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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08534/15
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:05/07/2015
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:I.R.C.
NOÇÃO DE CUSTOS.
REQUISITO DA INDISPENSABILIDADE DE UM CUSTO.
NÃO POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS INCIDENTES SOBRE A OPORTUNIDADE E MÉRITO DA DESPESA.
DESPESAS DE REPRESENTAÇÃO. CONCEITO.
TRIBUTAÇÃO AUTÓNOMA DAS DESPESAS DE REPRESENTAÇÃO.
DESPESAS DE PUBLICIDADE (CFR.ARTº.23, Nº.1, AL.B), DO C.I.R.C.).
Sumário:
1. Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito. Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico.
2. O requisito da indispensabilidade de um custo tem sido jurisprudencialmente interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspectiva económica-empresarial, na percepção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um encargo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objecto societário do ente comercial em causa, sendo vedadas à A. Fiscal actuações que coloquem em crise o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo. Não obstante, se a A. Fiscal duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respectivo escopo societário.
3. É entendimento da jurisprudência e doutrina que a A. Fiscal não pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a oportunidade e mérito da despesa. Um custo é indispensável quando se relacione com a actividade da empresa, sendo que os custos estranhos à actividade da empresa serão apenas aqueles em que não seja possível descortinar qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos (ou com o rendimento, na expressão actual do código - cfr.artº.23, nº.1, do C.I.R.C.), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica.
4. O P.O.C. não conceptualizava as despesas de representação, pelo que, para a sua relevação contabilística, tem sido considerado o conceito previsto no C.I.R.C. Assim, o artº.41, nº.3, do referido diploma, prescrevia que se consideravam despesas de representação, nomeadamente, os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no país ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades.
5. Actualmente para o conceito de despesas de representação deve atender-se ao artº.81, nº.7, do C.I.R.C. (cfr.anteriormente o artº.4, nº.6, do dec.lei 192/90, de 9/6), devem considerar-se como abarcando tal conceito, nomeadamente, os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos, no país ou no estrangeiro, a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades.
6. A tributação autónoma das despesas de representação está actualmente incluída no artº.81, nº.3, do C.I.R.C., sendo a taxa de 20%. A sujeição a tributação autónoma de tais gastos implica que cada acto de despesa se considere um facto tributário autónomo, a que o contribuinte fica sujeito, venha ou não a ter rendimento tributável em I.R.C. no fim do período contabilístico respectivo.
7. Por último, refira-se que apenas são dedutíveis como despesas de representação os custos devidamente documentados e escriturados, assim devendo satisfazer o requisito de indispensabilidade previsto no citado artº.23, do C.I.R.C. para que sejam como tal considerados.
8. Se do exame da factualidade provada se conclui que estamos perante despesas que se destinam, não a representar a sociedade impugnante onde esta não se encontra presente (portanto, fora da sua actividade principal), mas a assegurar o normal desenvolvimento do seu objecto social, dentro do circuito económico onde este naturalmente se manifesta, não se pode qualificar tais custos como despesas de representação, mas antes como custos inerentes ao normal desenvolvimento da actividade principal da sociedade impugnante/recorrida, de acordo com a definição do mesmo constante do nº.4 do probatório (comércio por grosso de produtos farmacêuticos), assim devendo enquadrar-se no artº.23, nº.1, al.b), do C.I.R.C., enquanto despesas de publicidade.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.147 a 153 do presente processo, através da qual julgou totalmente procedente a impugnação intentada pela sociedade recorrida, “………………………, S.A.”, tendo por objecto acto de autoliquidação de I.R.C., relativa ao ano de 2008, e a consequente decisão de indeferimento de reclamação graciosa necessária que foi deduzida.
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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.172 a 174 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Nos termos do artigo 88 n.° 7 do CIRC são despesas de representação as despesas suportadas com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no país ou no estrangeiro a clientes ou fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades;
2-Não tendo sido demonstrado que as despesas em causa nos autos assumem a natureza de despesas de publicidade, nomeadamente nos termos previstos nos artigos 150 a 165 DL 176/2006 de 30/08, terá a pretensão da impugnante (de afastar a sua qualificação como despesas de representação) de improceder, porquanto era sobre esta que incidia o ónus da prova nos termos do art. 74 da LGT;
3-Sendo que as despesas incorridas na promoção de medicamentos fora das condições previstas naquele artigo 150 n.° 1, como sucede no caso dos autos, não são consideradas como despesas de publicidade para os efeitos previstos no mesmo decreto lei, e para efeitos do art. 23° do CIRC;
4-Nomeadamente ficando fora da previsão deste art. 23° do CIRC quando não tenham sido incorridas para promoção da venda dos medicamentos da impugnante (passando essa promoção de venda pelas formas prescritas no art. 150 n.° 1 do DL 176/2006 de 30/08), ou essa demonstração não tenha sido efectuada;
5-A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não merecendo por isso ser confirmada;
6-Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça.
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A sociedade recorrida produziu contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da decisão do Tribunal "a quo" (cfr.fls.175 a 183 dos autos), nas quais termina com as seguintes Conclusões:
1-A douta sentença bem andou ao declarar a subtracção à tributação autónoma do IRC de 2008 da recorrida o montante de despesas relativas a encargos com acolhimento de profissionais de saúde no âmbito de sessões clínicas de promoção dos seus fármacos, em cumprimento do despacho do Director-Geral dos Impostos de 16/07/2009 no qual se defende que os encargos suportados com viagens realizadas por profissionais de saúde para participarem em acções científicas (como as sessões clínicas) organizadas dentro do âmbito da promoção do medicamento (conforme regulado nos artigos 150 a 165 do DL 176/2006, de 30/8) devem ser considerados como acções de propaganda e aceites como custos de publicidade e propaganda enquadráveis na alínea b) do n.° 1 do artigo 23 do Código do IRC;
2-Não impende qualquer ónus de prova sobre a recorrida, nem em nenhum momento neste já longo processo, entenderam as equipas de inspecção da AF, a Fazenda Pública ou o Tribunal, que seria necessário provar o cumprimento do Estatuto do Medicamento por parte de qualquer sessão clínica promovida pela recorrida, exactamente por a mesma não se encontrar em causa, e por nunca ter sido sequer acusada de tal violação por parte da entidade de supervisão da indústria farmacêutica, o ………………….;
3-A nova linha de argumentação da Fazenda Pública apenas poderá radicar numa tentativa última de impedir a correcta aplicação da lei, neste caso a não sujeição a tributação autónoma de despesas assumidas pela recorrida com publicidade aos seus fármacos, tentativa vem contrariar grosseiramente a sua própria e recente doutrina sobre a qualificação de despesas de publicidade em acções de promoção levadas a cabo por empresas farmacêuticas, e naturalmente obviar à aplicação da justiça;
4-Pelo que se deverá novamente e em confirmação da douta sentença proferida em 1ª. instância, determinar a anulação da autoliquidação de IRC de 2008 da ……………., declarando-se em consonância a devolução do imposto indevidamente entregue nos cofres do Estado;
5-Termos em que, deve ser negado provimento ao presente recurso, por ao mesmo não assistir qualquer fundamento, mantendo-se a sentença recorrida, determinando-se, em consequência, a correcção da autoliquidação de 2008 e consequente devolução do valor de € 191.330,97 e competentes juros indemnizatórios, com os fundamentos acima indicados e assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se negar provimento ao presente recurso (cfr.fls.196 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.

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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.149 e 150 dos autos - numeração nossa):
1-A impugnante procedeu à autoliquidação de IRC do exercício de 2008, com base na apresentação da declaração periódica de rendimentos Modelo 22, em 22/05/2009, na qual indicou o montante de € 248.215,11 referente a tributação autónoma, os quais compreendiam encargos com viaturas e despesas de representação (cfr.documento junto a fls.32 a 35 dos presentes autos);
2-O acto tributário referido supra foi objecto de reclamação graciosa, com fundamento na aplicação indevida da taxa de 10%, sobre os encargos com viaturas ligeiras e despesas de representação em resultado da aplicação das taxas mandadas aplicar aos encargos suportados desde 1/01/2008 até 31/12/2008, por força do disposto no n°1, do art° 5, da Lei nº.64/2008, de 5/12, relativo a despesas de representação e a viaturas ligeiras de passageiros à taxa de 10%, no qual se invoca que o valor incorrido entre aquelas datas perfaz o montante de € 522.010,85, assim como da consideração de certas despesas contabilizadas e tributadas autonomamente como de representação que se traduzem em despesas de publicidade, no valor total de € 1.662.748,76, tendo em vista a comercialização de medicamentos destinadas à realização dos proveitos de actividade de venda de produtos farmacêuticos, a qual foi indeferida quanto à tributação daqueles encargos, por despacho de 16/09/2011 pela D.F. Adjunta, da D.J.Adm., cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, por se haver entendido que tais despesas não têm conexão directa com a formação do lucro tributável, destinando-se a promover os medicamentos e não necessariamente à sua venda (cfr.ofício de fls.25 e despacho aposto sobre parecer e informação de fls.26 a 31 dos presentes autos; petição de reclamação graciosa de fls.3 e seg., que contém "um mapa das despesas de publicidade" de fls.25 a 32, e "detalhe de tributação autónoma do Mod 22" de fls.33, tudo dos autos de reclamação graciosa apenso);
3-Dão-se aqui por reproduzidas as facturas das despesas incorridas pela impugnante e consideradas como de promoção de medicamentos apresentadas no âmbito da reclamação graciosa referida supra (cfr.documentos juntos a fls.52 a 61 dos presentes autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “...Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita …”.

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A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório…”.

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Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
4-A sociedade impugnante/recorrida, “………………………, S.A.”, com o n.i.p.c. ………………., no ano de 2008 tinha por actividade principal o comércio por grosso de produtos farmacêuticos, CAE 46460 (cfr.documento junto a fls.32 a 35 dos presentes autos; cópia de relatório da A. Fiscal junta a fls.36 a 42 dos presentes autos).

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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar totalmente procedente a impugnação pela sociedade recorrida intentada, assim anulando o acto de indeferimento da reclamação graciosa e a auto-liquidação de I.R.C., na parte objecto dos presentes autos, mais ordenando a devolução de € 191,330,97 de imposto liquidado e superior ao legalmente devido (cfr.nºs.1 e 2 do probatório).
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em síntese e como supra se menciona, que nos termos do artº.88, nº.7, do C.I.R.C., são despesas de representação as despesas suportadas com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no país ou no estrangeiro a clientes ou fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades. Que os custos em causa nos presentes autos não podem ser considerados como despesas de publicidade para os efeitos previstos no decreto lei 176/2006, de 30/08, e no artº.23, do C.I.R.C. Que a sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados (cfr.conclusões 1 a 5 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal pecha.
No exame do presente recurso, desde logo, se deve recordar que o apelante não impugna a factualidade provada constante da sentença recorrida no âmbito do salvatério que deduz para este Tribunal (cfr.artº.640, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), nos termos previstos na lei.
Avancemos.
A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no artº.3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Por outro lado, é no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7524/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2ª. Edição, pág.237 e seg.; António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.101 e seg.).
Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc. 5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7524/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.206 e seg.).
O requisito da indispensabilidade de um custo tem sido jurisprudencialmente interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspectiva económica-empresarial, na percepção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um encargo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objecto societário do ente comercial em causa, sendo vedadas à A. Fiscal actuações que coloquem em crise o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo. Não obstante, se a A. Fiscal duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respectivo escopo societário (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 29/3/2006, rec.1236/05; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 17/7/2007, proc.1107/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13).
Mais se deve recordar que é entendimento da jurisprudência e doutrina que a A. Fiscal não pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a oportunidade e mérito da despesa. Um custo é indispensável quando se relacione com a actividade da empresa, sendo que os custos estranhos à actividade da empresa serão apenas aqueles em que não seja possível descortinar qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos (ou com o rendimento, na expressão actual do código - cfr.artº.23, nº.1, do C.I.R.C.), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 21/04/2010, rec.774/09; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/02/2008, rec.798/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/11/2009, proc.3253/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13).
Refira-se, igualmente, que as empresas são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal, a qual permita o controlo do lucro tributável (cfr.artº.98, do C.I.R.C., na versão em vigor em 1994; artºs.29 e 31, do C.Comercial).
Revertendo ao caso dos autos, entende o recorrente que as despesas incorridas pela sociedade recorrida e identificadas no nº.3 do probatório, não podendo ser consideradas como de publicidade e enquadráveis no artº.23, do C.I.R.C., devem ser vistas como despesas de representação a enquadrar no artº.81, nº.7, do mesmo diploma (actual artº.88, do C.I.R.C.) e sujeitas a uma taxa de tributação autónoma nos termos do nº.3, do mesmo preceito.
Pelo contrário, o Tribunal "a quo" entende que tais despesas se devem qualificar como encargos de publicidade, enquadráveis no artº.23, nº.1, al.b), do C.I.R.C., assim não sendo despesas de representação sobre as quais incide uma taxa de tributação autónoma.
De acordo com o anterior artº.37, al.a), do Código da Contribuição Industrial (C.C.I.), as despesas de representação não se consideravam como custos ou perdas do exercício, sendo escrituradas a qualquer título e ainda que devidamente documentadas, na parte em que a Direcção Geral das Contribuições e Impostos as reputasse de exageradas.
Face ao regime previsto no citado artº.37, al.a), do C. C. Industrial, a doutrina definia as despesas de representação como aquelas que visavam custear as deslocações dos gerentes das empresas ou os seus representantes, sempre que tais deslocações fossem ao serviço das mesmas e devendo ser devidamente documentadas para serem consideradas custos pela Administração Fiscal (cfr.Prof. Raúl Dória e António Álvaro Dória, Dicionário Prático de Comércio e Contabilidade, Livraria Cruz-Braga, 3ª. edição, 1975, I volume, pág.489).
O Código do I.R.C., aprovado pelo Dec.lei 442-B/88, de 30/11, na redacção originária do artº.41, nº.1, al.g), passou a determinar que as despesas de representação não são custos fiscais, sendo escrituradas a qualquer título, na parte em que a Direcção Geral dos Impostos as repute exageradas.
Em qualquer dos normativos mencionados o “quantum” das despesas de representação não se encontrava vertido na lei e dependia da subjectividade de interpretação da D.G.I. Deste modo, o quantitativo das despesas de representação que não era aceite fiscalmente sujeitava-se ao poder discricionário da Administração Fiscal, podendo o sujeito passivo recorrer hierarquicamente para o Ministro das Finanças, no caso de não concordar com a decisão da D.G.I.
Com a Lei 39-B/94, de 27/12 (Lei do OE/95), regime em vigor a partir de 1/1/1995, o artº.41, nº.1, al.g), do C.I.R.C., passou a não considerar como custo fiscal as despesas de representação, escrituradas a qualquer título, na proporção de 20%. Com esta alteração legislativa, a quantificação em 20% da não consideração como custo fiscal das despesas de representação, o legislador visou resolver os ditos problemas subjectivos inerentes ao critério de razoabilidade a analisar pela Administração Fiscal.
Como já referimos, o P.O.C. não conceptualizava as despesas de representação, pelo que, para a sua relevação contabilística, tem sido considerado o conceito previsto no C.I.R.C. Assim, o artº.41, nº.3, do referido diploma, prescrevia que se consideravam despesas de representação, nomeadamente, os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no país ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades.
Posteriormente, o artº.41, nº.5, da Lei 3-B/2000, de 4/4 (OE/2000), veio revogar, além do mais, o artº.41, nºs.3 e 4, do C.I.R.C., integrando essas despesas no artº.4, do dec-lei 192/90, de 9/6, mais estabelecendo, no seu nº.3, que as despesas de representação são tributadas autonomamente em I.R.S. ou I.R.C., consoante os casos, a uma taxa de 6,4%. Com a Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro (a designada “Lei da Reforma Fiscal”), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2001, no seu artº.6, aditou o artº.69-A, ao C.I.R.C., sendo que no nº.3 deste novo preceito, passam a ser tributados autonomamente, a taxa correspondente a 20% da taxa normal mais elevada, as despesas de representação. Por último, através do dec.lei 198/2001, de 3/7, que procedeu à renumeração dos artigos do C.I.R.C., a tributação autónoma das despesas de representação passou a ser incluída no artº.81, nº.3, do mesmo diploma, mantendo-se a taxa de tributação autónoma em 20%. Desta forma, é assegurada uma maior receita fiscal em I.R.C., pois que a tributação autónoma de tais despesas se caracteriza pelo facto de a empresa pagar imposto, independentemente da obtenção de lucro ou prejuízo fiscal.
É que, recorde-se, a sujeição a tributação autónoma de tais gastos implica que cada acto de despesa se considere um facto tributário autónomo, a que o contribuinte fica sujeito, venha ou não a ter rendimento tributável em I.R.C. no fim do período contabilístico respectivo (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/2/2013, rec.1375/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13).
Por último, refira-se que apenas são dedutíveis como despesas de representação os custos devidamente documentados e escriturados, assim devendo satisfazer o requisito de indispensabilidade previsto no citado artº.23, do C.I.R.C. para que sejam como tal considerados (cfr.F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.346).
Ainda no que diz respeito ao conceito de despesas de representação, atento o disposto no artº.81, nº.7, do C.I.R.C. (cfr.anteriormente o artº.4, nº.6, do dec.lei 192/90, de 9/6; actual 88, nº.7, do C.I.R.C.), devem considerar-se como abarcando tal conceito, nomeadamente, os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos, no país ou no estrangeiro, a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc. 6754/13; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.202 e seg.).
No caso "sub judice", do exame da factualidade provada (cfr.nºs.3 e 4 do probatório), deve concluir-se, com o Tribunal "a quo", que nos encontramos perante despesas que se destinam, não a representar a sociedade impugnante onde esta não se encontra presente (portanto, fora da sua actividade principal), mas a assegurar o normal desenvolvimento do seu objecto social, dentro do circuito económico onde este naturalmente se manifesta. Por outras palavras, não nos encontramos perante despesas de representação, mas antes perante custos inerentes ao normal desenvolvimento da actividade principal da sociedade impugnante/recorrida, de acordo com a definição do mesmo constante do nº.4 do probatório (comércio por grosso de produtos farmacêuticos), assim devendo enquadrar-se no artº.23, nº.1, al.b), do C.I.R.C., enquanto despesas de publicidade, conforme se entendeu na decisão recorrida, nenhum relevo tendo, para o efeito, o regime previsto no dec.lei 176/2006, de 30/08 (regime jurídico relativo aos medicamentos de uso humano).
Face ao exposto, a auto-liquidação em causa e o posterior acto de indeferimento da reclamação graciosa padecem de vício invalidante, neste sentido se confirmando a sentença apelada.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 7 de Maio de 2015



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)