Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:9281/16.7BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:07/09/2020
Relator:JORGE CORTÊS - Relator por vencimento
Descritores:IRS.
CATEGORIA G.
NEGÓCIO JURÍDICO SIMULADO.
INTEGRAÇÃO JURISDICIONAL PROBATÓRIA DOS FACTOS DA CAUSA.
Sumário:i) Cabe ao tribunal apurar a matéria de facto relevante com vista a integrar as várias soluções plausíveis da questão de direito suscitada. Para além das diligências requeridas, o tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados.

ii) Se dos elementos colhidos nos autos resulta que o contribuinte pretendia vender os imóveis em presença pelo preço correspondente às quantias por si recebidas, seja do promitente comprador, seja do adquirente definitivo, então a outorga de contrato de promessa com terceiro e a retenção da quantia pelo mesmo paga a título de sinal, corresponde a negócio jurídico simulado, com interposição fictícia de terceiro, com vista à ocultação do verdadeiro preço recebido pelo contribuinte.

Votação:COM DECLARAÇÃO DE VOTO
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

P...................... veio impugnar a liquidação adicional de IRS nº…………., respeitante ao ano de 1999, no montante de €70.438,73.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, por decisão de 28 de Setembro de 2015, julgou improcedente a impugnação.

Nas suas alegações, o recorrente P......................, formula as seguintes conclusões:

«a) A divida tributária, referente a IRS do ano de 1999, titulada pela liquidação cuja apreciação é objecto da presente impugnação, encontra-se prescrita, nos termos enunciados supra nos pontos 4 a 21, pelo que, deverá ser revogada a douta sentença recorrida, e, consequentemente, declarada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

Quando assim não se considere:

b) A notificação do acto de liquidação impugnado ocorreu com preterição de formalidades legais essenciais (ausência de Aviso de Recepção), não estando perfeito, em função disso, o acto que se ora se sindica, não produzindo este efeitos, e sendo inválido, face ao que, não julgando a douta sentença neste sentido, padece de erro de julgamento quanto à matéria de direito, violando as disposições conjugadas dos arts. 38.º, n.º 1 do CPPT e art.133.º,  n.º 1 do CPA.

c) O acto ora impugnado carece de motivação relevante, no sentido em que, o autor do acto não expressou, sequer, a adesão a outro documento ou parecer, do qual resultassem os fundamentos de facto e de direito do acto de liquidação adicional. Mais uma vez, optou a sentença "por uma lógica desculpabilizadora" da falta de cumprimento de pressupostos legais, essenciais, do acto em causa, optando por uma garantia insuficiente dos direitos dos particulares.

d) Face ao exposto, ao não considerar desta forma, padece a douta sentença recorrida de erro de julgamento de direito, por violação do disposto no art. 77.º da LGT e art. 268.º. n.º 3 da CRP.

e)  Existe erro quanto à determinação colectável, na medida em que, se considerou parte do preço, respeitante à venda dos prédios rústicos melhor identificados supra no art 44.º, o valor recebido pelo ora recorrente, a título indemnizatório, por via da perda do sinal pelo promitente-comprador A....................... resultante do incumprimento por este da promessa.

f) A este respeito ocorre insuficiência da factualidade provada, sendo de aditar ao rol dos factos provados, a seguinte asserção: "O promitente-comprador, A...................... não celebrou o contrato de compra e venda prometido, tendo incumprido a data estabelecida no acordo - considerado na al. C) dos factos provados - 1 de Outubro de 1999", pelo que, se verifica a omissão de consideração de um facto relevante, tornado relevante pelo julgamento em primeira instância,

g) A este respeito, requer-se, nos termos do art. 651.º n.º 1. in fine do CPC, a junção aos autos de certificado emitido pelo Notário do Cartório Notarial de Vila Viçosa. que comprova a não comparência do promitente-comprador, na data acordada para a celebração do contrato definitivo (1 de Outubro de 1999), que ora se junta sob o Doc.1.

h) Note-se que este facto, valorado à luz da descrição das incidências contratuais constantes dos arts. 45.º a 48.º, em conjugação com a cláusula 7.ª do acordo constante do facto   provado sob a alínea c), patenteia o incumprimento total do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre o recorrente e A......................, sendo esta a base da transformação do sinal, imputável no preço, em prestação indemnizatória, sendo que esta não concorre para a fixação do valor de realização enquanto elemento essencial para a determinação do valor tributável.

i) Esta circunstância torna evidente o erro na fixação da matéria tributável, inquinando tal desvaler, todo o raciocínio da Administração Fiscal, ao qual, acriticamente, aderiu o julgador.

j) Desta forma, Indubitavelmente ocorreu erro na determinação da matéria colectável, e nessa medida erro quanto à quantificação e qualificação dos factos tributários, que conduz à anulação do acto impugnado, pelo que, ao não considerar desta forma incorreu a douta sentença em erro sobre o julgamento de direito.

k) A decisão recorrida reconstrói o ónus da prova, alocando ao contribuinte, ora recorrente, com clara preterição dos seus direitos de defesa face à AT, o ónus de suprir as insuficiências argumentativas da Administração Tributária, acabando por decidir em função de uma regra de decisão claramente "truncada", relativamente ao contribuinte.

l) Face ao exposto, quer a existência de facto tributário, quer a sua quantificação, não podem deixar, também por esta via, de ser questionados, devendo em consequência, ser    determinada a anulação da liquidação impugnada, pelo que, a douta sentença ora recorrida, violou o disposto no art.100.º do CPPT.

Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, e em consequência ser revogada a douta sentença, e substituída por outra que considere a inutilidade superveniente da lide, em virtude da prescrição da divida tributária, ou, quando assim não se julgue, que considere procedente a impugnação judicial apresentada nos autos, com todas as consequências legais daí advenientes.»


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A recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta 1ª Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão.

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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«A) Por escrito datado de 23 de Abril de 1998, o ora impugnante prometeu vender a A......................, e este prometeu comprar, pelo preço total de 106.700.000$00, a “Herdade de Almeida" com 60 hectares, a "”Herdade de Almeida" com 6.75 hectares e a "Herdade do Pinto" com 127,275 hectares, tendo as partes declarado que na mesma data havia sido entregue a quantia de 2.000.000$00 como princípio de pagamento e que o restante preço ajustado, no valor de 104.700.000$00, seria pago no momento da outorga da escritura pública, a realizar no dia 24 de Junho de 1998 [cf. documento de fls. 27 a 36 dos autos ou fls. 97 a 105 do PA apenso].

B) Por escrito datado de 4 de Junho de 1998, o ora impugnante e A...................... acordaram modificar o teor do contrato celebrado em 23 de Abril de 1998, passando a constar do mesmo que o impugnante reconhece ter recebido a importância de 46.470.000$00 e que a escritura pública seria “adiada para um ano a partir da data do contrato" [cf. documento de fls. 32 a 43 dos autos ou fls. 106 a 108 do PA apenso].

C) Em 11 de Agosto de 1999, o ora impugnante, na qualidade de Réu, e A...................... e M......................, na qualidade de Autores, assinaram um escrito do qual consta, além do mais, o seguinte teor:

«Autores e Réu acordam transigir relativamente ao objecto do processo nos seguintes termos: // (...) // 1º - Autores e Réu consideram válidos e eficazes o contrato promessa de compra e venda, celebrado em 23 de Abril de 1998 e o aditamento ao referido contrato, celebrado em 04 de Junho de 1998, referentes à Herdade de Almeida, de 60 ha, inscrita na Conservatória do Registo Predial de Elvas sob o n.º……………., freguesia de Santa Eulália, à Herdade de Almeida, de 6,75 ha, inscrita na Conservatória do Registo Predial de Elvas sob o nº………., freguesia de Santa Eulália, e à Herdade de Pinto, de 127,275 ha, inscrita na Conservatória do Registo Predial de Elvas sob o n.º………., freguesia de São Vicente e Ventosa, com as alterações que passam a contar nos artigos que se seguem:

2º - O Réu promete vender aos Autores, livres de quaisquer ónus ou encargos, os prédios denominados Herdade de Almeida, de 60 ha, inscrita na Conservatória do Registo Predial de Elvas sob o n.º……….., freguesia de Santa Eulália, e a Herdade de Pinto, de 127,275 ha, inscrita na Conservatória do Registo Predial sob o n.º………, freguesia de São Vicente e Ventosa, pelo preço global de 97.600.000$00 (noventa e sete milhões c seiscentos mil escudos).

3º - O prédio denominado Herdade de Almeida, de 6,75 ha, inscrita na Conservatória do Registo Predial sob o n…………, freguesia de Santa Eulália, é excluído do negócio de compra e venda agora acordado e os Autores renunciam a qualquer direito de natureza obrigacional que detenham sobre o mesmo. // (...)

5º - O Réu reconhece ter recebido a título de sinal a quantia de 46.470.000$00 (quarenta e seis milhões quatrocentos e setenta mil escudos) pela celebração do contrato prometido e respectivo aditamento, verba esta que fica afecta à totalidade do negócio a que reporta o artigo segundo do presente acto de transacção, sendo os restantes 51.000.000$00 (cinquenta e um milhões de escudos) entregues na data da escritura de compra e venda.

6°- A escritura de compra e venda a que se reporta o artigo anterior do presente acordo será celebrada até ao próximo dia 01 de Outubro de 1999, no Cartório Notarial de Campo Maior ou noutro situado em comarca limítrofe, e a respectiva marcação fica a cargo dos AA. (...)» [cf. documento de fls. 35 a 38 dos autos ou de fls. 109 a 112 do PA apenso].

D) Em 23 de Novembro de 1999, A......................, na qualidade de primeiro outorgante e C....................., na qualidade de segundo outorgante, assinaram o escrito designado "contrato de promessa de compra e venda" do qual consta o seguinte teor:«( ...)


1 º

O Primeiro Outorgante é Promitente Comprador dos seguintes prédios rústicos, conforme resulta do acordo judicial efectuado no Proc. nº 207/98, que correu termos no Tribunal de Círculo de Portalegre, cuja fotocópia se junta e é devidamente rubricada pelos outorgantes do presente contrato:

-Herdade de Almeida, de 60 ha, inscrita na conservatória do registo predial de Elvas sob o n.º……….., sita na Freguesia de Santa Eulália, Concelho de Elvas

- Herdade de Pinto, de 127,275 ha, inscrita na conservatória do registo predial de Elvas sob o n.º……….., sita na Freguesia de Santa Eulália, Concelho de Elvas



O Primeiro Outorgante promete vender ao Segundo, e este, reciprocamente comprar, a referida propriedade, com os direito e obrigações constantes do referido acordo.


O preço total da venda é de sessenta milhões de pesetas.

À data da escritura de compra e venda o segundo outorgante pagará directamente ao Sr.  P......................, a quantia de Esc: 51.000.000$00 (cinquenta e um milhões de escudos), referida no acordo judicial, acrescida de Esc: 4.000.000$00 (quatro milhões de escudos).

O Remanescente do preço será pago ao Sr. A..................., primeiro outorgante, também na data da escritura de compra e venda. // (...)



A escritura de compra e venda será celebrada até ao final do mês de Dezembro de 1999, em Campo maior, Elvas ou Vila Viçosa, em data a designar pelo Primeiro Outorgante, a cargo de quem fica a sua marcação.


Sobre cada um dos prédios objecto do presente contrato incide um arresto efectuado pelo Sr. A..................., o qual se compromete a pedir o cancelamento dos referidos ónus no prazo de 10 dias. (...)» [cf. documento de fls. 113 a 114 do PA apenso].

E) Por escritura pública de "Compra e Venda", lavrada em 23 de Novembro de 1999, no Cartório Notarial de Vila Viçosa, o ora impugnante declarou vender a C..................... Torres, e este declarou comprar, pelo preço global de 51.000.000 (cinquenta e um milhões de escudos) os seguintes prédios rústicos: "Herdade de Almeida" com área de 60 hectares, sito na freguesia de Santa Eulália, descrito na C.R.P. sob número ….., e a "Herdade do Pinto" com área de 127,275 hectares, sito na freguesia de São Vicente e Ventosa, descrito na C.R.P. sob o número….. [cf. documento de fls. 79 a 82 do PA apenso].

F) Em 23 de Novembro de 1999 foi efectuado o termo de declaração de SISA referente à transmissão dos imóveis referidos na escritura pública mencionada na alínea anterior, incidente sobre o preço global de 51.000.000$00 [cf. documento de fls. 77 do PA apenso].

G) Em 18/07/2000, A...................... compareceu na Direcção de Finanças de Portalegre onde assinou o termo de declarações constante de fls. 115 do PA apenso, cujo teor se dá por reproduzido, no qual declarou saber que na escritura de compra e venda celebrada no Cartório Notarial de Vila Viçosa, entre P...................... e C..................... Torres, terão sido declarados valores inferiores àqueles que na realidade foram contratados.

H) Em 17/08/2000, o impugnante entregou a declaração anual de rendimentos do ano de 1999 - IRS Modelo 3 - acompanhada do Anexo C no qual declarou rendimentos da Categoria D, não constando da referida declaração o Anexo G referente a rendimentos da Categoria G [cf. fls. 128 a 129 dos autos].

I) Em cumprimento do despacho nº 184 S/00, de 27/07/2000, os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Portalegre levaram a efeito uma acção de inspecção tributária ao ora impugnante, de âmbito parcial, incidente sobre o IRS do ano de 1999 [cf. fls. 19 do PA apenso].

J) Em 09/02/2001 foi elaborado o relatório final da inspecção tributária de fls. 17 a 36 do PA apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual se destaca o seguinte:

«(...) // III Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável.

1. Relativamente ao ano de 1999, o SP apresentou, em 17.08.00, na Repartição de Finanças de Elvas (Serviço Local de Finanças), a Declaração Anual de Rendimentos Modelo 3 a que se refere o art.º 57.º do CIRS.

2. A acompanhar a declaração, foi apresentado o Anexo C (SP do IRS com contabilidade organizada) e onde foram declarados os rendimentos da Categoria D (Rendimentos Agrícolas) respeitantes ao presente SP e único titular.

3. No entanto e conforme consultas efectuadas, nomeadamente através do terminal informático para o IRS, numa primeira fase e a própria verificação e análise da referida Declaração de Rendimentos, numa fase posterior, para além das diligências e averiguações a que procedemos, quer junto do próprio SP, quer ainda através do contacto estabelecido junto do gabinete responsável pela sua contabilidade, constatámos que:

a) Não são considerados rendimentos sujeitos ao IRS e enquadráveis na Categoria D -Rendimentos Agrícolas, tal como se encontra definido no n.º 2 do art.º 5.º do CIRS, as mais-valias resultantes da alienação onerosa de prédios rústicos afectos ao exercício de uma actividade agrícola, silvícola ou pecuária ou ainda a transferência destes para o património particular do empresário.

b) Como tal e porque este tipo de rendimentos se encontram sujeitos ao IRS (e enquadráveis na Categoria G - Rendimentos das Mais-Valias), deveria ter sido apresentado, como lhe competia e relativamente à transmissão onerosa de dois prédios rústicos, ocorrida durante o ano de 1 999 e a acompanhar a declaração respeitante a este mesmo ano, o Anexo G para os rendimentos das Mais-Valias (Categoria G - IRS), situação que justifica a proposta de correcção (correcção meramente aritmética) a que nos reportamos no presente Relatório de Inspecção Tributária e conforme factos e fundamentos expressos no mesmo.

4. Reportando-nos aos dados conhecidos numa primeira fase, façamos, no presente quesito, uma breve retrospectiva da aparente sucessão dos factos que estarão na origem da presente acção inspectiva dirigida ao SP - P...................... e à sua situação tributária (situação para efeitos fiscais - IRS):

4.1 - Em 18.07.2000 teve esta DFPortalegre conhecimento de que teria sido celebrado, entre P......................, cidadão e agente económico português, residente em  S. Vicente - Elvas, na qualidade de promitente vendedor e A..................., cidadão espanhol e residente em Badajoz - Espanha, na qualidade  de promitente comprador, um contrato que formalmente previa um acordo de promessa de compra e venda de determinadas propriedades localizadas na área do concelho de Elvas (o referido contrato embora constitua elemento de trabalho, não faz parte integrante do presente relatório) .

4.2 - Complementarmente e porque não se chegou a concretizar o negócio entre as duas pessoas antes referidas, também dispõe estes Serviços da informação de que entre o promitente comprador - A................... e uma outra terceira pessoa, o também cidadão espanhol C..................... Torres, com residência  igualmente em Badajoz Espanha, foi  posteriormente celebrado um outro contrato de promessa de  compra  e  venda, contrato em que aquele (A...................) se  comprometia a vender a este (C...................), por determinada importância e e determinadas condições, as propriedades em causa (o exemplar deste último contrato também não se considera parte integrante do presente relatório, embora também constitua "papéis" de trabalho).

4.3 - Ainda de acordo com os elementos na posse da DIT - DFPortalegre, terá sido posteriormente celebrada, entre este último promitente comprador (C...................), na qualidade de adquirente e P.................., proprietário e titular das propriedades e inicialmente promitente vendedor a A..................., na qualidade de vendedor, uma escritura notarial de compra e venda das referidas propriedades e em que os valores declarados terão sido inferiores aos que na realidade foram acordados anteriormente (valores que haviam sido inicialmente acordados e que constariam da primitiva escritura de promessa de compra e venda) entre o inicial e promitente comprador (A...................) e o promitente vendedor (P..............).

5. Dispondo, pois, de tais elementos e em face do superiormente determinado, efectuámos outros tipos de diligências e averiguações, nomeadamente junto do próprio SP - P.............. e da RF -  Serviço Local de Finanças de Elvas, tendo verificado o seguinte:

5.1 - Em 23.11.99 foi paga, conforme Termo de Declaração para a Liquidação da Sisa n.º 482 (fotocópia em arquivo), a sisa do valor de 4 080 000$00 e resultante da compra que pelo preço de 51 000 000$00 (cinquenta e um milhões de escudos) C.....................  M…………., C. F. - NIP's ……….e…………., com residência declarada em Rua………., n.º …. - Campo Maior iam fazer a P......................, solteiro, maior, C. F. – NIP…………, residente em Herdade de Água de Banhos - Elvas, dos seguintes prédios:

a) - Prédio rústico com a área de 127,2750 ha.s, inscrito na matriz cadastral rústica da freguesia de São Vicente e Ventosa, concelho de Elvas, sob parte do art.º 2 da Secção C, sito ou denominado "Herdade do Pinto", com a área total de 246,9750 ha.s e ao qual corresponde o valor tributável total de 1 383 279$00, prédio adquirido pelo preço (valor declarado) de 35 000 000$00 .

b) - Prédio rústico com a área de 60 ha. s, inscrito na matriz cadastral rústica da freguesia de Santa Eulália, concelho de Elvas, sob parte do art.º 7 da secção H, sito ou denominado "Herdade   de   Almeida", com a área total de 128,4480 ha. s e ao qual corresponde o valor tributável total de 4 234$00, prédio adquirido pelo preço (valor declarado) de 16 000 000$00.

5.2 - Serviu de base à liquidação da sisa o valor total declarado / preço de compra de 51 000 000$00, embora sujeita a liquidação adicional se se viesse a verificar posterior alteração para um valor superior, conforme processo de cadastro instaurado naquela data.

5.3 - Nessa mesma data (23.11.99) foi celebrada, no Cartório Notarial de Vila Viçosa, a competente escritura de compra e venda e em que constam como outorgantes P...................... (primeiro outorgante) e C..................... (segundo outorgante), escritura em que o primeiro outorgante (P..............) vende ao segundo outorgante (C...................), pelo preço global de 51 000 000$00 (cinquenta e um milhões de escudos), já recebido, os dois prédios rústicos sitos no concelho de Elvas e já identificados no Termo de Declaração para a Liquidação da Sisa supra referido (este documento também constitui documento em arquivo e em "papeis" de trabalho).

6. Estamos, pois, perante uma situação de alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, tal como prescreve e se encontra definido no art.º 10.º,n.º 1 , al. a), do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, ou seja, são considerados Rendimentos da Categoria G do IRS e constituem Mais-Valias, os ganhos obtidos pelas transmissões dos prédios rústicos antes referidos e constantes da citada escritura de compra e venda, ganhos que, face à data do acto/escritura (23.11.99), se consideram obtidos durante o ano de 1999 .

7. Porque esta situação terá sido omitida e/ou incorrectamente tratada pelo SP aquando da entrega da respectiva Declaração de Rendimentos Modelo 3 para o IRS e para o ano de 1999, iremos dirigir e orientar o nosso trabalho no sentido de se determinar a matéria tributável que se encontra em falta, trabalho que se irá basear em duas vertentes, ou seja, procura e/ou definição dos valores de realização e de aquisição relativamente aos bens/prédios transmitidos.

8. Relativamente aos prédios rústicos objecto da transmissão, há que definir ainda determinadas regras e/ou parâmetros e que passam pelo seguinte:

a) Que tipo de património constituem os referidos bens;

b) Sua afectação, destino e/ou uso;

c) E se os mesmos teriam sido adquiridos em data anterior a 1 de Janeiro de 1989.

9. Tendo em consideração, para além de todos estes pressupostos, os vários tipos de elementos recolhidos e resultantes das investigações e diligências efectuadas, cumpre-nos levar ao conhecimento superior o seguinte:

9.1 - Estamos perante dois prédios rústicos adquiridos pelo vendedor em data posterior a 01.01.89 e que passaram a constituir, à data das respectivas aquisições, património particular do cidadão e presente SP.

9.2. Os referidos prédios rústicos foram posteriormente afectos à actividade agrícola exercida em nome individual pelo seu proprietário, sem que, no entanto, tenha sido correctamente processada a sua transferência do património particular do respectivo proprietário para o activo da sua empresa agrícola.

9.3 - No entanto, é fiscalmente irrelevante, a exemplo da situação anterior, se e quando se deu a transferência dos prédios da empresa agrícola para o património particular.

9.4 - Será o saldo anual, positivo ou negativo, apurado entre as mais-valias e as menos-valias resultantes da alienação onerosa de bens imóveis em geral e de prédios rústicos em particular (caso concreto), que, nos termos atrás referidos e de conformidade com a legislação em vigor, se enquadra nos rendimentos sujeitos ao IRS e na Categoria G.

10. Elemento essencial para a determinação da matéria tributável será o valor de realização, valor que embora conste da escritura de compra e venda ter sido de 51 000 000$00 não é por nós aceite e se corrige, se atendermos aos seguintes factos conhecidos:

10.1 - De acordo com o teor do Contrato celebrado em 23 de Abril de 1998, em Elvas e com certificação no Consulado de Portugal, em Badajoz, documento autenticado em 29.09.98 no Cartório Notarial de Campo Maior, é estabelecido um pré    acordo / contrato de promessa de compra e venda entre P...................... e A................... e em que aquele, proprietário das "Herdade de Almeida", com 60 ha.s, "Herdade de Almeida", com 6,75 ha.s e "Herdade do Pinto", com 127,275 ha.s, acorda vender, a este último, as referidas propriedades rústicas e em que ambos fixaram, como preço base, por hectare, o valor de 550 000$ (o preço total das três herdades seria de 106 700 000$00), acordo que previa ainda o dia 24 de Junho de 1 998 como a data para a celebração da escritura pública de compra e venda (documentos em arquivo) .

10.2 - Posteriormente e em função de reformulação do acordo primitivo, é estabelecido, entre as mesmas partes, um outro acordo, com data de 04 de Junho de 1 998 e igualmente autenticado no CNCampo Maior, em que, entre outro clausurado, acordam excluir, do contrato que haviam estabelecido, a transmissão da "Herdade de Almeida" e com a área de 6.75 ha.s, mantendo-se a compra e venda das duas propriedades restantes, tendo também sido igualmente acordada a alteração do preço global, inicialmente de 107 700 000$00 para as três herdades//prédios rústicos, para o valor de 97 600 000$00, alterando-se também a data prevista para a efectivação da escritura definitiva e que ficou marcada para o dia de Outubro de 1999 (documento que também se arquiva em "papéis" de trabalho) .

10. 3- É esse, pois, o valor previsto e acordado entre P.................. e A................... para o negócio que se propunham fazer, ou seja, a transmissão, por parte daquele e a título oneroso, das propriedades rústicas "Herdade de Almeida”, com a superfície de 60 ha.s e "Herdade do Pinto", esta com a superfície de 127,2750 ha.s, constando ainda deste último contrato e posteriormente confirmado pelo promitente vendedor, ter-lhe sido paga, por A................... e a título de sinal, a verba de 46470000$00, valor que ficaria afecto à totalidade do negócio e sendo os restantes 51 000 000$00 entregues na data da escritura definitiva.

10.4 - Posteriormente vem a ser celebrado, entre o promitente comprador - A................... e C....................., também cidadão espanhol, um Contrato de Promessa de Compra e Venda, datado de 23 de Novembro de 1999, contrato em que o primeiro outorgante (A...................) promete vender ao segundo (C...................), os prédios rústicos em causa e em que ele (A...................), como a documentação existente e a que nos vimos referindo comprova, era, à data de 23.11.99, promitente comprador e ficando desde logo ali expresso e acordado, entre outro clausurado, ser o total da venda de 60000000 (sessenta  milhões) de pesetas, correspondentes a cerca de 72 000 000$00 e dever o segundo outorgante (C...................), à data da escritura de compra e venda que entre os dois iria ser celebrada, pagar directamente a P...................... (no momento ainda o proprietário e que já havia recebido, por parte de A................... e a título de sinal, o montante de 46 470 000$00), a quantia de 51 000 000$00 (documento que igualmente se anexa e que também constitui "papéis" de trabalho) .

11. VALOR DE REALIZAÇÃO:

- De acordo, pois, com os vários tipos de desenvolvimentos por que passou o negócio e se atendermos a que:

a) Entre P.............. e A..................., promitentes vendedor e comprador, respectivamente, foi acordado o preço de 97 600 000$00 para a venda das duas herdades - prédios rústicos sitos na área do concelho de Elvas e inscritos sob os artigos 7-H ("Herdade        de Almeida", venda apenas de uma parte com a área de 60 ha.s ) e 2-C ("Herdade do Pinto", também venda apenas de uma parte com a área de 127,2750 ha.s);

b) É um facto, confirmado pelo vendedor e presente SP, que o promitente comprador - A..................., lhe pagou, aquando da promessa de compra e venda (na data de 11.08.99, data da alteração do pré-acordo entre ambos) e a título de sinal, a quantia de 46 470 000$00, ficando desde logo acordado entre ambos que a parte restante e do montante de cerca de 51 000 000$00, lhe seria pago no momento da celebração da escritura definitiva;

c) Embora não se tenha concretizado o negócio entre P.............. e A..................., a própria feitura e concepção do contrato de promessa de compra e venda celebrado entre A................... e C................... (contrato em que este se compromete a comprar as propriedades de que aquele era promitente comprador e em que ele - C..................., também assumiria os direitos e obrigações antes aceites pelo A...................) indicia e sugere ser o mesmo do conhecimento do titular das propriedades e promitente vendedor - P.............. , ali constando, no seu clausurado, a referência à obrigatoriedade de ele - C..................... pagar, à data da escritura (definitiva) de compra e venda e directamente a P.............. , a quantia de Esc. 51 000 000$00;

d) Finalmente e com a celebração da escritura de compra e venda, em 23 de Novembro de 1 999, no Cartório Notarial de Vila Viçosa, é concretizado o negócio, figurando P.............. como vendedor e C..................... como comprador, constando da mesma que, pelo preço global de 51 000 000$00, já recebido por aquele, o mesmo vende, a este último, os prédios rústicos em causa e a que se reporta a presente informação, parece-nos perfeitamente líquido considerarmos, como valor de realização, não a quantia paga por C..................... a P...................... na data de 23.11.99 (data da escritura definitiva de compra e venda celebrada entre ambos), ou seja, a verba de 51 000 000$00 e que não será mais do que o pagamento da parte restante relativamente ao preço de 97 600 000$00 inicialmente acordado entre P.............. , ao tempo promitente vendedor e A..................., antes promitente comprador e que lhe havia já pago, por força de contrato de promessa existente entre ambos, a verba de 46 470 000$00, mas sim a importância de 97 470 000$00 (noventa e sete milhões quatrocentos e setenta mil escudos) e que terá sido, de facto, a verba total recebida pelo vendedor P.............. pela alienação onerosa dos dois prédios rústicos, valor que equacionamos e superiormente sugerimos como o correcto, uma vez que, embora efectuados os dois pagamentos de forma diferida, o primeiro e do montante de 46 470 000$00, efectuado em 11 de Agosto de 1 999 e cujo valor foi entregue pelo A................... como sinal, valor considerado por ambos afecto à totalidade do negócio e ficando ainda desde logo estipulada a data da escritura definitiva como data para o pagamento dos restantes 51 000 000$00 e o segundo, efectuado em 23 de Novembro de 1999 (data da escritura de compra e venda, mas já celebrada entre P.............. e C.....................) e do referido montante de 51 000 000$00, valor que já foi pago pelo adquirente C..................., conforme havia sido acordado e estipulado na cláusula 3.ª do Contrato de Promessa celebrado entre o A................... e o C.................... (...)».

K) Em resultado das conclusões extraídas da acção de inspecção foram efectuadas correcções técnicas, e m sede de IRS do ano de 1999, no montante de 33.996.435$00 [cf. fls. 18 do PA apenso].

L) Sobre o relatório da inspecção tributária recaiu parecer concordante e despacho de sancionamento [cf. fls. 17 do PA apenso].

M) Em 16/02/2001, J.............., invocando a qualidade de Director de Finanças, proferiu despacho a alterar o rendimento colectável do impugnante em sede de IRS do ano de 1999 para a quantia de 35.426.282$00, em conformidade com a fundamentação constante do relatório da inspecção tributária [cf. fls. 9 do PA apenso].

N) Em 06/03/2001 foi remetido ao impugnante,  através de carta registada, com aviso de recepção, o oficio nº 1681, do qual consta o seguinte teor: «(...)Fica(m) V.ª(s), por este meio notificado(s), nos termos do art. 77.º da LGT e art.º  61.º do RCPIT da fundamentação das correcções meramente aritméticas efectuadas à matéria colectável ou ao imposto, do(s) exercício(s) / período(s) de 1999 resultantes do relatório da Inspecção Tributária, de que se junta fotocópia, como parte integrante da presente notificação. A(s) liquidação(ões) associada(s) a esta(s) correcção(ões) será(ão), a breve prazo, notificada(s) pelos Serviços da DGCI (...)» [cf. fls. 7 do PA apenso].

O) O aviso de recepção identificado na alínea anterior foi assinado em 15-03-2001 [cf. fls. 5 do PA apenso].

P) Em 10/08/2001 foi emitida em nome do impugnante a liquidação adicional de IRS nº………….., relativa ao ano de 1999, no valor a pagar de 70.438,23€ [cf. fls. 50 dos autos].

Q) O impugnante foi notificado do teor da liquidação mencionada na alínea anterior, através do documento junto com petição inicial, constante de fls. 26 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

R) Por despacho de 17/09/2001 do Subdirector-Geral, proferido em substituição legal do Director-Geral da Direcção-Geral dos Impostos, publicado no Diário da República nº 248, 2ª Série, de 25/10/2001, Aviso (extrato) nº 12 882/2001, J.............., foi nomeado, em regime de substituição, no cargo de director de Finanças de Portalegre, com efeitos a partir de 18 de Março de 1999 [cf. fls. 121 e 122 dos autos].

S) A presente impugnação deu entrada na Repartição de Finanças do concelho de Elvas em 08/01/2002 [cf. fls. 3 dos autos].


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Com interesse para a decisão nada mais se provou.

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Motivação: A decisão da matéria de facto efectuou-se com base nos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo (PA) apenso, conforme discriminado em cada uma das alíneas dos factos provados.

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Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto: //
T) "O promitente-comprador, A...................... não compareceu no Cartório Notarial de Vila Viçosa na data de 01.10.1999, prevista no acordo referido na alínea c) dos factos provados, com vista à celebração do contrato definitivo”.

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2.2. Direito
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre as questões seguintes:
i) Prescrição da dívida subjacente aos presentes autos (conclusão a)).
ii) Erro de julgamento quanto à preterição de formalidades legais essenciais da notificação do acto impugnado (conclusão b)).
iii) Erro de julgamento quanto à falta de fundamentação formal do acto tributário impugnado (conclusões c) e d)).
iv) Erro de julgamento na fixação da matéria de facto relevante para o julgamento da causa (conclusões e) a g)).
v) Erro de julgamento quanto à ocorrência de erro na quantificação e qualificação do facto tributário, subjacente ao acto impugnado (demais conclusões de recurso).
2.2.2.Para julgar improcedente a impugnação, a sentença estruturou, em síntese, a argumentação seguinte:

«Caberia, então, ao impugnante alegar e demonstrar factos concretos que permitisse criar fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário [art.° 121° do CPT, correspondente ao actual 100°, n° 1 do CPPT], ou seja, que o valor de realização fixado pela AT pela mais-valia em causa nos autos não corresponde à realidade.

Para o efeito, o impugnante alega, mas de forma conclusiva, que o montante recebido de 46.470.000$00 corresponde à indemnização que teve direito pelo facto de A...................... ter incumprido com o contrato de promessa de compra e venda, defendendo que tal montante se encontra excluído de tributação, nos termos do 13° do C1RS [na redacção em vigor à data dos factos], não se verificando o facto tributário em relação a tal valor.
Porém, para que a sua tese pudesse merecer acolhimento caberia ao impugnante, pelo menos, alegar e demonstrar factos concretos que permitissem evidenciar que resolveu o contrato de promessa de compra e venda com fundamento em motivo imputável ao promitente-comprador [cf. artigos 801°, 808°, 432° e 436° todos do CCivil],

No entanto, do probatório não resulta qualquer facto que permita concluir ou indiciar que o promitente tenha resolvido o contrato de promessa, não tendo o impugnante, por conseguinte, logrado demonstrar fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, sendo de salientar que o impugnante veio nos presentes autos prescindir da inquirição das testemunhas que havia arrolado na petição inicial, o que revela que se demitiu de efectuar qualquer prova perante o Tribunal».
2.2.3. No que respeita à prescrição [fundamento do recurso referido em i)], cumpre referir o seguinte.

A questão da prescrição não foi suscitada pelo Recorrente junto do Tribunal de 1ª Instância, tendo, apenas, surgido como fundamento do recurso deduzido para este TCAS.

Acompanhamos, relativamente a esta matéria, o entendimento que se deixou expresso no Acórdão deste tribunal, proferido no âmbito do processo 2951/09, nos seguintes termos:

“(…) Em impugnação judicial, a prescrição é apreciada apenas para aferir se deve a instância prosseguir ou deve ser declarada a inutilidade superveniente da lide (cfr. Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, vol. I, 2006, p. 708).

Donde decorre, que não há obstáculo a que incidentalmente possa ser apreciada a prescrição, para efeito de se determinar se existe utilidade em se conhecer da invalidade de um acto que titula uma obrigação tributária que está extinta por prescrição.

Por outro lado, tem-se entendido que as causas de inutilidade superveniente da lide são também do conhecimento oficioso, por estarem conexionadas com o interesse processual ou interesse em agir, que é assumido pela doutrina como pressuposto processual ou condição da acção. E que não tem de existir apenas no momento em que o processo se inicia, mas também ao longo dele, justificando a sua falta a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide (entendimento preconizado no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28.06.2006, proferido no processo n.º n.º 189/06, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Note-se, finalmente, que só pode conhecer-se da prescrição da obrigação tributária, em impugnação judicial, incidentalmente, como eventual causa de inutilidade superveniente da lide, se o processo disponibilizar, sem necessidade de averiguação, todos os elementos factuais necessários (neste sentido, vide, entre muitos outros: Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 04.07.2018, proferido no processo n.º 01433/17, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).(...)”

In casu, embora a Recorrente afirme que constam dos autos todos os elementos que permitem efectuar um juízo seguro sobre a verificação da prescrição da dívida em apreço, certo é que o processo não contém todos os elementos indispensáveis ao conhecimento da questão da prescrição, já que não se encontrando apenso o PEF, difícil se torna aferir, com segurança se ocorreram, ou não, factos suspensivos ou interruptivos do decurso do prazo de prescrição, o que impede o seu conhecimento nesta sede.

No entanto, sempre se dirá que, na circunstância de a dívida tributária em referência estar, efectivamente, prescrita, o Recorrente poderá no processo de execução fiscal requerer essa mesma declaração (neste sentido, vide, entre muitos outros: Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.12.2015, proferido no processo n.º 1364/14, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Atento o exposto se decide não tomar conhecimento relativamente à questão da prescrição da dívida subagente ao acto tributário impugnado.
2.2.4. No que respeita ao erro de julgamento na fixação da matéria de facto relevante para o julgamento da causa [fundamento do recurso referido em iv)], o recorrente pretende juntar aos autos certificado emitido pelo Notário do Cartório Notarial de Vila Viçosa emitido em 01/10/1999, relativo à falta de comparência de A..................., no local com vista à celebração da escritura pública de compra e venda dos prédios denominados “Herdade de Almeida” e Herdade do Pinto”, bem como pretende aditar ao probatório o enunciado correspondente.
Apreciação.
Na petição inicial, o impugnante havia invocado a factualidade seguinte (artigos 18.º a 34.º):

«Em 23 de Abril de 1998, o Impugnante e A...................... celebraram um contrato-promessa de compra e venda, como promitente-vendedor. e promitente-vendedor, respectivamente, de três herdades, sitas em Almeida e melhor descritas no documento que se junta sob o n° 2, na alínea A), a fls 1.

O preço global acordado cifrou-se em Esc. 1 06.700,000$00.

Na data da assinatura daquele contrato-promessa, o agora Impugnante recebeu a importância de Esc. 2.000.000$00.

Para o que interessa directamente à presente impugnação judicial, ficou estabelecido no referido contrato-promessa que «no mesmo dia 24 de Junho de 1998 será lavrada a escritura pública da presente compra e venda, entregando-se nesse momento o resto do preço» - cft. cláusula 3a.

Uma vez que o A...................... manifestava dificuldades em cumprir no prazo convencionado (até 24 de Junho de 1 998),

Em 4 de Junho de 1998, o Impugnante e A...................... efectuaram um aditamento ao contrato-promessa de compra e venda, que haviam celebrado entre eles, em 23 de Abril de 1998 - doc. n° 3.

Neste aditamento, passou a constar, como prazo para a celebração do contrato prometido, a data de 18 de Setembro de 1999.

Como condição de consentir neste aditamento, exigiu o aqui Impugnante o pagamento de uma parcela do preço ainda em dívida,

Tendo recebido, então, a importância de esc. 44.470.000$00, a qual, adicionada ao que já fora anteriormente recebido, somou a importância de esc. 46.470.000$00.

Tendo, entretanto, ocorrido um litígio entre o Impugnante e o promitente-comprador, ambos acordaram transigir relativamente ao objecto do processo, por documento de 11 de Agosto de 1999 - doc. n° 4.

No referido documento, ficou excluída do contrato-promessa de compra e venda o prédio denominado Herdade de Almeida, com a dimensão de 6,75 ha, inscrito na Conservatória do Registo Predial sob o n°……….., freguesia de Santa Eulália.

Em função da retirada daquele prédio do objecto do contrato, o preço global acordado foi modificado e cifrou-se em Esc. 96.700.000$00.

No mesmo documento é reiterado que o aqui Impugnante recebera já, a título de sinal, a quantia de esc. 46.470.000$00, pela celebração do contrato prometido e respectivo aditamento.

O prazo para o cumprimento do contrato-promessa foi, neste acto, uma vez mais adiada,

Passando a ser a data de 1 de Outubro de 1999 a data-limite para a celebração da escritura de compra e venda dos bens imóveis, objecto do contrato-promessa.

O promitente-comprador, A......................, não celebrou o negócio prometido até ao dia 1 de Outubro de 1999.

No dia 23 de Novembro de 1999, o agora Impugnante vendeu os referidos prédios a C..................... Torres - doc. n° 4.»
A este propósito, estatui o artigo 13.º, n.º 1, do CPPT (“Poderes do juiz”), que «Aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direcção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar todas as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer». «Não conhecendo logo do pedido, o juiz ordena as diligências de produção de prova necessárias, as quais são produzidas no respectivo tribunal…» (artigo 114.º do CPPT “Diligências de prova”).
O impugnante/recorrente pretende fazer prova do «incumprimento total do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre o recorrente e A......................, sendo esta a base da transformação do sinal, imputável no preço, em prestação indemnizatória, sendo que esta não concorre para a fixação do valor de realização enquanto elemento essencial para a determinação do valor tributável». Junta para tal um certificado emitido pelo Notário do Cartório Notarial de Vila Viçosa, que comprova a não comparência do promitente-comprador, na data acordada para a celebração do contrato definitivo (01.10.1999).
A junção do documento em causa deve ser analisada à luz das normas sobre o erro de julgamento na determinação da matéria de facto.
Na tese do recorrente, o acto tributário é ilegal, dado que assentou em erro na quantificação da matéria colectável, porquanto o sinal pago pelo promitente-comprador que incumpriu o contrato promessa não concorre para a formação do preço recebido pelo impugnante pela venda dos prédios em apreço.
Por seu turno, o pressuposto em que assenta o acto tributário impugnado reside na simulação combinada de negócios jurídicos realizada pelo impugnante com A................... (primeira contraparte do impugnante no negócio da venda dos prédios) e C..................... (segunda contraparte do impugnante no negócio da venda dos prédios), o que terá levado a que a compra e venda dos prédios rústicos em causa tenha sido realizada com C....................., pese embora ter sido prometida com A..................., no quadro de um esquema negocial que envolveu todas as partes, com vista à obtenção da erosão da base tributária, mas cujo fim último, por todos conhecido, era o da transacção das propriedades da esfera do impugnante para a esfera do comprador, pelo preço global, composto pelas quantias pagas, quer no quadro do contrato promessa, por A..................., quer no quadro do contrato definitivo, por C......................
Por seu turno, o impugnante contesta a versão dos factos invocada pela impugnada, dado que terá havido incumprimento definitivo do contrato promessa que lhe permitiu reter o sinal pago, como indemnização pelo incumprimento do contrato, quantia que não constitui contrapartida pela venda dos prédios em apreço, pelo que não pode integrar o valor de realização para efeitos de cômputo das mais-valias tributáveis em sede de IRS.
Em face da causa de pedir articulada pelo impugnante, cabe ao tribunal apurar a matéria de facto relevante com vista a integrar as várias soluções plausíveis da questão de direito suscitada. Quer isto dizer que o tribunal não se pode limitar a fixar «os factos essenciais ou relevantes, para a solução daquelas questões que, no seu entender, eram pertinentes: [seja qual for] a sua visão da que [deve] ser a decisão jurídica da causa e o caminho para a atingir, o juiz [tem] de selecionar também os factos que interessam a outras vias de solução possível do litígio»[1]. Por outro lado, cumpre referir que «o juiz ordena as diligências de produção de prova necessárias, as quais são produzidas no respectivo tribunal» (artigo 114.º do CPPT), o que significa que «[p]ara além das diligências requeridas, o tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados»[2].
No caso, a AT considerou que o primeiro contrato promessa de compra e venda celebrado pelo recorrente era um negócio jurídico simulado, pelo que o recebimento do sinal pago pelo promitente-comprador como forma de antecipação do contrato definitivo (artigo 442.º/1, do CC), retido pelo recorrente, como forma de pagamento de indemnização pelo incumprimento por parte do promitente comprador da obrigação de celebração do contrato definitivo (artigo 442.º/2, do CC), não configuraria verdadeira indemnização pelo referido incumprimento definitivo do contrato de promessa outorgado entre o recorrente e A..................., mas antes parte do preço recebido pelo recorrente, como contrapartida pela venda dos dois prédios rústicos em presença.
A questão que se suscita nos autos consiste em saber se a quantia recebida pelo impugnante, a título de indemnização pelo incumprimento do contrato promessa constitui verdadeira e própria indemnização, a qual não é tributável em IRS (artigo 13.º/1, do CIRS, versão vigente) ou se tal quantia corresponde a parte do preço recebido pelo impugnante pela venda dos prédios rústicos em causa, pelo que, seguindo esta última tese, tal quantia integra a mais-valia a tributar em sede de IRS-rendimentos categoria G (artigo 10.º do CIRS).Tal questão não pode ser resolvida pelo tribunal recorrido, sem proferir decisão quanto à matéria de facto alegada pelo impugnante na petição inicial para sustentar a sua pretensão. «[O] procedimento tributário é dominado pelo princípio do inquisitório. É o que resulta do art.º 58.º da LGT. O mesmo sucedendo, de resto, com o processo judicial tributário – artigo 99.º do mesmo diploma. Assim sendo, as regras do ónus da prova não servem, no caso para determinar a quem compete provar a simulação, mas para determinar sobre quem recai o ónus da falta de prova da simulação»[3].
Recorde-se que «A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa» (artigo 662.º/1, do CPC).
Motivo porque que se impõe determinar a junção aos autos do documento junto com as alegações de recurso, bem como deferido o pretendido aditamento da matéria de facto assente.
Da mesma passa a constar, no local próprio, o enunciado probatório seguinte:
"O promitente-comprador, A...................... não compareceu no Cartório Notarial de Vila Viçosa na data de 01.10.1999, prevista no acordo referido na alínea c) dos factos provados, com vista à celebração do contrato definitivo”.
Motivo porque se impõe julgar procedente a presente imputação.
2.2.5. No que respeita ao fundamento do recurso referido em ii) Preterição de formalidades legais essenciais da notificação do acto impugnado, cumpre referir o seguinte.

Discorda o recorrente da posição sufragada pela sentença recorrida relativamente à notificação da liquidação por registo postal simples, referindo que, pelo facto de a notificação não ter sido efectuada com A/R padece de nulidade. Afirma que foram violados os artigos 38º, nº1 do CPPT e 133º, nº1 do CPA.

Recuperemos o decidido pela sentença recorrida quanto a este aspecto:

“(…) A notificação da liquidação é o acto pelo qual se leva a mesma ao conhecimento de alguém [artigo 36º, nº 1 do CPPT].

A notificação é, deste modo, um acto posterior e independente do acto de liquidação, razão pela qual os eventuais vícios da notificação não contendem com a validade do acto de liquidação, mas tão só com a respectiva eficácia [neste sentido, cf. entre outros, Acórdão do STA de 03/05/2006, Proc.  nº 0154/06, disponível para consulta em www.dgsi.pt].

Deste modo, o vício que o impugnante imputa à notificação da liquidação nunca poderá conduzir à anulação do acto tributário.

Não obstante, sempre se dirá que a não observância de todas as formalidades da notificação exigidas por lei [artigo 38°, nº 1 do CPPT], sempre seria irrelevante no caso dos autos na medida em que foi atingido o objectivo que se visava alcançar com a notificação, ou seja, transmitir ao impugnante o teor do acto de liquidação.

Pelo exposto, deve ser julgado improcedente o pedido de anulação do acto de liquidação com tal fundamento. (…)”

Comecemos por dizer que o Recorrente não vem colocar em causa o facto constante da alínea q) do probatório, onde se refere ter o mesmo sido notificado do teor da liquidação impugnada pelo documento constante a fls. 26.

A sentença recorrida, a nosso ver, bem, considerou que era irrelevante apurar do cumprimento do preceituado no nº1 do artigo 38º do CPPT por ter sido atingido o objectivo da notificação, qual seja o de transmitir ao Recorrente o teor do acto de liquidação.

Efectivamente, da análise do documento constante a fls. 26 (junto pelo Recorrente) se constata que se trata da demonstração da liquidação adicional do imposto em causa (IRS 1999), e que aquele foi notificado da mesma, ou seja, não persiste dúvida alguma relativamente à realização da notificação.

Neste sentido, veja-se o sumário do Acórdão do STA de 29/11/2006, proferido no âmbito do processo nº 412/06, que nos permitimos transcrever:

“I – Os actos de liquidação de tributos são actos susceptíveis de alterar a situação do contribuinte, para efeitos do disposto no artº 38º, nº 1 do CPPT.

II – O nº 3 do artº 139º (hoje artº 149º) do CIRS, em que se prevê a notificação da liquidação por carta registada sem aviso de recepção, foi revogado pelo artº 2º, nº 1 do Decreto-lei nº 433/99 de 26/10, por dispor ao contrário daquele artº 38º, nº 1.
III – No entanto, no âmbito de aplicação destas normas, se tiver sido enviada simples carta registada para notificação dessa liquidação e se provar que a carta foi efectivamente recebida, não pode deixar de se considerar efectuada a notificação.”

Improcede, pois, este esteio do recurso, não padecendo a sentença recorrida do invocado erro de julgamento.
2.2.6. No que respeita ao fundamento do recurso referido em iii), Falta de fundamentação formal do acto tributário impugnado, cumpre referir o seguinte.

O Recorrente dissente do decidido relativamente à fundamentação do acto de liquidação adicional impugnado, afirmando que é inexistente.

A sentença recorrida, relativamente ao invocado vício de falta de fundamentação, considerou o seguinte:

“(…) Quanto à fundamentação dos actos de liquidação dispõe-se no artigo 77º, nº 2, da LGT que a mesma pode ser efectuada de forma sucinta.

A fundamentação do acto deve ser clara, congruente e suficiente.

A fundamentação diz-se suficiente quando um destinatário normal colocado na posição do destinatário concreto consegue aperceber-se das razões de facto e de direito que permitiram ao autor do acto decidir como decidiu.

Ora, a apreciação da suficiência da fundamentação é contextual sendo que "a avaliação quantitativa da fundamentação suficiente só pode realizar-se em concreto a partir da multiplicidade de elementos susceptíveis de condicionarem a variabilidade do conteúdo fundamentador" [cf. ANDRADE, José Carlos Vieira de - O dever de fundamentação expressa de actos administrativos, Coimbra: Livraria Almedina, 1992, pág. 241].

A exigência da suficiência da fundamentação não implica a rejeição de fundamentações estandardizadas, tipificadas, decorrentes de actos praticados em massa com recurso a meios automáticos.

Como já decidiu o STA em aresto relativo ao IRC, mas cujos fundamentos e decisão são aplicáveis mutatis mutandis aos actos de liquidação de IRS, «a liquidação em IRC, porque feita centenas de milhares de vezes em cada ano, constitui "um acto de massa" e, porque assim é, tudo aconselha a que não se exija de tais actos o mesmo rigor formal que se deve exigir dos outros actos administrativos que se destinam a situações específicas individualizadas» [cf. Acórdão de 22/11/2000, Proc. nº 025389, disponível para consulta em www.dgsi.pt].

Nestes casos, o juízo sobre a suficiência da fundamentação deve orientar-se pela possibilidade do destinatário, em face do contexto em que o acto é praticado, ter tido a possibilidade de conhecer as razões determinantes da decisão e como tal não ter visto diminuída a possibilidade de impugnação judicial do ato.

Ora, está provado nos autos que o acto de liquidação impugnado resulta directamente de um procedimento de inspecção, sendo que o acto de determinação da matéria colectável e o acto de liquidação estão entre si unidos por uma relação lógica de interdependência, funcionando o segundo como acto consequente ou corolário do primeiro, pelo que é no contexto do relatório de inspecção notificado ao impugnante que tem ser analisado o vício de falta de fundamentação do acto de liquidação e não a partir da sua posterior notificação.

Neste sentido se pronunciou o TCA Sul, em Acórdão proferido em 31/10/2006 no processo nº 0122/04 [disponível para consulta em www.dgsi.pt], no qual conclui que «O princípio da suficiência significa que a fundamentação se deve estender a todos os elementos escolhidos pela administração de forma a reconstituir-se o iter lógico e jurídico do procedimento que terminou com a decisão final (...). No caso "sub judice" a liquidação impugnada foi precedida de uma acção de fiscalização que deu origem ao relatório da inspecção tributária junto aos autos e em devido tempo dado a conhecer ao impugnante. É através da inspecção efectuada que se confirma, corrige ou determina a matéria coletável, objecto de liquidação. Assim, embora as liquidações "stricto sensu" constituam os actos tributários por excelência, devem ser analisadas em conjunto com o relatório da inspecção tributária, da qual são uma consequência, sendo este um acto administrativo preparatório daquelas. (...) Se do Relatório da fiscalização, é possível conhecer o iter cognoscitivo que levou a AF à prática do acto, este está fundamentado. É nesta visão de conjunto que o impugnante encontrará a fundamentação dos actos tributários.».

Ora, do conteúdo do relatório de inspecção resulta que um destinatário médio colocado na posição da impugnante teve a possibilidade de conhecer o iter cognoscitivo-valorativo percorrido em que assentou a decisão impugnada, nada existindo na lei que determine que o autor do acto de liquidação deva ser o autor das correcções efectuadas em sede de acção inspectiva.

Pelo exposto, deve ser julgado improcedente o pedido de anulação do acto de liquidação com tal fundamento. (…)”

Entendemos que a sentença decidiu bem, de acordo com a legislação aplicável e referindo jurisprudência que acolheu, carecendo a argumentação do Recorrente de respaldo legal, pelo que nada mais temos a acrescentar, sendo de considerar improcedente este segmento do recurso. Os motivos do acto tributário constam do relatório imspectivo, sendo os mesmos acessíveis a um destinatário médio, colocado na posição do impugnante.

Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.7. No que respeita ao fundamento do recurso referido em v), Erro de julgamento quanto à ocorrência de erro na quantificação e qualificação do facto tributário, subjacente ao acto impugnado, cumpre referir o seguinte.

O Recorrente discorda do entendimento adoptado pela sentença recorrida no sentido de que a quantia de Esc. 51.000.000$00 declarada na escritura de compra e venda dos bens imóveis em causa nos autos não corresponde ao valor efectivo recebido pelo Recorrente a título de preço, antes incluiria, também, o valor de Esc. 46.470.000$00 recebido a título de sinal referente ao contrato-promessa celebrado entre o recorrente e o primitivo promitente-comprador.

Recuperemos o segmento da sentença recorrida que analisou esta questão:

“(…) No caso dos autos, conforme decorre do relatório de inspecção constante do probatório, a fiscalização concluiu que o impugnante omitiu rendimentos da Categoria G, provenientes de mais-valias realizadas com a alineação de dois prédios rústicos, tendo procedido à respectiva correcção, nos termos do artigo 10º, nº 1, al. a) do CIRS, tendo, para o efeito, fixado como valor de realização o montante de 97.470.000$00, por entender ter sido este o preço efectivamente recebido pelo impugnante pela alienação dos imóveis, assim desconsiderando o preço global de venda de 51.000.000$00 constante da respectiva escritura de compra e venda.

A fiscalização chegou a tal conclusão a partir dos seguintes factos conhecidos e provados nos autos:

- (i) por escrito assinado em 11 de Agosto de 1999, o ora impugnante e A...................... transigiram sobre um litígio judicial tendo por objecto um contrato de promessa de compra e venda celebrado em 23 de Abril de 1998 e alterado em 4 de Junho de 1998;

- (ii) na referida transacção, o ora impugnante prometeu vender a A...................... os prédios denominados de "Herdade de Almeida" e a "Herdade de Pinto'', pelo preço global de 97.600.000$00, tendo o impugnante declarado ter recebido a título de sinal a quantia de 46.470.000$00, tendo as partes convencionado que o remanescente do preço, no montante de 51.000.000$00, seria entregue na data da escritura pública, a realizar até ao dia 1 de Outubro de 1999;

- (iii) em 23 de Novembro de 1999, tendo por base a referida transacção, A...................... prometeu vender os referidos prédios a C..................... e este prometeu comprar, tendo as partes acordado que na data da escritura de compra e venda C..................... pagaria directamente ao ora impugnante a quantia de 51.000.000$00, referida no acordo judicial.

- (iv) na mesma data de 23 de Novembro de 1999, entre o ora impugnante e C..................... foi celebrada escritura pública de compra e venda dos prédios denominados de "Herdade de Almeida" e a "Herdade de Pinto", tendo sido declarado o preço global de venda de 51.000.000$00.

-(v) Em 18 de Julho de 2000, A...................... declarou perante a AT que na escritura pública foram declarados valores inferiores aos contratados.

-(vi) Na declaração de rendimentos do ano de 1999 o impugnante não apresentou o anexo G, referente a rendimentos de categoria G.

Ora, tais factos apurados pela fiscalização e provados nos autos constituem indícios sólidos e seguros que demonstram com elevado grau de certeza que o preço efectivamente recebido pelo ora impugnante pela venda dos imóveis foi de 97.470.000$00, correspondente ao valor do sinal entregue por A......................, acrescido do valor de 51.000.000$00 constante da escritura pública.

Resulta do exposto que a AT logrou demonstrar os pressupostos legais da sua actuação, quer quanto à existência do facto tributário omitido na declaração de rendimentos do impugnante, quer em relação à sua quantificação.

Caberia, então, ao impugnante alegar e demonstrar factos concretos que permitisse criar fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário [art.º 121º do CPT, correspondente ao actual 100º, nº 1 do CPPT], ou seja, que o valor de realização fixado pela AT pela mais-valia em causa nos autos não corresponde à realidade.

Para o efeito, o impugnante alega, mas de forma conclusiva, que o montante recebido de 46.470.000$00 corresponde à indemnização que teve direito pelo facto de A...................... ter incumprido com o contrato de promessa de compra e venda, defendendo que tal montante se encontra excluído de tributação, nos termos do 13° do CIRS [na redacção em vigor à data dos factos], não se verificando o facto tributário em relação a tal valor.

Porém, para que a sua tese pudesse merecer acolhimento caberia ao impugnante, pelo menos, alegar e demonstrar factos concretos que permitissem evidenciar que resolveu o contrato de promessa de compra e venda com fundamento em motivo imputável ao promitente-comprador [cf. artigos 801º, 808º, 432º e 436º todos do CCivil].

No entanto, do probatório não resulta qualquer facto que permita concluir ou indiciar que o promitente tenha resolvido o contrato de promessa, não tendo o impugnante, por conseguinte, logrado demonstrar fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, sendo de salientar que o impugnante veio nos presentes autos prescindir da inquirição das testemunhas que havia arrolado na petição inicial, o que revela que se demitiu de efectuar qualquer prova perante o Tribunal. (…)”

Apreciação. O Recorrente entende que se verifica erro na determinação da matéria colectável, concretamente no valor que a AT considerou como valor de realização em sede de venda dos prédios rústicos em causa nos autos.

Não vem posta em causa a factualidade dada como provada na sentença recorrida, concretamente as vicissitudes em torno dos contratos-promessa celebrados.

A argumentação do Recorrente radica no alegado incumprimento contratual por parte do primeiro promitente-comprador – A....................... Afirma que a conclusão da AT e da sentença recorrida de que o preço recebido pela compra e venda titulada pela escritura pública a que se refere a alínea e) do probatório, englobava não só o valor de Esc. 51.000.000$00 (constante da escritura pública), mas também o sinal recebido de A................... e que este perdera por incumprimento do contrato se trata de erro notório.

Refere que a posição sufragada pela AT se baseia em raciocínio apriorístico, sustentado em suposições e sugestões, recorrendo a expressões como indicia e sugere, as quais não poderão conduzir a nenhuma prova concludente e segura que coloque em causa a veracidade dos elementos declarados pelo sujeito passivo, contrariamente ao que foi considerado pela sentença recorrida.

Considera incorrecta a alocação do ónus da prova ao contribuinte relativamente à veracidade das suposições alvitradas no RIT.

Antes de mais, cabe referir que o impugnante logrou provar toda a factualidade por si aduzida na petição inicial.

Ou seja, das alíneas A) a E) e T), do probatório resulta o seguinte:

«Em 23 de Abril de 1998, o Impugnante e A...................... celebraram um contrato-promessa de compra e venda, como promitente-vendedor. e promitente-comprador, respectivamente, de três herdades, sitas em Almeida e melhor descritas no documento que se junta sob o n° 2, na alínea A), a fls 1.

O preço global acordado cifrou-se em Esc. 1 06.700,000$00.

Na data da assinatura daquele contrato-promessa, o agora Impugnante recebeu a importância de Esc. 2.000.000$00.

Para o que interessa directamente à presente impugnação judicial, ficou estabelecido no referido contrato-promessa que «no mesmo dia 24 de Junho de 1998 será lavrada a escritura pública da presente compra e venda, entregando-se nesse momento o resto do preço» - cft. cláusula 3a.

Uma vez que o A...................... manifestava dificuldades em cumprir no prazo convencionado (até 24 de Junho de 1 998),

Em 4 de Junho de 1998, o Impugnante e A...................... efectuaram um aditamento ao contrato-promessa de compra e venda, que haviam celebrado entre eles, em 23 de Abril de 1998 - doc. n° 3.

Neste aditamento, passou a constar, como prazo para a celebração do contrato prometido, a data de 18 de Setembro de 1999.

Como condição de consentir neste aditamento, exigiu o aqui Impugnante o pagamento de uma parcela do preço ainda em dívida,

Tendo recebido, então, a importância de esc. 44.470.000$00, a qual, adicionada ao que já fora anteriormente recebido, somou a importância de esc. 46.470.000$00.

Tendo, entretanto, ocorrido um litígio entre o Impugnante e o promitente-comprador, ambos acordaram transigir relativamente ao objecto do processo, por documento de 11 de Agosto de 1999 - doc. n° 4.

No referido documento, ficou excluída do contrato-promessa de compra e venda o prédio denominado Herdade de Almeida, com a dimensão de 6,75 ha, inscrito na Conservatória do Registo Predial sob o n° 00302/230491, freguesia de Santa Eulália.

Em função da retirada daquele prédio do objecto do contrato, o preço global acordado foi modificado e cifrou-se em Esc. 96.700.000$00.

No mesmo documento é reiterado que o aqui Impugnante recebera já, a título de sinal, a quantia de esc. 46.470.000$00, pela celebração do contrato prometido e respectivo aditamento.

O prazo para o cumprimento do contrato-promessa foi, neste acto, uma vez mais adiada.

Passando a ser a data de 1 de Outubro de 1999 a data-limite para a celebração da escritura de compra e venda dos bens imóveis, objecto do contrato-promessa.

O promitente-comprador, A......................, não celebrou o negócio prometido até ao dia 1 de Outubro de 1999.

No dia 23 de Novembro de 1999, o agora Impugnante vendeu os referidos prédios a C.....................  - doc. n° 4.».

Ou seja, o impugnante logrou provar a factualidade relevante, com vista a sustentar a tese de que a quantia por si recebida e paga por A...................... corresponde ao pagamento de sinal, pelo que pode assumir uma função indemnizatória, nos termos do artigo 442.º/2, do CC, na eventualidade do incumprimento do contrato promessa por parte do promitente comprador. Outra questão reside em saber se da prova produzida resulta a infirmação do pressuposto em que assenta o acto tributário, de que o valor do preço recebido pelo impugnante inclui os dois montantes que lhe foram entregues, seja por parte de A......................, seja por parte de C..................... .

A este propósito, estabelecia o artigo 39.º da LGT (“Simulação dos negócios jurídicos”) que, «1 - Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado. // 2 - Sem prejuízo dos poderes de correcção da matéria tributável legalmente atribuídos à administração tributária, a tributação do negócio jurídico real constante de documento autêntico depende de decisão judicial que declare a sua nulidade. «O artigo 39º da Lei Geral Tributária não impede a Administração Fiscal de, perante uma escritura pública da qual consta determinado preço de venda, tributar em IRS o correspondente provento, considerando, por presunção, um preço superior ao declarado. // Aquela disposição legal não impõe à Administração que, para assim proceder, obtenha a declaração judicial de nulidade do negócio jurídico simulado, porque constante de escritura pública, pois a mera simulação do preço não é causa da nulidade de tal negócio, não existem, no caso, dois negócios, um real e outro simulado, e o Fisco pode recorrer a métodos presuntivos, quando a lei lho autorize»[4].

Dos dados coligidos nos autos resulta que a quantia recebida pelo impugnante de A...................... integra o preço de venda das herdades, desde logo, porque a função indemnizatória do referido sinal só ocorreria se o negócio prometido realizar não se tivesse concretizado concomitantemente, o que no caso não sucedeu. O contrato definitivo foi outorgado e os imóveis foram vendidos pelo impugnante exatamente pelo preço global que o mesmo havia estabelecido no dia 23 de Novembro de 1999, menos de um mês depois da data prevista no contrato promessa para a outorga do contrato definitivo. Pelo que não existe nenhum prejuízo na esfera jurídica do impugnante que autorize a invocação do direito a reter o sinal pago, nos termos do artigo 442.º/2, do CC. Pela venda dos imóveis em presença o impugnante recebeu, a título de preço, o valor que desde o início tencionava receber (97.600.000$00), ainda que pago em momentos distintos e aparentemente por sujeitos jurídicos diversos.

Como resulta do RIT:

10. Elemento essencial para a determinação da matéria tributável será o valor de realização, valor que embora conste da escritura de compra e venda ter sido de 51 000 000$00 não é por nós aceite e se corrige, se atendermos aos seguintes factos conhecidos:

10.1. De acordo com o teor do Contrato  celebrado em 23 de Abril de 1998, em Elvas e com  certificação no Consulado de Portugal, em Badajoz, documento autenticado em 29.09.98 no Cartório Notarial de Campo Maior, é estabelecido um pré-acordo / contrato de promessa de  compra  e venda entre P...................... e A................... e em que aquele, proprietário   das "Herdade  de  Almeida",  com 60 ha.s, "Herdade  de Almeida", com 6,75  ha.s  e  "Herdade  do  Pinto",   com   127,275  ha.s,  acorda  vender,  a este  último, as  referidas  propriedades  rústicas e  em   que   ambos fixaram, como preço  base, por hectare,  o  valor  de 550  000$  (o  preço total  das  três herdades seria  de  106 700 000$00),  acordo  que previa ainda o dia 24 de Junho de 1998 como a data para a celebração da escritura pública de compra e venda (documentos em arquivo) .

10.2 - Posteriormente e em função de reformulação do acordo primitivo, é estabelecido, entre as  mesmas  partes, um  outro  acordo, com   data de 04 de Junho de 1998 e  igualmente autenticado no CNCampo Maior,  em que, entre outro clausurado, acordam  excluir, do contrato que haviam estabelecido, a transmissão da  "Herdade  de  Almeida"  e  com  a área de 6.75 ha.s, mantendo-se  a   compra  e  venda  das  duas  propriedades restantes,  tendo  também sido igualmente acordada a alteração do  preço   global,  inicialmente   de   107  700   000$00  para as  três  herdades//prédios  rústicos, para o valor de 97600000$00, alterando-se também a data prevista  para  a  efectivação da  escritura  definitiva  e  que ficou marcada  para o dia de Outubro  de 1999  (documento  que também se arquiva em "papéis" de trabalho) .

10. 3- É esse, pois, o valor previsto e acordado entre P.................. e A...................    para o  negócio que  se propunham fazer, ou seja, a transmissão, por parte daquele e a título oneroso, das propriedades rústicas  "Herdade  de  Almeida”, com  a  superfície de 60 ha.s e "Herdade do Pinto",  esta  com  a  superfície de  127,2750  ha.s, constando  ainda deste último contrato e posteriormente confirmado pelo promitente  vendedor, ter-lhe sido paga, por A................... e  a   título   de   sinal, a verba  de 46470000$00, valor  que ficaria  afecto  à totalidade  do negócio  e  sendo os  restantes 51 000 000$00 entregues na data da escritura definitiva.

10.4 - Posteriormente vem a ser celebrado, entre o promitente comprador - A................... e C....................., também cidadão espanhol, um Contrato de   Promessa de Compra e Venda, datado de 23  de  Novembro  de  1999,  contrato em   que o primeiro outorgante (A...................) promete vender ao  segundo (C...................),  o  prédios  rústicos em causa e  em que  ele (A...................), como  a  documentação existente e   a que nos vimos referindo comprova, era, à data de 23.11.99, promitente comprador e ficando desde logo ali expresso e acordado, entre outro clausurado, ser total  da   venda   de 60000000 (sessenta  milhões) de pesetas, correspondentes a cerca de 72 000 000$00 e dever  o segundo outorgante (C...................), à  data  da  escritura  de compra  e  venda  que  entre os dois iria ser celebrada, pagar directamente a P...................... (no momento ainda o proprietário e  que  já  havia  recebido,  por parte de A................... e a título de sinal, o montante de 46  470  000$00), a quantia de 51 000 000$00 (documento que igualmente se anexa e que também constitui "papéis" de trabalho) .

E como se conclui no RIT,

11. VALOR DE REALIZAÇÃO:

- De acordo, pois, com os vários tipos de desenvolvimentos por que passou o negócio e se atendermos a que:

a) Entre P.............. e A..................., promitentes vendedor e comprador, respectivamente, foi acordado o preço de 97 600 000$00 para a venda das duas herdades - prédios rústicos sitos na área do concelho de Elvas e inscritos sob os artigos 7-H ("Herdade de Almeida", venda apenas de uma parte com a área de 60 ha.s )  e  2-C  ("Herdade  do Pinto", também venda apenas de uma parte com  a  área  de  127,2750 ha.s);

b) E um facto, confirmado pelo vendedor e presente SP, que o promitente comprador - A..................., lhe pagou, aquando da promessa de compra e venda (na data de 11.08.99, data da alteração do pré-acordo entre ambos) e a título de sinal, a quantia de 46 470 000$00, ficando desde logo acordado entre ambos que a parte restante e do montante de cerca de 51 000 000$00, lhe seria pago no momento da celebração da escritura definitiva;

c) Embora não se tenha concretizado o negócio entre P.............. e A..................., a própria feitura  e  concepção  do  contrato  de  promessa  de compra  e venda celebrado entre A................... e C................... (contrato em que este se compromete a comprar as propriedades de que aquele era promitente comprador e em que ele - C..................., também assumiria os direitos e obrigações antes aceites  pelo  A...................)  indicia  e  sugere  ser  o  mesmo do conhecimento do titular das propriedades e promitente vendedor  - P..............  .,  ali  constando,   no   seu   clausurado,  a  referência  à obrigatoriedade de ele - C..................... pagar, à  data  da  escritura (definitiva)  de  compra  e  venda  e  directamente  a  P.............. .,  a quantia de Esc. 51 000 000$00;

d) Finalmente e com a celebração da escritura de compra e venda, em 23 de Novembro de 1 999, no Cartório Notarial de Vila Viçosa, é concretizado o negócio, figurando P.............. . como vendedor e C...................   .   como   comprador, constando  da  mesma  que  pelo preço global de 51 000 000$00, já recebido por aquele, o  mesmo vende, a este último, os prédios rústicos em causa e a que se reporta a presente informação, parece-nos perfeitamente líquido considerarmos, como valor de realização, não a  quantia  paga  por  C...................  a  P...................... na data de  23.11.99  (data  da  escritura definitiva de compra e venda celebrada entre ambos), ou seja, a verba de 51 000 000$00 e que não será mais do que o pagamento da parte restante relativamente ao preço  de  97 600 000$00  inicialmente acordado entre P.............. ., ao tempo  promitente  vendedor  e A...................,  antes  promitente  comprador  e  que  lhe havia já pago,  por  força  de  contrato  de  promessa  existente  entre ambos,   a   verba   de   46   470   000$00,   mas   sim   a   importância  de 97.470  000$00 (noventa e sete milhões quatrocentos e setenta mil escudos) e que terá sido, de facto, a verba total recebida pelo vendedor P.............. . pela alienação onerosa dos dois prédios rústicos, valor que equacionamos e superiormente sugerimos como o correcto,  uma vez que, embora efectuados os dois pagamentos de  forma  diferida,  o primeiro e do montante de 46 470 000$00, efectuado em 11 de Agosto de 1 999 e cujo valor foi entregue pelo A................... como sinal, valor considerado por ambos afecto à totalidade do negócio e ficando ainda desde logo estipulada a data da escritura definitiva como data para o pagamento dos restantes 51 000 000$00 e o segundo, efectuado em 23 de Novembro de 1999 (data da escritura de compra e venda, mas já celebrada entre P.............. . e C.....................) e do referido montante de 51 000 000$00, valor que já foi pago pelo adquirente C....................., conforme havia sido acordado e estipulado na cláusula 3.ª do Contrato de Promessa celebrado entre o A................... e o C.................... (...)».
Os indícios da simulação de preço no negócio definitivo e de negócio simulado em relação ao contrato celebrado entre o impugnante e A................... são os que resultam do RIT, sem que o recorrente logre pôr em crise a sua verificação. Ou seja, o impugnante pretendia vender as propriedades em presença pelo preço correspondente às quantias por si recebidas, sendo comprador, apenas, C...................... No mais, ocorreu a interposição fictícia de terceiro (A...................), com vista à ocultação do verdadeiro preço recebido pelo impugnante.
«Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado. // O negócio simulado é nulo» (artigo 240.º do CC). «Quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é aplicável a este o regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não sendo a validade prejudicada pela nulidade do negócio simulado» (artigo 241.º/1, do CC).
De onde se extrai que, ao considerar como preço recebido pelo impugnante, com vista ao cômputo das mais-valias tributáveis, o valor de 97.470.000$00, o acto tributário não enferma do erro que lhe é apontado, como se decidiu na sentença recorrida. Esta última, por não incorrer em erro, deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.


*

Dispositivo


Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª sub-Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 9 de Julho de 2020


(Jorge Cortês)

[Relator por vencimento]

(Isabel Fernandes)

[com Declaração de voto]

 (Lurdes Toscano)


Declaração de voto

Vencida quanto à admissão do documento em sede de recurso.
Embora concorde com a decisão, não admitiria o documento junto pelo Recorrente com as alegações de recurso, pelas seguintes razões:
O Recorrente, P.............., veio requerer, nas alegações de recurso, a junção aos autos de certificado emitido pelo Notário do Cartório Notarial de Vila Viçosa emitido em 01/10/1999.
Para justificar a oportunidade da junção do referido documento o Recorrente nada disse.
Para justificar a utilidade da junção do apontado documento, defende o Recorrente, a propósito da alegada não celebração do contrato de compra e venda prometido, “que deveria ter sido considerado como provado pela douta sentença”.
Vejamos.
Sobre a admissibilidade da junção de documentos nesta fase processual, tenhamos presente o que a jurisprudência dos Tribunais Superiores vem entendendo a este propósito, recuperando, para tal, o sumário do acórdão proferido neste TCA Sul, em 25/01/18, no processo nº 312/17.4 BEBJA, no qual se lê o seguinte:
“(…) 6 - Em fase de recurso, a lei processual civil (cfr.artºs.524 e 693-B, do C.P.Civil; artºs.425 e 651, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), somente possibilita a junção de documentos ao processo, sempre e só com as alegações (ou contra-alegações) e não em momentos posteriores, quando ocorra alguma das seguintes circunstâncias:
A -Quando não tenha sido possível a respectiva apresentação em momento anterior (artº.524, nº.1, do C.P.Civil);
B -Quando se destinem à demonstração de factos posteriores aos articulados (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
C -Quando a respectiva apresentação se tenha tornado necessária em resultado de ocorrência posterior ao encerramento da discussão em 1ª Instância (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
D -Quando a junção de documentos se torne necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª Instância (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil; artº.651, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6);
E -Nos casos previstos no artº.691, nº.2, als.a) a g) e i) a n), do C. P. Civil (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil).
7. A verificação das circunstâncias que se acabam de elencar tem como pressuposto necessário que os factos documentados sejam relevantes/pertinentes à decisão a proferir, o que decorre, desde logo, directamente da circunstância dos documentos cuja junção se pretende deverem ter por desiderato a prova dos fundamentos da acção e/ou da defesa (citado artº.523, do C.P.Civil) e, indirectamente e como consequência do que se vem de referir, do facto de o juiz se encontrar vinculado a mandar retirar do processo os que sejam impertinentes ou desnecessários, por força do estipulado no artº.543, do mesmo compêndio legal.
8. No que diz respeito à hipótese de junção de documentos quando esta se torne necessária em virtude do julgamento efectuado em 1ª Instância (cfr.al.d) supra), o advérbio “apenas”, usado no artº.651, nº.1, do C.P.Civil, significa que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª Instância, isto é, se a decisão da 1ª Instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento. A lei quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão da 1ª. Instância ser proferida”.
Atentemos, ainda, no que se escreveu no Acórdão deste tribunal proferido em 30/09/2019, no âmbito do processo nº 1983/09:
“(…) O recurso é o meio processual que se destina a impugnar as decisões judiciais, e nessa medida, o tribunal “ad quem” é chamado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos.
Como refere António Santos Abrantes Geraldes, in Recurso no Novo Código de Processo Civil, 2.ª ed., 2014, Almedina, pp. 92 “(…) A natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão, determina uma importante limitação ao objecto, decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas.
Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados à reapreciar as decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo se quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. (…)“
Ou seja, o recurso como meio de impugnação de uma decisão judicial, apenas pode incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas.
A conjugação do n.º 1 art.º 640.º e n.º1 do art.º 662.º do CPC afasta, também a possibilidade de o Tribunal de recurso com competência em matéria de facto efectuar um novo julgamento ao fazer recair sobre o recorrente o ónus de, primeiro, indicar os concretos pontos de facto que pretende ver modificados e, em segundo, indicar os concretos meios probatórios constantes do processo, do registo ou da gravação que imponham decisão diversa sobre aqueles pontos de facto.
Dito isto, importará conhecer o regime legal que se aplica à junção de documentos, em sede de recurso.
Nos termos do disposto no artigo 425º do Código de Processo Civil (CPC) “depois de encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento.”
Determina, por sua vez, o nº 1 do artigo 651.º do mesmo diploma que ” as partes só podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º do CPC ou no caso da junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1.ª instância.”
Nos termos do artigo 108º/3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e do artigo 423º/1 do CPC, a regra é a de os documentos serem apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes. Ou seja, com a petição inicial, caso visem fazer prova dos fundamentos da acção, podendo, contudo, ser apresentados até 20 dias antes da data que se realize a audiência final.
No contencioso tributário a sua junção pode ser feita até ao encerramento da discussão da causa na 1ª instância, que ocorrerá com o termo do prazo para alegações. Todavia, a junção tardia originará o pagamento de uma multa, caso a parte não prove que os não pôde oferecer com o articulado. cfr. artº 423º/2 do CPC.
Decorrido tal prazo, só serão admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária, em virtude de ocorrência posterior. cfr. art. 423.º/3 do CPC.
Em sede de recurso e de acordo com os normativos acima citados, a junção de documentos assume carácter excecional, só devendo ser consentida nos casos especiais previstos na lei (artº 651º/1, CPC).
Será assim possível, nesta sede, a junção de documentos com as alegações, quando a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento, em virtude de ter ocorrido superveniência objectiva [documento formado depois de ter sido proferida a decisão] ou subjectiva [documento cujo conhecimento ou apresentação apenas se tornou possível depois da decisão e ou se tenha revelado necessária em virtude do julgamento proferido]. Vide, entre outros, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, p. 191 e segs.(…)”
Ora, considerando o invocado pela Recorrente, entendo que a pretendida junção de documento não se enquadra em nenhuma das circunstâncias supra referidas, mais se verificando que, considerando a data em que terá sido emitido, não se vislumbra por que razão não foi junto em momento oportuno e adequado. O que nos leva a concluir pela sua não admissão nesta fase processual, por contrariar o preceituado no artigo 651º do CPC.
Como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa em anotação ao artigo 279º do CPPT, a proibição de junção tardia de documentos, consagrada em normas especiais relativa à produção de prova documental, implica que o Tribunal não poderá, ao abrigo do poder genérico de ordenar e realizar as diligências que considere necessárias para apuramento da verdade, ordenar a junção de documentos apresentados intempestivamente.
Pelo que, não admitiria a requerida junção de documento.

Isabel Fernandes

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[1] José Lebre de Freitas, A acção declarativa comum à luz do Código de Processo Civil de 2013, Cimbra Editora, 2013, pp. 190/191. Na expressão do artigo 511.º/1 do CPC, versão anterior à reforma de 2013, « O juiz, ao fixar a base instrutória, selecciona a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que deva considerar-se controvertida»
[2] Jorge Lopes de Sousa, CPPT, comentado, Vol. II, 6:ª Ed., p. 254.
[3] Nuno Bastos, Problemas da simulação em direito tributário, in Cadernos de Justiça Tributária, 18, Out-Dez, 2017, pp. 11/ 27, máxime, p. 17.
[4]Acórdão do STA, de 19.02.2003, P.  01757/02.