Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:13409/16
Secção:CA
Data do Acordão:08/02/2016
Relator:CATARINA JARMELA
Descritores:EXECUÇÃO DE SENTENÇA ANULATÓRIA - ARTIGO 173º DO CPTA - CASO JULGADO - CAUSA LEGÍTIMA DE INEXECUÇÃO - IMPOSSIBILIDADE ABSOLUTA
Sumário:I - Em geral, a execução das sentenças anulatórias dos tribunais administrativos impõe à Administração a obrigação de desenvolver uma actividade de execução com a finalidade de pôr a situação de facto de acordo com a situação de direito constituída pela decisão anulatória, obrigação que, de acordo com o disposto no art. 173º n.º 1, do CPTA, subdivide-se em dois deveres concretos:
- dever de respeitar o julgado, conformando-se com as limitações que dele resultam para o eventual exercício dos seus poderes [efeito preclusivo, inibitório ou conformativo], e
- dever de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto anulado [efeito repristinatório, reconstitutivo ou reconstrutivo].
II - O respeito pelo caso julgado significa que a Administração, a repetir o acto anulado, terá de o fazer desprovido da(s) ilegalidade(s) que motivou(aram) a anulação, não podendo reincidir nessa(s) ilegalidade(s) - pois o limite objectivo do caso julgado das decisões anulatórias de actos administrativos determina-se pelo(s) vício(s) que fundamentou(aram) a decisão -, sob pena de incorrer em nulidade (cfr. art. 133º n.º 2, al. h), do CPA de 1991/art. 161º n.º 2, al. i), do CPA de 2015, e arts. 158º n.º 2 e 179º n.º 2, ambos do CPTA).
III - A imutabilidade da decisão judicial em que se caracteriza a autoridade de caso julgado significa que, apreciada uma causa de invalidade, o tribunal fica obrigado a aplicar, dentro do processo e fora dele, a decisão tomada (cfr. art. 619º n.º 1, do CPC de 2013).
IV – Tendo a entidade executada proferido novo despacho no qual reincidiu na ilegalidade anteriormente cometida e identificada na sentença exequenda, bem andou a sentença recorrida ao declarar a nulidade desse despacho por desrespeito pelo caso julgado.
V - Se a recorrente nas alegações de recurso não colocou em causa a razão em que assentou a sua condenação a depositar nos cofres do Estado o valor da sanção pecuniária compulsória, pois impugna motivo em que essa condenação não assentou, o presente recurso, no segmento em que é impugnada tal condenação, está votado ao insucesso, pois seria inútil apreciar o fundamento invocado pela recorrente, dado que, mesmo que se lhe reconhecesse razão na totalidade, sempre seria de manter a decisão recorrida, neste segmento, pelo fundamento nela descrito e não atacado neste recurso (cfr. art. 635º n.º 5, do CPC de 2013).
VI - A ocorrência de causa legítima de inexecução é uma questão de conhecimento oficioso.
VII - A impossibilidade absoluta na execução da sentença não se reconduz a uma mera dificuldade ou onerosidade dessa execução, pois é necessário que à mesma se aponha, em absoluto, impedimento irremovível, de natureza física ou legal.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
I - RELATÓRIO
R… intentou no TAF de Sintra, por apenso ao processo da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias n.º /14.2 BESNT, execução de sentença de anulação de acto administrativo contra o Director-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, tendo em vista obter a execução da sentença desse tribunal proferida em 27.2.2015, peticionando:
- a declaração de nulidade do acto consubstanciado na notificação de 12.3.2015;
- a notificação do executado para dar cabal cumprimento à sentença de intimação de 27.2.2015:
- respondendo ao requerimento do exequente de 28.11.2014;
- aí explicando, em caso de recusa, quais os motivos pelos quais não concede a autorização de execução da entrevista, devendo tal fundamentação conter a explicitação dos prejuízos que a entrevista, em concreto, se levada a cabo, traria para as finalidades da prisão preventiva;
- que se determine que, caso o executado não cumpra a intimação de imediato, responderá por crime de desobediência qualificada, desencadeando os necessários procedimentos para tanto;
- a notificação do executado para depositar, em prazo razoável, nos cofres do Estado o valor da sanção pecuniária compulsória vencido até 31.7.2015, no montante mínimo de € 2 903,75, e do valor restante vincendo, até integral cumprimento do determinado, ou, pelo menos, que se diligencie no sentido de ser desencadeado o pagamento por conta da dotação orçamental inscrito à ordem do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais;
- a liquidação periódica daquele valor pecuniário, até cumprimento.

A entidade executada apresentou contestação na qual pugnou pela improcedência da presente execução, com base na circunstância de a sentença de 27.2.2015 ter sido executada.

Por sentença de 10 de Fevereiro de 2016, o TAF de Sintra julgou procedente a presente acção executiva, determinando no respectivo dispositivo o seguinte:
a) Em conformidade com o art 205º, nº 2 e nº 3 da CRP, arts 158º e 167º, nº 1 do CPTA, declara a nulidade do ato praticado em 30.4.2015 pela entidade executada;
b) Determina que, em execução da sentença de 27.2.2015, a entidade executada, em 10 dias, decida o pedido que lhe foi dirigido, em 28.11.2014, em conformidade com o disposto no art 75º, nº 2 e nº 5 do Código de Execução das Penas, nos arts 123º, nº 1, al d), 124º, nº 1, al a), 125º do CPA de 1991.
c) Com a cominação expressa do incumprimento do agora decidido, no prazo fixado, acarretar para o titular do cargo o pagamento de sanção pecuniária compulsória no valor de 10% do salário mínimo nacional por cada dia de atraso (cfr arts 110º, nº 5 e 169º do CPTA).
d) Condena-se o executado a depositar, em 10 dias, nos cofres do Estado o valor da sanção pecuniária compulsória de €: 404,00.
O tribunal absolve a entidade executada de tudo o mais peticionado”.

Inconformada, a entidade executada interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões:
“Texto e/ou quadro no original”.

O exequente, notificado, apresentou contra-alegações, nas quais pugnou pela manutenção na íntegra da sentença recorrida.

O DMMP junto deste TCA Sul emitiu parecer no qual sustentou que o recurso merece provimento. A este parecer respondeu o recorrido, concluindo como nas contra-alegações de recurso.

Em 24.6.2016 foi proferido neste TCA Sul pela Juíza relatora o seguinte despacho:
Notifique as partes para, querendo, se pronunciarem, no prazo de 5 (cinco) dias – cfr. art. 146º n.º 2, conjugado com o art. 147º n.º 2, ambos do CPTA, já que o presente processo encontra-se a ser tramitado como urgente -, sobre a hipótese de, na eventual[idade] da decisão recorrida ser confirmada quanto à al. a), do dispositivo (em que foi declarada a nulidade do acto praticado em 30.4.2015), ser declarada a existência de causa legítima de inexecução – e consequente revogação das als. b) e c) do dispositivo -, dado que é um facto notório que J… já não se encontra preso preventivo”.

Na sequência do cumprimento desse despacho vieram as partes pronunciar-se, em síntese, nos seguintes termos:
- o recorrido, defendendo que a existência de causa legítima de inexecução apenas ocorre a partir de 4.9.2015, data em que J deixou de estar em prisão preventiva, salientando que não prescinde do direito a ver-lhe arbitrada nos autos a indemnização pelo facto da inexecução, prevista no art. 166º, do CPTA;
- a recorrente, argumentando que declarar a ocorrência de causa legítima de inexecução da sentença de 27.2.2015 é admitir que a Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais desrespeitou uma decisão judicial anulatória transitada em julgado, o que não admite, por tal não corresponder à verdade.

II – FUNDAMENTAÇÃO
Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos:
“A) Por sentença proferida em 27.2.2015 no processo principal apenso com o nº /14.2BESNT foi decidido:
a) anular o ato de 15.12.2014, por falta de fundamentação do mesmo;
b) intimar a entidade requerida a responder ao requerimento do requerente de 28.11.2014, explicando, em caso de recusa, quais os motivos pelos quais não concede autorização de entrevista.
c) a decisão deve ser proferida em 10 dias, pelo diretor-geral dos Serviços Prisionais.
d) com a cominação expressa do incumprimento do decidido, no prazo fixado, acarretar para o titular do cargo o pagamento de sanção pecuniária compulsória no valor de 5% do salário mínimo nacional por cada dia de atraso,
dando-se aqui por integralmente transcritas, quer a factualidade, quer a fundamentação jurídica da referida decisão judicial dos autos principais apensos.
B) A sentença foi notificada às partes, por carta registada expedida a 5.3.2015, e ao Ministério Público no mesmo dia, tendo transitado em julgado em 24.3.2015 – ver as notificações efetuadas nos autos principais apensos.
C) Por ofício de 12.3.2015 o executado notificou o exequente do despacho de 11.3.2015 com o teor seguinte:
 Considerando que R, enquanto diretor do Jornal , solicitou em requerimento datado de 28.11.2014, pedido de entrevista ao recluso preventivo J;
 Considerando que esta Direção Geral solicitou através do ofício nº /2014, de 28.11.2014, nos termos e para os efeitos do art 75º, nº 5 do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade, doravante CEPMPL, a pronúncia do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva;
 Considerando que em 12.12.2014 o tribunal à ordem do qual o recluso se encontra preso preventivamente comunicou o douto despacho do Sr Juiz de Instrução Criminal onde se lê: …«opõe-se o tribunal a que se conceda autorização para a realização das entrevistas solicitadas pelos referidos meios de comunicação social ao arguido J – ex vi do art 75º, nº 5 da Lei nº 115/2009, de 12.10».
 Considerando que o detentor da ação penal, pronunciou-se pela oposição à autorização da referida entrevista, conforme parecer transcrito no despacho supra referido e que agora se transcreve, pela sua importância, a respetiva conclusão: «promovemos assim, se informe a DGRSP da oposição à autorização das entrevistas solicitadas pelos referidos meios de comunicação social ao arguido J, nos termos e para os efeitos do art 75º, nº 5 da Lei nº 115/2009, de 12.10.
 Considerando que, atento o estatuído no art 75º, nº 5 do CEMPL, a autorização da entrevista depende da não oposição do Tribunal a ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, o qual, de forma expressa opõe-se a que se conceda autorização para a realização das entrevistas por parte do recluso J;
 E não podendo esta DGRSP contrariar a decisão do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, tenho intenção, sob pena de violação de lei, de indeferir o pedido para a realização da entrevista solicitada por R, por requerimento datado de 28.11.2014, ao recluso preventivo J.
Pelo exposto, e em face do sentido desfavorável à pretensão do requerente, deve o mesmo ser notificado para se pronunciar, querendo, de forma escrita e em 10 dias úteis, sobre a intenção da Administração, em cumprimento do princípio de audiência prévia previsto nos arts 100º e segs do CPA – ver doc nº 1 junto com a pi de execução.
D) O exequente não se pronunciou sobre o sentido desfavorável da proposta da decisão – por acordo.
E) Por despacho de 30.4.2015 o Subdiretor geral J decidiu: decorrido o prazo de audiência prévia o requerente nada alegou. Assim sendo, indefiro o pedido – ver doc junto com a oposição.
F) A petição inicial do presente meio processual deu entrada em juízo no dia 23.7.2015 – ver petição de execução.”.

Nos termos do art. 662º n.º 1, do CPC de 2013, ex vi art. 140º, do CPTA, procede-se à alteração da factualidade dada como provada nos seguintes termos:

- Os factos A) e B) são substituídos pelos seguintes factos:
A) Em 27.2.2015 foi proferida no processo principal (n.º /14.2 BESNT) sentença, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual se escreveu designadamente o seguinte:
Relatório.
R, jornalista, , com domicílio profissional na Rua , vem intentar contra o Diretor Geral de Reinserção e Serviços Prisionais da Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, com domicílio na Travessa da Cruz do Torel, nº 1, em Lisboa, intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, nos termos do disposto nos arts 109º e segs do CPTA e do ponto 3º do Código Deontológico do Jornalista, aprovado em 4.5.1993, que estipula que o jornalista deve lutar contra as restrições no acesso às fontes de informação e as tentativas de limitar a liberdade de expressão e o direito de informar. É obrigação do jornalista divulgar as ofensas a estes direitos.
O requerente alega, em síntese, ter solicitado ao requerido autorização para entrevistar J que se encontra preso preventivamente, o que lhe foi negado.
(…)
Assim, para assegurar o exercício em tempo útil, do seu direito de liberdade de imprensa, na vertente de direito de acesso a fonte de informação, o requerente pede:
a) Que o ato de 15.12.2014 seja declarado inexistente;
b) Sendo, em consequência, reconhecido o direito do requerente a aceder à fonte de informação identificada e, para tanto, intimando a Direção Geral a autorizar a entrevista;
c) O reconhecimento do direito do requerente a publicar a informação que resultar do acesso à fonte de informação identificada.
(…)
Fundamentação de facto.
Com interesse para a decisão – tendo em conta os elementos documentais carreados para os autos pelas partes – consideram-se provados os seguintes factos:
A) No dia 28.11.2014 o requerente, jornalista, na qualidade de Diretor do jornal apresentou junto do Diretor Geral da Reinserção e Serviços Prisionais o pedido de realização de uma entrevista a J, que se encontra no estabelecimento prisional de , seria realizada pelos jornalistas R e B. A entrevista foi pedida ao jornal pelo próprio, que ontem nos ligou a aceder ao pedido e solicita que seja realizada no início da próxima semana. Gostaríamos que fosse no dia da visita 4ª feira, dia 3.12, às 9h30m Para tal vimos solicitar a Vossa autorização. … fico a aguardar resposta – ver doc nº 1 junto com a pi.
B) A DGRSP solicitou, através do ofício nº /2014, de 28.11.2014, ao tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, informação sobre se a concessão de entrevista a órgão de comunicação social poderá colocar em causa alguma das finalidades da prisão preventiva – ver fls não numeradas do paa.
C) No dia 15.12.2014 o requerido, por intermédio de J, Diretor de Serviços de Organização, Planeamento e Relações Externas da DGRSP, notificou o requerente da seguinte decisão:
Na sequência do pedido de entrevista formulado por esse órgão de comunicação social e dando cumprimento ao disposto no nº 5 do art 75º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, esta Direção Geral solicitou parecer ao Tribunal à ordem do qual o Recluso cumpre prisão preventiva.
A resposta daquele tribunal informa, em termos conclusivos, que … «opõe-se o tribunal a que se conceda autorização para a realização das entrevistas solicitadas pelos referidos meios de comunicação social ao arguido J …», pelo que esta Direção Geral cumpre a decisão do douto tribunal e, nos termos da Lei, nada mais lhe compete decidir – ver doc nº 2 junto com a pi.
D) No dia 15.12.2014 o jornalista do , R, solicitou a J cópia do parecer do Ministério Público e do despacho do juiz sobre o pedido de entrevista – ver doc nº 3 junto com a pi.
E) Em resposta foi-lhe comunicado o seguinte: o despacho do tribunal, à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, responde a diligências desencadeadas por esta Direção Geral no cumprimento do disposto no nº 5 do art 75º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade. Considera-se, por isso, inoportuna a sua partilha pública partir desta Direção Geral – ver doc nº 3 junto com a pi.
(…)
*
Fundamentação de direito.
Da declaração de inexistência do ato de 15.12.2014.
O requerente vem a juízo, lançando mão do processo de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, para, diz, salvaguardar o exercício do direito constitucional de liberdade de imprensa, consagrado no art 38º da CRP, ofendido pela proibição vazia: (i) do exercício de um ato de jornalismo, (2) de contacto do recluso com a comunicação social não previamente determinada nas medidas de coacção impostas e (3) de acesso a fonte pelos jornalistas.
A entidade requerida sustenta a legalidade da recusa da entrevista, por um lado, porque se encontra vinculada ao parecer negativo do Juiz à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, por outro lado, o segredo de justiça impede-a de dar a conhecer os fundamentos da oposição daquele juiz à concessão de autorização de entrevista.
Analisemos.
(…)
No caso, o requerente entende que a recusa de autorização para a realização da entrevista solicitada ofende o direito de liberdade de imprensa, previsto no art 38º da CRP, o qual implica o direito de os jornalistas terem livre acesso às fontes de informação.
O direito de liberdade de imprensa, com consagração constitucional, no art 38º da Constituição da República Portuguesa, não é um direito absoluto, podendo comportar limitações, restrições ou condicionamentos, particularmente importantes no domínio do acesso à fonte de informação integrada por recluso, a cumprir pena efetiva de prisão ou preventivo, por razões que se prendem com a necessidade de acautelar as finalidades da medida de coação e o segredo de justiça.
Para tanto dispõe o art 75º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, aprovado pela Lei nº 115/2009, de 12.10, com as alterações introduzidas pela Lei nº 33/2010, de 2.9, Lei nº 40/2010, de 3.9, Lei nº 21/2013, de 21.2, com a epígrafe contactos com órgãos de comunicação social, o seguinte:
1 - Os órgãos de comunicação social podem, com autorização do director-geral dos Serviços Prisionais, visitar os estabelecimentos prisionais para realização de reportagens sobre o seu funcionamento e atividades desde que tal não prejudique a reinserção social dos reclusos ou a ordem, segurança e disciplina no estabelecimento prisional.
2 - Os órgãos de comunicação social podem igualmente ser autorizados a realizar entrevistas a reclusos, com o consentimento esclarecido e expresso deste, quando tal não prejudique a sua reinserção social nem ponha em causa a disciplina, ordem ou segurança no estabelecimento prisional, as finalidades da prisão preventiva, a privacidade ou a segurança de terceiros.
3 - Na decisão prevista no número anterior são especialmente ponderados os riscos de estigmatização do recluso decorrente da sua excessiva exposição mediática, de impacte negativo sobre a vítima ou familiares desta, de violação da privacidade de terceiros e de desvalorização da conduta delituosa e das suas consequências.
4 - A decisão prevista no n.º 2 é da competência do director-geral dos Serviços Prisionais, podendo ser impugnada pelo recluso perante o tribunal de execução das penas.
5 - Tratando-se de recluso preventivo, a autorização da entrevista depende ainda da não oposição do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, com base na ponderação do prejuízo da entrevista para as finalidades da prisão preventiva.
6 - Em qualquer caso, não são permitidas:
a) A recolha e divulgação de imagens e sons que permitam a identificação de reclusos, salvo consentimento esclarecido e expresso dos mesmos;
b) A recolha e divulgação de imagens e sons que permitam a identificação de filhos que os reclusos mantenham consigo no estabelecimento;
c) Emissões de rádio ou televisão em direto do estabelecimento prisional;
d) Entrevistas a reclusos colocados em regime de segurança ou reportagens em estabelecimentos prisionais ou unidades de segurança especial;
e) A recolha e divulgação de imagens que possam pôr em risco a segurança do estabelecimento prisional.
Portanto, os órgãos de comunicação social podem ser autorizados a realizar entrevistas a reclusos, por um lado, desde que os mesmos o consintam expressamente e, no caso dos preventivos, desde que o tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva a tal não se oponha, com base na ponderação do prejuízo da entrevista para as finalidades da prisão preventiva.
Por outro lado, desde que a realização da entrevista:
i) não prejudique a reinserção social do recluso,
ii) não ponha em causa a disciplina, ordem ou segurança no estabelecimento prisional,
iii) não ponha em causa as finalidades da prisão preventiva,
iv) não ponha em causa a privacidade ou a segurança de terceiros.
No caso, o requerente, jornalista, na qualidade de Diretor do jornal , em 28.11.2014, apresentou junto do Diretor Geral da Reinserção e Serviços Prisionais o pedido de realização de uma entrevista a J, que se encontra no estabelecimento prisional de , preso preventivamente.
Em consequência, a Direção geral solicitou ao tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, informação sobre se a concessão de entrevista a órgão de comunicação social poderá colocar em causa alguma das finalidades da prisão preventiva.
Depois disso, em 15.12.2014, a entidade requerida notificou o requerente da seguinte decisão:
«Na sequência do pedido de entrevista formulado por esse órgão de comunicação social e dando cumprimento ao disposto no nº 5 do art 75º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, esta Direção Geral solicitou parecer ao Tribunal à ordem do qual o Recluso cumpre prisão preventiva.
A resposta daquele tribunal informa, em termos conclusivos, que … «opõe-se o tribunal a que se conceda autorização para a realização das entrevistas solicitadas pelos referidos meios de comunicação social ao arguido J …», pelo que esta Direção Geral cumpre a decisão do douto tribunal e, nos termos da Lei, nada mais lhe compete decidir».
No périplo pela tramitação do pedido de entrevista formulado pelo requerente à Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais ficamos a saber que o órgão de comunicação social formalizou o pedido, a entidade requerida, por se tratar de preso preventivo, diligenciou pela posição do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, mas depois disso, a entidade requerida não disse os motivos por que não autorizou a entrevista ao recluso.
Escudou-se para o efeito no segredo de justiça que incide sobre o despacho proferido pelo tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva.
Porém, não documentou os autos com o referido despacho, que diga-se não se vislumbra como possa estar abrangido pelo segredo de justiça, uma vez que o mesmo visa tão só a ponderação do prejuízo da entrevista para as finalidades da prisão preventiva.
No entanto, mesmo que aquele despacho não pudesse ser conhecido do requerente, atento o alegado segredo de justiça, ainda assim, por exigência legal do art 268º, nº 3 da CRP e do art 124º, nº 1, al a) do CPA, sempre a decisão da DG tinha de ser fundamentada.
Porque note-se a Administração, por força do art 75º, nº 5 do CEP, está vinculada à ponderação do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, mas não pode limitar-se a dizer ao interessado que a respetiva pretensão é recusada porque o tribunal se opõe, tout court, a que seja concedida tal autorização.
Pois, a recusa comprime o direto de liberdade de imprensa expresso no direito do jornalista a aceder livremente às fontes de informação.
E só dando a conhecer os prejuízos que a entrevista pedida trás no caso para as finalidades da prisão preventiva daquele recluso se pode perceber a justificação da recusa da sua autorização.
A indicação dos motivos do ato é exigida mesmo que esse ato seja praticado no exercício de poderes vinculados, como acontece na situação em apreço.
Em suma, o direito de liberdade de imprensa do requerente, na vertente de direito de acesso a fonte de informação, encontra-se injustificadamente comprimido pelo ato da entidade requerida.
Ora a falta de justificação/ de fundamentação é cominada no ordenamento administrativo português com a sanção de anulabilidade (cfr arts 123º e 135º do CPA) e não com nulidade, que é uma forma de invalidade excecional (cfr art 133º do CPA), e menos ainda com a inexistência de ato. O ato de 15.12.2014 existe, tendo sido preterido um requisito de validade do mesmo – a fundamentação legalmente exigível (art 123º, nº 1, al d) do CPA), que não faz parte do elenco do art 133º, nº 2 do CPA, e portanto é sancionado com a anulabilidade.
Do reconhecimento do direito do requerente a aceder à fonte de informação identificada.
Da intimação da Direção Geral a autorizar a entrevista.
Do reconhecimento do direito do requerente a publicar a informação que resultar do acesso à fonte de informação identificada.
Procedendo, nos termos que vimos de dizer, o pedido principal, a reconstituição da situação do requerente passa pela imposição à entidade requerida de decisão do pedido que lhe foi dirigido, em 28.11.2014, em conformidade com o disposto no art 75º, nº 2 e nº 5 do Código de Execução das Penas, nos arts 123º, nº 1, al d), 124º, nº 1, al a), 125º do CPA.
Decisão que, por versar sobre o exercício do direito de liberdade de imprensa, consagrado no art 38º, nº 1 e nº 2, al b) da CRP, deve ser proferida em 10 dias, pelo diretor-geral dos Serviços Prisionais.
Com a cominação expressa do incumprimento do decidido, no prazo fixado, acarretar para o titular do cargo o pagamento de sanção pecuniária compulsória no valor de 5% do salário mínimo nacional por cada dia de atraso (cfr arts 110º, nº 5 e 169º do CPTA).
Decisão.
Pelo exposto, o Tribunal decide:
a) ser improcedente a exceção de incompetência material dos tribunais administrativos;
b) não condenar a entidade requerida em sanção pecuniária compulsória pela falta de remessa do original ou cópia certificada do processo administrativo completo;
c) anular o ato de 15.12.2014, por falta de fundamentação do mesmo;
d) intimar a entidade requerida a responder ao requerimento do requerente de 28.11.2014, explicando, em caso de recusa, quais os motivos pelos quais não concede autorização de entrevista.
e) a decisão deve ser proferida em 10 dias, pelo diretor-geral dos Serviços Prisionais.
f) com a cominação expressa do incumprimento do decidido, no prazo fixado, acarretar para o titular do cargo o pagamento de sanção pecuniária compulsória no valor de 5% do salário mínimo nacional por cada dia de atraso.
g) Absolver a requerida do mais peticionado.
(…)”.
B) A sentença descrita em A) foi notificada aos mandatários das partes por carta registada expedida em 2.3.2015 e ao Ministério Público nessa mesma data, não tendo sido objecto de recurso ou reclamação (cfr. fls. 71 a 85, do proc. n.º 2838/14.2 BESNT).

- É aditado o seguinte facto:
G) Desde 4.9.2015 que J não se encontra preso preventivo no âmbito do inquérito relativo à denominada “” (cfr. documento de fls. 159, dos autos em suporte de papel).
*
Presente a factualidade antecedente, cumpre entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão recorrida enferma de erro ao ter julgado que a sentença de 27.2.2015 não se encontra executada e, caso se conclua no sentido da inexistência de tal erro de julgamento, se ocorre uma causa legítima de inexecução.


Passando à análise da questão relativa ao alegado erro da sentença recorrida ao ter julgado que a sentença de 27.2.2015 não se encontra executada

A entidade executada defende que a decisão ora sindicada enferma de erro, pois a sentença de 27.2.2015 foi integralmente cumprida com a prolação do acto 30.4.2015 (que remete para os fundamentos do despacho de 11.3.2015).

Passemos, então, à análise do acerto (ou não) da decisão judicial recorrida que entendeu que o acto de 30.4.2015 é nulo, por violar o caso julgado resultante da sentença anulatória de 27.2.2015.

Em geral, a execução das sentenças anulatórias dos tribunais administrativos impõe à Administração a obrigação de desenvolver uma actividade de execução com a finalidade de pôr a situação de facto de acordo com a situação de direito constituída pela decisão anulatória. E esta obrigação subdivide-se, segundo a lei, em dois deveres concretos:
- dever de respeitar o julgado, conformando-se com as limitações que dele resultam para o eventual exercício dos seus poderes [efeito preclusivo, inibitório ou conformativo – cfr. art. 173º n.º 1, do CPTA (“Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo acto administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado (…)”)], e
- dever de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto anulado [efeito repristinatório, reconstitutivo ou reconstrutivo – cfr. art. 173º n.º 1, do CPTA (“(…) a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado (…)”)].


A propósito do respeito pelo caso julgado, prescreve o art. 158º, do CPTA – em concretização do art. 205º n.º 2, da CRP -, sob a epígrafe “Obrigatoriedade das decisões administrativas”, o seguinte:
1 - As decisões dos tribunais administrativos são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer autoridades administrativas.
2 - A prevalência das decisões dos tribunais administrativos sobre as das autoridades administrativas implica a nulidade de qualquer ato administrativo que desrespeite uma decisão judicial e faz incorrer os seus autores em responsabilidade civil, criminal e disciplinar, nos termos previstos no artigo seguinte.”.

Como explicam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª Edição, 2010, págs. 1039 a 1041, em anotação ao n.º 2 deste art. 158º:
Reafirma-se aqui, antes de mais, a regra segundo o qual são nulos os actos administrativos que ofendam os casos julgados: cfr. artigo 133.°, n.° 2, alínea h), do CPA. A fórmula utilizada ("qualquer acto administrativo que desrespeite uma decisão judicial") faz, no entanto, apelo a um conceito mais amplo, com raízes no regime normativo anterior (cfr. artigo 9.°, n.º 2, do Decreto-Lei n.° 256-A/77) e que o CPTA retoma nos seus artigos 167.°, n.° 1, e 179.°, n.° 2: o de actos desconformes com a sentença. Não se confundem, entretanto, com os casos de nulidade por desconformidade com decisões judiciais, os casos de anulabilidade a que também fazem referência os artigos 164.°, n.° 3, 167.°, n.° 1, 176.°, n .° 5, e 179.°, n.° 2, dos "actos que mantenham, sem fundamento válido, a situação ilegal" (para a distinção, cfr. nota 1 ao artigo 167.°).
Quando não se consubstancia numa atitude meramente passiva, de incumprimento do que seria devido, e se concretiza numa atitude de rebeldia activa, consubstanciada na tomada de uma decisão e, portanto, na prática de um acto administrativo, o desrespeito pelas decisões judiciais, por parte da Administração, traduz-se na introdução de uma definição que ofende o caso julgado quando nessa definição se contraria a pronúncia emitida pelo tribunal, com autoridade de caso julgado.
É o que sucede, para dar apenas alguns exemplos, quando, tendo o tribunal reconhecido, numa sentença de simples apreciação, que determinada situação se apresentava de determinada maneira, a Administração venha emitir um acto em que afirma que ela se apresenta de maneira diferente; ou quando, tendo o tribunal condenado a Administração a praticar um acto administrativo com determinado conteúdo, ela pratica um acto com conteúdo diferente.
É, ainda, o que sucede quando, tendo o tribunal anulado um acto administrativo com determinados fundamentos (por exemplo, falta de um dos pressupostos de que dependia a sua emissão ou preterição de uma formalidade essencial do respectivo procedimento), a Administração renove o acto reincidindo nas mesmas ilegalidades (ou seja, sem que, entretanto, se tenha preenchido o pressuposto que faltava ou voltando a preterir o trâmite que, já da primeira vez, devia ter observado). Com efeito, entende-se que o caso julgado da sentença de anulação de actos administrativos cobre os fundamentos que determinaram a anulação, pelo que se considera que há ofensa ao caso julgado em caso de reincidência, por parte da Administração, nas ilegalidades que o tribunal tinha identificado no processo de anulação.
(…)” (sublinhados e sombreados nossos).

E como explica José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa (Lições), 8ª Edição, 2006:
- a págs. 379-380, “Por outro lado, ressalta ainda o dever, para a Administração, de respeitar o julgado, conformando-se com o conteúdo da sentença e com as eventuais limitações que daí derivam para o eventual exercício futuro dos seus poderes - isto é, reconhece-se um efeito conformativo ou preclusivo (ou inibitório) da sentença, que proíbe a "reincidência", excluindo a possibilidade de a Administração praticar um acto idêntico com os mesmos vícios individualizados e condenados pelo juiz administrativo, sob pena de nulidade, por ofensa do caso julgado (854 A nulidade atinge seguramente os actos que repitam vícios que estiveram na base da sentença anulatória (por ofensa directa do caso julgado - cf. artigo 133.°, n.° 2, alínea h), do CPA)”;
- a págs. 382-383, “Por sua vez, o alcance da sentença e, portanto, a delimitação, não só do efeito conformativo, mas também do próprio efeito reconstitutivo, depende dos fundamentos da decisão de anular, isto é, da concreta ilegalidade demonstrada, não se limitando à consideração do dispositivo da sentença - por outras palavras, o alcance da sentença decorre do carácter normativo (negativo) da pronúncia anulatória.
Na realidade, as anulações não produzem necessariamente os mesmos efeitos: o conteúdo dos deveres de conformação e de reconstituição há-de ser naturalmente variável conforme o vício dado como provado, o tipo de acto anulado e o regime legal da actividade, nos termos que constituem os pressupostos lógico-normativos da sentença, a qual, desta forma, para além da consequência invalidatória contida no seu dispositivo, contribui para a definição do direito substantivo aplicável àquele caso” (sublinhado e sombreado nossos);
- a pág. 385, “2.4. De acordo com o que se afirmou atrás, o dever positivo que resulta para a Administração da sentença de mera anulação é, afinal, o dever de reexaminar a situação de facto à luz da lei aplicável e da sentença, e o dever de actuar em termos legais e correctos em face desse exame - com esse alcance, dir-se-á que os efeitos "ultra-constitutivos" se resumem afinal numa condenação genérica à resolução administrativa de um caso concreto, condicionada e orientada pelos termos da fundamentação anulatória”;
- e a págs. 390-391, “A consideração dos efeitos das sentenças mostra que o alcance objectivo do julgado tem, no processo administrativo, algumas especialidades, quando está em causa uma decisão de anulação de actos administrativos - ao contrário do que se admite, em geral, no processo civil, não releva só o dispositivo da sentença, relevam também os fundamentos da anulação, justamente porque desencadeiam consequências normativas para o caso, seja quanto à possibilidade de renovação dos actos anulados, seja quanto ao conteúdo dos deveres de reconstituição da situação de facto de acordo com o direito pronunciado” (sublinhados e sombreados nossos).

Do exposto resulta que o respeito pelo caso julgado significa que a Administração, a repetir o acto anulado, terá de o fazer desprovido da(s) ilegalidade(s) que motivou(aram) a anulação, não podendo reincidir nessa(s) ilegalidade(s) - pois o limite objectivo do caso julgado das decisões anulatórias de actos administrativos determina-se pelo(s) vício(s) que fundamentou(aram) a decisão -, sob pena de incorrer em nulidade (cfr. art. 133º n.º 2, al. h), do CPA de 1991/art. 161º n.º 2, al. i), do CPA de 2015, e arts. 158º n.º 2 e 179º n.º 2, ambos do CPTA) – neste sentido, entre outros, Acs. do STA de 4.12.2012, proc. n.º 198/12, 23.10.2012, proc. n.º 262/12, 30.9.2010, proc. n.º 1388A/03, 18.11.2009, proc. n.º 581/09, e 2.7.2008, proc. n.º 1328A/03, Ac. do TCA Sul de 30.4.2015, proc. n.º 11829/15, e Ac. do TCA Norte de 10.12.2010, proc. n.º 345-A/01.

Com efeito, a imutabilidade da decisão judicial em que se caracteriza a autoridade de caso julgado significa que apreciada uma causa de invalidade - seja no sentido da procedência seja no sentido da improcedência -, o tribunal fica vinculado a aplicar a decisão tomada, mesmo em distintas controvérsias que perante ele venham a ser colocadas [cfr. art. 619º n.º 1, do CPC de 2013 (“Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele (…)”)].

Assim, a autoridade do caso julgado que se impunha à Administração respeitar, no presente caso, enquanto constituída no dever de executar o julgado anulatório, era limitada pelo pedido e pelo segmento da causa de pedir que foram julgados procedentes na sentença de 27.2.2015, ou seja, pela anulação do despacho de 15.12.2014, com fundamento no vício de falta de fundamentação.

Conforme resulta da alínea E), dos factos provados, para execução dessa sentença de 27.2.2015 a entidade executada proferiu o despacho de 30.4.2015 – que remete para a fundamentação constante do despacho de 11.3.2015 -, o qual entende que dá cumprimento rigoroso à mesma, isto é, respeita o caso julgado.

Vejamos.

Na sentença recorrida considerou-se que o despacho de 30.4.2015 repete o vício de falta de fundamentação que já tinha sido apreciado na sentença de 27.2.2015, pois esse despacho limitou-se a fundamentar o indeferimento do pedido de autorização para a realização de entrevista, formulado por R, com a invocação da oposição do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, fundamentação que já tinha sido declarada insuficiente pela sentença exequenda (de 27.2.2015).

Com efeito, afirma-se na sentença recorrida o seguinte
E os fundamentos do aludido despacho de 30.4.2015 são os invocados no projeto de decisão que consta do despacho de 11.3.2015.
Pois bem, lendo os considerandos do despacho de 11.3.2015, como bem argumenta o exequente, no art 7º da petição de execução, ficamos sem saber quais as razões pelas quais o ora executado indefere a pretensão do aqui exequente, datada de 28.11.2014.
Na verdade, o ato de 30.4.2015 volta a padecer de falta de fundamentação, violando deste modo os fundamentos de direito usados no título executivo.
Lembremos.
O tribunal em sede declarativa decidiu:
(…)
A transcrição que vimos de fazer é válida para o ato praticado em 30.4.2015, o mesmo é dizer, também este ato padece de falta de justificação/ de fundamentação.
Assim sendo, o ato que em 30.4.2015 indeferiu o pedido de entrevista ao recluso preventivo J repete o vício de forma apreciado e decidido pela sentença exequenda, na medida em que considera que a oposição do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva é suficiente para indeferir o pedido para realização da entrevista solicitada por R.
Mas, o novo ato, de 30.4.2015, não pode estar inquinado de idêntico vício do anulado.
Isto decorre, desde logo, do art 205º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, o qual estabelece que as decisões dos tribunais são obrigatórias, vinculando autoridades públicas e privadas, prevalecendo sobre quaisquer outras. A que corresponde, na lei ordinária, o estatuído pelo art 158º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
A isso obriga também a força do caso julgado da decisão anulatória.
Pelo que, o ato praticado em 30.4.2015, por violar o caso julgado, é nulo
Pelo exposto, em conformidade com o art 205º, nº 2 e nº 3 da Constituição da República Portuguesa, arts 158º e 167º, nº 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2002 e art 133º, nº 2, al h) do Código de Procedimento Administrativo de 1991, declara-se a nulidade do ato praticado em 30.4.2015 pela Entidade Requerida.” (sublinhado nosso).

Ora, é precisamente esta desconformidade apontada na sentença recorrida que a entidade executada considera que não se verifica, mas sem razão, conforme se passa a demonstrar.

Como acima referido, o caso julgado anulatório não abrange só o dispositivo da sentença, mas também abrange os fundamentos da anulação.

Ora, a sentença exequenda de 27.2.2015 determinou no respectivo dispositivo a anulação do acto de 15.12.2014, por falta de fundamentação, bem como a intimação da entidade requerida a responder ao requerimento do requerente de 28.11.2014, explicando, em caso de recusa, os motivos pelos quais não concede autorização de entrevista.

Os fundamentos que ditaram tal anulação foram os seguintes:
No périplo pela tramitação do pedido de entrevista formulado pelo requerente à Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais ficamos a saber que o órgão de comunicação social formalizou o pedido, a entidade requerida, por se tratar de preso preventivo, diligenciou pela posição do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, mas depois disso, a entidade requerida não disse os motivos por que não autorizou a entrevista ao recluso.
Escudou-se para o efeito no segredo de justiça que incide sobre o despacho proferido pelo tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva.
Porém, não documentou os autos com o referido despacho, que diga-se não se vislumbra como possa estar abrangido pelo segredo de justiça, uma vez que o mesmo visa tão só a ponderação do prejuízo da entrevista para as finalidades da prisão preventiva.
No entanto, mesmo que aquele despacho não pudesse ser conhecido do requerente, atento o alegado segredo de justiça, ainda assim, por exigência legal do art 268º, nº 3 da CRP e do art 124º, nº 1, al a) do CPA, sempre a decisão da DG tinha de ser fundamentada.
Porque note-se a Administração, por força do art 75º, nº 5 do CEP, está vinculada à ponderação do tribunal à ordem do qual o recluso cumpre prisão preventiva, mas não pode limitar-se a dizer ao interessado que a respetiva pretensão é recusada porque o tribunal se opõe, tout court, a que seja concedida tal autorização.
Pois, a recusa comprime o direto de liberdade de imprensa expresso no direito do jornalista a aceder livremente às fontes de informação.
E só dando a conhecer os prejuízos que a entrevista pedida trás no caso para as finalidades da prisão preventiva daquele recluso se pode perceber a justificação da recusa da sua autorização.
A indicação dos motivos do ato é exigida mesmo que esse ato seja praticado no exercício de poderes vinculados, como acontece na situação em apreço.
Em suma, o direito de liberdade de imprensa do requerente, na vertente de direito de acesso a fonte de informação, encontra-se injustificadamente comprimido pelo ato da entidade requerida.
Ora a falta de justificação/ de fundamentação é cominada no ordenamento administrativo português com a sanção de anulabilidade (cfr arts 123º e 135º do CPA) e não com nulidade, que é uma forma de invalidade excecional (cfr art 133º do CPA), e menos ainda com a inexistência de ato. O ato de 15.12.2014 existe, tendo sido preterido um requisito de validade do mesmo – a fundamentação legalmente exigível (art 123º, nº 1, al d) do CPA), que não faz parte do elenco do art 133º, nº 2 do CPA, e portanto é sancionado com a anulabilidade.” (sublinhados e sombreados nossos).

Da sentença exequenda de 27.2.2015 resulta, portanto, que o despacho anulado (de 15.12.2014) padece de falta de fundamentação, pois, não obstante a Administração, por força do art. 75º n.º 5, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (aprovado pela Lei 115/2009, de 12/10, na redacção da Lei 21/2013, de 21/2), estar vinculada à ponderação do tribunal à ordem do qual o recluso (J) cumpre prisão preventiva, a mesma “(…) não pode limitar-se a dizer ao interessado que a respetiva pretensão é recusada porque o tribunal se opõe, tout court, a que seja concedida tal autorização.” (sombreado nosso).

Acrescenta ainda a sentença exequenda que:
(…) a recusa comprime o direto de liberdade de imprensa expresso no direito do jornalista a aceder livremente às fontes de informação.
E só dando a conhecer os prejuízos que a entrevista pedida trás no caso para as finalidades da prisão preventiva daquele recluso se pode perceber a justificação da recusa da sua autorização.
A indicação dos motivos do ato é exigida mesmo que esse ato seja praticado no exercício de poderes vinculados, como acontece na situação em apreço.” (sombreado nosso).

Dito de outro modo, da sentença exequenda (de 27.2.2015) resulta um caso julgado no sentido de que a fundamentação do indeferimento do pedido de autorização para a realização de entrevista, formulado por R, não se podia limitar à informação de que o tribunal à ordem do qual o recluso (J) cumpre prisão preventiva se opõe a que seja concedida autorização a tal entrevista, tendo de explicitar os prejuízos que a entrevista pedida acarreta para as finalidades da prisão preventiva do recluso J.

Ora, o despacho de 30.4.2015 indeferiu o pedido de autorização formulado por R com o exclusivo fundamento de que o tribunal à ordem do qual o recluso (J) cumpre prisão preventiva se opõe a que seja concedida tal autorização – face ao estatuído no art. 75º n.º 5, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade -, fundamentação que a sentença exequenda de 27.2.2015 já tinha considerado insuficiente, ou seja, o despacho de 30.4.2015 ofende o caso julgado resultante dessa sentença, pois o vício determinante da anulação foi a falta de fundamentação e o novo despacho praticado em 30.4.2015 repete o vício determinante da anulação.

Como explicam Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo III, Actividade administrativa, 2ª Edição, 2009, pág. 175, “Situações típicas de ofensa de decisões jurisdicionais transitadas em julgado dão-se quando, na sequência de uma sentença anulatória de um acto administrativo, a administração pública volta a praticar um novo acto administrativo que padece de uma ilegalidade idêntica àquela que serviu de fundamento à anulação do primeiro”.

Cumpre salientar que as questões invocadas nas conclusões III a X, das alegações de recurso (suficiência da fundamentação consistente na oposição do Tribunal de Instrução Criminal à concessão de autorização à entrevista, conjugada com o disposto no art. 75º n.º 5, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, e existência de segredo de justiça), já foram apreciadas na sentença exequenda de 27.2.2015, a qual transitou em julgado, pelo que não podem ser novamente apreciadas, pois, como acima referido, a imutabilidade da decisão judicial em que se caracteriza a autoridade de caso julgado significa que, apreciada uma causa de invalidade, o tribunal fica obrigado a aplicar, dentro do processo e fora dele, a decisão tomada (cfr. art. 619º n.º 1, do CPC de 2013).

Se a recorrente considerava que o decidido na sentença de 27.2.2015 era desconforme com o direito, deveria, oportunamente, ter interposto recurso jurisdicional da mesma. Não o tendo feito, deixando transitar em julgado tal decisão, não pode vir agora discutir questões relativas a matéria sobre a qual se formou caso julgado.

Do exposto resulta que a entidade executada proferiu o novo despacho de 30.4.2015 em desrespeito pelo caso julgado, isto é, reincidindo na ilegalidade anteriormente cometida e identificada na sentença exequenda (de 27.2.2015), pelo que bem andou a sentença recorrida ao declarar a nulidade desse despacho, isto é, a decisão ora sindicada não enferma, nesta parte, de erro de julgamento.

A recorrente também alega que a condenação constante da sentença recorrida a depositar, em 10 dias, nos cofres do Estado o valor da sanção pecuniária compulsória de € 404 não tem suporte legal, dado que já cumpriu integralmente a sentença de 27.2.2015, através do despacho de 30.4.2015.

A sentença recorrida condenou a recorrente a depositar o valor de € 404 com base na seguinte fundamentação:
Quanto à questão da liquidação da sanção pecuniária compulsória aplicada no título executivo, considerando o facto de a sentença declarativa datar de 27.2.2015, ter sido notificada a 5.3.2015, ter transitado em julgado a 23.3.2015 e a entidade executada ter praticado novo ato em 30.4.2015, quando estavam passados 16 dias úteis após o termo do prazo que o tribunal lhe concedeu para o efeito, sem que a entidade executada tenha alegado e justificado o atraso no cumprimento da decisão judicial, liquida-se a sanção pecuniária compulsória no valor de 5% do salário mínimo nacional por cada dia de atraso.
O que se computa no montante diário de €: 25,25 (€: 505,00 x 5%) e no montante em dívida de €: 404,00 (€: 25,25 x 16 dias).”.

Do trecho ora transcrito decorre que a sentença recorrida condenou a recorrente a depositar os € 404 por entender que o novo acto de 30.4.2015 foi praticado com 16 dias de atraso, face ao prazo de cumprimento fixado na sentença exequenda de 27.2.2015.

Ora, a recorrente nas alegações de recurso (tanto no respectivo corpo, como nas suas conclusões) não colocou em causa as razões em que assentou tal condenação (atraso de 16 dias na prática do acto de 30.4.2015), pois impugna motivos (falta de cumprimento da sentença de 27.2.2015) em que essa condenação não assentou.

Assim sendo, cumpre ter presente que, de acordo com o disposto no art. 635º n.º 5, do CPC de 2013, “Os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo”.

Nestes termos, o presente recurso, no segmento em que é impugnada a condenação da recorrente a depositar € 404, está votado ao insucesso, pois seria inútil apreciar o fundamento invocado pela recorrente (cumprimento integral da sentença de 27.2.2015 através do despacho de 30.4.2015) - e sendo certo que, de acordo com o estatuído no art. 130º, do CPC de 2013, não é lícito praticar actos inúteis no processo -, dado que, mesmo que se lhe reconhecesse razão na totalidade (o que também nunca ocorreria, pois, como decorre do supra exposto, a decisão recorrida mostra-se acertada ao declarar a nulidade do despacho de 30.4.2015), sempre seria de manter intocada, por inatacada, a decisão recorrida, neste segmento, pelos fundamentos nela descritos (e não atacados neste recurso – atraso de 16 dias na prática do acto de 30.4.2015), isto é, face ao trânsito em julgado, por carência de impugnação, deste segmento da decisão recorrida.


Passando à apreciação da questão relativa à ocorrência de causa legítima de inexecução

A sentença recorrida de 10.2.2016, e face à declaração de nulidade do despacho de 30.4.2015, ou seja, permanecendo a sentença exequenda de 27.2.2015 por executar, fez constar da respectiva fundamentação o seguinte:
Aqui chegados, tendo sido declarada a nulidade do ato de 30.4.2015, por ofensa do caso julgado, a entidade executada tem, para executar a sentença de 27.2.2015, antes de mais, de praticar um novo ato que não só não repita o vício do ato anulado por essa sentença, como também não contrarie e se compatibilize com as vinculações dela emergentes, designadamente, decidindo o requerimento de 28.11.2014 e, em caso de recusa, explicando quais os motivos pelos quais não concede a autorização de execução da entrevista, maxime, identificando os prejuízos que a entrevista, em concreto, se levada a cabo, traria para as finalidades da prisão preventiva.
Por conseguinte, ao abrigo do disposto no art 167º, nº 1 do CPTA, determina-se que, em execução da sentença de 27.2.2015, a entidade executada, em 10 dias, decida o pedido que lhe foi dirigido, em 28.11.2014, em conformidade com o disposto no art 75º, nº 2 e nº 5 do Código de Execução das Penas, nos arts 123º, nº 1, al d), 124º, nº 1, al a), 125º do CPA de 1991.
Com a cominação expressa do incumprimento do decidido, no prazo fixado, acarretar para o titular do cargo o pagamento de sanção pecuniária compulsória no valor de 10% do salário mínimo nacional por cada dia de atraso (cfr arts 110º, nº 5 e 169º do CPTA).”.

E no respectivo dispositivo consta a este propósito o seguinte:
b) Determina que, em execução da sentença de 27.2.2015, a entidade executada, em 10 dias, decida o pedido que lhe foi dirigido, em 28.11.2014, em conformidade com o disposto no art 75º, nº 2 e nº 5 do Código de Execução das Penas, nos arts 123º, nº 1, al d), 124º, nº 1, al a), 125º do CPA de 1991.
c) Com a cominação expressa do incumprimento do agora decidido, no prazo fixado, acarretar para o titular do cargo o pagamento de sanção pecuniária compulsória no valor de 10% do salário mínimo nacional por cada dia de atraso (cfr arts 110º, nº 5 e 169º do CPTA).”.

Ora, por despacho de 24.6.2016 foi suscitada a questão relativa à ocorrência de causa legítima de inexecução, o que implicaria que não se pudessem manter as alíneas b) e c) do dispositivo da sentença recorrida (transcritas no parágrafo antecedente).

Desde já, cumpre salientar que a ocorrência de causa legítima de inexecução é uma questão de conhecimento oficioso. Neste sentido se pronunciou o Ac. do STA de 25.9.2014, proc. n.º 1710/13 (“I - O processo de execução é o meio processual adequado para proceder à fixação da indemnização por inexecução de sentença de acto anulatório, ainda que se dê a circunstância de a declaração de existência de causa legítima de inexecução ter tido lugar já em fase de recurso. II - A indemnização por inexecução de sentença pode ser fixada ainda que não tenha sido solicitada pelo exequente”), no qual se escreveu nomeadamente o seguinte:
Este raciocínio deve valer, mutatis mutandi, para aquela situação não expressamente prevista nos preceitos relativos à execução de sentenças de anulação de actos administrativos, em que a existência de causa legítima de inexecução do julgado anulatório é declarada pelo tribunal de recurso e não pelo tribunal de 1.ª instância.
Efectivamente, não se vislumbram motivos válidos capazes de contrariá-la, sobretudo se se tiver em conta que: (i) o processo executivo é a sede própria para se obter a compensação devida pela inexecução da sentença; (ii) este tipo de indemnização funciona como um sucedâneo da inexecução da sentença anulatória; (iii) o carácter objectivo da indemnização por inexecução de sentença e a sua fixação – ou seja, por acordo entre as partes a convite do tribunal ou, quando tal não se mostre possível, pelo próprio tribunal através de um juízo equitativo – não exigem “grandes desenvolvimentos processuais”.
Assim sendo, nada impede que, em sede de recurso, se determine o pagamento de uma indemnização por inexecução de sentença, na sequência da declaração da causa legítima de inexecução, ainda que esta não tivesse sido peticionada pelo exequente ou que, tendo sido peticionada, não o tenha sido nas conclusões da alegação de recurso, as quais fixam o thema decidendum. Mais ainda, esta solução deverá ser seguida mesmo naqueles casos em que a própria Administração nunca tenha chegado a invocar a causa legítima de inexecução de sentença. A isto não obstará a letra do texto do n.º 1 do art. 178.º do CPTA, ab initio: “Quando se julgue procedente a invocação da existência de causa legítima de inexecução”. À primeira vista, este inciso apontaria para a necessidade da invocação expressa dessa causa enquanto pressuposto da própria indemnização. Não obstante, todos os elementos supra referenciados apontam claramente para o carácter oficioso da fixação desta indemnização compensatória, além de que a palavra “invocação” admite um sentido amplo, de tal modo que o conhecimento oficioso por parte do tribunal pode ser considerada também ele uma invocação.
Considerando todos estes elementos conjugadamente, não colhe o argumento de que a questão só pode ser tratada em via de recurso se tiver sido colocada pela via do recurso subordinado ou através da ampliação do recurso.” (sublinhados e sombreado nossos).

Como esclarecem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, cit., págs. 1059 e 1060, «Na definição proposta por DIOGO FREITAS DO AMARAL, cuja actualidade permanece intacta, as causas legítimas de inexecução são “situações excepcionais que tornam lícita, para todos os efeitos, a inexecução das sentenças dos tribunais administrativos, obrigando, no entanto, ao pagamento de uma indemnização compensatória ao titular do direito à execução”. Que a ocorrência de causas legítimas de inexecução desonera as entidades públicas do seu dever de cumprir - executar, no sentido em que a expressão é tradicionalmente empregue, de execução espontânea por parte do obrigado (cfr. nota 1 ao artigo 159.°) -, resulta do artigo 162.°, n.° 1 (assim como do artigo 175.°, n.° 1). Que a extinção do dever de cumprir dá origem a um dever de pagar "a indemnização devida pelo facto da inexecução", resulta dos artigos 164.°, n.° 6, 166.°, n.° 1, 176.°, n.° 7, e 177.°, n.° 3 (…)» (sublinhado nosso).

De acordo com o disposto no art. 163º n.º 1, do CPTA, só constituem causa legítima de inexecução a impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público na execução da sentença.

A impossibilidade absoluta na execução da sentença não se reconduz a uma mera dificuldade ou onerosidade dessa execução, pois é necessário que à mesma se aponha, em absoluto, impedimento irremovível, de natureza física ou legal.

Retomando o caso vertente verifica-se que pela sentença exequenda de 27.2.2015 a recorrente foi intimada a responder ao requerimento do recorrido de 28.11.2014 – no qual é solicitada autorização para a realização de uma entrevista a J que se encontra no estabelecimento prisional de -, explicando, em caso de recusa, os motivos pelos quais não concede autorização de entrevista.

Ora, desde 4.9.2015 que J não se encontra preso preventivo, pelo que desde esta data tornou-se impossível o cumprimento da sentença exequenda.

Efectivamente, a prolação de despacho em resposta ao requerimento do recorrido de 28.11.2014 tem como pressuposto necessário a prisão de J, pelo que, não se verificando tal pressuposto desde 4.9.2015, desde esta data é impossível o cumprimento da sentença exequenda de 27.2.2015 (ou seja, a causa da impossibilidade absoluta de cumprimento do dever de executar a sentença de 27.2.2015 reside no facto de ter desaparecido a necessidade de autorizar a entrevista, face à circunstância de J já não se encontrar preso), razão pela qual deverá ser declarada a existência de causa legítima de inexecução e, em consequência, revogadas as als. b) e c), do dispositivo da sentença recorrida, e determinada a baixa dos autos ao TAF de Sintra, a fim de ser proferido despacho a convidar as partes para, no prazo de 20 (vinte) dias – sem prejuízo da sua prorrogação, caso seja previsível que o acordo venha a concretizar-se em momento próximo -, acordarem no montante da indemnização a que o recorrido tem direito (cfr. art. 178º n.º 1, do CPTA) e, na falta de acordo, prosseguir a instância para os efeitos do n.º 2 do art. 178º, do CPTA.


Do exposto resulta que deverá ser:
- negado provimento ao presente recurso jurisdicional quanto às als. a) e d), do dispositivo da sentença recorrida, confirmando-se a mesma nesta parte;
- julgada verificada ex officio a ocorrência de causa legítima de inexecução e, em consequência, revogadas as als. b) e c), do dispositivo da sentença recorrida, bem como a condenação em custas (as quais deverão ser fixadas a final, pois a instância terá de prosseguir em 1ª instância), e determinada a baixa dos autos ao TAF de Sintra, a fim de ser proferido despacho a convidar as partes para, no prazo de 20 (vinte) dias, acordarem no montante da indemnização a que o recorrido tem direito, e, na falta de acordo, prosseguir a instância para os efeitos do n.º 2 do art. 178º, do CPTA.

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Uma vez que a recorrente ficou vencida no presente recurso jurisdicional, deverá suportar as respectivas custas (cfr. art. 527º n.ºs 1 e 2, do CPC de 2013, ex vi art. 1º, do CPTA).
III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em:
I – Negar provimento ao presente recurso jurisdicional quanto às als. a) e d), do dispositivo da sentença recorrida, confirmando-se a mesma nesta parte.
II - Julgar verificada ex officio a ocorrência de causa legítima de inexecução e, em consequência, revogar as als. b) e c), do dispositivo da sentença recorrida, bem como a condenação em custas, e determinar a baixa dos autos ao TAF de Sintra, a fim de ser proferido despacho a convidar as partes para, no prazo de 20 (vinte) dias – sem prejuízo da sua prorrogação, caso seja previsível que o acordo venha a concretizar-se em momento próximo -, acordarem no montante da indemnização a que o recorrido tem direito, e, na falta de acordo, prosseguir a instância para os efeitos do n.º 2 do art. 178º, do CPTA.
III – Condenar a recorrente nas custas relativas ao presente recurso jurisdicional.
IV – Registe e notifique.
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Lisboa, 2 de Agosto de 2016


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(Catarina Jarmela)


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(Nuno Coutinho)



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(Barbara Tavares Teles)