Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:636/10.1BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:03/11/2021
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:IVA;
CADUCIDADE;
SOCIEDADE RESIDENTE EM ESPANHA QUE VENDE CARTÕES TELEFÓNICOS A CIDADÃOS PORTUGUESES.
Sumário:1. Se depois da primeira notificação das liquidações de IVA dentro do prazo de caducidade a AT corrigiu o montante relativo a juros compensatórios em benefício do Contribuinte e procedeu a nova notificação que ocorreu já depois de completado o prazo de caducidade, esta não opera por que a “nova” liquidação nada tem de inovador e além do mais é favorável ao contribuinte.

2. Não sendo a nova notificação lesiva e não comportando qualquer novidade, os elementos essenciais da liquidação foram definidos na primeira notificação e é esta que deve relevar para efeitos de caducidade.

3. Estando a Impugnante matriculada em Espanha, onde tem escritório, armazena os cartões telefónicos que depois vende a clientes portugueses, e ali paga impostos, não é sujeito passivo de IVA em Portugal, não obstante os sócios e administrador único residirem em Portugal.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

RECORRENTE: Autoridade Tributária
RECORRIDO: E........, SL.
OBJECTO DO RECURSO:
Sentença proferida pelo MMº juiz do TAF de Sintra que julgou procedente a Impugnação Judicial deduzida por E........, SL., contra as liquidações adicionais de IVA e Juros Compensatórios dos períodos 050ST, 0506T, 0509T, respectivamente, de € 66.221,75, € 114.326,17, € 256.269,83 e € 352.566,00.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
I - Quanto à caducidade das liquidações adicionais de IVA referentes ao ano de 2005, verifica-se que a Impugnante no que respeita ao IVA de 2005 foi objecto de duas notificações.
II - A primeira das referidas notificações ocorreu em 28/12/2009, cf. Doc. 1 junto com a Petição Inicial pela Impugnante.
III - E assim sendo, a notificação do imposto relativo ao ano de 2005 ocorreu dentro do prazo de caducidade.
IV- O facto de haver posteriormente, por iniciativa da Administração Fiscal, sido corrigido a favor do sujeito passivo o valor do imposto inicialmente liquidado, com redução do valor de imposto cujo pagamento lhe era exigido, bem como o facto de lhe haver sido conferido novo prazo para efectuar o pagamento e apresentar os seus meios de defesa, não obsta à necessária consideração da eficácia da notificação da primeira liquidação no sentido de impedir a ocorrência da caducidade do direito de liquidar o imposto.
V - O mesmo não sucederia, evidentemente, caso da liquidação adicional resultasse um agravamento da situação do contribuinte.
VI - Com efeito, como resulta do determinado no artigo 78° da LGT, a revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou, por iniciativa da Administração Tributária, pode ser feita no prazo de quatro anos após a liquidação, como sucede no caso sub judice, podendo inclusivamente ser feita a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.
VII - A situação dos autos deverá seguir o mesmo regime da anulação parcial de liquidação na sequência de procedência de Impugnação “mutatis mutandis" por nenhumas razões atendíveis justificarem "in casu" um regime diferente, veja-se o que nos diz o Acórdão n° TCAS_00021 /04 de 09-01 -2007,
"A sentença entendeu que a revogação parcial operada no âmbito do processo de impugnação judicial n.° 31/99 do 1.° Juízo, 2.a Secção do TT de 1* Instância de Lisboa (cfr. ais. B), C), I) e J) do Probatório), não operou a realização de um acto de liquidação inovatório susceptível de impugnação judicial autónoma: trata-se apenas de uma correcção dos anteriores actos de liquidação efectuados na sequência da interposição de uma impugnação judicial.
E, adianta-se desde já, julga-se que a sentença decidiu de acordo com a lei."
VIII-Prosseguindo:
“ Com efeito, tal como se diz na sentença, a dita revogação parcial operada no âmbito do processo de impugnação judiciai n.° 31/99 não operou a realização de um acto de liquidação inovatório susceptível de impugnação judicial autónoma: trata-se apenas de uma correcção dos anteriores actos de liquidação efectuados na sequência da interposição de uma impugnação judicia/’'.
IX- Acrescentando ainda que:
" Todavia, não cremos que se esteja perante uma nova liquidação, na formulação que lhe pretende dar a recorrente (...) Estamos assim não perante uma nova liquidação mas perante uma liquidação corrigida, sendo que nem sequer vem alegado que a “nova” liquidação seja substancialmente diversa da anterior, sendo curial pensar que daquela foram rectificadas as verbas cujo provimento aconteceu em resultado daquele despacho de 22/3/99/’
X- E ainda que:
E também pelas razões apontadas, não se pode falarem caducidade do direito do Estado à liquidação (Conclusão E do recurso), pois que as liquidações relevantes foram feitas em tempo útil.
Acresce que é pacífico que, visando a impugnação judicial a anulação dos actos de liquidação ou outros a que a lei confira esta forma de reacção processual, se só em parte tais actos estiverem afetados pela ilegalidade ou pelo vício invocados, só nessa parte deverão ser anulados e não a sua totalidade.
Na verdade, o acto tributário é divisível, tanto por natureza como na própria expressão legal, consequentemente, pode ser só parcialmente anulado, quer pela AT quer peto tribunal, ou seja, pode ser anulado apenas na parte em que sofra de vício que afecte a sua validade, como apontam as normas dos arts. 130.°n.°3 e 145.°do CPT, 79.°n.° 1 e 100.°daLGT e Hl^nSÔdo CPPT(neste sentido, cfr: entre outros, os acs. do STA, de 26/3/2003 e de 27/9/2005, recursos n.°s 1973/02 e 287/05-30, respectivamente).
E também por isso, como se diz no citado ac. do STA, de 22/3/2005, não «pode falar-se em reforma do acto tributário, que se verifica quando a lei manda substituir uma liquidação praticada, por posterior variação da matéria colectável. Aqui, estamos perante uma modificação superveniente do objecto do acto tributário. E, ao contrário do que sucede na anulação parcial, não se mantêm os efeitos produzidos pela liquidação primitiva. 
Esta é integralmente revogada e substituída por um acto novo que reaprecia directamente a situação tributável (Conceito e natureza do Acto Tributário, Alberto Xavier, págs. 129 e 130)”
XI - No caso concreto dos autos, surgindo as segundas notificações com intuito de rectificar erros que haviam sido detectados pela Administração Tributária relativamente às notificações iniciais, deverá ser atendível o facto de o contribuinte não ser prejudicado, permitindo a rectificação desses erros que o penalizam o mais rapidamente possível, não tomando essa rectificação dependente de uma eventual reclamação ou impugnação do acto.
XI - Por essa razão, não se deverá cominar aquela revogação parcial do acto com a impossibilidade de cobrar o imposto efectivamente devido por verificação do prazo de caducidade, quando a notificação do imposto liquidado já havia sido efectuada dento do respectivo prazo de caducidade.
XII - Por outro lado, caso fosse entendido dever retirar-se eficácia às segundas notificações, não se poderá considerar que, sendo ineficazes, são susceptíveis de revogar o acto de liquidação inicia).
XIII - No que se refere à apreciação da fundamentação das liquidações sindicadas, constante da douta sentença recorrida, cumpre referir que na parte final da douta sentença é referido que de acordo com a al. a) do n.° 1 do art. 2º do CIVA a qualidade do sujeito passivo não está dependente da verificação do “critério da direcção efectiva.”
XIV - Prosseguindo, dizendo que: “É certo que o “critério da direcção efectiva" é relevante para a qualificação ou não da qualidade de residente para efeitos de IRC (...) mas já será irrelevante para a aplicação das regras de inscrição como sujeitos passivos de IVA.” E que: o chamamento da CDT celebrada entre Portugal e Espanha efectuado pela Administração Tributária é "completamente descabida”, visto que aquele convénio afasta o IVA do seu âmbito de aplicação."
XV - A douta sentença, no entanto, se nos diz que a Impugnante deveria ser considerada sujeito passivo caso cumprisse as condições previstas no artigo 2º do CIVA, não refere se as cumpre ou não.
XVI - Nos termos do artigo 2º n.° 1 al. a) do CIVA (norma que define a incidência pessoal do IVA - como decorre aliás do teor da douta sentença ora recorrida) são sujeitos passivos de IVA as pessoas singulares ou colectivas que de modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços em território nacional.
XVII - Ora, a Impugnante é na verdade uma pessoa colectiva que exerce, em Portugal, de modo independente e com carácter de habitualidade uma actividade de “comercialização de cartões telefónicos de chamadas".
XVIII - Veja-se nesse sentido o que a Impugnante refere no artigo 7° da sua Petição Inicial onde refere que a "E........ realiza efectivamente operações internas no território Espanhol pese embora de expressão material menor, quando comparada, essa materialidade, com as operações que realiza em Portugal." 
XIX - Admite ainda nos artigos 8º e 9º da sua Petição Inicial ao facto de os seus clientes são fundamentalmente pessoas físicas ou jurídicas com número de identificação fiscal português para efeito de IVA.
XX - O relatório dos serviços de inspecção tributária, junto aos pela Impugnante como documento 5 da sua PI, em que se baseiam as liquidações de IVA controvertidas nos presentes autos refere que a Impugnante tem a sua direcção efectiva em Portugal.
XXI - Contudo, verifica-se que da referida acção inspectiva resultaram correcções relativas a IVA e IRC, e, como bem nota a douta sentença recorrida, o critério da direcção efectiva encontra-se previsto no CIRC.
XXII - No que respeita ao IVA, pode ler-se no referido relatório (depois de considerar que “O Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), nas normas de incidência pessoal, qualifica como residente, "... as pessoas colectivas e outras entidades que tenham sede ou direcção efectiva em território português." Assim face ao artigo 2º, n.° 3 daquele código considera-se a E........ como sujeito passivo de IRC’) que: “Por outro lado, nos termos do artigo 2°. n.° 1. al. a) do Código do Imposto sobre Valor Acrescentado (CIVA) referente à incidência pessoal, a E........ é igualmente sujeito passivo desse imposto. ” (sublinhado nosso)
XXIII - Ora, não restam dúvidas de que (ainda que não se mostrasse preenchido o critério da direcção efectiva em Portugal da E........), nos termos do art. 2º, n.° 1, al. a) do Código do Imposto sobre Valor Acrescentado (CIVA) referente à incidência pessoal, a E........ é sujeito passivo desse imposto.
XXIV - Sendo que, o facto de ser mencionado naquele relatório o critério da direcção efectiva em Portugal da E........, como bem reconhece a douta sentença faz sentido por referência à sujeição desta sociedade a IRC, daí não se pode retirar que: entendendo a Administração Fiscal que a Impugnante é sujeito passivo de IRC em Portugal, não o poderá ser de IVA.
XXV - Com efeito revela-se relevante saber se a Impugnante é ou não sujeito passivo de IVA.
XXVI - A douta sentença recorrida, contudo, nenhuma menção faz ao facto de a Impugnante não ser sujeito passivo de IVA, embora aceitando que a qualidade de sujeito passivo deve ser aferida de acordo com a al. a) do n.° 1 do art. 2º do CIVA, como decorre do relatório de inspecção.
XXVII - Certo é que, de acordo com a al. a) do n.° 1 do art. 2º do CIVA, contrariamente ao que, aparentemente, pretende o Impugnante, não depende a sua qualificação como sujeito passivo de IVA em Portugal que os seus clientes sejam “exclusivamente" portugueses.
XXVIII - A douta sentença considera não estar verificada a direcção efectiva em Portugal, prevista no CIRC e na CDT, e por essa razão não ser a Impugnante sujeito passivo de IVA em Portugal, porém, a Administração Fiscal, considera ser a Impugnante sujeito passivo de IVA em Portugal, atento o disposto no artigo 2º n.° 1, al. a) do CIVA, e além disso considera que se encontra verificada a sua direcção efectiva em Portugal, entendimento aliás partilhado pelas autoridades fiscais Espanholas, conforme comunicado à Direcção de Finanças de Lisboa pela Direcção de Serviços de Investigação da Fraude e Acções Especiais (DSIFAE) através do ofício n.° 2.092 de 15/07/2008 de 15/07/2008.
XXIX - Até porque, mais do que um mero juízo de valor quanto à forma como a Impugnante exerce a sua actividade, constataram as Administrações Fiscais destes dois países, como referido no Relatório da Inspecção Tributária, conforme transcrito em E) do probatório, que: não só não possuía a Impugnante estrutura empresarial em Espanha que suportasse o exercício da sua actividade naquele país, como efectivamente a desenvolvia em Portugal e bem assim atenta a forma desse exercício, designadamente, exclusivamente através dos seus sócios, residentes em Portugal, aqui se encontrava situado o real centro de decisão, não fazendo, em nosso entender, sentido eventuais deslocações a Espanha para a tomada das decisões, e a sua direcção efectiva.
XXX - Não obstante, da não consideração da direcção efectiva em Portugal, nunca se pode retirar que deixe a Impugnante de ser sujeito passivo de IVA em território nacional, uma vez que aqui exerce efectivamente a sua actividade
XXXI - É que consta do relatório da inspecção tributária, em que assentam as liquidações controvertidas que "(...) a E........ procede à transmissão dos cartões integralmente para Portugal, não só para a empresa E........, principal cliente, como também para diversos pequenos retalhistas (quiosques). Nesse momento, é feita a activação dos cartões telefónicos virtuais de chamadas pelo operador português de rede fixa S........ S.A. (PT .......), ex N........, entidade com quem a E........ celebrou um contrato de parceria tecnológica. A S........ é responsável peia activação desses cartões e pela gestão da “linha” telefónica que permite efectuar as chamadas por parte dos consumidores finais. Ressalta assim claro que o que está efectivamente em causa é a prestação de serviços de telecomunicações e não a venda de cartões telefónicos, porquanto estes constituem apenas o suporte físico de minutos de chamadas (razão pela qual se utiliza a expressão cartões telefónicos virtuais de chamadas”).”
XXXII - E, se dúvidas houvessem quanto ao exercício da actividade em território nacional, refere ainda o relatório que: “São os próprios sócios que de forma regular se deslocam a Badajoz para recolher parte da mercadoria e distribuí-la em Portugal, sendo que a restante mercadoria ou é enviada de Espanha para Portugal por outros meios (correio ou empresas de transporte), ou é enviada directamente de Inglaterra para Portugal."
XXXIII - Acrescendo que, consta do referido relatório, por referência à informação prestada pela Administração Fiscal Espanhola: “Em qualquer dos casos os cartões telefónicos virtuais de chamadas são vendidos sempre a clientes portugueses ou a entidades com número de identificação fiscal português”.
XXXIV - E, acresce ainda que, como se refere naquele relatório: foi promovida em 2009-09-14 a inscrição oficiosa da sociedade E........ S.L. como sujeito passivo residente em território nacional com início de actividade em 2005-01-01.
XXXV - Sendo que, por via do citado registo oficioso de início de actividade para efeitos fiscais, o sujeito passivo foi enquadrado no regime de tributação geral em sede de IRC e no regime normal de periodicidade trimestral em termos de IVA, tendo-lhe sido atribuído o domicílio fiscal do sócio à data (2009-09-14), isto é a Rua…………….., ……..ESTORIL.
XXXVI - Deste modo, considerando que a impugnante assumiu a qualidade de sujeito passivo por via da sua inscrição oficiosa e início de actividade naquela data, é devida a liquidação do IVA, correspondente aos anos de 2005 e 2006.
XXXVII - Há, que referir, porém, que mesmo que a Impugnante não tivesse residência fiscal em Portugal, ainda assim seriam sujeitas a IVA em território nacional as operações objecto de correcção pela Administração Tributária.
XXXVIII - Ora, veja-se o que alega o impugnante no artigo 5o da sua PI: “(...) No que tange ao enquadramento das operações levadas à prática pela aqui impugnante a partir de Espanha aceita-se que estamos perante prestações de serviços e, por isso, enquadráveis para efeitos de IVA na alínea j) do n.° 8 e n.° 9 do art.° 6o do CIVA (na redacção à data anterior a 1.1.2010), ou seja, com sujeição a imposto na sede, estabelecimento estável ou domicílio do adquirente registado como sujeito passivo.”
XXXIX - Sucede que, tendo os adquirentes dos serviços em causa nos autos a qualidade de sujeitos passivos registados em território nacional (Portugal), conforme valores declarados pela Impugnante no sistema VIES como transmissões intracomunitárias de bens destinadas a operadores com NIF português, Anexo 4 ao relatório da inspecção tributária, resulta com meridiana clareza que sempre seriam aquelas prestações de serviço sujeitas a Imposto em Portugal.
XL - A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não merecendo por isso ser confirmada.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça.”

CONTRA ALEGAÇÕES:

Não houve contra-alegações apresentadas pela entidade recorrida.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer no sentido da procedência do recurso.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar procedente a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de IVA.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

A) A Impugnante é uma sociedade de direito espanhol com sede em Badajoz. ( Doc. n.° 26 junto á p.i.)
B) A Impugnante dedica-se à comercialização de cartões telefónicos virtuais de chamadas.
C) Em 30.05.2008, na sequência do pedido de cooperação administrativa efectuado ao abrigo do art. 5º do Regulamento (CE) n.° 1798/2002, acerca da Impugnante foi pela Administração Fiscal Espanhola - Delegacion Especial de Estremadura elaborada a informação junta a fls. 84/98 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.
D) A Impugnante foi objecto de uma inspecção interna, tendo por base as Ordens de Serviço n.° 0I 200907653 e OI200907654 de 19.10.2009, com despacho de 20.10.2009, incidindo sob os exercícios de 2005 e 2006 (IVA e IRC).
E) Na sequência da acção inspectiva a que alude a al. D) do probatório, foi elaborado o Relatório Final, do qual se extrai designadamente o seguinte:
"II. 2. Motivo, Âmbito e Incidência Temporal
Com base na informação espontânea prestada em 2008-06-30 pela Administração Fiscal espanhola acerca da sociedade E........ S. L., foi elaborada informação sancionada favoravelmente pelo Director de Finanças de Lisboa, na qual se considerou que apesar de se tratar de uma sociedade de direito espanhol, possui o seu centro de decisão e a sua direcção efectiva em Portugal, aqui exercendo de facto a sua actividade (ver ponto 113.1 deste relatório). Deste modo, as presentes ordem de serviço foram abertas para em face das normas de incidência constantes do CIRC e CIVA, tributar o resultado da actividade obtida pela E........, SL. bem como as transacções efectuadas em território nacional, respectivamente, em 2005 e 2006.
O âmbito desta acção de inspecção é parcial e incide sobre o IRC e o IVA tendo por extensão os exercidos de 2005 e 2006.
II. 3. Outras Situações
113.1. Desenvolvimento da acção
• Através do Oficio n.° 2092 de 2009-07-15 da Direcção de Serviços de Investigação da Fraude e Acções Especiais (DSIFAE), foram remetidas a esta Direcção de Finanças as seguintes informações prestadas pela Administração Fiscal Espanhola, sobre a sociedade E........ S.L. registada em Espanha com o número de IVA ES- 806399547
- Informação espontânea prestada pela Delegación Especial de Extremadura [No âmbito do acordo bilateral transfronteiriço para a troca directa de irformação de 2008-05-30 (Cfr. Anexo 1 folhas 6 a 13);
- Resposta a um pedido de cooperação administrativa efectuado ao abrigo do art.º 5° do Regulamento (CE) n. 1798/2003, de 2006-09-19 (Cfr. Anexo 1 folhas 14 a 19).
• As conclusões transmitidas pela Administração Fiscal espanhola, foram vertidas de forma resumida em informação elaborada em 2009-07-03 conforme segue (Cfr. Anexo 1):
1. A E........o S.L., sociedade constituída em Espanha em 2003, de acordo com o Sistema de Troca de Informação sobre o IVA (VIES) tem domicílio fiscal na CL……………….., 06010 BADAJOZ, dedicando-se à comercialização de cartões telefónicos virtuais de chamadas.
2. Tem como sócios M........ e M........, ambos residentes em Portugal (casados conforme consta nas declarações de rendimentos de IRS).
3. M........ é administrador único da sociedade espanhola, sendo também actualmente sócio único da principal distribuidora de cartões telefónicos virtuais de chamadas em Portugal, a E........ ....... Lda. (PT.......).
Os cartões telefónicos virtuais de chamadas são impressos por uma gráfica inglesa e objecto de transmissão intra comunitária de bens para a empresa espanhola. Posteriormente a E........ procede à transmissão dos cartões integralmente para Portugal, não só para a empresa E........, principal cliente, como também para diversos pequenos retalhistas (quiosques). Nesse momento, é feita a activação dos cartões telefónicos virtuais de chamadas pelo operador português de rede fixa S........ - ……S.A. (PT .......), ex N.........., entidade com quem a E........ celebrou um contrato de parceria tecnológica. A S........ ê responsável pela activação desses cartões e pela gestão da "linha" telefónica que permite efectuar as chamadas por parte dos consumidores finais. Ressalta assim claro que o que está efectivamente em causa é a prestação de serviços de telecomunicações e não a venda de cartões telefónicos, porquanto estes constituem apenas o suporte físico de minutos de chamadas (razão peja qual se utiliza a expressão cartões telefónicos virtuais de chamadas).
5. Na informação espontânea supra mencionada, a Administração Fiscal espanhola reforça ainda as constatações da anterior resposta ao pedido de cooperação administrativa entre Estados-membros de que a E........:
a. Não dispõe de estrutura nem de meios materiais e humanos adequados e suficientes para o exercício de uma actividade comercial em Espanha, uma vez que não possui uma estrutura comercial própria e permanente, nem estabelecimento aberto ao público, nem trabalhadores por sua conta, sendo os únicos trabalhadores da empresa os próprios sócios, distribuindo em Portugal os cartões telefónicos virtuais de chamadas;
b. Encontra-se sediada num escritório de domiciliação em Badajoz (C.......... AGENCIA EMPRESARIAL) que lhe presta serviços de cedência do domicílio fiscal, de recepção de correspondência, mercadorias e outra documentação, elaborando ainda a contabilidade e arrendando-lhe um espaço de armazenagem dos referidos cartões. O sócio-administrador desse escritório de domiciliação é C.........., que é também representante legal da E........;
c. É titular de uma conta bancária do B.......... em Portugal a qual é utilizada para os pagamentos de maior valor;
d. São os próprios sócios que de forma regular se deslocam a Badajoz para recolher parte da mercadoria e distribuí-la em Portugal, sendo que a restante mercadoria ou é enviada de Espanha para Portugal por outros meios (correio ou empresas de transporte), ou é enviada directamente de Inglaterra para Portugal;
e. Em qualquer dos casos os cartões telefónicos virtuais de chamadas são vendidos sempre a clientes portugueses ou a entidades com número de identificação fiscal português;
f Deste modo, a Administração Fiscal espanhola considera que o centro de decisão assim, como a gestão dos negócios da E........, não estão localizados em Espanha.
Considera também que a passagem de mercadorias por Espanha é unicamente efectuada por conveniência económico-fiscal. Acrescenta mesmo que o domicílio fiscal declarado em Espanha constitui uma mera “ficção”, tendo inclusivamente procedido ao cancelamento oficioso do respectivo NIF para efectuar operações intercomunitárias.
Face ao descrito na referida informação, concluiu-se partilhar do entendimento da Administração Fiscal espanhola de que a gestão da actividade da E........, o centro de decisão e a sua direcção efectiva se situam efectivamente em Portugal.
A convenção para evitar a dupla tributação celebrada entre Portugal e Espanha, estabelece no seu artigo 4°, n° 3 que se "... uma pessoa, que não seja uma pessoa singular, for residente de ambos os estados Contratantes, será considerada residente do Estado em que estiver situada a sua direcção efectiva. " À luz deste preceito, e atendendo ao facto da direcção efectiva ser exercida em território português, recai sobre a E........ a qualidade de sujeito passivo residente em Portugal.
O Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), nas normas de incidência pessoal, qualifica como residente, "... as pessoas colectivas e outras entidades que tenham sede ou direcção efectiva em território português.", Assim face ao artigo 2.°, n.° 3 daquele código considera-se a E........ como sujeito passivo de IRC.
Por outro lado, nos termos do artigo 2°, n.° 1, al. a) do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) referente à incidência pessoal, a E........ é igualmente sujeito passivo desse imposto.
• Assim foi colocado à consideração superior, proceder ao registo da sociedade E........, SL como sujeito passivo residente em Portugal. Para o efeito, propôs-se a notificação à empresa E........, SL na pessoa do seu administrador único, M........, NIF .........., para entregar no prazo de 10 dias a declaração de registo e inicio de actividade a que se refere os artigos 109° n.° 1 al. a) do CIRC e 31° n.° 1 do CIVA, reportada a 2005-01-01, sem prejuízo de eventual inscrição oficiosa por parte destes Serviços, no caso de incumprimento da notificação.
• Tal proposta, constante da informação mencionada, obteve despacho favorável do Director de Finanças de Lisboa em 2009-07-03 (ver folha 1 do Anexo l), pelo que em 2009-07-09 foi notificado o sócio da E........ S. L., M........, Nlf .........., para conforme referido, entregar a declaração de registo e início de actividade reportada a 2005-01-01 (Cfr. Anexo 2). Não tendo o contribuinte mencionado cumprido a notificação, foi promovida em 2009-09-14 a inscrição oficiosa da sociedade E........ S.L. como sujeito passivo residente em território nacional com início de actividade em 2005-01-01.
* Por via do citado registo oficioso de inicio de actividade para efeitos fiscais, o sujeito passivo foi enquadrado no regime de tributação geral em sede de IRC e no regime normal de periodicidade trimestral em termos de IVA, tendo-lhe sido atribuído o domicílio fiscal do sócio à data (2009-09-14), isto é a Rua………, ……….ESTORIL.
• Em 2009-10-27, através do Oficio n.º 91.037 de 2009-10-26, foi notificado o Sr. M........, na qualidade de sócio-gerente da E........ S. L. para a sua morada actual (Rua……………………, ………. ESTORIL), para entregar, no prazo de 10 dias, as Declarações de Rendimentos Modelo 22, DAICF e Declarações Periódicas de IVA com referência aos exercícios de 2005 e 2006. A empresa E.......... foi notificada em 2009-10-29 pelo Oficio n. º 91.038 de 26-10-2009 do mesmo teor. Contudo à data deste relatório não foram enviadas quaisquer declarações referentes ao sujeito passivo em análise. (Cfr. Anexo 3)



11.1. Em sede de IVA
Conforme referido no capítulo anterior, o sujeito passivo, notificado para o efeito, não procedeu à entrega das Declarações de Rendimentos Modelo 22, DAICF e Declarações Periódicas de IVA dos anos de 2005 e 2006.
Face à falta de entrega de declarações que permitam aferir o resultado da sua actividade. e atendendo a que a sociedade E........ S.L. possui na realidade o centro de decisão e direcção efectiva em território nacional e não em Espanha, as transmissões de bens (cartões telefónicos) que declarou no sistema VIES destinadas a operadores com NIF português, em 2005 e 2006 deverão ser tributadas como operações internas, à taxa de IVA normal em vigor constante do art° 18.°, n°l, al. c) do CIVA.
O quadro abaixo evidencia o total das vendas declaradas de cartões telefónicos virtuais de chamadas a operadores com NIF português por ano e trimestre, bem como o IVA Liquidado à taxa em vigor, que deverá ser entregue pela E........: (...)





(a) Valores declarados no sistema VIES pela E........ como transmissões intracomunitárias de bens destinadas a operadores com NIF português - Cfr. ANEXO 4”. ( Doc. fls. 104/117 dos autos)
F) Com base no Relatório Final, o Chefe de Equipa emitiu o seguinte parecer: "(…) No que se refere ao IVA verificou-se que não liquidou e entregou imposto referente às transmissões de bens (cartões telefónicos) que declarou indevidamente no sistema de VIES e que deverão ser tributados como operações internas conforme o descrito no ponto III do relatório. Tal situação origina falta de liquidação e entrega de IVA nos cofres do Estado no montante de 67287,18 € em 2005 e 62517,68 em 2006."(Doc. fls. 104/117 dos autos)
G) Em 17.12.2009, o Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa exarou no parecer a que alude a al. F) do probatório, despacho de concordância. ( Doc. fls. 104/117 dos autos)
H) Mediante ofício sob o n.° 55840, emitido pela Direcção de Finanças de Lisboa datado de 07.07.2009, foi a Impugnante notificada para em 10 dias proceder à entrega da declaração de inscrição no registo e inicio de actividade a que se referem os art.s 109°, n.°l, al.a) do CIRC e 31°,n.°l do CIVA, com efeitos á data de 01.01.2005. (Doc. n.°4 junto á p.i.)
I) Através do ofício n.° 91037, emitido pela Direcção de Finanças de Lisboa datado de 26.10.2009, foi a Impugnante notificada para entregar a Declaração de Rendimento Mod.22 a que se refere a al.b) do n.°l do art. 109° do CIRC, Declaração Anual de Informação contabilística e fiscal a que se refere a al.c) do n.°l do art. 109° do CIRC e Declarações Periódicas de IVA a que se refere o art. 41° (anterior art.40°) do CIVA relativamente aos exercícios de 2005, 2006 e 2007. (Doc. n.° 10 junto á p.i.)
J) Em 04.11.2009, a Impugnante deduziu reclamação graciosa contra o acto de inscrição oficiosa no cadastro. (Doc. n.° 8 junto á p.i.)
L) Em 28.12.2009, Chefe da Divisão I da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, emitiu o oficio n° 111096, tendo por objecto a “ notificação das Liquidações Adicionais de IVA e dos Juros Compensatórios respectivos dos períodos 0503T, 0506T, 0509T e 0512T’ e do qual consta designadamente o seguinte:



Fica igualmente V.Exa notificado para, no prazo de 30 dias contados a partir da data considerada na notificação da presente liquidação, solicitar guias em qualquer Serviço de Finanças Local para pagamento da importância referida. “( Doc. n.° 1 junto à p.i.)
M) Em 28.12.2009, foi emitido pelo Chefe da Divisão I da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa um mandado de notificação pessoal da impugnante, com vista á notificação contida no ofício a que alude a al. L) do probatório. (Doc.n.° 1 junto á p.i.)
N) Em 11.02.2010, a Impugnante foi notificada dos actos tributários de liquidação emitidos na decorrência das correcções efectuadas, e que seguidamente se identificam:

«imagem no original»

(Doc.s. n.°s 2 e 11 junto á p.i.)

O) A Administração Fiscal emitiu, ainda, mas com referência ao exercício de 2006 os seguintes actos tributários de liquidação:
«imagem no original»

(Doc. n.°3 junto à p.i.)


P) Em 28.12.2009, a Impugnante foi notificada das liquidações a que aludem a al. L) do probatório. ( Doc.n.°l junto á p.i.)
Q) Mediante ofício datado de 26.02.2010, foi a Impugnante notificada do despacho proferido em 24.02.2010, pelo Chefe de Divisão da Direcção de Finanças de Lisboa de determinou o arquivamento da reclamação graciosa a que alude a al. J) do probatório, com fundamento em impropriedade do meio empregue (Doc.n.°9 junto à pi.)
R) No exercício de 2005, a Impugnante realizou operações internas no território Espanhol. (Doc. n.°12 junto à p.i.)
S) Na informação espontânea emitida em 30.05.2005, pela Agencia Tributária- Delegacion de Badajoz- foi proposta a baixa da Impugnante enquanto sujeito passivo registado para efeitos do VIES. (Doc. n.°20 junto à p.i.)
T) Conta dos doc. juntos à p.i. sob os n.°s 12, 14 as declarações — modelos 3, 390 e 201 apresentadas junto Agencia Tributária-Delegacion de Badajoz relativas a IVA e imposto sobre as sociedades referentes aos exercícios de 2005 e 2006.
U) Em 16.03.2010, a Agencia Tributária-Delegacion de Badajoz- emitiu um documento titulado “ CERTIFICADO HISTORICO DE INCLUSION EM EL REGISTRO DE OPERADORES’ atestando que a Impugnante figurou como sujeito passivo para efeitos do VIES de 05.03.2003 a 13.05.2008, retomando a 09.06.2008.(Doc. n.°20 junto à p.i.)
V) Em 16.03.2010, a Agencia Tributária-Delegacion de Badajoz- declarou que a Impugnante é residente em Espanha. (Doc. n.°21 junto à p.i.)
X) A Impugnante tem a obrigação de possuir livros contabilísticos em Espanha.(Doc. n.° 23 junto à p.i.)
Z) A Impugnante apresenta contas em Espanha. (Does. n.°s 24-A e 24-B junto
á p.i.)
AA) A Impugnante tem os seus livros contabilísticos em Espanha. (Doc.s n.° s 6, 23 e 25 junto á p.i.)
AB) A Impugnante tem os seus livros fundacionais em Espanha. (Doc. n.° 26 junto á p.i.)
AC) A Impugnante aguarda a sua escrita em Espanha. (Doc.s n.° s 6, 23 junto
á p.i.)
AD) A Impugnante paga impostos e taxas locais nesse Estado. (Doc.s n.° s 12, 24 junto á p.i.)
AE) A Impugnante paga renda pelo aluguer de imóvel sito em Espanha. (Doc. n.° 22-Bjunto à p.i.)
AF) A Impugnante paga avença a técnico de contas para a produção em Espanha. (Doc.s n.° 2Sjunto á p.i.)
AG) Consta dos autos como doc. n.°25-A e BA dois documentos titulados “ “ACTA DE LA JUNTA GENERAL DE SÓCIOS DE LA SOCIEDAD E.......... S.L,” que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.
AH) As comunicações telefónicas incorporadas nos cartões podem ser utilizadas em Portugal, Espanha, Brasil e Polónia. (Doc. n.°l8 junto à p.i.)
AI) Em 22.04.2010, deu entrada em juízo a petição inicial que originou os presentes autos. (Cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos)

Factos Não Provados
Não se provaram quaisquer outros factos, com relevância para a decisão da causa.

Motivação da decisão de facto

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
Com referência aos documentos apresentados pela Impugnante escritos em língua estrangeira, não vislumbrou o tribunal necessidade da sua tradução, pela evidência da mesma e atendendo a que as partes se mostraram concordantes quanto ao respectivo conteúdo. É que, como se assinala no recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/04-/2010 (processo n,° 9810/03.6TVLSB, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsj). o art. 140.°, n.° 1, do CPC, estipula que os documentos estrangeiros só serão traduzidos quando careçam de tradução, não se tratando de formalidade essencial, admitindo-se que o tribunal possa ser ele próprio traduzir.»

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
A Impugnante deduziu impugnação judicial contra as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios relativos aos períodos 0503T, 0506T, 0509T e 0512T, no total de € 789.383,75, novamente notificadas, por via postal, das mesmas para o mesmo período de tributação, mas no valor de € 789.035,09, bem como liquidações relativas aos períodos 0603T, 0606T; 0609T e 0612T, num total de € 706.577,67 alegando, em síntese, quanto às liquidações relativas a 2005, a sua caducidade. Isto porque as notificações ocorreram a primeira vez em 28/12/2009 e depois outra vez em 11/2/2010, constituindo esta última a revogação das liquidações anteriores. Como a última notificação estabelece nova regulamentação material sobre a situação já regulada por acto anterior, deve concluir-se que caducou o direito à liquidação, já que o facto gerador do imposto relativo ao IVA de 2005 é necessariamente anterior a 31/12/2005.
E quanto ao restante, defende, também em síntese, não ser um sujeito passivo de imposto quer de IVA quer de IRC, pois não tem residência, atividade nem direção efetiva em Portugal.

A MMª juiz decidiu a primeira questão do seguinte modo:

“Neste particular alega (e demonstra) a Impugnante que, em 28.12.2009, foi notificada pessoalmente das liquidações adicionais de IVA e JC referentes aos períodos 0503T, 0506.0509T e 0512T, respectivamente de 66.221,75€, 114,326,17€, 256.269,83€ e 352.566€, num total 789.383,75€ e novamente notificada, por via postal em, relativamente aos mesmos períodos de tributação, num total de 789.035,09€.
Em face do quadro fáctico relatado, entende, a Impugnante que as segundas liquidações ( Cfr. al. N) do probatório), assumem ainda que implicitamente a natureza revogatória, na medida em que fizeram extinguir os efeitos jurídicos dos actos tributários de liquidação anteriormente produzidos e levados ao seu conhecimento em 28.12.2009 ( Cfr. al.P ) do probatório.
Segundo a posição da Fazenda Pública, “ocorreu de facto uma revogação parcial do acto inicialmente notificado, porquanto apenas uma parte daquele foi revogado, concretamente no que respeita ao montante dos juros compensatórios o qual foi reduzido em 348,86€", porém, a notificação efectuada em 11.02.2010 " traduziu-se num alargamento do prazo para efectuar o pagamento voluntário, que passou de 28.01.2010 para 30.04.2010 e numa redução no valor de juros compensatórios no montante global de € 348,66 mantendo inalteráveis todas as demais garantias, relativamente ãs quais foi igualmente alargado o prazo para, querendo, reagir”.

Vejamos com quem está a razão.

A questão decidenda passa por determinar se as liquidações notificadas em são meras liquidações correctivas ou concretizadoras das anteriormente efectuadas, ou se, pelo contrário, se tratam de liquidações inovatórias.

Vejamos.

A questão suscitada não é nova e aliás já foi objecto de apreciação pelo Tribunal Central Administrativo Sul n.° 15.02.2011, rec. 044-80/11, (que recaiu sobre a Sentença proferida de que fomos Relatora), que face á sua proficiente fundamentação, razão nos limitaremos a transcrever o que aí a esse respeito foi dito:

(...)

Prossegue depois a MMª juiz com a transcrição parcial do referido acórdão para, a final, concluir que:

“No caso em apreço, resulta da matéria de facto assente, que a Impugnante foi notificada pessoalmente dos actos tributários de liquidação de IVA em 28.12.2009, sucedendo que posteriormente, a Administração Fiscal revogou parcialmente as liquidações, quanto aos segmentos de juros compensatórios, no montante de € 348,66 e consequentemente, emitiu em 09.02.2010, com referência ao mesmo tributo e períodos as liquidações elencadas na al. N) do probatório, notificadas à Impugnante em 11.02.2010.
Como já se notou, está em causa o tributo de IVA do exercício de 2005.
Nos termos do disposto no n°l do artigo 45° da LGT, o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, resultando do n° 2 do referido normativo que o prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.
Resulta da interpretação da norma citada que para obstar à caducidade do direito à liquidação são necessários dois requisitos, a saber, a liquidação do imposto, bem como a sua notificação validamente efectuada.

Faltando um daqueles requisitos de verificação cumulativa, é a própria validade do acto de liquidação do imposto que está em causa.

Donde, respeitando o tributo ao ano de 2005, o prazo de caducidade iniciou-se no dia 31.12.2005, pelo que, não se verificando qualquer facto interruptivo ou suspensivo, sendo o seu termo «adquem» o dia 31.12.2009.

Ora, sendo o facto impeditivo da caducidade do direito à liquidação não a sua efectivação mas a notificação da mesma ao sujeito passivo dentro do prazo legalmente estabelecido para a Administração Fiscal exercitar tal direito, é à luz da jurisprudência transcrita e bem assim a doutrina que aquela acolheu, tendo ficado provado que a Impugnante foi notificada em 11.02.2010, tem-se por verificada a caducidade do direito à respectiva liquidação.

Do que se conclui, que a liquidação padece de ilegalidade, conducente à respectiva anulação. Ilegalidade traduzida na liquidação depois de ultrapassado o prazo de caducidade”.

O ERFP discorda. Defende que tendo a correção sido efetuada a favor do contribuinte, acrescida do facto de lhe ter sido conferido novo prazo para efetuar o pagamento não obsta à necessária eficácia da notificação da primeira liquidação. O mesmo não sucederia caso da liquidação resultasse num agravamento da situação do contribuinte, o que não se verifica (Conclusões I a XII).

Entrando na apreciação desta questão, desde já adiantamos que, com o devido respeito, não sufragamos o entendimento da MMª juiz.

Como resulta dos factos provados, (alínea P) a sociedade Impugnante foi notificada em 28/12/2009 das liquidações referidas na alínea L) do probatório, que é como quem diz, das liquidações de IVA relativas aos períodos 0503T; 0506T; 0509T e 0512T.

Depois de uma revogação parcial dos juros compensatórios, no montante de € 348,66, o valor inicial de € 789 383,75 - correspondente às liquidações notificadas em primeiro lugar - foi reduzido para € 789.035,09 na notificação posterior (-348,66), em 11/2/1010.

Ou seja, após a concretização da primeira notificação efetuada em 28/12/2009, a AT concluiu que a liquidação de juros compensatórios deveria ser de montante inferior. Corrigiu-a a favor do contribuinte e procedeu a nova notificação.

Resulta claro que no primeiro caso a caducidade do direito à liquidação não se verificou, por não terem decorridos quatro anos contados nos termos do art.º 45º/1 e 4 da LGT.

No segundo caso, a (segunda) notificação foi realizada em 26/2/2010, manifestamente após o decurso do prazo de quatro anos, contados nos termos do artigo 45º/4 LGT.

Porém, com esta notificação, a AT limitou-se a eliminar da ordem juridicamente, na respetiva medida e, por isso, parcialmente, o acto de liquidação adicional por forma a fazer corresponder o montante dos juros compensatórios à luz do que seria legalmente devido.

Por isso que, por imposição da lei, e como a AT também dá conta, os efeitos jurídicos do acto tributário da liquidação, na medida em que excedem os decorrentes da posterior anulação, deixam de se produzir retroativamente, valendo, apenas e a final, como se tivessem sido produzidos pela liquidação adicional logo que praticada, os efeitos desta decorrentes com as alterações resultantes daquelas anulações parciais.

E não se obste com a circunstância, meramente de natureza formal, de, em decorrência daquela alteração terem resultado “duas liquidações”, porque sendo manifesto que o que releva é a substância sobre a forma, é evidente que a tese da Impugnante/Recorrida apenas poderia vingar se a AT tivesse pura e simplesmente revogado, por inteiro, as liquidações adicionais e, em sua substituição tivesse praticado “ex novo” novas liquidações.

Porém, não foi isso que sucedeu no caso sub judice. A “nova” liquidação nada tem de inovador e além do mais é favorável ao contribuinte.

No fundo, trata-se de um acto secundário, produzido sobre um acto anterior, que resultou apenas de uma revogação/anulação parcial, mantendo parcialmente intacto o acto inicial.

Por isso, não sendo minimamente lesivo e não comportando qualquer novidade, devemos concluir que os elementos essenciais da liquidação foram definidos na primeira notificação e é esta que deve ser tida em consideração para efeitos de caducidade (1).

Assim, com este fundamento, não pode a sentença manter-se, nesta parte.

Prosseguindo.
A AT procedeu à liquidação de imposto com fundamento em que a atividade e o centro e a direção efetiva se situam efetivamente em Portugal, essencialmente com base nos seguintes factos:

1. A E........o S.L., sociedade constituída em Espanha em 2003, de acordo com o Sistema de Troca de Informação sobre o IVA (VIES) tem domicílio fiscal na CL…………., 06010 BADAJOZ, dedicando-se à comercialização de cartões telefónicos virtuais de chamadas.
2. Tem como sócios M........ e M........, ambos residentes em Portugal (casados conforme consta nas declarações de rendimentos de IRS).
3. M........ é administrador único da sociedade espanhola, sendo também actualmente sócio único da principal distribuidora de cartões telefónicos virtuais de chamadas em Portugal, a E........ .......Lda. (PT.......).
Os cartões telefónicos virtuais de chamadas são impressos por uma gráfica inglesa e objecto de transmissão intra comunitária de bens para a empresa espanhola. Posteriormente a E........ procede à transmissão dos cartões integralmente para Portugal, não só para a empresa E........, principal cliente, como também para diversos pequenos retalhistas (quiosques). Nesse momento, é feita a activação dos cartões telefónicos virtuais de chamadas pelo operador português de rede fixa S........ - …………….S.A. (PT .......), ex N.........., entidade com quem a E........ celebrou um contrato de parceria tecnológica. A S........ é responsável pela activação desses cartões e pela gestão da "linha" telefónica que permite efectuar as chamadas por parte dos consumidores finais. Ressalta assim claro que o que está efetivamente em causa é a prestação de serviços de telecomunicações e não a venda de cartões telefónicos, porquanto estes constituem apenas o suporte físico de minutos de chamadas (razão peja qual se utiliza a expressão cartões telefónicos virtuais de chamadas).
5. Na informação espontânea supra mencionada, a Administração Fiscal espanhola reforça ainda as constatações da anterior resposta ao pedido de cooperação administrativa entre Estados-membros de que a E........:
a. Não dispõe de estrutura nem de meios materiais e humanos adequados e suficientes para o exercício de uma actividade comercial em Espanha, uma vez que não possui uma estrutura comercial própria e permanente, nem estabelecimento aberto ao público, nem trabalhadores por sua conta, sendo os únicos trabalhadores da empresa os próprios sócios, distribuindo em Portugal os cartões telefónicos virtuais de chamadas;
b. Encontra-se sediada num escritório de domiciliação em Badajoz (CTMA AGENCIA EMPRESARIAL) que lhe presta serviços de cedência do domicílio fiscal, de recepção de correspondência, mercadorias e outra documentação, elaborando ainda a contabilidade e arrendando-lhe um espaço de armazenagem dos referidos cartões. O sócio-administrador desse escritório de domiciliação é C.........., que é também representante legal da E........;
c. É titular de uma conta bancária do B.......... em Portugal a qual é utilizada para os pagamentos de maior valor;
d. São os próprios sócios que de forma regular se deslocam a Badajoz para recolher parte da mercadoria e distribuí-la em Portugal, sendo que a restante mercadoria ou ê enviada de Espanha para Portugal por outros meios (correio ou empresas de transporte), ou é enviada directamente de Inglaterra para Portugal;
e. Em qualquer dos casos os cartões telefónicos virtuais de chamadas são vendidos sempre a clientes portugueses ou a entidades com número de identificação fiscal português;
f Deste modo, a Administração Fiscal espanhola considera que o centro de decisão assim, como a gestão dos negócios da E........, não estão localizados em Espanha. Considera também que a passagem de mercadorias por Espanha é unicamente efectuada por conveniência económico-fiscal. Acrescenta mesmo que o domicílio fiscal declarado em Espanha constitui uma mera “ficção”, tendo inclusivamente procedido ao cancelamento oficioso do respectivo NIF para efectuar operações intercomunitárias.

A MMª juiz julgou procedente este segmento da impugnação com a seguinte fundamentação:

“O discurso que suportou a posição da Administração Fiscal a respeito do centro de decisão e direcção da Impugnante se situar em Portugal não merece acolhimento, pois tal discurso, aponta claramente para um juízo de valoração quanto à gestão da Impugnante e os critérios de gestão não são questionáveis pelo Fisco.

O juízo sobre a oportunidade e conveniência de possuir uma estrutura comercial ou estabelecimento aberto ao público é exclusivo do empresário. Se ele (Impugnante) decide que sua actividade é desenvolvida por dois únicos trabalhadores, in casu os seus sócios, tendo em vista prosseguir o objecto da empresa, há-de admitir-se que é um acto de acto de gestão.

A própria Administração Fiscal reconhece que o escritório de domiciliação da Impugnante “lhe presta serviços de cedência do domicilio fiscal, de recepção de correspondência, mercadorias e outra documentação, elaborando ainda a contabilidade e arrendando-lhe um espaço de armazenagem dos referidos cartões.

Embora os únicos trabalhadores da Impugnante tenham residência em Portugal, tal facto em nada releva, (para o caso que nos ocupa) porque o que se aqui discute é a tributação da Impugnante e não a das pessoas singulares.

Nada impede que aqueles possuam residência em Portugal e a fonte do rendimento se situe em Badajoz.

Uma vez que a Administração Fiscal Espanhola trata a Impugnante como sujeito passivo de IVA e de Imposto de Rendimento de Sociedades, (Cfr. als S) a AD) do probatório), é contraditório afirmar-se que estamos perante um sujeito passivo que mais não é uma "mera ficção’’ conveniente para efeitos fiscais.

A AT nenhuma alegação ou prova produziu no sentido do domicilio fiscal em Espanha ter como finalidade “ conveniência-económica-fiscal”.

E ainda que a tal procedesse, sempre se lhe impunha provar tratar-se de planeamento fiscal ilegítimo, o que também não fez.

A Administração Fiscal Espanhola confirmou que no exercício de 2006, a Impugnante praticou operações em Espanha e a realização de lucros -em sede de IVA, operações internas de 63.702,84 € e transmissão intracomunitárias de bens de 3.150.729,11 €, em sede de imposto sobre as sociedades, proveitos de 3.397.059,90 €, custos de 3.024.693,06 € , resultado de 58.501,82€ e lucro tributável de 80.201.74€, sendo que dai terá resultado pagamento de imposto de 22.760,52€.

Demonstrou-se ainda que a Impugnante figurou como sujeito passivo para efeitos do VIES de 05.08.2003 a 13.05.2008 retomando a 09.06.2009, assim se considerarmos a data da emissão da informação da Administração Fiscal Espanhola (30.05.2008) na qual propõe a baixa da Impugnante do universo dos sujeitos passivos registados para efeitos de VIES e a data da reposição mediaram somente 10 dias, o que não a impediu de continuar a tratar a Impugnante como sua contribuinte.

Assim, a Administração Fiscal não cumpriu o ónus da prova da verificação dos requisitos legais da decisão desfavorável que culminou nas liquidações sindicadas, como sejam os fundamentos que a suportou.

Em, bom rigor, e como já disso demos nota, limitou-se a acolher o entendimento expresso na informação emitida pela Administração Fiscal Espanhola, que como vimos, desprovidos de prova e contrariados pela sua própria actuação.

Sublinhe-se, ainda, que de acordo com a al. a) do n.°l do art. 2º do CIVA a qualidade de sujeito passivo não está depende da verificação do requisito que a Administração Fiscal elegeu de modo a qualificar a Impugnante como sujeito passivo de IVA, visto que o preceito não faz depender a incidência subjetiva do tributo da verificação da direção efetiva em Portugal, que como vimos não resultou assente.

É, certo que o “critério da direção efetiva” é relevante para a qualificação ou não da qualidade de residente para efeitos de IRC ( cfr. art. 2º, n.°3 do CIRC), mas já será irrelevante para aplicação das regras de inscrição como sujeitos passivos de IVA.

A Convenção Portugal/Espanha, seguindo o Modelo de Convenção da OCDE, estabelece critérios que permitem resolver os casos em que uma pessoa física ou jurídica, por aplicação da legislação interna dos Estados Contratantes surge como residente de ambos os Estados.

O n.° 3 do art. 4º estabelece que se aplica o critério da direcção efectiva, no caso de uma pessoa não singular residente de ambos os Estados Contratantes.

Os impostos visados pela Convenção Portugal/Espanha estão previstos no art. 2º e aplicam-se "aos impostos sobre o rendimento exigidos por cada um dos Estados Contratantes, suas subdivisões políticas ou administrativas e suas Autarquias Locais, seja qual for o sistema usado para a sua percepção” (Cfr. n°.l).

Consideram-se impostos sobre o rendimento “os impostos incidentes sobre o rendimento total, ou sobre parcelas do rendimento, incluídos os impostos sobre os ganhos derivados da alienação de bens mobiliários ou imobiliários, bem como os impostos sobre as mais-valias”( Cfr. n.° 2).

De acordo com a enumeração do art 2º n. 3 a) e b), os impostos actuais a que a Convenção se aplica são:

- Relativamente a Espanha, o imposto sobre la renta de las personas físicas; o imposto sobre sociedades.

- Relativamente a Portugal, o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, o imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas e a derrama.

Dispõe, finalmente, o n.º. 4 do art. 2°, que também se aplicará a Convenção aos impostos de natureza idêntica ou similar que entrem em vigor posteriormente à data da assinatura da Convenção que venham a acrescer aos actuais ou a substituí-los. Assim como “as autoridades competentes dos Estados Contratantes comunicarão uma à outra as modificações importantes introduzidas nas respectivas legislações fiscais”.

Donde, o chamamento da CDT celebrada entre Portugal e Espanha efectuado pela Administração Tributária, é como bem, qualifica a Impugnante” completamente descabida, visto que aquele Convénio afasta o IVA do seu âmbito de aplicação. (cfr. art. 2º)

Assim sendo, é de concluir que os fundamentos de facto e de direito aduzidos pela Administração Fiscal não permitem suportar os actos tributários sindicados, pelo que devem ser banidos da Ordem Jurídica”.

A estas considerações reage a AT nas doutas conclusões, com a seguinte argumentação:

A Impugnante é uma pessoa colectiva que exerce em Portugal de modo independente e com caráter de habitualidade a “actividade de comercialização de cartões telefónicos de chamadas”.

Por conseguinte, é sujeito passivo de IVA nos termos do art. 2º/1-a) CIVA (Conclusões XV a XIX).

O RIT refere que a Impugnante tem a direção efetiva em Portugal, razão por que resultaram da inspeção correções em sede de IRC e IVA. Mas mesmo que se não provasse o critério da direção efetiva em Portugal, relevante para efeitos de IRC, sempre a Impugnante seria sujeito passivo de imposto, nos termos do referido art. 2º/1-a) CIVA. Não é sequer necessário, para o efeito, que os clientes da Impugnante sejam ”exclusivamente” portugueses (Conclusões XX a XXVIII).

A Impugnante não só não possui estrutura empresarial em Espanha que suportasse o exercício da sua actividade naquele país, como efetivamente desenvolvia essa atividade em Portugal, aqui se encontrando o centro de decisão, bem como o exercício efetivo da sua atividade.

A sua atividade é desenvolvida em Portugal, com a venda dos cartões integralmente em Portugal, a clientes portugueses, sendo a S........ responsável pela ativação desses cartões, entidade com que a E.......... celebrou um contrato de pareceria tecnológica. (Conclusões XXIX a XXXI).

São os sócios da Impugnante que se deslocam a Badajoz para recolher parte da mercadoria e distribuí-la em Portugal, sendo que a restante ou é enviada por outros meios, ou diretamente de Inglaterra para Portugal (Conclusões XXXII a XXXIII).

Em 14/9/2009 foi promovida a inscrição oficiosa da Impugnante como sujeito passivo residente em território nacional com início de atividade em 1/1/2005, ficando por isso sujeito a liquidação de IVA. (Conclusões XXXIV a XXXVI).

Mesmo que a Impugnante não tivesse residência fiscal em Portugal, ainda assim seriam sujeitas a IVA as operações objecto de correção pela AT, uma vez que os adquirentes dos serviços em causa têm a qualidade de sujeito passivo registados em território nacional (Conclusões XXXVII a XL).

Apreciemos.

A questão essencial que nos é colocada consiste em saber se a Impugnante é um sujeito passivo de IVA de acordo com os critérios previstos no art.º 2º/1-a) do CIVA, cujo teor (na redação aplicável), é o seguinte:

São sujeitos passivos de imposto:

As pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com caráter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo actividades extrativas, agrícolas e as profissões livres, e bem assim as que, do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas actividades, onde quer que este ocorra, ou quando, independentemente dessa conexão, tal operação preencha os pressupostos da incidência real de IRS e de IRC.

Parece claro que a Impugnante ao proceder à transmissão de cartões telefónicos pratica com caráter de habitualidade actividades de comércio ou prestação de serviços.

Porém, a Impugnante é uma sociedade constituída em Espanha (fls. 362 da sentença) sediada num escritório em Badajoz que comercializa “cartões telefónicos virtuais de chamadas”, impressos por uma gráfica inglesa e objecto de transmissão intracomunitária de bens para a Impugnante, que por sua vez, os vende a clientes portugueses, podendo ser utilizados não só em Portugal mas também em Espanha, Brasil e Polónia (factos Provados AH) e não consta que tenha nomeado representante nos ternos do art. 29º/1 do CIVA.

Tais cartões são recolhidos em Espanha (Badajoz) pelos sócios da Impugnante para distribuição em Portugal, sendo que a restante mercadoria ou é enviada de Espanha para Portugal por outros meios (correio ou empresas de transporte), ou é envidada diretamente de Inglaterra para Portugal (alínea d) da informação espontânea – fls. 363 da sentença).

Ora, determinando o art.º 6º/1 do CIVA que são tributáveis as transmissões de bens que estejam situados em território nacional no momento em que se inicia o transporte ou expedição para o adquirente, é inegável que tal não sucede no caso em apreço.

Acresce que no exercício de 2005 a Impugnante realizou operações internas no território Espanhol (alínea R dos Factos Provados) e apresentou na Agência Tributária as declarações modelo 3, relativas a IVA e imposto sobre as sociedades referentes aos exercícios de 2005 e 2006 (Factos Provados T).

Para além disso, tem os seus livros contabilísticos em Espanha, onde guarda a escrita e é tratada por técnico de contas (AB a AF).


Os factos expostos demonstram-nos ser excessiva a conclusão da AT espanhola segundo a qual “o domicílio fiscal declarado em Espanha constitui mera ficção”, pois, como refere a MMª juiz, “No caso dos autos, e como resulta, ainda da matéria de assente ( Cfr. al. R) do probatório), a Administração Fiscal Espanhola confirmou que no exercício de 2006, a Impugnante praticou operações em Espanha e a realização de lucros -em sede de IVA, operações internas de 63.702,84 € e transmissão intracomunitárias de bens de 3.150.729,11 €, em sede de imposto sobre as sociedades, proveitos de 3.397.059,90 €, custos de 3.024.693,06 € , resultado de 58.501,82€ e lucro tributável de 80.201.74€, sendo que dai terá resultado pagamento de imposto de 22.760,52€.”

Para que estes valores se considerassem “mera ficção”, ter-se-iam de efetuar outras diligências de onde essa ficção resultasse demonstrada. Tal como os factos se encontram provados, não acompanhamos a tese de que se trata de mera ficção o domicílio fiscal declarado em Espanha.

A circunstância de os sócios, e administrador único, da Impugnante residirem em Portugal, onde esta também é titular de uma conta bancária no B.......... Portugal, utilizada para os pagamentos de maior valor, não torna os seus negócios tributáveis em Portugal.

E nem a afirmação de que a Impugnante não tem meios materiais e humanos adequados para uma atividade em Espanha parece compatível com os valores dos impostos suportados em Espanha.

Desde logo, o facto de a “C…… Agência Empresarial” arrendar um espaço à Impugnante para armazenagem dos referidos cartões (sub alínea b) do n.º 5, da alínea E) – fls. 363 da sentença) parece não confirmar a falta de meios materiais para a atividade.

E a circunstância de não ter trabalhadores por sua conta não desvaloriza a atividade em Espanha. A AT não esclarece se o trabalho dos sócios que se deslocam a Badajoz para recolher parte da mercadoria e distribuí-la em Portugal, sendo a restante enviada por outros meios (correio ou empresas de transporte), são, ou não suficientes para o desempenho da atividade.

Sugere que sim, mas não esclarece em que dados se fundamenta para uma conclusão de tal natureza.

Por fim, o facto de (alguns) adquirentes terem a qualidade de sujeito passivo registados no território nacional os bens que adquirirem estão efetivamente sujeitos a IVA, nos termos do art. 1º/a) e 3º do RITI.

Mas não a Impugnante, que é sujeito passivo de IVA registado em Espanha, a partir de onde desenvolve a sua atividade nos termos já referidos.

Assim, improcedendo as conclusões, a sentença deverá ser confirmada uma vez que o seu segmento decisório se mantém na totalidade, embora com diferente fundamentação.

Nos termos do artigo 527.º do CPC aplicável ex vi do artigo 2.º alínea e) do CPPT a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte a que elas houver dado causa (n.º 1), entendendo-se que dá causa às custas do processo a parte vencida na proporção em que o for (n.º 2).

A Recorrente é vencida uma vez que o segmento decisório da sentença não sofre alteração.


V DECISÃO.
Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAS em negar provimento ao recurso e com a presente fundamentação confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 11 de março de 2021.


[Nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, o relator consigna e atesta que têm voto de conformidade as Exmas. Senhoras Desembargadoras Patrícia Manuel Pires e Susana Barreto que integram a presente formação de julgamento.]


(Mário Rebelo)





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(1) Cfr. o ac. do STA n.º 01104/13 de 14-10-2015 - Relator: FRANCISCO ROTHES

Sumário: I - Se a AT emitir uma nova demonstração de liquidação na qual, por referência à primeira, se limita a corrigir o cálculo do imposto por não ter levado em conta que o contribuinte tinha efectuado a opção pelo não englobamento dos rendimentos (deixando totalmente intocada a matéria tributável), não está a praticar um acto novo de liquidação tributária, mas apenas a dar expressão quantitativa à correcção do acto praticado.

II - Assim, se o contribuinte deixou caducar o direito de impugnar judicialmente a liquidação, não é a anulação parcial do acto e a consequente nova demonstração da liquidação (que, à excepção da correcção daquele erro, em benefício do contribuinte, não tem conteúdo inovatório) que lhe reabre a possibilidade de impugnar aquele acto tributário com fundamento no erro na determinação da matéria tributável, apurada pela AT na sequência da inspecção que corrigiu a que foi declarada.