Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1002/15.8BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:10/14/2021
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO,
PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO
Sumário:Tendo sido praticada uma infração consubstanciada na falta de entrega de pagamento por conta, punível nos termos do disposto no art. 114.º, n.º 2, e 5 alínea a), e art. 26.º n.º 4, ambos do RGIT, aplica-se o prazo de prescrição especial previsto no n.º 2 do art. 33.º do RGIT, uma vez que a infração depende da liquidação da prestação tributária, pelo que o prazo de prescrição é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária, in casu, 4 anos contados a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO

A H..., LDA veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente o recurso da decisão proferida nos autos de contraordenação n.° 2119201506000..., que lhe aplicou a coima de € 3.716,58 acrescida de custas no montante de € 76,50, pela prática da contraordenação prevista no artigo 104.°, n.° 1, alínea a] do Código de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) e punida pelos artigos 114.°, n.°s 2 e 5 alínea f) e 26.°, n.° 4 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT)..

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as conclusões seguintes:

«30. Não pode a recorrente concordar com a perspectiva vertida na douta sentença, conforme a seguir se expõe:
31. Conforme decorre da motivação aduzida em sede de recurso interposto da decisão de aplicação da coima, a ora recorrente não pagou atempadamente o pagamento por conta respeitante ao período de 201407.
32. Contudo, decorrente de tal infracção sempre tinha de proceder a Administração Tributária ao levantamento de auto de notícia sendo que é este que dá causa à autuação do processo de contra ordenação.
33. Dispõe a alínea a) e b) do n.°1 do artigo 63.° do RGIT, que constitui nulidade insuprível no processo de contra ordenação tributário, o levantamento de auto de notícia por funcionário incompetente e a falta de assinatura do autuante e de menção de algum elemento essencial da infracção.
34. Não resulta dos factos provados que tenha o auto de notícia sido notificado em momento algum à recorrente.
35. Resulta sim da douta sentença que foram notificados os elementos apurados constantes do auto de notícia, através da notificação para defesa.
36. Ora, uma coisa é a notificação dos elementos apurados constantes do auto de noticia, outra é a notificação do auto de noticia, de forma, a que possa a autuada aferir da competência do funcionário que procede à autuação.
37. A ausência de notificação do auto de notícia, equivale, por impossibilidade, a que tenha o auto sido levantado por funcionário incompetente e nesse sentido, praticada nulidade insuprível no processo de contra ordenação, que tem por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo.
38. Nesse sentido, deve a douta decisão do Tribunal ad quem, reconhecer a nulidade insuprível praticada no processo de contra ordenação, determinando a anulação dos termos subsequentes do processo.
39. Quanto ao pedido de redução de coima, entende a douta sentença que não pode a recorrente pretender beneficiar da aplicação da coim reduzida, sem que para tal tenha formulado um pedido expresso, antes do levantamento do auto de notícia.
40. Mais uma vez com todo o respeito não pode a recorrente concordar com a perspectiva vertida na douta decisão, desde logo porque não decorre da lei que o pedido tenha de ser expresso.
41. Depois, porque, não tendo sido notificada do auto de notícia, desconhece se o mesmo foi ou não levantado na data indicada em factos provados, que necessariamente se impugna.
42. Não resta qualquer dúvida que o tributo (IRC) apurado relativo ao exercício de 2014 mostra-se integralmente pago sendo certo que até ao pagamento do mesmo nenhum auto de noticia foi notificado à recorrente.
43. Determina a alínea b) do n.°1 do artigo 29.° do RGIT, que as coimas pagas a pedido do agente, são reduzidas para 25% do montante mínimo legal, se o pedido for apresentado para além de 30 dias posteriores à prática da infracção sem que tenha sido levantado auto de notícia, recebida participação ou iniciado procedimento de inspecção tributária.
44. In casu, foi o pedido apresentado para além dos 30 dias do cometimento da infracção com o pagamento do imposto, não tem conhecimento de ter sido recebida qualquer participação ou iniciado procedimento inspectivo e, quanto ao auto de notícia, desconhece se o mesmo se mostrava levantado porque em nenhum momento lhe foi notificado.
45. O direito á redução da coima depende da regularização da situação tributária, conforme dispõe o artigo 30.° do RGIT, não exigindo a norma qualquer pedido expresso, conforme refere a douta sentença
46. In casu, conforme decorre dos registos informáticos da Direcção Geral dos Impostos, regulariza o sujeito passivo a prestação tributária com a apresentação da declaração de rendimentos modelo 22 respeitante ao exercício de 2014, mostrando-se o tributo apurado integralmente pago.
47. A douta decisão o que diz é que foram notificados os elementos apurados, constantes do auto de notícia, mas auto que a recorrente nunca viu por não lhe ter sido notificado.
48. Sendo certo que determina o n.° 5 do artigo 30.° do RGIT, que se o pagamento da coima com redução não for efectuado ao mesmo tempo que a entrega da prestação tributária, é o contribuinte notificado para o efectuar no prazo de 15 dias, sob pena de ser levantado auto de notícia e instaurado o competente processo de contra-ordenação.
49. Ora, o contribuinte procedeu à regularização da situação tributária relativa ao exercício de 2014.
50. Donde, é considerado montante mínimo 20% da prestação tributária, por se tratar de pessoa colectiva, nos termos do n.°1 do artigo 31.° do RGIT, reduzida para 25%, nos termos do que dispõe a alínea b) do n.°1 do artigo 29.° do RGIT.
51. Os presentes autos foram autuados por infracção à alínea a) do n.° 1 do artigo 104.° do CIRC.
52. Sendo que, nos termos do n.°2 do mesmo normativo, há lugar a reembolso quando o valor apurado na declaração, líquido das deduções a que se referem os n.°s 2 e 4 do artigo 90.° do CIRC, for negativo, pela importância resultante da soma do correspondente valor absoluto com o montante dos pagamentos por conta.
53. Mais, nos termos do n.° 5 ainda do mesmo normativo, caso não tenha sido efectuado o pagamento a que se refere a alínea a) do n.° 1, começam de imediato a correr juros compensatórios que serão contados até ao termo do prazo para envio da declaração ou até à data do pagamento da autoliquidação, se anterior.
54. Mostrando-se o tributo apurado em sede de IRC integralmente pago e, sendo certo que foi em valor superior ao que seria apurado caso houvesse a deduzir pagamento por conta, entende a ora recorrente ser a coima aplicada pena demasiado severa, para infracção que só foi praticada, devido às enormes dificuldades com que se debatem as empresas actualmente, em cumprir com todas as obrigações fiscais, mormente as ligadas ao ramo da agricultura no caso particular, apenas de alfaces.
55. Contudo e ainda assim, não deixou de proceder à autoliquidação atempada do IRC apurado que necessariamente foi em valor superior ao que teria de suportar uma vez não haver pagamento por conta a deduzir.
56. Por tudo o que se motiva deve a douta decisão decidir pela invocada nulidade insuprível por ausência de notificação do auto de notícia, cujo efeito é a anulação dos actos subsequentes do processo.
57. Em alternativa decidir pela aplicação da coima com redução nos termos invocados.
58. Por último, o que ainda assim constitui elevado encargo para a recorrente, que se debate diariamente com dificuldades para se manter no mercado, que decida a douta decisão do Tribunal ad quem, pela aplicação da coima correspondente ao mínimo legal com redução a metade.
Termos em que requer a V. Ex.ª seja o recurso admitido por estar em tempo concedendo a douta decisão do tribunal ad quem provimento ao mesmo por provado, reconhecendo a nulidade insuprível praticada no processo de contra ordenação, por impossibilidade de aferir a competência do funcionário que procede ao levantamento do auto de noticia. Mais requer a V.Ex.ª decida pela aplicação da coima reduzida conforme o motivado em alternativa pela aplicação do mínimo legal com redução a metade, uma vez se encontrar o tributo apurado em sede de IRC integralmente pago.»

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A recorrida, devidamente notificada para o efeito não contra-alegou.

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A Magistrada do Ministério Público pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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A questão prévia a decidir nos presentes autos prende-se com a prescrição do procedimento contraordenacional.

II. FUNDAMENTAÇÃO
A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:


A) Contra “H..., LDA” foi levantado um “Auto de Notícia” a 28-2-2015, onde consta como “Elementos da Infracção”, o seguinte:

“1. Imposto/Trib.: Imposto sobre Rendimento Pessoas Colectivas (IRC]
2. Valor da prestação tributária em falta: 11.470,95
3. Período a que respeita a infração: 2014/07
4. Termo do prazo para cumprimento da obrigação: 2014-07-31
5. Normas infringidas: Art 104.º n.°1 a) CIRC - Falta de entrega de Pagamento por Conta
6. Normas punitivas: Art. 114 n.° 2, 5 f) e 26 n.° 4 do RGIT - Falta de entrega de pagamento por conta” (cf. auto de notícia de fls. 4 dos autos).

C) Em 1-3-2015 foi autuado, pelo Serviço de Finanças de Torres Novas, o processo de contraordenação n.° 2119201506000... contra a ora Recorrente, por infracção do artigo 104.°, n.° 1, alínea a) do Código de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) e punida pelos artigos 114.°, n.°s 2 e 5 alínea f) e 26.°, n.° 4 do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT).

D) Em 1-3-2015, foi emitido um Ofício dirigido à arguida, para efeitos do exercício do direito de defesa, no qual expressamente consta que a infracção do artigo 104.° n.° 1, alínea a) do Código de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) é punível entre a coima mínima que se cifra em € 3.441,28 e a máxima no montante de € 11.470,95 (cf. fls. 6 dos autos).

E) Em 14-4-2015, por despacho do Chefe de Finanças de Torres Novas, foi proferida “Decisão da Fixação da Coima”, cujo teor se reproduz:
"(…)


«Imagem no original»


F) Em 14-4-2015, foi emitido o Ofício dirigido à ora recorrente da decisão da fixação da coima (cf. fls. 9 dos autos).

G) Em 12-5-2015, foi apresentado o respectivo recurso da decisão de aplicação da coima (cf. fls. 10 dos autos).

H) Em 25-5-2014, a Recorrente apresentou via internet, a Declaração Modelo 22 de IRC relativa ao exercício de 2013, da qual se extrai que, o cálculo dos pagamentos por conta era de € 1.148,00 (cf. fls. 23/30 dos autos).

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A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos ao processo e acima referidos em cada um dos pontos do probatório.

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.»
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Antes do conhecimento dos fundamentos do recurso da arguida, cumpre conhecer da prescrição do procedimento contraordenacional por se tratar de questão de conhecimento oficioso (cf. acórdão do STA de 20/05/2020, proc. n.º 01901/15.7BELRA, em cujo sumário se pode ler: “ I - Jurídico-conceptualmente, a prescrição do procedimento contra-ordenacional agrega a excepção peremptória (pressuposto processual negativo) de conhecimento oficioso em qualquer altura do processo, até à decisão final (cfr. artºs.35 e 193, al.b), do C.P.Tributário, e 27, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aprovado pelo Dec.Lei 433/82, de 27/10; artº.33, do R.G.I. Tributárias), obstando à apreciação da matéria de fundo e gerando o arquivamento dos autos.”).

Dispõe o art. 33.º n.º 1 do RGIT que o procedimento por contraordenação se extingue, por efeito da prescrição, decorridos cinco anos sobre a prática do facto.

Para determinar o momento da prática da infração é necessário ter em conta que o facto se considera praticado no momento em que o agente atuou ou, no caso da omissão no momento em que deveria ter atuado ou naqueles em que o resultado típico se tiver produzido (art. 5.º, n.º 1 do RGIT), sendo que “As infracções tributárias omissivas se consideram praticadas na data em que termine o prazo para o cumprimento dos respectivos deveres tributários” (art. 5.º, n.º 2 do RGIT).

Contudo, nos termos do n.º 2 o prazo de prescrição é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infração depender daquela liquidação. Trata-se de um prazo especial relativamente ao n.º 1, sendo casos em que a existência da contraordenação depende da liquidação da prestação tributária os previstos nos arts. 108.°, n.°1, 109.°, n.° 1, 114.°, 118.° e 119.°, n.° 1, todos do RGIT (nesse sentido, v. Jorge Lopes de Sousa, e Manuel Simas Santos, in Regime Geral das Infracções Tributárias – anotado, 3.ª ed., anotação ao art. 33.º , Áreas Editora, p. 320. Também nesse sentido, cf. acórdão do STA de 20/05/2020, proc. n.º 01901/15.7BELRA, cujo sumário é o seguinte “(…) II-O vigente prazo de prescrição do procedimento contra-ordenacional está estabelecido no artº.33, do R.G.I.T., norma que mantém no seu nº.1 o prazo geral de cinco anos, já consagrado no anterior artº.119, da L.G.Tributária, tal como no artº.35, do C.P.Tributário, no atinente às contra-ordenações fiscais não aduaneiras. III - Por seu turno, o nº.2, do artº.33, do R.G.I.T., estabelece um prazo especial idêntico ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infracção depender daquela liquidação, sendo os casos em que a existência da contra-ordenação depende da liquidação da prestação tributária os previstos nos artºs.108, nº.1, 109, nº.1, 114, 118 e 119, nº.1, todos do R.G.I.T. IV - Mas está abrangida no prazo prescricional prognosticado no artº.33, nº.2, do R.G.I.T., a infracção tributária decorrente da violação do regime de autoliquidação e pagamento do I.V.A., enquadrável em termos de responsabilidade contra-ordenacional no artº.114, do R.G.I.T. (…)”.

Como se sumariou no acórdão do TCAS de 16/12/2020, proc. n.º 1579/13.2BESNT:

“Para efeitos de aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 33.º do RGIT, deve entender-se que a infração depende da liquidação sempre que a determinação do tipo de infração ou da sanção que lhe é aplicável depende da prévia determinação do valor da prestação tributária devida.

II-Tendo sido imputada infração à Arguida punida pelo artigo 114.º, nºs. 2, e 5, al.f), do RGIT, e estando a mesma dependente do apuramento do imposto em falta o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional tem de ser igual ao prazo de caducidade do direito à liquidação desse imposto, o qual, de harmonia com o artigo 45.º, nº.4, da LGT, é de quatro anos contados a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.

Como se escreve no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 28.04.2010 - Processo: 0777/09: “… sendo aplicável o prazo previsto no n.º 1 do artigo 33.º, o procedimento extingue-se logo que sobre a prática do facto sejam decorridos cinco anos. O que significa que o prazo prescricional é contado desde o dia em que a infracção foi praticada, o que, aliás, se encontra em consonância com a regra do artigo 119.º do Código Penal. Já se for aplicável o prazo especial previsto no n.º 2, o procedimento extingue-se logo que volvido o prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária, e não quando decorrido determinado prazo sobre a prática da infracção. E, nessa medida, importa estar atento ao dia em que ocorre a caducidade do direito à liquidação para determinar a data em ocorre a prescrição do procedimento por contra-ordenação” – no mesmo sentido, v. também acórdão do STA de 16/09/2020, proc. n.º 01476/15.7BELRA).

Por outro lado, se antes daquele prazo se completar, ocorrerem causas de interrupção ou de suspensão do prazo de prescrição, estas deverão ser consideradas nos termos do n.º 3 do art. 33.º do RGIT. Dispõe este preceito legal que “O prazo de prescrição interrompe-se e suspende-se nos termos estabelecidos na lei geral, mas a suspensão da prescrição verifica-se também por efeito da suspensão do processo, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 42.º, no artigo 47.º e no artigo 74.º, e ainda no caso de pedido de pagamento da coima antes de instaurado o processo de contra-ordenação desde a apresentação do pedido até à notificação para o pagamento.”

Assim, o prazo de prescrição do procedimento por contraordenação interrompe-se nos termos estabelecidos na lei geral, ou seja, nos termos do disposto no art. 28.º do RGCO:

1 - A prescrição do procedimento por contra-ordenação interrompe-se:
a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação;

b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa;

c) Com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito;

d) Com a decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima.

2 - Nos casos de concurso de infracções, a interrupção da prescrição do procedimento criminal determina a interrupção da prescrição do procedimento por contra-ordenação.

3 - A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade.”

Por outro lado, o prazo de prescrição suspende-se nos casos previstos no art. 27.º-A do RGCO:

“1 - A prescrição do procedimento por contra-ordenação suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento:
a) Não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal;
b) Estiver pendente a partir do envio do processo ao Ministério Público até à sua devolução à autoridade administrativa, nos termos do artigo 40.º;
c) Estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso.
2 - Nos casos previstos nas alíneas b) e c) do número anterior, a suspensão não pode ultrapassar seis meses.”

De igual modo, o prazo de prescrição do procedimento de contraordenação suspende-se nos termos do n.º 3, do art.º 33.º do RGIT:

i) Por efeito da suspensão do processo, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 42.º, no artigo 47.º e no artigo 74.º;

ii) No caso de pedido de pagamento da coima antes de instaurado o processo de contraordenação desde a apresentação do pedido até à notificação para o pagamento.

Importa ainda ter presente que a suspensão do prazo de prescrição impede que o prazo da prescrição decorra enquanto se mantiver a causa que a determinou, ou seja o prazo de prescrição só volta a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão (cf. n .° 6 do art. 120.°- do Código Penal, ex vi art. 32.º do RCGO, ex vi art. 33.º, n.º 3 do RGIT), e portanto, na contagem importa considerar o tempo decorrido antes da verificação da causa de suspensão adicionado ao tempo decorrido após essa causa ter desaparecido.

Diversamente, havendo causa (s) de interrupção do prazo de prescrição o tempo decorrido antes da causa de interrupção fica sem efeito, uma vez que depois de cada interrupção começa a correr novo prazo de prescrição (cf. n.º 2 do art. 121.º do Código Penal, ex vi art. 32.º do RCGO, ex vi art. 33.º, n.º 3 do RGIT).

Finalmente, importa ainda considerar que nos termos do n.º 3 do art. 28.º do RGCO “3 - A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade.”

Este preceito legal estabelece um prazo de prescrição máximo do procedimento (obstando à perpetuação do prazo de prescrição por força de sucessivas interrupções que renovam o prazo de prescrição) apenas releva o tempo de suspensão, não sendo de considerar qualquer interrupção ocorrida no procedimento.

Este prazo de prescrição apenas se aplica supletivamente, ou seja, se no caso concreto não tiver se completado o prazo ordinário de prescrição previsto no n.º 1, ou n.º 2 do art. 33.º do RGIT (cf. nesse sentido, entre outros, v. acórdãos do TCAS de 14/04/2016, proc. n.º 08986/15, e de 24/01/2020, proc. n.º 2707/06.0BELSB).

Apliquemos, então o direito ao caso dos autos.

In casu, tendo sido praticada uma infração consubstanciada na falta de entrega de pagamento por conta, punível nos termos do disposto no art. 114.º, n.º 2, e 5 alínea a), e art. 26.º n.º 4, ambos do RGIT, aplica-se o prazo de prescrição especial previsto no n.º 2 do art. 33.º do RGIT, uma vez que essa infração depende da liquidação da prestação tributária.

Deste modo, o prazo de prescrição é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária, ou seja, 4 anos (cf. art. 45.º, n.º 1 da LGT) contados a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, por estarmos perante um imposto periódico (n.º 4, do art. 45.º da LGT).

Portanto, in casu, o momento da prática da infração é o dia 31/07/2014 (cf. alínea E) da matéria de facto), contando-se o prazo de prescrição de 4 anos, previsto no n.º 2, do art. 33.º do RGIT a partir de 01/01/2015 (art. 45.º, n.º 4 da LGT). Portanto, se não se verificasse qualquer causa de suspensão ou interrupção do prazo, se completaria no dia 31/12/2018.

Contudo, no caso vertente, a última causa de interrupção do prazo de prescrição ocorreu 17/04/2015, com a notificação da decisão administrativa de aplicação de coima (cf. alínea F) da matéria de facto, conjugado com o art. 39.º, n.º 1 do CPPT, ex vi art. 70.º, n.º 2 do RGIT), pelo que o tempo decorrido antes da causa de interrupção fica sem efeito, e reinicia-se a contagem do prazo de prescrição de 4 anos a partir de 18/04/2015, e assim sendo, não correndo causas de suspensão o prazo que se completaria em 18/04/2019.

Porém, importa ainda considerar a única causa de suspensão do prazo de prescrição, ou seja, a prevista na alínea c), do n.º 1, do artigo 27.º-A, que por força do n.º 2 tem como limite máximo o prazo de 6 meses, e, portanto, o prazo ordinário de prescrição de 4 anos completou-se em 18/10/2019.

Pelo exposto, conclui-se que o procedimento contraordenacional se encontra prescrito, o que conduz à sua extinção, nos termos da alínea b) do art. 61.º do RGIT, devendo ser determinado o arquivamento do processo nos termos do art. 77.º do RGIT, e art. 64.º, n.º 3 do RGCO.

Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC)

Tendo sido praticada uma infração consubstanciada na falta de entrega de pagamento por conta, punível nos termos do disposto no art. 114.º, n.º 2, e 5 alínea a), e art. 26.º n.º 4, ambos do RGIT, aplica-se o prazo de prescrição especial previsto no n.º 2 do art. 33.º do RGIT, uma vez que a infração depende da liquidação da prestação tributária, pelo que o prazo de prescrição é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária, in casu, 4 anos contados a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.

DECISÃO


Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em julgar extinto por prescrição o procedimento de contraordenação objeto dos presentes autos, determinando o arquivamento do processo nos termos do art. 77.º do RGIT, e art. 64.º, n.º 3 do RGCO.


Sem custas - artigos 94.º, n.º 3 e 4 do RGCO, aplicável ex vi, art. 3.º, alínea b) do RGIT.

D.n.

Lisboa, 14 de outubro de 2021.


Cristina Flora (Relatora)

Patrícia Manuel Pires (1.ª adjunta)

Vital Lopes (2.º adjunto)