Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 13655/16 |
Secção: | CA- 2º JUÍZO |
Data do Acordão: | 10/06/2016 |
Relator: | NUNO COUTINHO |
Descritores: | PROVIDÊNCIA CAUTELAR FUMUS BONI IURIS |
Sumário: | I – A segunda parte do nº 1 do artigo 120º do CPTA, na versão que resulta do D.L. nº 214-G/2015, de 2 de Outubro, exige, como pressuposto para o deferimento da pretensão cautelar, que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente. II – Não se mostra preenchido o critério de decisão em apreço – fumus boni iuris – em sede de providência cautelar de suspensão de eficácia de acto administrativo que determinou o afastamento do requerente de território nacional, quando este foi condenado na pena de 4 anos e 6 meses de prisão efectiva, pela prática do crime previsto e punido no artigo 21 nº 1 do D.L. nº 15/93, de 22/01. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório José ………………………… requereu contra o Ministério da Administração Interna providência cautelar de suspensão de eficácia de acto praticado em 15 de Dezembro de 2015 pelo Director Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras nos termos do qual foi determinado o afastamento coercivo do recorrente do território nacional. Por decisão proferida em 19 de Maio de 2016, o T.A.F. de Sinta indeferiu a pretensão cautelar formulada. Inconformado com o decidido, o requerente recorreu para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões: “I - A Sentença proferida pelo Tribunal "a quo" encontra-se ferida de nulidade; II - O tribunal "a quo" não só não procedeu a qualquer análise e exame crítico da prova como não procedeu à inquirição das testemunhas arroladas pelo Requerente; III - A prova testemunhal indicada pelo recorrente era essencial à boa decisão da causa, isto porque, uma das testemunhas indicadas era precisamente a esposa do recorrente; IV - Ao pura e simplesmente ignorar a prova indicada pelo Recorrente o tribunal "a quo" impediu-o de demonstrar e provar que atualmente se encontra empregado, bem como aquele que foi todo o seu percurso em Portugal desde a sua chegada com Três anos de idade; V - O tribunal "a quo" violou os artigos 94º e 118º do C.P.T.A., bem como o artigo 205º da C.R.P. VI - O Tribunal "a quo" não designou data para inquirição das testemunhas, mas mais grave do que isso, não explicou sequer na sua decisão porque decidiu não ouvir as mesmas; VII - O tribunal "a quo" não esclarece qual ou quais as provas que se socorreu para decidir como decidiu, logo não procede a qualquer exame crítico da prova; VIII - Conforme se decidiu no douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, processo n.º 01579/05.6BEVIS, de 28/01/ 2016: "III - O exame crítico da prova deve consistir na indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro, permitindo às partes perceber as razões essenciais que levaram o juiz a pronunciar-se de determinado modo relativamente aos factos essenciais, por forma a ficar garantida tanto a impugnação da decisão, como a sua reapreciação pelo tribunal de recurso. IV - Se a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir, como se decidiu, nomeadamente nos casos em que a fundamentação é ininteligível, deverá entender-se que se está perante uma mera aparência de fundamentação o que implicará a nulidade da sentença por falta de fundamentação. IX - O Recorrente não foi condenado pelo Tribunal Criminal na pena Acessória de Expulsão do País; X - O Recorrente está a ser dupla e violentamente castigado, com efeito, depois de ter sido sujeito ao cumprimento de uma pena de prisão pretende agora o SEF deportar o Recorrente para um país que lhe é completamente estranho atualmente; XI - O aqui recorrente não é um "criminoso hediondo" como o Tribunal "a quo" quer fazer crer; XII - A conduta do Recorrente não tem a gravidade exigida pelo artigo 134º, n.º 1, alínea f) Da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho; XIII - Conforme se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13/02/ 2003, Processo n.º 03P167, in ww w. dgsi.pt, o qual refere o seguinte: "A estratégia repressiva atinge basicamente os consumidores, traficantes/ consumidores, pequenos traficantes. São esses que inundam os tribunais de processos e enchem a abarrotar as cadeias, numa progressão contínua que, a manter-se esta política, nada fará parar. Todo o nosso sistema penal está "colonizado" pelo consumo e pequeno tráfico de estupefacientes. " E continua mais à frente: XIV - "É hoje ingrato, incómodo e sobretudo ineficaz aplicar penas de prisão a grande parte dos arguidos que circulam nos Tribunais no âmbito da criminalidade relacionada com o consumo e o tráfico de estupefacientes. Ingrato, porque, normalmente, as razões de tutela de uma situação de perigo que estão na origem da punição do tráfico não se verificam. Incómodo, porque grande parte dos arguidos julgados são pessoas doentes que, mais do que uma pena, que afinal é aquilo que "levam" do Tribunal, precisam de apoio pessoal, familiar e clínico. Ineficaz, porque não se resolvem nos Tribunais e nas prisões grande parte das situações pessoais que levaram alguém a consumir e a traficar pequenas quantidades de estupefacientes. " Haverá, por isso, que não "meter no mesmo saco" todos os traficantes, distinguindo entre os casos "graves" (Artigo 21º) os muito graves (Artigo 24°) e os pouco graves (Artigo 25°). Em tempos, é certo, a "jurisprudência quase esvaziou os Artigos 25º e 26º, remetendo para o Artigo 21º a generalidade das situações e fazendo uma interpretação contra legem do Artigo 25°. Mas, aplicando-se este artigo às situações em que a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das drogas, a interpretação que parece mais consentânea com o texto (e com a epígrafe do artigo) é a de que o legislador quis incluir aqui todos os casos de menor gravidade ", ou seja, o "pequeno tráfico", "o pequeno retalhista de rua. " (Negrito e Sublinhado Nossos) XV - No caso Sub Júdice o Tribunal ''a quo" pretende pura e simplesmente, porque errou uma vez, afastá-lo daquilo que mais é importante para si: a sua esposa e o seu filho menor; XVI - Como referem Júlio A.C. Pereira e José Cândido de pinho, in Direito de Estrangeiros, Coimbra Editora, pág. 464: "Actos criminosos graves", para efeitos desta al. F), é expressão indeterminada que exigirá ponderação no momento da apreciação de cada caso pelas autoridades administrativas ou pelos órgãos jurisdicionais competentes." XVII - O crime praticado tem que ter aos olhos da pessoa comum uma gravidade extrema, estamos a falar de uma medida que permite inclusive separar uma família, separar o pai de um filho e a esposa de um marido. XVIII - Ora, sempre com o devido respeito por opinião diversa, analisada a situação concreta dos presentes autos o crime pelo qual o arguido foi condenado não tem uma gravidade tal que permita o seu afastamento da sua família, aliás como decorre o Acórdão do STJ acima referido; XIX - Como resulta da matéria provada, o recorrente sempre contribuiu para o sustento do seu filho menor, mesmo agora em cumprimento de pena exerce atividade profissional no Estabelecimento prisional, o que lhe permite tirar algum rendimento que, posteriormente remete à sua esposa para fazer face com as despesas dos filhos; XX - Após abandonar o Estabelecimento Prisional, o que ocorrerá no decurso do presente ano o Recorrente tem já trabalho assegurado como lavador de automóveis. XXI - Se a providência cautelar não for decretada, o Recorrente será expulso para um País onde atualmente não tem qualquer relação, será afastado do seu filho menor, com 6 anos de idade, que depende do recorrente e da sua esposa; XXII - Caso o presente procedimento cautelar não seja deferido o Recorrente será expulso do País, ou seja, teremos uma situação de facto consumada; XXIII - O Recorrente ficará impedido de poder entrar em território nacional, fica impedido de viajar para Portugal, de ver a sua família, filho e esposa; XXIV - Como consta da exposição de motivos do CPTA, "no que se refere ao critério da aparência do bom direito, adapta-se um critério gradualista, admitindo que esse critério ( ...) deva ser de indagação mais exigente quando esteja em causa a adopção de uma providência antecipatória do que a adopção de uma providência meramente conservatória - com o que, no que diz respeito a providências conservatórias como a suspensão da eficácia de actos administrativos, se evita a adopção de um regime mais restritivo, que conferisse à aparência de bom direito um papel decisivo que tradicionalmente não lhe é atribuído. " XXV - "Consagra-se, deste modo, o que já foi qualificado como um fumus non malus iuris: não é necessário um juízo de probabilidade quanto ao êxito do processo principal, basta que não seja evidente a improcedência da pretensão de fundo do requerente ou a falta do preenchimento de pressupostos dos quais dependa a própria obtenção de uma pronúncia sobre o mérito da causa." Mário Aroso de Almeida, Carlos Cadilha, in Comentário ao C.P.T.A., Almedina, pág.706. XXVI - "Se a providência pedida for apenas uma providência conservatória, já não é preciso que se prove ou que o juiz fique com a convicção da probabilidade de que a pretensão seja procedente, bastando que "não seja manifesta a falta de fundamento". Vieira de Andrade, in A justiça Administrativa, 4ª edição, Almedina, pág.300. XXVII - Como se decidiu no douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, no âmbito do processo n.º 0764/14.4BEAVR, proferido em 11/02/2015, disponível em www.dgsi.pt : I)- Não se perspectivando manifesta falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular no processo principal ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito, existindo "periculum in mora” e jogando a ponderação de interesses a favor do requerente de uma providência conservatória, é esta concedida.* XXVIII - Verte o artigo 135º, da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho que : "Não podem ser expulsos do País os cidadãos estrangeiros que: …… e) Tenham filhos menores, nacionais de Estado terceiro, residente em território português, sobre os quais exerçam efectivamente o poder paternal e a quem assegurem o sustento e a educação." XXIX - Refere-se em anotação ao artigo 8° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem: "... a expulsão de uma pessoa de um país onde vive a sua família próxima pode colocar problemas em relação ao disposto neste artigo - Acórdãos Moustaquim, de 18 fevereiro de 1991, A 1193, pág. 18... Os estrangeiros estabelecem naturalmente relações sociais e familiares no páis de acolhimento - Acórdão Da/ia, de 19 de Fevereiro de 1998, R98-l, pág. 89§45. Por isso, a sua expulsão pode vir a ferir aquelas; a expulsão de um estrangeiro para um país onde não tem ligações só pode ser admitida em circunstâncias excepcionais - relatório de 15 de Março de 1990, caso Djeroud, A 191-B, págs. 35-36, §65." "A Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Anotada, por Ireneu Cabral Barreto, Coimbra Editora, 3ª edição, pág.189-190. XXX - O SEF ao decidir como decidiu violou, nomeadamente, os princípios consagrados nos artigos 3º, 4º, Sº, 6º, 7º, 8º, 10º e 110 todos do C.P.A ., bem como o artigo 135º, da Lei n.º 23/2007 e bem assim o artigo 8° da Convenção Europeia dos Direitos do homem;” Não foram apresentadas contra alegações. O EMMP emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. II) Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos: “Artigo 120.º 1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adoptadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente. Critérios de decisão 2 - Nas situações previstas no número anterior, a adopção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências. 3 - As providências cautelares a adoptar devem limitar-se ao necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos pelo requerente, devendo o tribunal, ouvidas as partes, adoptar outra ou outras providências, em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tenham sido concretamente requeridas, quando tal se revele adequado a evitar a lesão desses interesses e seja menos gravoso para os demais interesses públicos ou privados, em presença. 4 - Se os potenciais prejuízos para os interesses, públicos ou privados, em conflito com os do requerente forem integralmente reparáveis mediante indemnização pecuniária, o tribunal pode, para efeitos do disposto no número anterior, impor ao requerente a prestação de garantia por uma das formas previstas na lei tributária.” (…) Não estando em causa o preenchimento do requisito relativo ao periculum in mora, desde logo porque a execução do acto suspendendo que determina o afastamento do recorrente de território nacional será geradora de uma situação de facto consumado, importa atentar no critério do fumus boni iuris que o Tribunal considerou não verificado, indeferindo, com este fundamento, a providência. No que concerne ao critério de decisão em apreço escreveu-se, genericamente quanto ao mesmo, o seguinte, na decisão recorrida: (…) “ Relevam no caso, fundamentalmente, os nºs 1 e 2, do citado artigo 120, do CPTA/2015. Deste modo, segundo o novo CPTA, as providências cautelares, quer sejam conservatórias quer sejam antecipatórias, são adotadas quando haja fundado receio [periculum in mora] da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal «e», cumulativamente [como indica a conjunção copulativa «e»], seja provável [ou seja verosímil, expectável, previsível] que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente [fumus boni iuris]. Assim, exige-se agora que, num juízo de prognose prévia, em face da análise da questão que se coloque, seja razoavelmente de prever, de forma clara e expectável, que a pretensão do processo principal do Requerente vai ser julgada procedente. Deste modo, comparando, enquanto que no anterior artigo 120-1-b), do CPTA, se exigia, cumulativamente [vd a mesma copulativa «e»], que «não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão [fumus malus juris]» do processo principal, bastando, então, que não existisse manifesto fumus malus iuris, agora o legislador veio exigir que, para o decretamento da providência, além de ter de existir um periculum in mora, tenha de existir também, cumulativamente, um claro fumus boni iuris.” O acto impugnado estribou-se nas alíneas a) e f) do nº 1 do artigo 134º da Lei 23/2007, de 04 de Setembro, alterada pela Lei 29/2012, de 9 de Agosto, preceito que se transcreve: “Artigo 134.º 1 - Sem prejuízo das disposições constantes de convenções internacionais de que Portugal seja Parte ou a que se vincule, é afastado coercivamente ou expulso judicialmente do território português, o cidadão estrangeiro: Fundamentos da decisão de afastamento coercivo ou de expulsão a) Que entre ou permaneça ilegalmente no território português; b) Que atente contra a segurança nacional ou a ordem pública; c) Cuja presença ou actividades no País constituam ameaça aos interesses ou à dignidade do Estado Português ou dos seus nacionais; d) Que interfira de forma abusiva no exercício de direitos de participação política reservados aos cidadãos nacionais; e) Que tenha praticado actos que, se fossem conhecidos pelas autoridades portuguesas, teriam obstado à sua entrada no País; f) Em relação ao qual existam sérias razões para crer que cometeu actos criminosos graves ou que tenciona cometer actos dessa natureza, designadamente no território da União Europeia; g) Que seja detentor de um título de residência válido, ou de outro título que lhe confira direito de permanência em outro Estado membro e não cumpra a obrigação de se dirigir, imediatamente, para esse Estado membro; h) O disposto no número anterior não prejudica a responsabilidade criminal em que o estrangeiro haja incorrido; i) Aos refugiados aplica-se o regime mais benéfico resultante de lei ou convenção internacional a que o Estado Português esteja obrigado. 2 - O disposto no número anterior não prejudica a responsabilidade criminal em que o estrangeiro haja incorrido. O T.A.F. de Sintra, na decisão recorrida considerou não se mostrar preenchido o requisito do fumus boni iuri, com a densidade vertida na segunda parte do nº 1 do artigo 120º do C.P.T.A., entendimento contra o qual se insurgiu o recorrente, estribado, em síntese em dois argumentos, no disposto no artigo 135º da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho e na circunstância de a grave do crime pela prática do qual foi punido não ter a gravidade exigida pelo artigo 134º, nº 1 alínea f) da referida Lei. Vejamos, tendo presente que o recorrente não questionou permanecer ilegalmente em Portugal. O artigo 135º da Lei 23/2007, na redacção originária preceituava: “Artigo 135º Não podem ser expulsos do País os cidadãos estrangeiros que:Limites à expulsão a) Tenham nascido em território português e aqui residam; b) Tenham efectivamente a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa a residir em Portugal; c) Tenham filhos menores, nacionais de Estado terceiro, residentes em território português, sobre os quais exerçam efectivamente o poder paternal e a quem assegurem o sustento e a educação; d) Que se encontrem em Portugal desde idade inferior a 10 anos e aqui residam.” Por força da alteração introduzida pela Lei 29/2012, de 9 de Agosto – aqui aplicável - o preceito em apreço foi alterado passando a ter a seguinte redacção: “Artigo 135.º Com excepção dos casos de atentado à segurança nacional ou à ordem pública e das situações previstas nas alíneas c) e f) do n.º 1 do artigo 134.º, não podem ser afastados ou expulsos do território nacional os cidadãos estrangeiros que: Limites à decisão de afastamento coercivo ou de expulsão a) Tenham nascido em território português e aqui residam habitualmente; b) Tenham a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa ou estrangeira, a residir em Portugal, sobre os quais exerçam efectivamente as responsabilidades parentais e a quem assegurem o sustento e a educação; c) Se encontrem em Portugal desde idade inferior a 10 anos e aqui residam habitualmente.” É notória a diferença de redacção da versão original e da versão alterada pela Lei 29/2012, de 9 de Agosto, resultando desta, nomeadamente, que nas situações previstas nas alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 134º e mesmo que o cidadão estrangeiro tenha a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa ou estrangeira, a residir em Portugal, sobre os quais exerçam efectivamente as responsabilidades parentais e a quem assegurem o sustento e a educação, pode o mesmo ser alvo de decisão de expulsão desde que a sua presença ou actividades no País constituam ameaça aos interesses ou à dignidade do Estado Português ou dos seus nacionais ou em relação ao qual existam sérias razões para crer que cometeu actos criminosos graves ou que tenciona cometer actos dessa natureza, designadamente no território da União Europeia. No caso em apreço e para além de não se poder concluir que o recorrente tinha a seu cargo o filho menor Carlos Miguel, dado o recorrente se encontrar à data da prolação da decisão recorrida a cumprir pena de prisão no Estabelecimento Prisional de Caxias, não podendo exercer assim, de modo efectivo como exige a alínea b) do artigo 135º supra transcrito, as responsabilidades parentais, pese embora o recorrente contribuir para o sustento do filho menor, exercendo actividade no estabelecimento prisional, a questão fulcral residirá em saber se o crime – tráfico de estupefacientes – pelo qual o recorrente foi punido assume foros de gravidade justificativos da decisão de afastamento do território nacional, entendimento que o T.A.F. de Sintra acolheu, discordando o recorrente do mesmo. Importa recordar que o recorrente foi condenado por Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa na pena de 4 anos e 6 meses de prisão efectiva, pela prática do crime previsto e punido no artigo 21 nº 1 do D.L. nº 15/93, de 22/01 – tráfico de estupefacientes -, prevendo o referido preceito: “Artigo 21.º 1 - Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40.º, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos.”Tráfico e outras actividades ilícitas O recorrente refere que a prática do crime de tráfico de estupefacientes não se reveste de gravidade bastante justificativa do acto suspendendo, argumentação da qual este Tribunal discorda. Um primeiro indício da gravidade do crime de tráfico de estupefacientes detecta-se na moldura penal do mesmo – a punição com pena de prisão de 4 a 12 anos -; um segundo indício, atinente à norma que sustentou a pena de prisão na qual foi o recorrente condenado pelo Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 4 de Novembro de 2014, reside na circunstância de o recorrente ter sido condenado pelo crime previsto e punido no nº 1 do artigo 21º do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro e não pelo crime previsto e punido no artigo 25º do mesmo diploma legal, que prevê o tráfico de menor gravidade, o que permite afastar a argumentação aduzida pelo requerente de acordo com a qual se estaria perante um crime menos grave, a que acresce ainda a circunstância de o crime de tráfico de estupefacientes causar, como se referiu na decisão recorrida, inquestionável “…corrosão social (…), ao nível pessoal, ao nível familiar, ao nível da erosão dos valores positivados das relações em sociedade, ao nível afectivo, ao nível das instituições, ao nível do património, ao nível da saúde mental e física, ao nível da saúde pública, sem descurar também as implicações que causa ao nível da implicação do cometimento de outros crimes, nomeadamente contra o património e contra as pessoas.”, crime que, nos termos igualmente apontados na decisão recorrida, se encontra no elenco da criminalidade altamente organizada, nos termos do artigo 1º alínea m) do Código de Processo Penal. Assim, o juízo a que chegou o T.A.F. de Sintra quanto ao não preenchimento do requisito relativo ao fumus boni iuris, plasmado na segunda parte do nº1 do artigo 120º do CPTA é acolhido por este Tribunal, pelo que independentemente de todas as considerações tecidas pelo recorrente quanto às consequências, inelutáveis, que a execução do acto acarretará para a sua vida familiar – o afastamento da Mãe do seu filho e deste –, o que releva apenas para que se considere preenchido o requisito relativo ao periculum in mora, sempre a pretensão cautelar está votado ao insucesso, pelos motivos supra expostos, pelo que redundaria em diligência probatória inútil inquirir as testemunhas arrolada pelo recorrente, testemunhas com as quais pretenderia demonstrar que actualmente se encontra empregado, bem como todo o seu percurso em Portugal desde a sua chegada com três anos de idade – cfr. conclusão IV das alegações de recurso –, alegação esta que, refira-se, contraria o teor das declarações prestadas em 29 de Julho de 2015, no Estabelecimento Prisional de Caxias nas quais referiu ter chegado a Portugal no ano de 2000, altura em que teria 24/25 anos, dado ter nascido em 1975 (cfr. itens 1) e 18) dos factos apurados - pelo que a sentença recorrida não violou o artigo 118º do CPTA. Por último importa referir inexistir qualquer violação do artigo 8º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem dado a invocada ingerência na vida pessoal e familiar do recorrente estar prevista na lei e se mostrar adequada para a prevenção de infracções penais, não revelando os autos que o acto suspendendo viole os artigos 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 10º e 11º do CPA, dado o acto impugnado, em sede de avaliação própria da tutela cautelar, necessariamente mais aprofundada face à alteração operada na redacção do artigo 120º do CPTA pelo D.L. nº 214-G/2015, de 2 de Outubro, se mostrar conforme com o regime legal aplicável, pelo que soçobra o recurso. IV) Decisão Assim, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul, em negar provimento ao recurso. Custas pelo recorrente, Lisboa, 6 de Outubro de 2016 Nuno Coutinho José Gomes Correia Paulo Vasconcelos |