Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04888/11
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/15/2012
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. CONVOLAÇÃO. REVISÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO. FIXAÇÃO DO VALOR PATRIMONIAL. SEGUNDA AVALIAÇÃO.
Sumário:I) O dever de determinar a convolação processual, sempre que possível prende-se com o princípio “pro actione”, no sentido de promover a celeridade processual sempre que não existam obstáculos que a impeçam (cfr. art. 97º da LGT), sendo que tem sido entendido que constituem obstáculos a essa mesma convolação, a inadequação do pedido formulado e a intempetividade, por referência à forma processual correcta, ou seja, em regra a convolação é obrigatória para o Tribunal que constata o erro na forma do processo ou perante o qual é arguido mas para que se opere não podem ter já decorrido os prazos para propositura da acção que é a própria, matéria que obsta à referida convolação.
II) Quer se considere que com a presente impugnação judicial os recorrentes visam a anulação de todas as notas de liquidação de 2005 a 2007 emitidas com base no valor erradamente apurado, atribuindo efeitos retroactivos à rectificação do valor patrimonial, o que significa que o meio processual adequado para a impugnação de liquidações de tributos é, justamente, a impugnação judicial.
III) Quer se pondere que está em causa a fixação do valor patrimonial, é ponto assente que também a impugnação dos actos de fixação de valores patrimoniais, no caso a determinação do VPT é susceptível de impugnação judicial, nos termos do estatuído nos artigos 77º do CIMI e 134º do CPPT, o que significa que, em qualquer caso, é correcto o meio processual adequado, o que equivale a dizer que não existe fundamento legal para a convolação dos autos em revisão de acto tributário, nos termos do disposto no artigo 78º da LGT, atento o disposto nos artigos 97º nº 3 da LGT e 98º nº 4 do CPPT.
IV) O acto de fixação do VPT é um acto destacável do procedimento de liquidação do imposto e como tal deve ser impugnado autonomamente, não podendo a correcção do mesmo ser efectuada em sede de impugnação dos actos de liquidação.
V) Considerando que não é possível afirmar que a AF tinha a obrigação legal de corrigir o alegado lapso declarativo dos ora recorridos e que os mesmos não requereram segunda avaliação do imóvel nem impugnaram, consequentemente, a fixação do valor patrimonial, o VPT entretanto fixado, de acordo com a área bruta efectiva de construção, na sequência da apresentação de nova declaração modelo 1 para além do prazo para pedir segunda avaliação estatuído no artigo 76º do CIMI, só poderia ser aceite ao abrigo do disposto no artigo 130º do CIMI, só produzindo efeitos a partir da data da sua entrega.
*
O Relator
Pedro Vergueiro
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário ( 2ª Secção ) do Tribunal Central Administrativo Sul:
1. RELATÓRIO
A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, datada de 22-03-2011, que determinou a convolação da presente acção em revisão do acto tributário (das liquidações) nos termos do art. 78º nº 4 da LGT no âmbito da instância de IMPUGNAÇÃO relacionada com o indeferimento de recurso hierárquico referente a indeferimento de reclamação graciosa relacionada com as liquidações adicionais de IMI de 2005 a 2007.
Formulou as respectivas alegações (cfr. fls. 178-184 ) nas quais enuncia as seguintes conclusões:
“(…)
1. A douta sentença recorrida considerou ocorrida a tempestividade da impugnação;
2. Não julgou a sentença recorrida ter-se verificado erro na forma de processo;
3. Não se encontram, por essa razão, reunidos os pressupostos para a convolação dos autos em revisão de acto tributário prevista no art.º 78º da LGT;
4. Resultando violadas as disposições previstas nos artigos 97º nº 5 da LGT e nº 98º nº 4 do CPPT;
5. Dos factos dados como provados e constantes da fundamentação da decisão judicial recorrida resulta que os documentos, nomeadamente 1ª versão do alvará de loteamento n.º 12/91, apresentados aquando da entrega da declaração modelo 1 de IMI não continham dados susceptíveis de indicarem a área correcta necessária à avaliação do prédio nos termos do art.º 38.º do CIMI;
6. Só os documentos entregues pelos impugnantes com a nova declaração modelo 1 permitem tal verificação;
7. Em consequência nunca poderia a AF ter corrigido oficiosamente o lapso declarativo dos impugnantes não se verificando qualquer erro dos Serviços;
8. O resultado da avaliação foi validamente notificado aos impugnantes;
9. Aquando da apresentação da nova declaração modelo 1 para correcção das áreas já tinha caducado o prazo de reclamação da avaliação ou de dedução de pedido de segunda avaliação nos termos do art.º 76º do CIMI;
10. Nesta conformidade, tal declaração só podia ser recebida ao abrigo do art.º 130º do CIMI;
11. Tendo por cominação a produção de efeitos a partir da data de entrega da declaração correctiva sem, portanto, efeitos retroactivos;
12. Tais factos não configuram uma situação subsumível nos n.º 4 e 5 do ar.º 78º da LGT por exigência, desde logo de comportamento não negligente do requerente e, por outro lado porque a injustiça resultante dos factos não pode inutilizar as disposições legais aplicáveis como a referida cominação de produção de efeitos;
13. A sentença recorrida padece de erro de julgamento, violando as normas previstas no art.º 130º do CIMI e 78º n.º 4 e 5 da LGT.
Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida como é de inteira JUSTIÇA.”

Os recorridos não apresentaram contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da procedência do presente recurso.

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

A questão suscitada pela Recorrente resume-se, em suma, em indagar da bondade da decisão recorrida que determinou a convolação da presente acção em revisão do acto tributário (das liquidações ), nos termos do art. 78º nº da LGT.

3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade:

A) Por escritura pública de compra e venda celebrada em 1 de Agosto de 2005 os ora impugnantes adquiriram, na proporção de ½ para cada, do prédio urbano inscrito na matriz sob o artº 18 548, da freguesia de Albufeira (facto aceite);

B) Em 8 de Setembro de 2005, os impugnantes apresentaram a declaração modelo 1 de IMI tendo sido indicado no campo nº 58 que o prédio referido em A) tinha de área bruta de construção 971,00 m2 (junto ao processo apenso);

C) A acompanhar a declaração modelo 1 de IMI os impugnantes fizeram-na acompanhar de cópia do alvará de loteamento nº 12/91 (facto aceite);

D) Do alvará de loteamento nº 12/91 ficamos a saber que o prédio dos impugnantes situa-se em Vale de Pedra, que a área autorizada para a construção do lote C38 é de 750 m2 e que é autorizado que os lotes C1 a C45 se destinam a construção de moradias unifamiliares que deverão ocupar o máximo de 30% da área do lote e com o máximo de 2 pisos não devendo o segundo piso exceder 60% da área do primeiro (junto ao processo apenso);

E) O prédio foi avaliado nos termos do IMI tendo sido atribuído um VPT de € 347.780,00 (facto aceite);

F) Em 4 de Janeiro de 2009 os impugnantes apresentaram reclamação graciosa a que coube o nº 100720090400412, solicitando a avaliação do prédio referido em A) e a devolução da quantia paga em excesso, invocando haver erro no preenchimento da declaração modelo 1, de 8 de Setembro de 2005 (processo de reclamação graciosa apenso);

G) Em 12 de Janeiro de 2009 entregaram nova declaração de IMI onde corrigiram o campo 58 (fls 18, do recurso hierárquico);

H) Fizeram acompanhar a declaração de IMI com uma planta de Localização, alvará de licenciamento de loteamento urbano nº 12/91, alvará de obras de construção nº 444/2007 (fls. 19 a 31, do recurso hierárquico apenso);

I) O alvará de obras de construção foi emitido em 10 de Outubro de 2007 onde ficou a constar que a área de construção é de 434/74 m2 (fls 31, do recurso hierárquico);

J) Em 30 de Janeiro de 2009 os impugnantes efectuaram o pagamento do IMI dos anos de 2005, 2006 e 2007 (liquidações e comprovativos do pagamento junto ao processo administrativo);

K) Em 27 de Janeiro de 2008 os impugnantes requereram segunda avaliação (junto ao processo de reclamação graciosa);

L) Em 27 de Março de 2009 na reclamação graciosa foi proferido despacho de indeferimento, que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, com o seguinte fundamento (fls 39 e 40, do processo de reclamação graciosa):

Tendo em conta os elementos entregues junto à declaração modelo 1 de IMI apresentada em 27/01/2009 (fls 13) confirma-se o alegado quanto ao facto de a área bruta de construção ser efectivamente 434,74 m2. Assim, poderá o valor patrimonial que vier a ser atribuído ao prédio em função da nova avaliação, vir a ser alterado.

Ora, no caso em apreço e uma vez que não foi apresentado pedido de segunda avaliação nos termos do artº 76º do CIMI, parece-me que o meio válido para a correcção do solicitado, será efectivamente o pedido de avaliação já apresentado correctamente pelos reclamantes, nos termos do artº 130º do CIMI.

(…)

M) Em 4 de Maio de 2009 os impugnantes interpuseram recurso hierárquico da decisão de indeferimento proferida na reclamação graciosa a que coube o nº 09/2009 sobre o qual recaiu despacho de indeferimento com os mesmos fundamentos do despacho proferido na reclamação graciosa (processo de recurso hierárquico apenso, que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais);

N) O prédio referido em A), com área bruta de construção de 434,74 m2, foi sujeito a nova avaliação, conforme ficha de avaliação nº 002630100, tendo-lhe sido atribuído um VPT de € 139.360,00 (processo administrativo);

O) Em 24 de Fevereiro de 2010 deu entrada a presente impugnação (fls 3, dos autos).

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3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se, desde logo, indagar da bondade da decisão recorrida que determinou a convolação da presente acção em revisão do acto tributário (das liquidações ), nos termos do art. 78º nº da LGT.


Nas suas alegações, a Recorrente aponta que a sentença recorrida não julgou verificado erro na forma de processo, de modo que, não se encontram, por essa razão, reunidos os pressupostos para a convolação dos autos em revisão de acto tributário prevista no art.º 78º da LGT, o que coloca em crise as disposições previstas nos artigos 97º nº 5 da LGT e nº 98º nº 4 do CPPT.
Depois, dos factos dados como provados e constantes da fundamentação da decisão judicial recorrida resulta que os documentos, nomeadamente 1ª versão do alvará de loteamento n.º 12/91, apresentados aquando da entrega da declaração modelo 1 de IMI não continham dados susceptíveis de indicarem a área correcta necessária à avaliação do prédio nos termos do art.º 38.º do CIMI e só os documentos entregues pelos impugnantes com a nova declaração modelo 1 permitem tal verificação, o que significa que em consequência nunca poderia a AF ter corrigido oficiosamente o lapso declarativo dos impugnantes não se verificando qualquer erro dos Serviços.
Além disso, o resultado da avaliação foi validamente notificado aos impugnantes a aquando da apresentação da nova declaração modelo 1 para correcção das áreas já tinha caducado o prazo de reclamação da avaliação ou de dedução de pedido de segunda avaliação nos termos do art.º 76º do CIMI, ou seja, tal declaração só podia ser recebida ao abrigo do art.º 130º do CIMI, tendo por cominação a produção de efeitos a partir da data de entrega da declaração correctiva sem, portanto, ter efeitos retroactivos.

Neste domínio, em termos de convolação, é sabido que o dever de determinar a convolação processual, sempre que possível prende-se com o princípio “pro actione”, no sentido de promover a celeridade processual sempre que não existam obstáculos que a impeçam (cfr. art. 97º da LGT), sendo que tem sido entendido que constituem obstáculos a essa mesma convolação, a inadequação do pedido formulado e a intempetividade, por referência à forma processual correcta, ou seja, em regra a convolação é obrigatória para o Tribunal que constata o erro na forma do processo ou perante o qual é arguido mas para que se opere não podem ter já decorrido os prazos para propositura da acção que é a própria, matéria que obsta à referida convolação.

Para cabal enquadramento da realidade subjacente aos autos, cabe notar que por escritura pública de compra e venda celebrada em 1 de Agosto de 2005 os ora impugnantes adquiriram, na proporção de ½ para cada, o prédio urbano inscrito na matriz sob o artº 18 548, da freguesia de Albufeira (facto aceite), sendo que em 8 de Setembro de 2005, os impugnantes apresentaram a declaração modelo 1 de IMI tendo sido indicado no campo nº 58 que o prédio referido em A) tinha de área bruta de construção 971,00 m2, verificando-se que a acompanhar a declaração modelo 1 de IMI os impugnantes apresentaram cópia do alvará de loteamento nº 12/91 (facto aceite) e do alvará de loteamento nº 12/91 ficamos a saber que o prédio dos impugnantes situa-se em Vale de Pedra, que a área autorizada para a construção do lote C38 é de 750 m2 e que é autorizado que os lotes C1 a C45 se destinam a construção de moradias unifamiliares que deverão ocupar o máximo de 30% da área do lote e com o máximo de 2 pisos não devendo o segundo piso exceder 60% da área do primeiro (junto ao processo apenso).

A partir daqui, o prédio foi avaliado nos termos do IMI tendo sido atribuído um VPT de € 347.780,00 (facto aceite).

Nesta sequência, em 4 de Janeiro de 2009, os impugnantes apresentaram reclamação graciosa a que coube o nº 100720090400412, solicitando a avaliação do prédio referido em A) e a devolução da quantia paga em excesso, invocando haver erro no preenchimento da declaração modelo 1, de 8 de Setembro de 2005 (processo de reclamação graciosa apenso), constando de tal reclamação, in fine, que “Assim, face ao supra exposto requer-se a V. Ex.ª nos termos do artigo 76º n.1, do Código do Imposto Municipal Sobre Imóveis, uma segunda avaliação de forma a obter o valor patrimonial correcto e, consequentemente, proceder-se à restituição do excedente do imposto que foi pago indevidamente pelos contribuintes, dando V. Exa., dessa forma, provimento à presente reclamação graciosa.”.

A reclamação em apreço foi indeferida por se ter considerado que não foi apresentado pedido de segunda avaliação nos termos do art. 76º do CIMI pois o prazo para o efeito estava esgotado e bem assim que o meio válido para o efeito seria o pedido de avaliação já apresentado nos termos do art. 130º do CIMI, o que conduziu ao indeferimento do recorrido, “pois ao corrigir as liquidações pretendidas referentes aos anos de 2005, 2006 e 2007, estaríamos a contradizer o estabelecido no já referido artº 130º do CIMI”.

Em seguida, tal como se retira do probatório, em 4 de Maio de 2009 os impugnantes interpuseram recurso hierárquico (onde se reclama o deferimento do presente recurso hierárquico atribuindo efeitos retroactivos à rectificação patrimonial do prédio identificado nos autos ) da decisão de indeferimento proferida na reclamação graciosa a que coube o nº 09/2009 sobre o qual recaiu despacho de indeferimento com os mesmos fundamentos do despacho proferido na reclamação graciosa (processo de recurso hierárquico apenso, que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais).

Finalmente, em 24 de Fevereiro de 2010 deu entrada a presente impugnação judicial, onde se conclui que “Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exa. mui doutamente suprirá, deverá ser deferido o presente recurso contencioso (entretanto os impugnantes requereram a rectificação deste elemento no sentido de passar a figurar impugnação judicial), atribuindo efeitos retroactivos à rectificação do valor patrimonial, cujo valor correcto é € 139.360,00, do prédio urbano da freguesia e concelho de Albufeira inscrito sob o artigo 18 548, anulando todas as notas de liquidação (2005/2006/2007) emitidas com base no valor erradamente apurado pela Administração Fiscal e no tudo o mais nos exactos termos peticionados.”.

Nesta medida, cabe notar que com a presente impugnação judicial os recorrentes visam a anulação de todas as notas de liquidação de 2005 a 2007 emitidas com base no valor erradamente apurado, atribuindo efeitos retroactivos à rectificação do valor patrimonial, o que significa que o meio processual adequado para a impugnação de liquidações de tributos é, justamente, a impugnação judicial.
Em se assim é, ou seja, sendo correcto o meio processual adequado não existe fundamento legal para a convolação dos autos em revisão de acto tributário, nos termos do disposto no artigo 78º da LGT, atento o disposto nos artigos 97º nº 3 da LGT e 98º nº 4 do CPPT.
Por outro lado, ainda que perfilhe outro tipo, ou outro ângulo de abordagem da matéria em apreço, com referência à fixação do valor patrimonial, é ponto assente que também a impugnação dos actos de fixação de valores patrimoniais, no caso a determinação do VPT é susceptível de impugnação judicial, nos termos do estatuído nos artigos 77º do CIMI e 134º do CPPT, o que quer dizer que mesmo que se entendesse que os ora recorridos pretendiam a impugnação do VPT fixado ao imóvel, também não seria viável a convolação dos autos em revisão de acto tributário, o que significa que a sentença recorrida procedeu a uma incorrecta aplicação do direito à factualidade apurada, pelo que incorreu em erro de julgamento devendo ser revogada por via da procedência do presente recurso.

A partir daqui, cabe indagar se, de acordo com o art. 715º do C. Proc. Civil, se pode aplicar no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução que deu ao litígio, tudo ao abrigo do princípio da economia processual, o qual, no caso concreto, se sobrepõe à eventual preocupação de supressão de um grau de jurisdição.
A resposta a esta questão terá de ser positiva, pois que se impõe apenas considerar a factualidade já apurada nos autos, nada havendo que obste a tal conhecimento, pois que o processo dispõe dos elementos de facto para o efeito, Por outro lado, é manifesto que o cumprimento do contraditório plasmado no art. 715º nº 3, do C. P. Civil, não tem razão de ser no caso “sub judice”, dado que as partes já tomaram posição sobre os demais fundamentos da presente impugnação, pelo que não existe necessidade de as ouvir antes de este Tribunal avançar para o conhecimento em substituição resultante da revogação da decisão recorrida quanto a matéria aí apreciada.

Assim sendo, e como retomando o discurso anterior, importa não olvidar que o acto de fixação do VPT é um acto destacável do procedimento de liquidação do imposto e como tal deve ser impugnado autonomamente, não podendo a correcção do mesmo ser efectuada em sede de impugnação dos actos de liquidação - Cons. Jorge de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 2006, pág. 963.
Como efeito, e como se pode ler no Ac. do S.T.A. de 06-07-2011, Proc. nº 0422/11, www.dgsi.pt., “… Por regra, o acto de determinação da matéria colectável não é susceptível de impugnação judicial autónoma, só podendo esse acto ser atacado na impugnação que venha a ser proposta do sequente acto de liquidação, processo onde poderá ser invocada qualquer ilegalidade ocorrida na fase de determinação da matéria colectável.
Hoje, o princípio da impugnação unitária encontra-se formulado no artigo 54.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que dispõe o seguinte: “Salvo quando forem imediatamente lesivos do direito do contribuinte ou disposição expressa em sentido diferente, não são susceptíveis de impugnação contenciosa os actos interlocutórios do procedimento, sem prejuízo de poder ser invocada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida”.
Não obstante o seu carácter preparatório, permite-se, no entanto, que certos actos de determinação da matéria colectável possam ser autonomamente impugnáveis, sempre que entre eles e o acto final haja uma relação de evidente prejudicialidade. É na inevitável relação de prejudicialidade entre o acto preparatório (acto prejudicial) e o acto de liquidação (acto prejudicado) que reside a explicação para que tal acto, embora preparatório, se autonomize e destaque (acto destacável) e seja, por si só, e autonomamente impugnável - cf., por todos, Alberto Xavier, in Conceito e Natureza do Acto Tributário, págs. 140 a 191; e Américo Braz Carlos, Os Actos Preparatórios de Fixação do Rendimento Colectável, sua Impugnabilidade Contenciosa, na Revista Fisco n.ºs 12/13, p. 20.
Diz Alberto Xavier, in Conceito e Natureza do Acto Tributário, p. 243 e ss., que a lei fixou entre os dois actos um regime de prejudicialidade, cujas notas essenciais são as seguintes: sendo o acto autonomamente impugnável, quer o contribuinte, quer a Fazenda Pública têm legitimidade para interpor recurso do acto de determinação da matéria colectável; em relação à determinação da matéria colectável ocorre preclusão processual, uma vez que tal matéria não pode voltar a ser apreciada no procedimento administrativo de liquidação; e, se o acto não for oportunamente impugnado, o valor tributável torna-se definitivo, com força de caso decidido ou caso resolvido.”.
Portanto, no caso em análise em que está em causa a impugnação de liquidações do IMI, não podem os ora recorridos discutir a correcção da fixação do VPT do imóvel em causa.
Depois, importa reter que da factualidade apurada nos autos resulta que a avaliação do imóvel foi feita, nomeadamente, tendo em conta a área bruta de construção de 971,00 m2 declarada pelos ora recorridos.

Nesta sequência, se é certo que essa área declarada não corresponde à área efectiva que é de 434,74 m2 e resultou de erro no preenchimento de uma quadrícula da declaração modelo 1, não é menos certo que, ao contrário do sustentado pelos ora recorridos, do alvará de loteamento 12/91 junto com a 1ª declaração modelo 1 não era possível determinar a área bruta de construção efectiva do imóvel o que só veio a acontecer com a entrega da nova declaração modelo 1, pelo que não se afigura correcto afirmar que a AF tivesse a obrigação legal de corrigir o alegado lapso declarativo dos ora recorridos.
Ora, o que é certo é que os ora recorridos não requereram segunda avaliação do imóvel nem impugnaram, consequentemente, a fixação do valor patrimonial, o que significa que a liquidação do IMI tinha que ter por base o VPT fixado e não impugnado.
O VPT entretanto fixado, de acordo com a área bruta efectiva de construção, na sequência da apresentação de nova declaração modelo 1 para além do prazo para pedir segunda avaliação estatuído no artigo 76º do CIMI, só poderia ser aceite ao abrigo do disposto no artigo 130º do CIMI, só produzindo efeitos a partir da data da sua entrega, o que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne à pretensão dos ora recorridos nos autos.


4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida, e em substituição, julga-se improcedente a presente impugnação dos actos de liquidação em apreço, com consequente manutenção destes na ordem jurídica.
Custas pelos Recorridos apenas em 1ª Instância.
Notifique-se. D.N..
Lisboa, 15 de Maio de 2012

PEDRO VERGUEIRO
PEREIRA GAMEIRO
JOAQUIM CONDESSO