades levadas a cabo pela recorrente não se encontram contemplados na lista das actividades paramédicas definidas pelo Decreto-Lei n° 261/93 de 24/07, por isso não podendo beneficiar da isenção do artigo 9° n°1 alínea b) do CIVA.
Numa segunda linha de argumentação vem a recorrente dizer que apesar de ter uma licenciatura em assistente social desenvolve actividades paramédicas com conhecimentos obtidos empiricamente.
Ora, como vimos, para o exercício de actividades paramédicas é exigida a titularidade de um curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais - alínea a) do n° 1 do artigo 2° do Decreto - Lei n.º 261/93 de 24 de Julho.
Acresce referir que, contrariamente ao afirmado pela recorrente o Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça, no âmbito do Processo C-76/99 (Comissão das Comunidades Europeias/ República Francesa), não tem aplicação ao caso dos autos.
Com efeito, ainda que o Tribunal de Justiça se tenha referido ao artigo 13.°, A, n.° 1, alínea b), da Sexta Directiva, fê-lo no âmbito de questão diversa à colocada nestes autos, porquanto o que ali se discutia foi o de saber se: « em razão da necessidade de interpretar restritivamente as derrogações à tributação em IVA a favor de determinadas operações, as diferenças existentes entre os contratos de colaboração e os contratos de preço fixo justificam que, neste último caso, o acto de transmissão da colheita seja sujeito, enquanto acto distinto, a IVA.», ou dito de outro modo, se um acto de colheita e a transmissão da colheita a um laboratório especializado constituem prestações estreitamente conexas com a análise, de tal forma que deviam seguir o mesmo regime fiscal desta e, portanto, não estar sujeitos a IVA.
E, quanto a esta concreta questão o Tribunal respondeu nos seguintes termos: « De facto, para efeitos de uma eventual isenção de IVA do acto de transmissão de colheitas médicas, deve ter-se em consideração a finalidade com que estas colheitas são efectuadas. Assim, quando um profissional de saúde habilitado para o efeito prescreve, com vista à elaboração do seu diagnóstico e com um fim terapêutico, que o seu paciente se sujeite a uma análise, a transmissão da colheita, que logicamente se insere entre o acto de colheita e a análise propriamente dita, deve ser considerada estreitamente conexa com a análise e, por conseguinte, beneficiar de isenção de IVA (v., no que respeita a prestações que, não tendo um fim terapêutico, devem ser sujeitas a IVA, acórdão de 14 de Setembro de 2000, D., C-384/98, Colect., p. I-6795, n.° 19).»(https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:61999CJ0076&from=PT).
Assim, não sendo o caso subjacente a estes autos não podemos concluir por uma identidade da situação de facto a legitimar a aplicação da jurisprudência ali afixada.
Por último, a recorrente refere ainda que, tendo contratado os serviços de contabilidade deverão ser responsabilizados a sociedade de contabilidade e o TOC pelo errado enquadramento fiscal.
Acontece, porém, que o processo de impugnação judicial visa apreciar a legalidade de actos de liquidação, daí que a argumentação expendida pela recorrente (conclusões 25 a 28) não se presta a servir de fundamento à pretensão anulatória dos actos de liquidação sindicados.
Com efeito, a invocada responsabilidade contratual não tem a ver com essa legalidade. Assim, torna-se, pois, claro que a questão relativa à eventual responsabilidade do Técnico Oficial e da sociedade de contabilidade, como bem referiu a sentença recorrida por «estarmos perante uma responsabilidade contratual, sempre teria de ser alegada, não sendo esta a sede própria.».
Daí que, em resumo e sem necessidade de maiores desenvolvimentos, se conclua pela improcedência do recurso, sendo de manter, a sentença recorrida.
IV.CONCLUSÕES
I. As isenções constituem derrogações ao princípio geral enunciado no artigo 2.° da Sexta Directiva, segundo o qual o IVA é cobrado sobre cada prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito passivo,
III. A isenção prevista no artigo 9.° n°1 al. b) do CIVA implica que a actividade seja prestada por determinados profissionais devidamente habilitados para o efeito.
IV. Para o exercício de actividades paramédicas é exigida a titularidade de um curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais - alínea a) do n° 1 do artigo 2° do Decreto - Lei n.º 261/93 de 24 de Julho.
V.DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam as juízas da 1ª Subsecção de Contencioso Tributário Tribunal Central Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 17 de Outubro de 2019.

Ana Pinhol


Isabel Fernandes


Catarina Almeida e Sousa