Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07512/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/10/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”). CONCEITO E ÂMBITO DESTA NULIDADE.
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL.
NOÇÃO DE COMPETÊNCIA.
VÍCIO DE INCOMPETÊNCIA.
RATIFICAÇÃO-SANAÇÃO.
VÍCIOS DO ACTO ADMINISTRATIVO-TRIBUTÁRIO. NULIDADE.
REGIME DO EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA DE FISCALIZAÇÃO POR PARTE DA A. FISCAL.
OBRIGAÇÃO GERAL DOS SUJEITOS PASSIVOS DISPOREM DE CONTABILIDADE ORGANIZADA.
ARTº.35, Nº.5, DO C.I.V.A. FORMALIDADES “AD SUBSTANTIAM”.
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).

2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma.

3. A competência é conceptualizada como um conjunto de poderes funcionais que a lei confere a um órgão para a prossecução das atribuições da pessoa colectiva pública que integra, assumindo-se como a pedra basilar e de vanguarda do princípio geral da legalidade administrativa. Em consequência, a competência só pode ser definida por lei ou regulamento, sendo imodificável, irrenunciável e inalienável (artº.29, C.P. Administrativo). Não obstante, a crescente flexibilidade da actividade administrativa, fruto da subsidiariedade da actuação dos poderes públicos na sociedade, tem determinado o legislador na adopção de cláusulas gerais de delegação de poderes, afastando um modelo rígido, fechado e inflexível de ordenação da competência de um órgão. Nesse sentido, o C. P. Administrativo institui, no seu artº.35, uma genérica delegabilidade de poderes, confiando nas mãos dos órgãos administrativos a concreta definição de quais, dentro da habilitação legal, gozam de determinada competência. No universo normativo tributário, tal cláusula geral encontra-se prevista no artº.62, da L.G.Tributária.

4. A incompetência pode definir-se como o vício que consiste na prática, por um órgão da Administração, de um acto incluído nas atribuições ou na competência de outro órgão.

5. Perante a prática de um acto administrativo por órgão desprovido de competência para tal, pode o titular do órgão competente promover a sua ratificação-sanação, acto administrativo secundário destinado à sanação do vício gerador da ilegalidade do acto administrativo principal.

6. Os vícios do acto administrativo-tributário são, em regra, fundamento da sua anulabilidade, só implicando a nulidade do mesmo quando se verifique a falta de qualquer dos seus elementos essenciais (v.g.autor do acto; destinatário do acto; fim público do acto; acto viciado por usurpação de poder) ou quando houver lei que expressamente preveja essa forma de invalidade (cfr.artº.133, nº.2, do C.P.A.).

7. A A. Fiscal no exercício da sua competência de fiscalização da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei, actua no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabendo-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação. Mais se deve realçar que o órgão instrutor pode utilizar, para conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento, todos os meios de prova admitidos em direito (cfr.artº.72, da L.G.T.).

8. Nos termos do C.I.V.A., a obrigação geral dos sujeitos passivos disporem de contabilidade adequada ao apuramento e fiscalização do imposto deriva do estabelecido no artº.28, nº.1, al.g), do mesmo diploma. Assim se explica que os sujeitos que face à lei comercial e fiscal estão obrigados a dispor de contabilidade organizada, devam observar, igualmente, certas obrigações contabilísticas em ordem a obter segurança e clareza no registo das operações decorrentes da aplicação do Código do I.V.A. e necessárias ao cálculo do imposto, bem como para permitir o seu controlo.

9. Contrariamente à dedutibilidade em sede de I.R.C., inexistindo factura ou documento equivalente com os requisitos do artº.35, nº.5, do C.I.V.A., fica logo afastada a dedutibilidade do I.V.A. E recorde-se que é posição unânime na jurisprudência dos Tribunais Superiores que tais requisitos consubstanciam verdadeiras formalidades “ad substantiam”.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
"FRANCISCO ………………. & …….., L.DA.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.171 a 202 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente a impugnação intentada pelo recorrente tendo por objecto liquidações de I.V.A. e juros compensatórios, relativas ao ano 2000 e no montante total de € 15.905,04.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.214 a 225 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-Na p.i. a impugnante argumentou no sentido da nulidade do acto que deu origem às liquidações de IVA invocando para o efeito:
a. o disposto no n.° 9 (actual n° 11) do artigo 39.° do CPPT, e
b. o facto do acto de delegação de competências:
-não mencionar expressamente a competência constante no artigo 82.° do CIVA, e
-incompetência da entidade que a emitiu por não ser o director de finanças à data do "despacho de delegação de competências";
2-A douta sentença apenas justifica a não tempestividade dos despachos de delegação de competências, não fazendo referência a estes argumentos que fundamentam a nulidade dos actos, pelo que deve ser declarada a nulidade da decisão por omissão de pronúncia e errada interpretação e aplicação das normas legais aos factos apurados;
3-De igual modo a douta sentença é omissa quanto à fundamentação apresentada na p.i. quanto à sustentação dos serviços prestados e constantes da factura n° 27506 de 27/10/2004;
Ainda que assim não se entenda, sempre, se deverá considerar que
4-A liquidação do IVA impugnada nos presentes autos é nula por ter sido proferida por quem não tinha competência para a prática do acto, uma vez que o despacho de delegação de competências, que confere competência ao Chefe de Divisão delegado, é proferido em data em que o delegante já havia cessado as suas funções;
5-Deve ser anulado o despacho de 28/10/2004 do Chefe de Divisão Alexandre ……………….; e
6-Consequentemente, e para efeitos de IVA, anuladas as liquidações de IVA n.°s ……….., ………. e ………., de, respectivamente, 12.579,61 €, 26,09 € e 2.670,36 €, e ainda o agravamento de 628,98 €, fixado nos termos do artigo 77.° do CPPT, totalizando 15.905,04 €;
7-Encontram-se violadas as normas dos artºs. 615°, n° 1, al. d) CPC, 35° e 40° do CPA e 39°, n° 9 (actual n° 11) do CPPT;
8-Quanto à emissão das facturas n° 25455 e 25456, de 20/7/2001 não violam elas o disposto no art.° 35° do CIVA;
9-Deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se, em conformidade, a douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.245 e 246 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.249 e 250 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.173 a 188 dos autos):
1-A impugnante é uma sociedade por quotas com o capital social de EUR 1.000.000,00, com início de actividade em 7/1/1980, tem por objecto o exercício de descasque e preparação de pinhão e outros frutos secos e sua comercialização, exerce a actividade em A…………., concelho de Coruche, está enquadrada em sede de I.V.A., no regime normal, periocidade mensal e em sede de I.R.C., no regime geral de tributação (cfr.relatório de inspecção junto a fls.111 a 138 dos presentes autos; informações não contestadas pela impugnante);
2-Em 31/12/2000 a impugnante emitiu as notas de lançamento n.° 4 e n.° 5 constantes a fls.7 e 8 do Processo Administrativo Tributário (PAT), cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido e das quais consta o seguinte:

NOTA DE LANÇAMENTO N°4
“(…)
Debite 27192
Credite 7214
Valor a receber de ………… SA (...) a Serviços de mulheres na laboração de secagem de arroz
11 Mulheres
22 Dias 2/mês
2 Meses
10 Horas/Dia
1800$00 hora
8.712.000$00
(…)”
NOTA DE LANÇAMENTO N.°5
"(...)
Debite 27191
Credite 739
Pela utilização de eira para secagem de cereais pela Casa ………, Lda.
500.000$00 /Mês
6.000.000$00
(…)”;
3-Em 20/7/2001, a impugnante emitiu as facturas constantes a fls.122 e 123 do PAT cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido e das quais consta o seguinte:
- Factura n.° 25455, no montante de EUR 43.455,27 (8.712.000$00), para a C……… SA, com a descrição " Serviço prestado do nosso pessoal na vossa fábrica em Alcácer - 4840 horas a EUR 8,978 (1.800$00), pela laboração de secagem de arroz", IVA no montante de EUR 7387,40 (1.481.040$00) foi liquidado à taxa de 17%.
- Factura n.° 25456, no montante de EUR 29.927,87 (6.000.000$00), para a Casa ………….Lda., com a descrição "Cedência da Eira para secagem de cereais, na Herdade dos ………. - 12 meses a EUR 2.493,99 (500.000$00) por mês, IVA no montante de EUR 5.087,74 (1.020.000$00) foi liquidado à taxa de 17% e contabilizado na conta 243423;

4-Entre 8/7/2004 e 1/10/2004 foi realizada pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Santarém, uma ação inspetiva à impugnante em sede de IVA e IRC no exercício de 2000, em cumprimento da ordem de serviço n.° 27245 de 21/5/2004 (cfr.relatório de inspecção junto a fls.111 a 138 dos presentes autos);
5-Em 22/10/2004 e em resultado da ação inspetiva identificada no ponto anterior foi emitido o respetivo relatório final, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr.relatório de inspecção junto a fls.111 a 138 dos presentes autos);
6-A ação de inspeção identificada nos dois pontos anteriores, teve como base uma proposta de verificação externa da Direcção de Finanças de Santarém de 20/5/2004, afim de proceder a uma análise da situação tributária do sujeito passivo, tendo em conta os resultados dos últimos exercícios, em termos de matéria colectável e imposto em IRC, bem como a situação em sede de IVA (cfr.relatório de inspecção junto a fls.111 a 138 dos presentes autos);
7-A ação de inspeção foi desenvolvida em Almeirim, nas instalações da sociedade responsável pela elaboração da contabilidade do sujeito passivo, com a análise do cumprimento fiscal a nível de IRC e IVA, recolha e análise dos dados constantes das declarações periódicas de IVA, da declaração de rendimentos de IRC, modelo 22 para o ano em causa, tendo sido constatado que não foi entregue a declaração anual de 2000, foram ainda analisados os documentos da escrita do sujeito passivo (cfr.relatório de inspecção junto a fls.111 a 138 dos presentes autos);
8-Na análise efetuada aos elementos contabilísticos descritos no ponto anterior a administração fiscal, constatou (cfr.relatório de inspecção junto a fls.111 a 138 dos presentes autos):
"(...)
3.1 - ANO DE 2000
3.1.1- Em sede de IRC
3.1.1.1 - Factura emitida mas não contabilizada de forma correcta
Tendo sido analisada a sequência das facturas consideradas na contabilidade no exercício de 2000, detectou-se uma factura não devidamente registada, nomeadamente a seguinte:
Factura 23166 de 24/7/2000, com o valor da venda de ESC 123.210$ - IVA liquidado ESC 20.946$, total da factura: ESC 144.156$.
De facto a referida factura foi registada na conta 713132 de venda de casca de pinhão no Diário das Vendas, com o número interno 1345, mas registou indevidamente pelo montante de zero escudos a referida factura, ou seja, não registou devidamente os valores constantes da factura.
Tendo-se constatado pela análise da contabilidade do sujeito passivo, que os referidos documentos não se encontram contabilizados de forma correcta, verifica-se dessa forma a infracção do disposto no n.° 3 do artigo 17.° do CIRC. Assim, tratando-se portanto de proveitos ou ganhos conforme o disposto no artigo 20.°, n.° 1 al. a) do CIRC conclui-se que o lucro tributável declarado do exercício deverá ser acrescido em EUR 614,57 (123.210$00).
3.1.1.2 Custos registados referentes a exercícios anteriores não aceites fiscalmente
O sujeito passivo registou na conta 697 de correcções relativas a exercícios anteriores um montante total de 5.656.042$00, e na conta 6988 de outros custos e perdas não especificados um total de 47.052$00. Também na conta 6229841 registou uma regularização de um saldo de um fornecedor de anos anteriores (saldo que passa de 1999 para 2000) no total de 147.879$00.
Verifica-se deste modo tratarem-se de custos, em todas as situações descritas, de idêntica natureza, ou seja, relativas a correcções de exercícios anteriores, e que o sujeito passivo não acresceu ao lucro tributável como o deveria ter feito, dado tratarem-se de custos que não são aceites fiscalmente por não cumprirem o principio da especialização dos exercícios previsto para efeitos fiscais no artigo 18.° do CIRC.
De facto os custos descritos não podem ser aceites fiscalmente nos termos do n.° 1 do artigo 18.° do CIRC, pelo que será de acrescer ao lucro tributável o montante de EUR 29.184,53 (5.850.973$00= 5.656.042$+47.052$00+147.879$00).
3.1.1.3 Reintegrações não aceites como custo fiscal e não acrescidas no modelo 22
O sujeito passivo procedeu à reintegração em 2000 da viatura Mercedes Benz, a qual se trata de uma viatura cujo custo de aquisição foi de 6.748.159$00, ultrapassando o montante de 6.000.000$00 referido na alínea f) do n.° 1 do artigo 32° do CIRC, pelo que tendo sido reintegrado um total de 1.687.040$00, não será aceite a parte que ultrapassa o referido limite, ou seja 187.040$00. Desta forma será de acrescer ao lucro tributável o montante de EUR 932,95 (187.040$00).
3.1.1.4 - Seguro do ramo Vida não aceite como custo fiscal
O contribuinte contabilizou em 2000 na conta 6222333 de seguros, um montante total de 980.018$00, referentes a custos tidos como prémios de dois seguros do ramo "Vida", em que as pessoas seguras são os sócios-gerentes da empresa, que garante, em caso de morte beneficiar os cônjuges, e em caso de vida ou invalidez, beneficiar a pessoa segura, sendo os documentos registados os que seguidamente se identificam:
(...)
TOTAL: 960.018$00
Estes montantes não podem ser aceites como custo fiscal no exercício de 2000 conforme o previsto no n.°4 do artigo 23° do CIRC, dado que não foi considerado rendimento de trabalho dependente, nos termos da primeira parte do n.° 3 do artigo 2° do Código do IRS.
Este custo também não se enquadra no âmbito do disposto no artigo 38.° do CIRC por não ter carácter geral em relação a todos os trabalhadores da empresa, com efeito o âmbito do seguro é restrito, as pessoas seguras não são os trabalhadores da empresa na sua totalidade mas apenas os sócios-gerentes, sendo beneficiários os sócios gerentes ou cônjuges.
Em face do exposto, será de corrigir o montante total acima apurado acrescendo-o ao lucro tributável do exercício no valor de EUR 4.788,55 (960.018$00).
3.1.1.5 Compras registadas referentes a anos anteriores
(...)
3.1.1.6 Compras registadas não devidamente documentadas
(...)
3.1.1.7 Compra não devidamente documentada
(...)
3.1.2 - Em sede de IVA
3.1.2.1 - IVA não contabilizado nas facturas emitidas
Em relação à factura não devidamente contabilizada, e descrita no ponto 3.1.1.1 em sede de IRC, o sujeito passivo mencionou IVA liquidado na mesma, não tendo declarado e entregue nos cofres do Estado o imposto devido, no período aí identificado.
Verifica-se assim que, o sujeito passivo não cumpre o disposto no artigo 44.°, n.°2, al.a) do CIVA, no que se refere à contabilização de todos os documentos relativos à transmissão de bens e prestações de serviços efectuadas.
Concluindo-se que, de acordo com o artigo 7.° e artigo 8.° do CIVA, o valor de imposto exigível e que foi liquidado na referida factura não entregue no período de Julho de 2000, perfaz o montante de EUR 104,48 (20.946$00).
3.1.2.2 - Registo dos proveitos sem liquidação de IVA
O sujeito passivo registou em 31/12/2000 no diário de operações diversas pelo lançamento interno n.° 598, proveitos de prestação de serviços nomeadamente com cedência de pessoal na conta 7214 por contrapartida da conta acréscimo de proveitos 27192 sem porém liquidar o IVA.
Também registou na conta 739, pelo mesmo documento atrás identificado, proveitos referentes a aluguer por contrapartida da conta acréscimo de proveitos 27191 sem porém liquidar o IVA.
Notificado o sujeito passivo para justificar a origem dos acréscimos de proveitos, esclareceu o sujeito passivo que "os acréscimos de proveitos contabilizados em 2000, referem-se a proveitos que embora sejam referentes ao exercício apenas teriam documentos no ano seguinte, especializou-se o exercício reconhecendo os proveitos no ano em que foram gerados. Estes proveitos referem-se a:
• Prestações de Serviços - 8.712.000$00 - Trabalhadores da empresa que prestaram serviços na secagem do arroz da empresa C………, SA.
• Proveitos suplementares - 6.000.000$00 - Utilização da eira pela Casa ………., Lda., para secagem de cereais.
Desta forma, tendo em conta o exposto, as referidas operações são enquadráveis como prestações de serviços nos termos do artigo 4.° do CIVA, pelo que tendo em conta o previsto no artigo 7° do CIVA, nomeadamente ao disposto na alínea b) do n.° 1 do citado artigo, o imposto é devido e torna-se exigível nas prestações de serviços no momento da sua realização.
Para efeitos do art. 16° do CIVA considera-se como valor tributável os valores registados dos serviços em causa, sendo aplicável a taxa normal prevista na al. c) do n.°1 do artigo 18° do CIVA.
Deste modo considera-se que em relação aos serviços descritos, e conforme o próprio sujeito passivo confirma, foram prestados no ano de 2000, ainda que os mesmos só viessem a ser pagos no ano seguinte. Por outro lado, tratando-se de proveitos do sujeito passivo, e os serviços já decorridos não se compreende a razão da falta da emissão da correspondente factura ou documento equivalente, nem em 2000 nem em 2001 como seria supostamente intenção do sujeito passivo.
Assim, tendo em conta a falta de indicação de uma data em que os serviços foram terminados, iremos considerar como data do momento da realização dos serviços a data em que o sujeito passivo efectuou o registo na sua contabilidade, ou seja, 31/12/2000, sendo esta a data que iremos considerar quer para a exigibilidade quer para a liquidação do imposto dado o sujeito passivo ter registado o proveito nesta data.
Aliás será de referir que dada a natureza dos trabalhos, secagem de arroz e secagem de cereais na eira, é pouco provável que tenham ocorrido no Inverno, designadamente em Dezembro, e por conseguinte a factura ou documento equivalente já deveria ter sido emitida até antes da data considerada mas ainda assim iremos ter em conta o registo do proveito com data de referência.
(...)
Desta forma será de corrigir ao período de Dezembro de 2000 o IVA não liquidado em falta no montante de EUR 12.475,13 (2.501.040$00).
(...)
IX - DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO
Tendo sido notificado o sujeito passivo para exercer o direito de audição, nos termos previstos no artigo 60.° da Lei Geral Tributária e no artigo 60.° do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária, pelo Oficio n.° 8867 de 06/10/2004, o mesmo não o exerceu.
Ao não exercer o direito de audição, o sujeito passivo não forneceu até à presente data quaisquer outros elementos novos que alterem as correcções propostas no projecto do relatório, pelo que o projecto do relatório é transcrito na integra para efeitos deste relatório final.
(…)”;

9-A impugnante emitiu a factura n.°27506, datada de 27/10/2004, constante de fls.9 do PAT e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, no montante de EUR 48.400,00, com a incidência da taxa de IVA de 19% no valor de EUR 9.196,00, no montante total de EUR 57.596,00, com a descrição "Prestação de serviços de laboração e secagem de arroz";
10-Em 28/10/2004, o Chefe de Divisão por delegação de competências do Director de Finanças proferiu o despacho de concordância com as conclusões do relatório final de inspecção identificado no ponto 8 (cfr.despacho constante a fls.111 dos presentes autos);
11-Através do ofício n.° 9397 datado de 28/10/2004 foi enviada à impugnante "Notificação do Relatório de Inspecção Tributária" (cfr.ofício, registo e a.r. constantes a fls. 108 a 110 dos presentes autos);
12-Em 9/11/2004 foram emitidas pela Direcção Geral dos Impostos as seguintes liquidações adicionais:
- Liquidação adicional n.° ………., relativa a IVA do exercício de 2000, no valor de EUR 12.579,61, com data limite de pagamento voluntário de 31/1/2005 (cfr.documento junto a fls.4 do Processo Administrativo Tributário apenso);
- Liquidação adicional n.° ……….., relativa a juros compensatórios no valor de EUR 2.670,30, com data de pagamento voluntário de 31/1/2005 (cfr.documento junto a fls.5 do Processo Administrativo Tributário apenso);
- Liquidação adicional n.° ………., relativa a juros compensatórios no valor de EUR 26,09 com data de pagamento voluntário de 31/1/2005 (cfr.documento junto a fls.6 do Processo Administrativo Tributário apenso);
13-A impugnante emitiu a factura n.° 27679, datada de 9/12/2004, constante de fls. 10 do PAT e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido no montante de EUR 27.000,00, com a incidência da taxa de IVA de 19% no valor de EUR 5.130,00, no montante total de EUR 32.130,00, com a descrição "Utilização da Eira para secagem de cereais";
14-Em 31/12/2004, a impugnante emitiu a nota de crédito n.° 49, de 31/12/2004, para a C……… SA, relativa à prestação de serviços 840 horas na laboração de secagem de arroz, no montante de EUR 48.400,00 e IVA liquidado de EUR 9,169,00 e que foi registada a crédito na conta "21110620 – C…… SA" (cfr.nota de crédito junta a fls.89 do Processo Administrativo Tributário apenso);
15-Em 2/05/2005 a impugnante apresentou a reclamação graciosa da liquidação de IVA n.° ………., constante a fls. 1 a 3 do PAT e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido e da qual consta o seguinte:
"(...)
Por vicissitudes várias, em especial pela doença do principal sócio-gerente da reclamante, que viria entretanto a falecer, essas duas notas internas apenas viriam a ser facturadas em 2004, e pelas importâncias correspondentes aos valores efectivamente utilizados.
(...)
Assim é, que à nota de lançamento n.° 4, corresponde a factura n.° 27.506, de 27/10/2004, no montante de 48.400,00 Euros, acrescida de IVA de 9.196,00 Euros, no total de 57.596,00 (doc. N.° 3).
(...)
E à nota de lançamento n.° 5, corresponde a factura n.° 27.679, de 2004.12.09, no montante de 27.000,00 Euros, acrescida de IVA de 5.130,00 Euros, no total de 32.130,00 Euros (doc. N° 4).
(...)
Tendo o IVA liquidado nas duas supracitadas facturas sido entregue à Direcção Geral do Tesouro aquando do envio das respectivas declarações periódicas.
(...)
Donde se conclui que se as liquidações reclamadas não são devidas por já ter sido oportunamente liquidado o imposto.
(...)"
16-Em 11/12/2011 foi emitida pela Direcção de Finanças de Santarém a "informação de procedimento de reclamação graciosa" constante a fls.58 e seg. do PAT, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido e da qual consta o seguinte:
"(...)
Face ao procedimento de Reclamação graciosa n.° 2011200594000242 apresentado por "Francisco ……….. e Filhos, Lda.", adiante designado por "C…….Filhos", a Divisão Justiça Tributária - DJT, em comunicação Interna n.° 497, solicitou a esta Divisão de Inspecção, que se pronunciasse sobre a matéria de facto, mais especificamente, sobre:
• Se existe alguma correspondência entre as facturas e as notas de lançamento constantes de fIs. 7 a 10 e,..."
• "...se o imposto constante das referidas facturas deu entrada efectiva nos Cofres do Estado aquando do envio das Declarações Periódicas para os períodos em causa."

Para cumprimento do solicitado, foram abertos os Despachos n.° (...) para consulta e recolha de informação e elementos, da contabilidade do sujeito passivo, de modo a cumprir com o solicitado pela DJT.
No âmbito dos Despachos supra identificados, procedeu-se à análise dos extractos das seguintes contas, para os exercício de 2000 a 2004:
(...)
Exercícios de 2001 a 2003
Nestes exercícios, os factos dignos de registo resumem-se a duas situações, ocorridas em 2001:
A conta "27191 - Rendas a Receber", não registou nenhum movimento, mantendo-se o saldo devedor de EUR 29.927,87 (anexo 4).
Na conta "27192 - Serviços a receber" registou-se um movimento a débito no montante de EUR 64.843,73. Alterando-se o saldo devedor desta conta de EUR 43.455,27 para EUR 108.298,99 (Anexo 5).
Foram emitidas duas facturas (Anexo 11):
• Factura n.° 25455 de 20/7/2001 (...)
Esta factura foi contabilizada como proveito do exercício na conta "734-Cedência pessoal serviço máquinas"; o IVA (...) foi liquidado à taxa de 17% e contabilizado na conta 243423.
• Factura n. ° 25456 de 20/7/2001 (...)
Esta factura foi contabilizada como proveito na conta "738 - Cedência de equipamento", o IVA no montante EUR 5.087,74 foi liquidado à taxa de 17% e contabilizado na conta 243423.

Muito embora estas facturas sejam de valor idêntico às notas de lançamento n.°4 e n.º5 supra referidas e os serviços nelas descritos sejam de natureza idêntica aos descritos nas notas de lançamento, o que é um facto é que as contas 27191 e 27192, não foram creditadas nos respectivos valores e estas facturas foram contabilizadas como proveitos do exercício de 2001.
Para além disso, as facturas não indicam que os serviços tenham sido efectuados em 2000, nem remetem para as notas de lançamento já referidas.
Nos exercícios de 2002 e 2003, não se verificou qualquer movimento nas contas 27191 e 27192 (Anexo 5)
Exercício de 2004
Neste exercício foram emitidos os seguintes documentos:
• A factura n.° 27506 de 27/10/2004 (...)
Contabilisticamente os registos respeitantes a esta factura foram os seguintes:
Débito de conta "21110620- C…… SÁ" pelo montante de EUR 57.596,00, em contrapartida do crédito nas contas "27192" pelo montante de EUR 48.400 e 2433119 pelo valor de EUR 9.196,00 (IVA).
• A nota de crédito n.° 49 de 31/12/2004 (...)
Foi registada a crédito na conta "21110620 – C……… SA" pelo montante de EUR 57.596,00, em contrapartida do débito nas contas "27192" pelo montante de EUR 48.400,00 e "2433119" pelo valor de EUR 9.196,00 (Anexo 7).
• A factura n.° 27679 de 9/12/2004, para a Casa ………….., Lda. (...)
Foi contabilizada a débito na conta 211105530 pelo montante de EUR 32.130,00 e a crédito, da 27191 pelo valor de EUR 27.000,00 e da 2433119 pelo montante de EUR 5.130,00 (Anexo 8).
Pelo exposto verifica-se que a factura n.° 27506 foi anulada pela nota de crédito n.° 49. Com a anulação da factura, a conta 27192 continua com o saldo devedor de EUR 43.455,27 e o IVA liquidado na factura foi regularizado a favor do sujeito passivo na declaração periódica de 2005, mais especificamente no período de 05/08.

Durante o procedimento, e no sentido de esclarecer algumas situações, solicitou-se ao sócio-gerente, Sr. Engenheiro Hélio ………….., que nos respondesse a algumas questões:
• Pela análise do mapa de amortizações e reintegrações do sujeito passivo, constatou-se a não existência de qualquer registo alusivo a secadores. O que suscita a questão: se a C…….. e Filhos não tem secadores, porque é que debita horas de trabalho na secagem de arroz à C….. SA? Ao que o gerente nos explicou que os secadores são propriedade da Casa ………….. Lda., que se encontram localizados na Herdade …………… e na A………… e que as mulheres ter-se-ão deslocado para efectuar esses serviços.
• Solicitou-se, a identificação das mulheres que em 2000, trabalharam na secagem de arroz, para a C……….. SA e em que datas e quantas horas foram imputadas a cada uma? Em resposta ao solicitado, foram apresentadas cópias de folhas de ponto semanais, do dia 1 de Setembro de 2000 a 29 de Dezembro de 2000, que se juntam em anexo 9 a esta informação.
(...)
Como se verifica pela análise do quadro, as funcionárias que, segundo as folhas de ponto, teriam estado afectas aos secadores são 18 e trabalharam 5121,6 horas.
(...)
Apreciação dos factos analisados
(...)
Nota de lançamento n.º 4 e factura n.° 27506
Nessa factura 27506 de 27/10/2004, não se indica que os serviços nela descritos tenham sido realizados em 2000, nem remete para qualquer nota de lançamento, pelo que, consequentemente se presume que os serviços facturados se referem ao ano da sua própria emissão.
(...)
o IVA foi liquidado à taxa de 19%.
(...)
Assim, se a factura em causa respeitasse a serviços efectuados em 2000, o IVA teria que ser liquidado à taxa em vigor no momento em que o imposto se tornou exigível, ou seja à taxa de 17%.
(...)
Ora, se as funcionárias que estiveram a prestar serviços de secagem nos secadores para a C…….. SA, no ano de 2000, segundo informação do reclamante, trabalharam 5121,6 horas, e se a factura n.° 27506 de 2004, corresponde aos serviços efectivamente realizados, então as horas facturadas deveriam ser 5121,6 horas, e não 4840 horas de secagem de arroz.
Deste modo parece-nos que os serviços prestados, referidos na factura n.° 27506 de 2004, não correspondem aos serviços prestados, em 2000, de secagem de arroz, à C…….. SA.
Para além disso, a factura n.° 27506 foi anulada pela nota de crédito n.° 49 de 31/12/2004, como tal, nem faz sentido, a reclamação apresentada quanto à liquidação adicional de IVA relativa aos serviços descritos na nota de lançamento n.° 4. Aliás, na contabilidade o saldo devedor da conta 27191, continua por saldar.
Pelos factos expostos, não é possível aferir que os serviços descritos na factura n.° 27506 de 27/10/2004, correspondem aos serviços prestados em 2000 e que constam da nota de lançamento n.° 4 de 31/12/2004.
(...)
Contudo, ao emitir a nota de crédito n.° 49 em 31/12/2004, o sujeito passivo anulou os registos contabilísticos efectuados aquando da emissão da factura. Regularizou o IVA a favor do sujeito passivo, no montante de EUR 9.196,00, contabilizando-o na conta 243419 em 31/12/2004, e exercendo o direito de dedução na declaração periódica de 2005/08 (Anexo 10).
Não se compreende qual a motivação do reclamante ao ter procedido do seguinte modo:
Tendo conhecimento, de que a Administração Tributária iria proceder à liquidação adicional, do IVA não liquidado pelos serviços prestados, em 2000, relativos às notas de lançamento n.° 4 e n.° 5 porque emite as duas facturas em 2004, procedendo à liquidação do IVA em Outubro e Dezembro de 2004?
Emitindo a nota de crédito n.° 49 em 31/12/2004 e contabilizando o IVA em regularizações a favor do sujeito passivo na conta 243419, também em 31/12/2004, porque razão, quando apresentou a reclamação em 2/5/2005 no Serviço de Finanças de Coruche, posteriormente à emissão da nota de crédito, omitiu na reclamação o facto de ter emitido essa nota de crédito?
(...)
Nota de lançamento n.° 5 e factura n.º 27679
Na factura n.° 27679 de 9/12/2004, não se indica que os serviços nela descritos tenham sido realizados em 2000, nem remete para qualquer nota de lançamento, pelo que, consequentemente se presume que os serviços facturados se referem ao ano da sua própria emissão.
(...)";

17-Por solicitação da AT de documentação de suporte à nota de lançamento n.° 4 de 31/12/2000, a impugnante apresentou as folhas de ponto, relativas às trabalhadoras que executaram a prestação de serviços constantes de fls.99 e seguintes do PAT e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
18-Através do ofício n.° 84, datado de 9/1/2008, enviado por carta postal registada à impugnante, foi a mesma "notificada" do projecto de decisão da reclamação graciosa, para "direito de audição" (cfr.projecto de decisão, ofício e registo postal juntos a fls.126 a 128 do PAT apenso);
19-Em 28/1/2008 foi proferido o despacho de indeferimento da reclamação graciosa apresentada constante de fls.192 do PAT, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta o seguinte:
“(…)
Considerando que o pedido é legal e tempestivo e a(s) parte(s) têm legitimidade.
Mais considerando o teor da informação que antecede, bem como a constante de fls. 124/125, as quais ficam a fazer parte integrante do presente despacho decisório nos termos dos n.° 1 e 2 do artigo 77°da LGT.
Considerando ainda que foram cumpridas todas as formalidades legais, máxime a notificação para exercer (em) o direito de audição, previsto no artigo 60.° da LGT.
Mantenho o indeferimento total do pedido, por falta de fundamentação legal, fixando ainda a título de agravamento à colecta nos termos do artigo 77° do CPPT, o valor de EUR 628,98, que corresponde a 5% da colecta ora reclamada, valor este que será cobrado a título de custas, devendo para o efeito, o Serviço de Finanças emitir a corresponde guia.
(...)
notifique o/a(s) Reclamantes do presente despacho, remetendo-lhes cópia não só do mesmo mas também das informações que lhe estão subjacentes.
(...)”;
20-Através do ofício n.° 581, datado de 7/2/2008 e enviado por carta postal registada a 11/2/2008, à impugnante, foi a mesma "notificada" da decisão de indeferimento da reclamação graciosa e agravamento à colecta (cfr.ofício e registo postal juntos a fls.136 e 137 do PAT apenso);
21-Em 27/2/2008, a p.i. da presente impugnação deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (cfr.carimbo de entrada aposto a fls.1 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada, não tendo sido dado relevo à prova testemunhal produzida e arrolada pela Representação da Fazenda Pública uma vez que reproduziu as informações constantes do relatório de inspecção e das diligências instrutórias posteriores em sede de reclamação que se encontram integralmente descritas nos autos e no processo administrativo tributário…”.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou totalmente improcedente a impugnação intentada pelo recorrente, em virtude do decaimento dos respectivos fundamentos, mais mantendo na ordem jurídica os actos tributários objecto do presente processo (cfr.nº.12 do probatório).
X
Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que na p.i. o recorrente argumentou no sentido da nulidade do acto que deu origem às liquidações de I.V.A. invocando para o efeito, o disposto no n.° 9 (actual n° 11) do artigo 39.° do C.P.P.T., e o facto do acto de delegação de competências não mencionar expressamente a competência constante no artigo 82, do C.I.V.A., e a incompetência da entidade que a emitiu por não ser o director de finanças à data do "despacho de delegação de competências". Que a decisão recorrida apenas justifica a não tempestividade dos despachos de delegação de competências, não fazendo referência a estes argumentos que fundamentam a nulidade dos actos, pelo que deve ser declarada a nulidade da decisão por omissão de pronúncia e errada interpretação e aplicação das normas legais aos factos apurados (cfr.conclusões 1 e 2 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar uma nulidade da sentença do Tribunal "a quo" devido a omissão de pronúncia.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal vício.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:
1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;
2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.615, do C.P.Civil.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/5/2011, proc.4629/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.6971/13).
Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.6971/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas. A falta de realização de diligências constituirá uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença. A falta de avaliação de provas produzidas, tal como a sua errada avaliação, constituirá um erro de julgamento da matéria de facto. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e referir se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P. Tributário).
Mais, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº. 133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac. T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.6971/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).
Revertendo ao caso dos autos, o que o recorrente pretende é que o Tribunal “a quo” não levou em consideração os argumentos por si apresentados no sentido da nulidade do acto que deu origem às liquidações de I.V.A. invocando para o efeito, o disposto no n.° 9 (actual n° 11) do artigo 39.° do C.P.P.T., e o facto do acto de delegação de competências não mencionar expressamente a competência constante no artigo 82, do C.I.V.A., e a incompetência da entidade que a emitiu por não ser o director de finanças à data do "despacho de delegação de competências".
Do exame do enquadramento jurídico da decisão recorrida, deve concluir-se que a mesma examina, durante três páginas, a questão da nulidade do despacho de concordância com o relatório final de inspecção, proferido pelo Chefe de Divisão, por alegada falta de competência, mais fazendo menção expressa das citadas normas constantes dos artºs.39, do C.P.P.T., e 82, do C.I.V.A. (cfr.fls.188 a 190 dos autos), em virtude do que conclui pela inexistência de qualquer vício que afecte a validade do despacho de concordância com as conclusões finais do relatório de inspecção proferido pelo Chefe de Divisão no âmbito da delegação de competências.
Por outro lado, conforme mencionado supra, resolver todas as questões que as partes tenham submetido à apreciação do juiz não significa considerar todos os argumentos que as mesmas tenham apresentado.
Em suma, não se vê que a sentença recorrida tenha omitido pronúncia sobre qualquer questão suscitada, não ocorrendo, portanto, a respectiva nulidade e, nestes termos, devendo improceder este fundamento do recurso.
Aduz, igualmente, o recorrente que a sentença recorrida é omissa quanto à fundamentação apresentada na p.i. relativa à sustentação dos serviços prestados e constantes da factura nº. 27506 de 27/10/2004 (cfr.conclusão 3 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo entendemos, mais uma nulidade da decisão recorrida devido a omissão de pronúncia.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal pecha.
Quanto ao regime processual da nulidade por omissão de pronúncia, remete-se o recorrente para os termos expendidos acima.
No caso concreto, é manifesto que a sentença recorrida igualmente não padece desta nulidade.
Desde logo, o Tribunal "a quo" fez constar da factualidade provada a mencionada factura nº. 27506 de 27/10/2004 (cfr.nº.9 do probatório), para além das referências ao mesmo documento contabilístico constantes de outros números do probatório (cfr.nºs.15 e 16 da factualidade provada).
Por outro lado, em sede de enquadramento jurídico da decisão recorrida, igualmente se examina o conteúdo de tal factura por mais de uma vez (cfr.fls.197, 198 e 200 dos autos), concluindo-se que a versão dos factos apresentada pelo recorrente para ser aceite como real, carecia de demonstração, o que o mesmo não fez de todo.
Concluindo, não padece a decisão do Tribunal "a quo" de qualquer nulidade devido a omissão de pronúncia, também quanto a esta questão.
Mais alega o recorrente que a liquidação de I.V.A. impugnada nos presentes autos é nula por ter sido proferida por quem não tinha competência para a prática do acto, uma vez que o despacho de delegação de competências, que confere competência ao Chefe de Divisão delegado, é proferido em data em que o delegante já havia cessado as suas funções. Que deve ser anulado o despacho de 28/10/2004 do Chefe de Divisão Alexandre António de Oliveira Reis e, por consequência, as liquidações objecto dos presentes autos (cfr.conclusões 4 a 6 do recurso). Com base em tal argumentação consubstanciando um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a sentença recorrida comporta tal vício.
Pede o recorrente, concretizando, que se declare a nulidade do despacho constante do nº.10 do probatório, devido a vício de incompetência.
A incompetência pode definir-se como o vício que consiste na prática, por um órgão da Administração, de um acto incluído nas atribuições ou na competência de outro órgão (cfr.M. Caetano, Manual de D. Administrativo, Almedina, 1991, I, pág.499 e seg.; D. Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 2010, pág.387 e seg.; ac.T.C.A.Sul-1ª.Secção, 17/6/2004, proc.2976/99).
A competência é conceptualizada como um conjunto de poderes funcionais que a lei confere a um órgão para a prossecução das atribuições da pessoa colectiva pública que integra, assumindo-se como a pedra basilar e de vanguarda do princípio geral da legalidade administrativa. Em consequência, a competência só pode ser definida por lei ou regulamento, sendo imodificável, irrenunciável e inalienável (artº.29, C.P. Administrativo). Não obstante, a crescente flexibilidade da actividade administrativa, fruto da subsidiariedade da actuação dos poderes públicos na sociedade, tem determinado o legislador na adopção de cláusulas gerais de delegação de poderes, afastando um modelo rígido, fechado e inflexível de ordenação da competência de um órgão. Nesse sentido, o C. P. Administrativo institui, no seu artº.35, uma genérica delegabilidade de poderes, confiando nas mãos dos órgãos administrativos a concreta definição de quais, dentro da habilitação legal, gozam de determinada competência. No universo normativo tributário, tal cláusula geral encontra-se prevista no artº.62, da L.G.Tributária (cfr.Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol.I, 2ª.edição, pág.604 e seg.; Paulo Otero, Legalidade e Administração Pública, 2003, págs.862 e seg.; Mário Esteves de Oliveira e Outros, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª.edição, págs.190 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4ª.edição, 2012, pág.536 e seg.).
Refira-se, ainda, que, perante a prática de um acto administrativo por órgão desprovido de competência para tal, pode o titular do órgão competente promover a sua ratificação-sanação, acto administrativo secundário destinado à sanação do vício gerador da ilegalidade do acto administrativo principal (cfr.D. Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 2010, pág.268 e 269; Mário Esteves de Oliveira e Outros, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª.edição, págs.662 e seg.).
Atento o expendido, será que o recorrente tem razão nas alegações que desenvolve?
Cremos que não, sendo de confirmar a decisão do Tribunal "a quo".
Antes de mais, diremos que a incompetência do órgão que profere a decisão do procedimento constitui um vício susceptível de conduzir à anulação do acto, pois só ocorre o vício de nulidade, no que para o presente processo interessa, nos casos de usurpação de poder e de prática de actos administrativos estranhos às atribuições do órgão que decidir o procedimento (cfr.artº.133, nº.2, als.a) e b), do C.P.A.).
Por outras palavras, os vícios do acto administrativo-tributário são, em regra, fundamento da sua anulabilidade, só implicando a nulidade do mesmo quando se verifique a falta de qualquer dos seus elementos essenciais (v.g.autor do acto; destinatário do acto; fim público do acto; acto viciado por usurpação de poder) ou quando houver lei que expressamente preveja essa forma de invalidade (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/8/2012, proc.5814/12; Jorge Lopes de Sousa, Código do Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.328 e seg.).
"In casu", como se verifica no despacho proferido em 28/10/2004 (cfr.nº.10 do probatório) é expressamente mencionado pelo seu autor que o acto é praticado ao abrigo de delegação de poderes e identifica-se a identidade do delegante, menção que se afigura legalmente suficiente para assegurar a validade e regularidade do acto praticado (cfr.artºs.36, nº.2, e 39, nº.11, do C.P.P.T.; artºs.38 e 123, nº.1, al.a), do C.P.A.).
Quanto à alegada falta de publicação do acto de delegação de poderes ao abrigo do qual foi praticado o acto, verifica-se que ocorreu a sua sanação com a publicação posterior do mesmo em 21/12/2004 (cfr.documentos juntos a fls.28 e 29 do processo administrativo apenso).
Também não se vislumbra qualquer ilegalidade ou irregularidade, contrariamente ao defendido pelo recorrente, no despacho administrativo de delegação de poderes de José …………. para o Chefe de Divisão Alexandre ……….., já que o mesmo desempenhava, com efeitos desde 1/1/2000, o cargo de Director de Finanças-Adjunto da Direcção Distrital de Finanças de Santarém, por despacho de delegação de competências do subdirector geral, datado de 12/3/2002 (cfr.documento junto a fls.16 do processo administrativo apenso). Mais se deve vincar que o facto de José A. N. da Silva ter sido nomeado, em regime de substituição e a título precário entre 1/6 e 30/10 do ano de 2004, no cargo de Director de Finanças, não implica a revogação ou desistência do cargo já ocupado de Director de Finanças Adjunto.
Acresce, que através de despacho de 30/3/2004, do Director de Finanças de Santarém, foi atribuída competência ao Chefe de Divisão Alexandre ……….. para determinar a revisão da matéria colectável declarada pelos sujeitos passivos, por via da avaliação directa e nos termos do artº.82, nº.1, da L.G.T. (cfr.documento junto a fls.21 a 23 do processo administrativo apenso).
Rematando, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente fundamento do recurso, nessa medida se confirmando a decisão recorrida neste segmento.
Por último, aduz o recorrente que a emissão das facturas nºs.25455 e 25456, de 20/7/2001 não viola o disposto no artº.35, do C.I.V.A. (cfr.conclusão 8 do recurso). Com base em tal argumentação consubstanciando mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal pecha.
A A. Fiscal no exercício da sua competência de fiscalização da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei, actua no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabendo-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação. Mais se deve realçar que o órgão instrutor pode utilizar, para conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento, todos os meios de prova admitidos em direito (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; artº.72, da L.G.T.).
Nos termos do C.I.V.A., a obrigação geral dos sujeitos passivos disporem de contabilidade adequada ao apuramento e fiscalização do imposto deriva do estabelecido no artº.28, nº.1, al.g). Assim se explica que os sujeitos que face a lei comercial e fiscal estão obrigados a dispor de contabilidade organizada, devam observar, igualmente, certas obrigações contabilísticas em ordem a obter segurança e clareza no registo das operações decorrentes da aplicação do Código do I.V.A. e necessárias ao cálculo do imposto, bem como para permitir o seu controlo (cfr.artºs.44 a 52, do C.I.V.A.; António Borges e Martins Ferrão, A Contabilidade e a Prestação de Contas, 8ª. Edição, Editora Rei dos Livros, pág.114; Clotilde Celorico Palma, Introdução ao Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Cadernos do I.D.E.F.F., nº.1, 2ª.edição, Almedina, 2005, pág.195 e seg.).
Por último, contrariamente à dedutibilidade em sede de I.R.C., inexistindo factura ou documento equivalente com os requisitos do artº.35, nº.5, do C.I.V.A., fica logo afastada a dedutibilidade do I.V.A. E recorde-se que é posição unânime na jurisprudência dos Tribunais Superiores que tais requisitos, em sede do regime de dedutibilidade do I.V.A., consubstanciam verdadeiras formalidades “ad substantiam” (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 10/10/2007, rec.487/07; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 15/4/2009, rec.951/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/3/2009, proc.2717/08; T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.6280/12).
Voltando ao caso concreto, na inspecção realizada ao impugnante/recorrente ao ano fiscal de 2000, a A. Fiscal estruturou a liquidação adicional objecto dos presentes autos em virtude da sociedade recorrente não ter procedido à liquidação e entrega do I.V.A. respeitante a duas prestações de serviços que ocorreram no ano fiscal de 2000 e que foram objecto de registo contabilístico através das notas de lançamento nºs.4 e 5, datadas de 31/12/2000 (cfr.nº.2 do probatório).
Os valores destas notas de lançamento não foram declarados em sede de I.V.A. no exercício de 2000, invocando a impugnante/recorrente, como justificação, o facto de terem sido emitidas em Julho do ano seguinte (2001) as duas facturas em falta (cfr.nº.3 do probatório).
No entanto, nas facturas emitidas em Julho de 2001 (facturas nºs.25455 e 25456, de 20/7/2001) não é feita qualquer referência ao ano de 2000, ou seja à data em que foi cedido o pessoal ou a eira para secagem de cereais, ou que os factos relativos à mesma facturação se reportam às notas de lançamento nºs.4 e 5 de 31/12/2000. Mais, ainda que estas facturas sejam de valor idêntico às notas de lançamento nºs.4 e 5, não houve qualquer operação contabilística que as relacione ao ano de 2000, por exemplo, as contas 27191 (rendas a receber) e 27192 (serviços a receber) não foram creditadas nos respectivos valores. Ao que acresce que estas facturas foram contabilizadas como proveitos no ano de 2001, a primeira na conta 734 (cedência pessoal serviço máquinas) e a segunda como proveito na conta 738 (cedência de equipamento), conclusões que se retiram do exame do nº.16 do probatório.
Ora, não indicando as facturas em causa que os serviços tinham sido efectuados em 2000, nem remetendo para as notas de lançamento nºs.4 e 5, de 31/12/2000, competia ao recorrente fazer prova dos elementos em falta, designadamente, o meio e a data de pagamento dos serviços em 2001 e que a cedência espelhada na factura emitida, foi realizada em 2000, pois, tendo emitido facturas em dissonância com o princípio da especialização dos exercícios e as determinações gerais previstas no C.I.V.A., cabia-lhe fazer referência expressa, na sua contabilidade, da relação das notas de lançamento com as facturas em causa.
E atente-se que nos presentes autos, não está em causa a demonstração pela Administração Fiscal de que os elementos contabilísticos exibidos pelo sujeito passivo não correspondem à realidade, mas precisamente o inverso, pois, a Fazenda Pública localiza temporalmente as notas de lançamento e facturas emitidas pelo contribuinte, precisamente no momento e na data em que o contribuinte as registou na sua contabilidade, de acordo com a presunção de veracidade das mesmas nos termos do artº.75, nº.1, da L.G.T.
Pelo contrário, é o recorrente que pretende que a Administração Fiscal retire conclusões e efeitos fiscais de alegadas operações de deferimento da emissão de facturas e consequente liquidação fiscal que não estão minimamente descritas, directa ou indirectamente, na sua contabilidade, mais lhe incumbindo fazer a prova da factualidade que pretende demonstrar (cfr.artº.74, nº.1, da L.G.T.).
Por último, sempre se refere que a emissão das facturas nºs.25455 e 25456, de 20/7/2001, atentas as vicissitudes contabilísticas a que se alude supra, obviamente viola o regime de emissão e das formalidades consagrado no citado artº.35, do C.I.V.A., desde logo, o nº.1, do preceito, o qual consagra o dever de emissão da factura o mais tardar no 5º. dia útil seguinte ao momento em que é devido o imposto, supondo que o imposto era devido na data de emissão das ditas notas de lançamento nºs.4 e 5, de 31/12/2000.
Arrematando, julga-se improcedente também este fundamento do recurso.
Finalmente, sempre se dirá que a decisão recorrida não violou as normas constantes dos artºs.615, nº.1, al.d), do C.P.C., 35 e 40, do C.P.A., e 39, do C.P.P.T.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 10 de Julho de 2014


(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)