Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:24/09.2BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:03/09/2023
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:SOBRECUSTOS
EXECUÇÃO DA EMPREITADA
Sumário:I – Na seleção da matéria de facto não foi pois dado cumprimento ao nº 4 do art. 607º CPC, o qual refere expressamente que “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”
Em bom rigor o tribunal fixou conclusivamente os factos, tendo decidido do mesmo modo.
II – Em qualquer caso, o referido, só por si, não determinaria necessariamente a anulação do sentido da decisão, conquanto se mostrasse adequado e possível proceder em sede de recurso à correção e adequação da matéria dada como provada à prova disponível.
III – Não tendo ficado demonstrado que a obra tenha sido suspensa por diversas vezes por responsabilidade direta do dono de obra, uma vez que apenas se deu como provado que “o Réu apresentou à Autora uma ordem de suspensão dos trabalhos relativas à fonte cibernética em 13/02/2007” (Facto QQ), significa que, mesmo esta suspensão, teve apenas caráter parcial, não colidindo com o normal prosseguimento do demais contratualizado.
IV - Mal se compreenderia que os conclusivamente invocados danos decorrentes da prorrogação do prazo contratual inicial, consequentes de contratos adicionais merecessem ser indemnizados, quando estes contratos foram correspondente e autonomamente pagos ao empreiteiro, sendo que este foi ainda remunerado acrescidamente em sede de revisão de preços.
V - Não pode o empreiteiro vir em sede contenciosa a reclamar danos decorrentes de erros e omissões do Projeto, quando, a verificarem-se, sempre teriam de ter sido suscitados no prazo de 66 dias a contar da consignação, nos termos do Artº 14º do DL 55/99, onde, sendo caso disso, são discriminados todos os procedimentos a adotar por ambas as partes.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
T...., S.A. (Massa Insolvente), devidamente identificada nos autos, intentou ação administrativa comum contra o Município de Santiago do Cacém, tendente à condenação deste a pagar-lhe a quantia de €640.617,27, acrescida de juros vencidos à taxa legal e juros vincendos desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, decorrentes de alegados sobrecustos sofridos com a execução da empreitada do Parque Urbano da Quinta do Chafariz em Santiago do Cacém.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja proferiu sentença em 11 de maio de 2018, através da qual decidiu julgar a ação procedente, e, nessa medida:
a) Julga-se improcedente a exceção de caducidade do direito de ação;
b) Condena-se o Réu a pagar à Autora a quantia de 405.553,29€, a que acrescerá juros computados à taxa legal de 11,07% até 20/01/2009, e naqueles que se venham a vencer até efetivo e integral pagamento;
c) Julga-se improcedente a invocada litigância de má fé.
Inconformado com a sentença, veio o Município interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja.
Formula o aqui Recorrente/Município de Santiago do Cacém nas suas alegações de recurso, apresentadas em 18 de junho de 2018, as seguintes conclusões:
“A A sentença recorrida é a proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja em 11 de Maio de 2018 no processo em referência que condenou o Município de Santiago do Cacém a pagar à massa insolvente de T...., SA a indemnização de 405 553,20€ acrescida de juros computados à taxa legal de 11, 07% até 20/01/2009 e naqueles que venham a vencer até efetivo e integral pagamento”, por atrasos na execução da obra a que alegadamente o Município teria dado causa.
B O tribunal “a quo” relativamente à factualidade com interesse para a decisão, não incluiu factos alegados (e provados por documentos juntos aos autos) pelo Município que contradizem os factos alegados pela primitiva A. e são essenciais para apreciação da matéria em litígio atrasos de execução da obra alegadamente imputados ao Município ora recorrente pelo que à seleção da matéria de facto não foi, assim, dado cumprimento ao nº 5 do art. 607º do CPC, aplicável nos termos do art. 1ºdo CPTA
C O tribunal “a quo” não indicou concretamente qual o documento ou depoimento testemunhal que lhe permitiu dar como provado cada um dos factos elencados na “factualidade provada”, o que não permite entender o critério do Tribunal para a seleção dos factos, t anto mais que sendo indicados factos dados como provados que notoriamente não correspondem à realidade como abaixo se demonstrará fica o Recorrente na dúvida sobre a sustentação do Tribunal, para os dar por assentes. Foi, assim infringida a norma do nº 4 do art. 607º do CPC, aplicável nos termos do art. 1ºdo CPTA , aplicável nos termos do art. 1º do CPTA
D A sentença recorrida causou grande perplexidade, pois matéria tão complexa como a dos autos, composta de tantos detalhes discutidos pela s partes nos articulados e suportados por enorme quantidade de documentos, mereceu uma sentença singela, dir-se-á mesmo demasiado singela que mais parece assentar num juízo a priori do que a apreciação dos factos concretos comprovados por documentos dos autos, apresentados pelas duas partes.
E. A sentença recorrida não explica a razão por que decidiu como decidiu, a não ser a de que o Tribunal aderiu totalmente aos argumentos do primitivo A., tendo mesmo, sem fazer qualquer exame crítico das provas, levado à matéria assente esses argumentos/conclusões, que por não serem factos não integram a factualidade assente.
F Os supostos fundamentos de facto da sentença proferida pelo Tribunal “a quo” são genéricos / conclusões que teriam de extrair se de factos que não se sabe quais são, invocando a sentença recorrida mesmo factos inverídicos bem demonstrativos, aliás, de que o Tribunal desconsiderou tudo quanto o Município ora recorrente alegou e demonstrou por documentos e que infra serão indicados.
G Não se desconhecendo que as provas são livremente apreciadas pelo Tribunal, não podem as provas documentais ser descartadas sem fundamentação, considerando umas, mas não outras. Acresce o facto de a sentença não interpretar os factos e não lhes aplicar as normas jurídicas pertinentes, indicar fundamentação de direito genérica para um conjunto genérico de factos, sendo que a ausência da motivação não esclarece e impossibilita compreender as razões que conduziram à decisão proferida. Ora,
H É unânime a jurisprudência dos Tribunais no sentido de considerar que:
• “o Juiz tem o dever de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquela cuja decisão esteja prejudicada pela decisão dada a outras ...” AC. TCAN de 28/4/2016
• “A fundamentação e a motivação dos atos decisórios destina se a conferir força pública inequívoca aos mesmos e a permitir a impugnação quando esta for legalmente admissível, ou, como refere Germano Marques da Silva« permita o controlo da legalidade do ato, por uma parte, e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correção e justiça”
I A fls. 19 ( 1º §) diz se na sentença:“ No caso em apreço não logrou o Tribunal apurar se houve lugar a revisão de preços e de que modo” . Bastaria ter o Tribunal olhado com um mínimo de atenção para a contestação e documentos aí juntos pelo ora recorrente, para verificar que os documentos juntos à contestação do ora recorrente sob os o nº 44 e nº 45 são duas faturas DE REVISÃO DE PREÇOS emitidas pelo primitivo A. ora recorrido, datadas de 5/12/2007 e 21/1/2008, respetivamente no montante de 18.056,23€ e 74.321, 93€. Mas o Tribunal “a quo” não logrou apurar ”esse facto que também está patente no caderno de encargos junto aos autos, bem como em atas de reunião também juntas aos autos que alertam até o primitivo A. para faturar a revisão de preços.
J a douta sentença recorrida é absolutamente NULA , em conformidade com o art. 615º nº1 alínea b) do CPC aplicável por força do art. 1º do CPTA.
Mesmo que se entendesse que a sentença recorrida não era nula, o que sem transigir, só se admite por facilidade de raciocínio
L Impugna-se a resposta de provado ao facto constante da Alínea SS) dos factos provados onde se lê que: “ A cobertura do edifício de apoio ao Parque não se encontrava prevista no projeto patenteado a concurso tendo sido detetada a falha em outubro de 2006”, porquanto o próprio recorrido, no S/ fax de 13/10/2017 que a entidade demandado juntou à contestação como doc. 30 e está nos autos --, diz“ Vimos por este meio alertar que no artigo 3.1, referente à cobertura do edifício de apoio, não está contemplado na proposta o painel Sandwich com tipo “Ondutherm ” Como este material se encontra nas peças desenhadas e pressupondo a intenção de execução do referido trabalho, informamos que o nosso melhor preço é de 87,30/m2…”
Deve, pois, da alínea SS) passar a constar: “A cobertura do edifício de apoio ao Parque encontrava se prevista no projeto patenteado a concurso, embora não estivesse medida no caderno de encargos”.
M A matéria levada às GG) alíneas GGG) III ) e OOO da factualidade assente não constituem factos (na verdade, são alegações da primitiva Autora), nas conclusões que não são suscetíveis de integrar os “ factos” assentes”.
Devem, pois, ser suprimidas da factualidade provada as referidas Alíneas GGG) III) e OOO)
N Quanto ao facto assente sob a Alínea OO) dos factos assentes: na alínea NN) anterior diz-se que “No plano de Trabalhos encontrava se prevista a instalação da fonte entre outubro de 2006 e janeiro de 2007” e no seguimento na referida alínea OO) “ Tais trabalhos iniciaram se após a sua aprovação” que segundo o facto assente sob alínea MM) se diz que ocorreu em 31/10/2006, o que cria ou pode criar a convicção que o primitivo A. instalou a fonte cibernética no período que ele próprio indicou e que consta da Alínea NN) (entre final de outubro de 2006 e Janeiro de 2007);
O facto assente sob a alínea OO) não corresponde à verdade ou é pouco rigoroso, pois, como se vê da ata de reunião de obra de 03/07/2007 como doc. nº41 junto com a contestação, documento não impugnado assinada pelos representantes da primitiva A., nessa data, 03/07/2007 (9 meses depois da aprovação), escreveu se: “O empreiteiro informou que somente durante a próxima semana é que o fornecedor da fonte se deslocará à obra. A fiscalização solicitou que sejam entregues BA individualmente para cada componente da fonte cibernética
Pelo que, deverá ser suprimida Alínea OO) dos factos provados
O As Alíneas HH) a MM) elencam factos relativos à proposta da primitiva A. de variante da fonte cibernética projetada, mas porque o Tribunal a quo ignorou factos comprovados nas atas de reuniões de obra (assinadas por recorrente e recorrida), designadamente as atas nº 13, nº 15, nº 17 juntas à contestação como docs. 21, 23 e 25 , não se mostra esclarecida a verdade dos factos, o que seguramente influiu na decisão final;
Devem, pois, ser aditados os seguintes factos que se mostram provados pelos docs. 21, 22,23, 24, 25, 26 e 28 juntos com a contestação que são atas de reuniões de obra assinadas pelas partes, de modo a esclarecer os atos de ambas as partes e, assim, a matéria relativa à fonte cibernética provada e que consta das Alíneas HH) a MM):
•Relativamente à fonte cibernética, na reunião de obra de 27/6/2006, o empreiteiro disse que iria apresentar um memorando relativamente a uma proposta alternativa” doc. 21 junto com a contestação do ora recorrente
• “Na reunião de obra de 26/7/2006 o empreiteiro entregou elementos referentes à fonte cibernética” doc. 22 junto com o articulado referido
• “Na reunião de obra de 8/8/2006 o dono de obra solicitou documentação referente à fonte cibernética nomeadamente fichas técnicas do equipamento a aplicar na mesma forma a poder tomar uma decisão” doc. 23 idem
• “Na reunião de obra de 22/8/2006, relativamente à fonte cibernética, o empreiteiro entregou as fichas técnicas referentes à fonte cibernética da proposta inicial e entregou uma nova proposta acompanhada de demonstração em obra” doc, 24 idem
• “Na reunião de obra de 13/9/2006 a fiscalização devolveu o pedido de aprovação da fonte cibernética, uma vez que não foram fornecidos os elementos pedidos “O empreiteiro entregou proposta definitiva do projeto alternativo da fonte cibernética” doc.25 idem
• “Na reunião de obra de 17/10/2006 o empreiteiro forneceu todos os elementos solicitados” doc. 26 idem
• “Na reunião de obra de 10/10/2006 a fiscalização, após parecer favorável do projetista e do responsável da divisão de águas e saneamento básico, concorda com a variante da fonte cibernética prevista no caderno de encargos apresentada pelo empreiteiro” doc. 28 idem.
P Os factos dados por assentes nas Alíneas UU) e RRR) que indicam a localização do edifício de apoio ao Parque na extremidade sudoeste e a entrada de equipamentos e trabalhadores na obra no extremo sudoeste não corresponde à realidade, pois como é público e notório o edifício de apoio do Parque está implantado a sul do parque e a entrada de equipamentos e trabalhadores era feito pelo estaleiro colocado a Noroeste situado a Noroeste, devendo, pois, serem corrigidos em conformidade as Alíneas UU) e RRR) , respetivamente substituindo-se “extremidade sudoeste” por “sul” e “extremo sudoeste” por “Noroeste”.
Q As Alíneas CC), GG) e VV) não correspondem à verdade e não podem estar sustentados em documentos válidos constantes do processo, porque efetivamente só foi aprovado uma suspensão da obra a referida na alínea Q)Q) dos factos provados
Devem, pois, ser suprimidas do conjunto da factualidade dada por provada as referidas alíneas CC) GG) e VV)
R À carta do primitivo Autor, ora recorrido, integralmente transcrita sob a Alínea ZZ) dos factos provados, o ora recorrente deu resposta por ofício da mesma data e que juntou à contestação com doc. 29. Deve, assim, ser aditado novo facto à matéria assente no qual se deverá transcrever o referido ofício do Município que foi junto à contestação 29 e se encontra nos autos.
S Mesmo que se entendesse que a sentença não era nula, o que não se admite e só se concede por hipótese de raciocínio, a sentença cometeu GRAVE ERRO DE JULGAMENTO, pois os dispositivos legais que foram indicados como fundamentos da decisão ora impugnada (nº 4 do art. 189º, nº1 do art. 196º e art. 198º do DL 59/99) foram erradamente aplicados aos factos assentes. Para além do facto de a sentença recorrida não ter considerado como factos provados factos essenciais à compreensão da matéria controvertida, alegados por uma das partes (ora recorrente), ter contaminado, desde logo, e irremediavelmente qualquer julgamento justo.
T. O nº 4 do art. 189º do Dec lei 59/99 reporta-se ao caso de não rescisão do contrato por parte do empreiteiro, quando o dono de obra aprova suspensão da obra fora dos condicionalismos do art. 185º. Ora, NUNCA a OBRA dos AUTOS esteve SUSPENSA TOTALMENTE, tendo sido apenas determinada uma suspensão, a que é referida na Alínea QQ), que nunca condicionou os restantes trabalhos que a primitiva A. podia e devia executar. Por outro lado, não foram provados concretos danos (e sua medida) à primitiva A, pelo que não é aplicável aos factos pertinentes o nº 4 do art. 189º do Dec Lei 59/99.
U. O art. 196º do dec lei reporta se à responsabilidade civil do dono da obra que causar danos ao empreiteiro. A responsabilidade civil assenta em dolo ou mera culpa. Não só não se provou dolo ou mera culpa do Município, ora recorrente , pelo que é inaplicável o art. 196º do Dec lei 55/99
V Finalmente no que se refere ao art. 198º do dec lei 59/99, a sua impertinência é manifesta, pois o tribunal confunde as normais vicissitudes dos contratos de empreitada, aliás previstas na lei e concretamente no Dec lei 59/99 que é o aplicável, com alteração anormal e imprevisível das circunstâncias em que as partes contrataram..
Cabe referir que não podem incluir-se na previsão do art. 198º alegados danos por prorrogação do prazo inicial do contrato decorrentes de contratos adicionais que foram devidamente pagos ao empreiteiro (acrescendo ao preço inicial da empreitada), além de o empreiteiro beneficiar de revisão de preços, como foi o caso.
Não podem incluir se na previsão do art. 198º alegados danos por prorrogações de prazo decorrentes da necessidade de avaliação de PROPOSTAS VARIANTES AO CADERNO DE ENCARGOS FEITAS PELO EMPREITEIRO AOS EQUIPAMENTOS COMPLEXOS (como é uma fonte cibernética) , cujas características, elementos técnicos e resultados tinham sido minuciosamente indicados nas peças que integraram o contrato de empreitado. Também não se incluem na previsão do art. 198º do dec lei 55/99 alegados danos por prorrogações de prazo decorrentes de alegados erros e omissões do projeto, porquanto nos termos do art. 14º do Dec lei 59/99 , essas alegadas omissões e erros do projeto que se efetivamente tivessem existido teriam ter sido reclamadas pelo empreiteiro no prazo de 66 dias a contar da consignação, o que o primitivo Autor nunca fez.
Finalmente, não se incluem na previsão do art. 198º do dec lei 55/99 alegados danos por prorrogações de prazo decorrentes de alegados atrasos quando se dá causa a esses atrasos, como aconteceu no caso dos autos.
X. A sentença recorrida julgou mal, não aplicou aos factos as normas legais pertinentes, interpretou incorretamente a lei e violou, pelo menos, o art. 189º, 196º e 198º do Dec lei 59 /99, o art. 607º do CPC, aplicável por força do art. 1º do CPTA e o art. 202º da Constituição da República, bem como os princípios constitucionais da proporcionalidade e do interesse público.
Consequentemente, deve a sentença ser declarada nula, ou se assim se não entender, deverá corrigir se a factualidade assente nos termos supra indicados e, a final, revogar se a sentença recorrida e proferir-se Acórdão que julgue a ação totalmente improcedente. Só assim se fará justiça!”
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 8 de abril de 2019.
A aqui Recorrida, T......, S.A., veio apresentar contra-alegações de Recurso em 23 de outubro de 2018, aí concluindo:
“I) Vem o presente recurso interposto da decisão Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, que julgou a julgou acção procedente e, nessa esteira, condenou o Município de Santiago do Cacém a pagar à Massa Insolvente de T...., S.A. uma indemnização de 405.553,20€, acrescida de juros computados à taxa legal de 11,07% até 20/01/2009 e aqueles que se venham a vencer até efectivo e Integral pagamento, por atrasos na execução da obra a que o Réu, ora Recorrente, deu azo;
II) Nas suas alegações, o Recorrente sufraga, fundamentalmente, que: a) o Tribunal a quo relativamente à factualidade com interesse para a decisão, não incluiu factos alegados pelo Município que contradizem os factos alegados pela primitivo A. e que estão efectivamente comprovados por documentos juntos aos autos, e que são essenciais para a apreciação da matéria em litígio; b à selecção da matéria de facto não foi, assim, dado cumprimento ao n.º 4 do art. 607.°; c) o Tribunal a quo não indicou concretamente qual o documento ou depoimento testemunhal que lhe permitiu dar como provado cada um dos factos elencados na “factualidade provada", o que não permite entender o critério do Tribunal para a selecção dos factos; d) a sentença recorrida causou grande perplexidade, pois matéria tao complexa como a dos autos, composta de tantos detalhes discutidos pelas partes nos articulados e suportados por enorme quantidade de documentos, mereceu uma sentença singela (...) mesmo demasiado singela que mais parece assentar num juízo a priori do que da apreciação dos factos concretos comprovados por documentos dos autos, apresentados pelas 2 partes; e) a sentença recorrida não explica a razão por que decidiu como decidiu, a não ser a de que o Tribunal aderiu totalmente aos argumentos do primitivo A., tendo mesmo, sem fazer qualquer exame crítico das provas, levado à matéria assente esses argumentos/conclusões, que por não serem factos não integram a factualidade assente; f) os supostos fundamentos de facto da sentença proferida pelo Tribunal a quo são genéricos/conclusões que teriam de extrair-se de factos que não se sabe quais são; g) (...) a sentença recorrida não interpreta os factos e não lhes aplica as normas jurídicas pertinentes; h) a fundamentação de direito é genérica para um conjunto genérico de factos; i) a douta sentença recorrida é absolutamente nula, em conformidade com o art. 615° n°1 alínea b) do CPC aplicável por força do art. 1o do CPTA; j) mesmo que se entenda que a sentença não era nula (...) teria cometido grave erro de julgamento, pois os dispositivos legais que foram indicados como fundamentos da decisão ora impugnada (n° 4 do art. 189°, n° 1 do art. 196° e art. 198° do dec-lei 59/99) foram erradamente aplicados aos factos assentes; k) a sentença recorrida julgou mal, não aplicou aos factos as normas legais pertinentes, interpretou incorrectamente a lei e violou, pelo menos, o art. 198° do dec-lei 59/99, o art. 607° do CPC, aplicável por força do art. 1o do CPTA e o art. 202° da Constituição da República, bem como os princípios constitucionais da proporcionalidade do interesse público e I) deve a sentença ser declarada nula, ou, se assim não se entender, corrigida a factualidade assente nos termos indicados pelo Recorrente e, a final, revogar-se a sentença recorrida e proferir-se acórdão que julgue a acção totalmente improcedente;
III) No caso dos autos, verifica-se que a decisão sobre a matéria de facto, compreendida na sentença recorrida, cumpre com o preceituado nas supra referidas normas legais, nomeadamente no artigo 607.°, n.°4, do CPC;
IV) Com efeito, não se antevê em que medida, ao contrário do que defende o Recorrente, a sentença recorrida não corresponda à satisfação da exigência estabelecida na lei;
V) Na verdade, a lei prevê, também, uma declaração em relação aos factos considerados não provados, declaração que assume especial importância para se saber da consideração, ou não, de toda a matéria relevante, no julgamento da causa, nomeadamente para os efeitos previstos no artigo 662.°, n.° 2, alínea c), do CPC;
VI) Não pode senão admitir-se como verificado um tal requisito, pois que o Tribunal a quo declara, depois de extensivamente elencada a factualidade provada com interesse para a decisão, que não ficaram demonstrados com interesse para a decisão a proferir, os demais factos alegados pelas partes nos respectivos articulados juntos ao presente processo.
VII) É assaz difícil que perante tal declaração possa, ainda, subsistir qualquer dúvida sobre a circunstância de, para além dos factos provados, o Tribunal a quo ter considerado, para efeitos de prova, todos os demais factos relevantes não contemplados no elenco que constitui a factualidade provada;
VIII) A certeza de que tal aconteceu está, evidentemente, plasmada na declaração, que se reproduz e reitera, de que não ficaram demonstrados com interesse para a decisão a proferir, os demais factos alegados pelas partes nos respectivos articulados;
IX) A prova dos factos resultou da análise do teor dos elementos documentais juntos aos autos, mas, também, do teor do depoimento das testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento, as quais revelaram um conhecimento directo e imediato dos factos e depuseram com credibilidade e isenção;
X) Nada há que possa colocar em crise o sentido de tais depoimentos, pelo que, e quanto a estes, andou bem o Tribunal a quo ao valorá-los como fez;
XI) Não pode conceder-se, nem concordar-se, com a visão do Recorrente, i.e., a de que não se encontra cumprido o desiderato do artigo 607.°, n.° 4, do CPC;
XII) Num processo complexo, como é o dos autos, que comporta numerosos documentos e testemunhas, é absolutamente inadmissível a consideração de que a sentença recorrida corresponde a uma “sentença singela”, pois que se assim, de facto fosse, tal circunstância prejudicaria sobremaneira a impugnação da decisão - que o Recorrente faz - e o cumprimento do ónus de alegação;
XIII) A fundamentação da matéria de facto indicou os concretos meios de prova que determinaram a decisão, dando, assim, o adequado cumprimento à formalidade legal consagrada no artigo 607.°, n.° 4, do CPC;
XIV) Nenhuma censura ou vício se pode imputar à decisão recorrida e ao exercício dos poderes de cognição do Tribunal a quo, não se vislumbrando, pois, de que nulidade a sentença ocorrida possa enfermar;
XV) Mesmo que se admitisse que a sentença recorrida fosse, conforme alega o Recorrente, “singela” ou “genérica”, ou até mesmo deficiente/incompleta, no concernente à sua fundamentação, nunca a mesma seria nula ou “absolutamente nula”, no dizer do Recorrente, o que, de resto, se sustenta em douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo 2494/14.8TBVNG.P1, de 29.09.2014, de cujas conclusões se extrai, fundamentalmente, o seguinte: “i. A deficiência da fundamentação quanto à matéria de facto declarada provada ou não provada na sentença, nos termos previstos na al. b). do n.° 1, do artigo 615° do mesmo código.
II. Quando (...) a prova dos factos é constituída por documentos que não exigem labor interpretativo no que respeita à sua aptidão para a prova sumária dos factos alegados, as exigências da fundamentação da matéria de facto são rudimentares e ficam satisfeitas com a indicação destes meios de prova, não sendo necessário proceder a qualquer análise crítica das provas, nos termos previstos no n.° 4 do artigo 607 ° do Código de Processo Civil {...)”.
XVI) Quando atendido o teor da decisão recorrida, afigura-se, desde logo, curial que a indicação da convicção do Juiz (julgador) não pode deixar de integrar a «fundamentação da sentença», como resulta, de resto, do n.° 4 do artigo 607.° CPC, embora, naturalmente, aquela (convicção) não integre o conceito de «fundamentos de facto», que consta da mencionada b), do n.° 1, do artigo 615.° do mesmo código;
XVII) Tal conclusão é reforçada pelo facto de no artigo 662.° do CPC, na redacção em vigor, se prescrever, para os vícios que afectam a explanação da convicção do Juiz, relativamente à matéria de facto declarada provada ou não provada, a mesma solução processual consagrada na versão anterior do mesmo código.
XVIII) A deficiência da fundamentação da matéria de facto não gera a nulidade da sentença, conforme o Recorrente invoca e pretende seja declarado;
XIX) As exigências de fundamentação da decisão tomada acerca da matéria de facto não são, nem podem ser, está bom de ver!, sempre as mesmas em todos os casos;
XX) Quando os meios de prova são essencialmente documentais, já o Tribunal Constitucional ponderou no acórdão n.° 303/2003 - D.R., II Série, n.° 29, de 4 de Fevereiro de 2004, págs. 2039-2041 -, de onde se retira que a fundamentação de julgamento de facto é uma justificação racional ex post destinada a permitir o controlo da racionalidade da respectiva decisão, necessário face à liberdade do juiz na avaliação da prova, que deve assim explicitar, com argumentação justificativa, a razão que o levou a atribuir eficácia aos meios de prova\
XXI) No caso dos autos, no que tange, em concreto, à prova documental, não pode afastar-se o facto de que a racionalidade da fundamentação da sentença se tenha, também, satisfeito com a menção de os factos resultarem da prova que os documentos fazem, o que permite, na perspectiva endoprocessual da função da fundamentação, i) às partes o exercício mais fácil do direito de impugnação e b) ao Tribunal de recurso o controlo da respectiva decisão;
XXII) O núcleo fundamental dos factos está provado por documentos, os quais, aliás, conforme bem refere a decisão recorrida, não foram objecto de qualquer forma de impugnação;
XXIII) O Tribunal a quo, ao fundamentar a sua convicção, para estes meios de prova, quis, implicitamente, exteriorizar que considerava o conteúdo de tais documentos como correspondendo à realidade, como fidedignos e merecedores de todo o crédito para efeitos de serem valorados como prova;
XXIV) E, assim, nada mais haveria a dizer e/ou a justificar, face ao alegado e ao material probatório disponível nos auto;
XXV) Em termos substanciais, não se antevê como não considerar que as exigências da fundamentação da matéria de facto eram rudimentares e as provas apresentadas não exigiam que o juiz procedesse a uma análise crítica das provas, devido, também e essencialmente, à clareza dos documentos apresentados, no que respeita à sua aptidão para a prova sumária dos factos alegados;
XXVI) A falta de análise crítica das provas - mesmo que se admitisse se tivesse verificado in casu - não gera a nulidade da sentença e, neste caso concreto, os meios de prova apresentados não implicavam a realização de uma análise crítica da prova;
XXVII) Estão documentados nos autos (e ficaram provados) os prejuízos incorridos e reclamados pela ora Recorrida, a cujo ressarcimento foi o Recorrente condenado;
XXVIII) As disposições em que o Tribunal a quo funda o dever de indemnização á ora Recorrida, por parte do Recorrente, as quais, por razões de economia e desnecessidade, aqui não se reproduzirão, só por desconcertante - senão mesmo grave - desconhecimento, não só do que se vinha discutindo nos autos, mas, também, da lei e do Direito, poderão ser tidas como “erradamente aplicadas” aos factos assentes, dados como provados;
XXIX) O Recorrente nada mais faz do que discordar da interpretação dos factos que é feita pelo Tribunal a quo e, consequentemente, da respectiva - e adequada - solução de Direito, limitando-se a alegar que os factos dados como provados - e o dever de indemnização à Recorrida que deles se extrai - não se incluem nas previsões dos artigos 189.°, n.°4, 196.°, n.°1 e 198.° do DL n.° 59/99;
XXX) A sentença recorrida não está inquinada de erro - muito menos grave - de julgamento, tendo o Tribunal a quo julgado de forma adequada e com justeza;
XXXI) Face a tudo quanto se disse, é evidente o mérito da sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual deverá, nestes termos, ser integralmente confirmada por este Venerando Tribunal, devendo o recurso interposto ser julgado totalmente improcedente.
Termos em que deve o presente recurso ser considerado totalmente improcedente por falta de fundamento, mantendo-se a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, só assim se fazendo a costumada Justiça!”
O Ministério Público, notificado em 12 de dezembro de 2018, nada veio dizer, requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, a nulidade da Sentença; verificação de erro de julgamento quanto à matéria de facto e quanto à aplicação dos dispositivos legais que foram indicados como fundamentos da decisão ora impugnada (nº 4 do art. 189º, nº1 do art. 196º e art. 198º do dec lei 59/99).”


III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada:
“A) Na sequência de concurso público foi adjudicada pelo Réu à Autora o contrato de empreitada de Execução do Parque Urbano da Quinta do Chafariz em Santigo do Cacém;
B) O contrato de empreitada foi assinado pelas partes em 24/02/2006;
C) O contrato consistia na execução de arranjos exteriores, incluindo pavimentação de zonas pedonais e estacionamento, espaços verdes, fonte cibernética, edifícios de apoio e mobiliário urbano, rede pública e predial de distribuição de água, infraestruturas elétricas e telefónicas, incluindo iluminação, rede de rega, rede de drenagem pública e predial de águas residuais domésticas e pluviais com estação elevatória para a rede de esgotos domésticos;
D) O valor dos trabalhos contratados foi de 1.959.028,45 €;
E) Conforme previsto no Caderno de Encargos a empreitada descrita seguia o regime de série de preços;
F) O projeto de execução a considerar para a realização da empreitada era da responsabilidade do dono da obra tendo sido patenteado a concurso;
G) Em 27/03/2006 foi assinado o auto de consignação;
H) O prazo de execução da obra então fixado foi de 12 meses;
I) Em 11/04/2006 foi entregue pela Autora o Programa de Trabalhos Definitivo;
J) Em 04/07/2007 foi celebrado entre as partes um contrato adicional de trabalhos a mais e a menos, intitulado contrato adicional nº 8/2007;
K) Neste o preço acordado foi de 14.063,92 €, correspondendo à diferença de valor entre os trabalhos a mais e a menos;
L) Em 03/03/2008 foi celebrado um novo contrato adicional de trabalhos a mais e a menos, intitulado nº 2/2008;
M) Neste o preço acordado foi de 136.378,51 € a deduzir ao valor total da empreitada que passou a ser, então, de 1.671.236,07 €;
N) Ambos os contratos com o preço acrescido de IVA à taxa legal em vigor;
O) O contrato de empreitada sofreu cinco prorrogações sendo elas:
- prorrogação legal de 151 dias e graciosa de 46 dias, decidida pelo Réu em 22/03/2007;
- prorrogação legal de 71 dias, decidida pelo Réu em 18/10/2007;
- prorrogação graciosa de 40 dias, decidida pelo Réu em 20/12/2007;
- prorrogação graciosa de 15 dias, decidida pelo Réu em 07/02/2008;
- prorrogação legal de 28 dias, decidida em 21/02/2008;
P) A primeira prorrogação foi decidida pelo Réu em 16/03/2007, e pedida pela Autora em 28/02/2007, fundando-se nos condicionamentos dos trabalhos até essa data, nomeadamente decorrentes da galeria de acesso ao poço, à fonte cibernética e cobertura do edifício de apoio;
Q) A segunda prorrogação foi devida à cobertura do edifício de apoio que foi objeto do contrato adicional descrito em L);
Q) A terceira prorrogação foi pedida em 12/12/2007 e decidida em 14/12/2007 com fundamento nas condições meteorológicas adversas registadas nas 2 semanas anteriores, alterações no pavimento do parque infantil do projeto e atraso no fornecimento de material;
R) A quarta prorrogação data de 11/02/2008 e fundou-se nas condições meteorológicas adversas e conclusão de trabalhos referentes ao contrato adicional nº 2;
S) A última prorrogação foi concedida para finalização dos trabalhos;
T) Em 09/04/2008 foi lavrado Auto de Receção Provisória Parcial com o seguinte teor:
(Dá-se por reproduzido Documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Art.º 663º nº 6 CPC)
U) Foi elaborado anexo a este auto rubricado pelos mesmos assinantes que enumera as anomalias detetadas na receção provisória;
V) Decorrido o prazo de 30 dias fixado para correção das anomalias detetadas pela Autora esta não ocorreu;
X) Não tendo ocorrido mesmo até à entrada da presente ação em juízo, em 20/01/2009;
Z) Relativamente ao plano de trabalhos por si apresentado a obra objeto da empreitada sofreu atraso entre 28/03/2006 e 12/06/2006;
AA) Tal atraso foi justificado na ata de reunião de obra de 13/06/2006 pela Autora com diversos circunstancialismos;
BB) Nas diversas reuniões de obra que tiveram lugar durante a execução da mesma a Autora sustentou que a descoberta do poço cuja existência era desconhecida, ocorreu com a desmatação do local em abril de 2006, motivou atrasos pela necessidade de estudo e adaptação do projeto para essa parte do Parque;
CC) (Facto suprimido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
DD) Os serviços do Ré iniciaram elaboração de projeto para essa zona da obra que vieram a entregar em 19/01/2007;
EE) O projeto consistia na construção de uma galeria sendo esta uma casa 47,46 m2;
FF) O poço encontrava-se na extremidade sudeste do parque;
GG) (Facto suprimido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
HH) A Autora apresentou ao Réu uma proposta de fonte cibernética alternativa àquela que se encontrava prevista no caderno de encargos em 27/06/2006;
II) A fiscalização de obra solicitou à Autora documentação referente a essa fonte alternativa, em 13/09/2006, nomeadamente as fichas técnicas do equipamento para apreciar;
JJ) A Autora não apresentou tais elementos mas antes a proposta de uma segunda fonte alternativa desacompanhada das fichas técnicas;
LL) A Autora veio, ainda, a apresentar uma terceira fonte alternativa, em 10/10/2006, e, em 17/10/2006, entregou as especificações técnicas da mesma;
MM) O Réu, representado pela fiscalização da obra ao seu serviço, aprovou tal proposta em 31/10/2006;
NN) No Plano de Trabalhos encontrava-se prevista a instalação da fonte entre outubro de 2006 e janeiro de 2007;
OO) Tais trabalhos iniciaram-se após a sua aprovação;
PP) No início do mês de dezembro o Réu foi alertado por empresa fornecedora desse tipo de equipamento quanto à possibilidade de a fonte aprovada deter qualidade inferior à pretendida e plasmada no projeto e caderno de encargos;
QQ) Nessa sequência o Réu apresentou à Autora uma ordem de suspensão dos trabalhos relativas à fonte cibernética em 13/02/2007;
RR) Após estudo e avaliação da fonte proposta, e já aprovada previamente, em maio de 2007 o Réu decidiu manter essa aprovação;
SS) A cobertura do edifício de apoio ao Parque não estava comtemplada na proposta, embora constasse das peças desenhadas, pelo que não estava medida no caderno de encargos. (Facto alterado nos termos do Artº 662º nº 1 CPC – antigo Artº 712º CPC)
TT) Além de outros trabalhos a mais foi a cobertura objeto de projeto e contrato adicional;
UU) O edifício de apoio situa-se na extremidade sul do Parque. (Facto corrigido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
VV) (Facto suprimido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
XX) Ficou estabelecido no contrato o pagamento faseado da obra com fundamento em autos de medição mensais elaborados por ambas as partes;
ZZ) Em 17/01/2007 a Autora dirigiu comunicação escrita ao Réu com o seguinte teor:
(Dá-se por reproduzido Documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Art.º 663º nº 6 CPC)
ZZ1 Relativamente ao facto anterior respondeu o Município por oficio nos termos fac-similados no Doc. 29 da Contestação. (Facto introduzido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
AAA) A área total do Parque Urbano da Quinta do Chafariz em Santiago do Cacém é de 11050 m2;
BBB) A fonte cibernética ocupa a área de 256 m2 do parque acrescendo a esta uma envolvente em calçada e situa-se na parte este do Parque;
CCC) Em 12/06/2008 a Autora dirigiu ao Réu ofício no qual formula pedido de indemnização fundado nos sobrecustos invocados neste processo peticionando o mesmo valor;
DDD) Em 09/07/2008 o Réu responde negativamente a tal pedido;
EEE) A Autora deu entrada à presente ação em 20/01/2009;
FFF) O estaleiro da obra esteve montado o período que a mesma durou;
GGG) (Facto suprimido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
HHH) Tais mobilizações e desmobilizações implicaram para a Autora custos inesperados;
III) (Facto suprimido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
JJJ) Os gastos com a estrutura central imputados à obra representaram o dobro do esperado atendendo a que a obra durou o dobro do tempo de execução em relação ao programado;
LLL) A faturação foi prolongada pelo dobro do tempo previsto pela Autora;
MMM) No cálculo dos custos diretos da Autora com a obra em questão esta determina uma improdutividade de 56 % e na componente de estrutura de custos um aumento de 40% do valor final faturado na empreitada e referido em M);
NNN) No cálculo dos custos indiretos a Autora fixa uma improdutividade da mesma ordem de grandeza e na componente de estrutura de custos correspondente a 25% do valor faturado e indicado em M);
OOO) (Facto suprimido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
PPP) Aquando da suspensão ordenada pelo Réu para reavaliação da fonte aprovada a Autora forneceu elementos adicionais a fim de abreviar o período de paragem dessa parte da obra;
QQQ) A obra esteve quase parada entre finais de maio de 2007 e fim de junho de 2007 sem que a Autora desenvolvesse trabalho em qualquer frente;
RRR) A entrada na obra de equipamentos e trabalhadores era feita pela zona Noroeste do Parque (Facto corrigido nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961);
SSS) Na obra em causa existia em permanência um fiscal do Réu;
TTT) O Diretor de Obra fazia ausências da mesma por vários dias o que conduziu à desmarcação de reuniões agendadas com o Réu;
UUU) Não obstante se encontrassem previstas penalidades para atrasos injustificados na empreitada o Réu não as aplicava.”

IV – Do Direito
No que aqui releva, discorreu-se no discurso fundamentador da decisão recorrida:
“(…)
Da análise deste regime decorre, pois, que se encontrava previsto o direito de indemnização por danos emergentes de factos não imputáveis ao empreiteiro.
Do mesmo modo que decorre que se porventura o dono da obra tiver concedido ao empreiteiro prorrogação de prazo (leia-se prorrogação legal do prazo) e ter procedido a revisão de preços não significa que desse alargamento do prazo de execução da empreitada não possa o empreiteiro ter sofrido danos ressarcíveis pelo dono da obra ao abrigo do disposto nos arts. 195º, nº 2 e 196º do RJEOP.
Perscrutado, pois, tal regime já não vigente conclui-se que aqueles acontecimentos que interferiram com o desenvolvimento normal da execução dos trabalhos que não se devem a razões imputáveis ao empreiteiro, mas, pelo contrário, ao dono da obra (como trabalhos a mais, alterações ao projeto, etc.), a força maior (como condições climatéricas adversas) e a maior onerosidade (como a aplicação de outros materiais mais dispendiosos), então a responsabilidade pela dilação não se pode imputar ao primeiro e os danos sofridos deverão ser suportados pelo segundo, por não corresponderem a riscos que devam ser seguros pelo empreiteiro nos termos do contrato.
Passando agora à análise do caso dos autos há que admitir – como o fez uma testemunha em sede de audiência final destes autos – que um contrato de empreitada sem a mínima alteração ou incerteza na sua execução não existe, apenas no campo teórico. É, igualmente, verdade que qualquer plano de execução pode, e deve, sofrer modificações por alteração anormal e imprevisível das circunstâncias em que as partes hajam fundado a decisão de contratar (cfr. art. 437º, nº 1, do C.C.).
Porém, em tal hipótese, deverá haver lugar a revisão de preços, cfr. arts. 198º e 199º.
No caso em apreço não logrou o Tribunal apurar se houve lugar a revisão de preços e de que modo.
Porém o que resulta inequívoco e até pacífico entre as partes é a concessão de cinco prorrogações sendo parte delas legais.
E, com efeito, a mera concessão de uma prorrogação já é motivo suficiente para a revisão de preços se o equilíbrio económico e financeiro da proposta tiver, em consequência, sofrido alteração. Nesse caso, para repor esse equilíbrio e para que o empreiteiro não sofra agravamento de encargos na execução da empreitada, haverá revisão. A revisão não serve para cobrir prejuízos mas antes para atualizar os preços em função dos encargos inicialmente não previstos com o alongamento do prazo de execução da empreitada. Tal, porém, não quer dizer que o alargamento não possa ter provocado na esfera económica e empresarial do empreiteiro danos próprios (tais como perda de outras empreitadas, retardamento prejudicial de outros contratos, onerosidade com a deslocação de meios humanos e materiais, subaproveitamento dos operários e do equipamento, etc.).
Quer isto dizer, enfim, que os fundamentos da revisão não anulam, nem inibem o acionamento dos fundamentos da indemnização, porque pertencem a conjuntos diferentes (ainda que, da sua intersecção, possam resultar causas comuns). Aqui chegados delimitamos o objeto da sua análise em função da definição do pedido e, assim, consagrar que a pretensão indemnizatória deduzida pela Autora contra o Réu reside no circunstancialismo factual de a empreitada que executou para este se haver prolongado no tempo e por período além daquilo que estava contratualizado, prolongamento esse que se deveu a causas que lhe são totalmente alheias e que motivaram atrasos na execução bem como foram causa de prejuízos patrimoniais com perda de faturação e de produtividade computados no valor global de 608.329,95 € acrescido de juros vencidos e vincendos.
Posto isto, em função do quadro factual apurado afigura-se ao Tribunal conceder, ainda, que parcialmente provimento de causa à Autora. Com efeito, presente a factualidade atrás fixada, designadamente, as alíneas O), P), Q), R), BB), CC), DD), GG), QQ), RR), ZZ), GGG), HHH), III), JJJ), LLL), MMM), NNN), OOO) temos como causas objetivas de alteração ao Plano de Trabalhos apresentado pela Autora e aprovado pelo Réu, o surgimento de três aspetos fulcrais à obra, a saber, o achamento do poço e a posterior construção de uma galeria sobre o mesmo, a fonte cibernética e a cobertura do edifício de apoio, que importaram uma destabilização àquele porque criadora de entraves ao decurso lógico previsto. Por outro lado, e por via desses mesmos circunstancialismos, temos o funcionamento do Réu que não facultando resposta célere àquelas questões veio mesmo a determinar a suspensão parcial das obras nesses locais, em duas ocasiões, acarretando uma improdutividade quer de meios quer de equipamentos afetos à obra e para a mesma mobilizados. É que, com efeito, invoca o Réu uma deficiente planificação desde o princípio da obra mas também ele não denotou agilização bastante para resolver as questões imprevistas que surgiram. Veja-se que no que respeita ao projeto da galeria este demorou a ser concebido desde maio de 2006 a janeiro de 2007. E, note-se, que se trata de um mero edifício com 46 m2. Por outro lado, uma vez decidida, porque aceite, a fonte cibernética a instalar na obra, veio o Réu a suspender tal instalação para reanálise que decorreu ao longo de 5 meses pois determinou a sua suspensão em maio e somente a aceitou definitivamente em maio. Já no que tange à cobertura em falta no edifício de apoio do Parque foi a omissão de projeto detetada em outubro de 2006 e somente em 04/07/2007 veio a ser celebrado o contrato adicional que a incluía como trabalho a mais a executar.
Não conseguindo o Réu eximir-se às suas responsabilidades nas diversas situações abordadas, aliás expressamente reconhecidas pelo próprio, deferiu com fundamento nas mesmas o período total de 250 dias de prorrogação legal.
Todavia, reconhece o Tribunal que se períodos houve em que a Autora não dispunha de margem de manobra suficiente para executar trabalhos e encetar novas frentes de trabalho, como quando estavam suspensos os mesmos em certas zonas e aguardavam definições de projeto e de equipamento – designadamente nas partes sudoeste, sudeste e este do Parque – outros momentos houve em que a Autora se coibiu de recuperar os atrasos na execução, avançando de modo mais célere.
Isto para se concluir que somente se admite como suscetíveis de reparar os dias adicionais de contrato concedidos a título de prorrogação legal e não os demais, ou seja, graciosos, porque se entendem imputáveis à Autora os seus fundamentos.
Desta forma, entende-se que estão reunidos os requisitos legalmente exigidos para a concessão da indemnização peticionada pela A. e que, como tal, lhe assiste o direito a obtê-la nos termos do disposto nos arts. 189º, nº 4, 196º, nº 1 e 198º do RJEOP. E, assim sendo, aceitando-se os prejuízos reclamados pela Autora nessa medida se entende dever ser ressarcida.
Concretizando: Partindo dos valores calculados como sobrecustos diretos e indiretos correspondentes a 12 meses além do prazo de execução contratualmente previsto – e cuja racionalidade o Tribunal entende ajustada face à ponderação que em casos similares já apreciou – façamos a correspondência daqueles 250 dias de prorrogação legal concedida que se traduzem em 8 meses.
Ponderados os rácios de improdutividade quanto aos custos diretos e indiretos em tal lapso temporal e ainda a componente de estrutura alcançamos os seguintes valores que são devidos pelo Réu, respetivamente: 249.571,26 € e 155.982,03 €, o que totaliza 405.553,29€.
(…)”

Enquadrando:
A sentença recorrida condenou o Município de Santiago do Cacém a pagar à massa insolvente de T...., SA a indemnização de 405.553,20€ acrescida de juros computados à taxa legal de 11,07% até 20/01/2009 e naqueles que venham a vencer até efetivo e integral pagamento”, por atrasos na execução da obra.

Os originariamente peticionados 640.617,27€, visavam indemnizar a Autora em resultado dos invocados atrasos na execução da obra imputáveis ao Município.

A controvertida obra foi consignada em 24/03/2006 e tinha o prazo de 12 meses, a contar daquela data nos termos do art. 152º do DL nº 59/99, devendo ter sido concluída em 23/04/2007.

Não resulta dos elementos de prova disponíveis que a obra tenha estado totalmente suspensa, ainda que tenha chegado a estar parcialmente suspensa numa ocasião.

Resulta ainda demonstrado que foi feita a receção provisória parcial da Obra em 9/4/2008 atenta a então invocada deficiente execução parcial da mesma, sendo que o prazo inicial da empreitada foi objeto de três prorrogações legais, no total de 250 dias, a primeira de 152 dias, aprovada pela Câmara Municipal em 22/3/2007, a 2 dias de terminar o prazo para a conclusão da obra; a segunda, de 71 dias, em 18/10/2017, 6 meses depois do termo do prazo contratual e uma última em 7/2/2008 de perto de um ano, depois do termo do prazo contratual.

O prazo contratual foi ainda objeto de três prorrogações graciosas, num total de 101 dias, a primeira de 46 dias (em 22/3/2007), a segunda de 40 dias (em 20/12/2017) e a terceira de 15 dias (em 31/01/2008).

Foram ainda celebrados 2 contratos Adicionais que implicaram novos prazos para a execução das obras objeto dos mesmos, o que se não consubstancia em atrasos do prazo inicial, por constituírem contratos autónomos.

A contratualização da Fonte cibernética foi proposta por 400.000€, a qual deveria ser instalada até Janeiro de 2006.

Não obstante o referido, a Autora, aqui Recorrida, só em 26/07/06, entregou à Fiscalização da Obra proposta alternativa de fonte cibernética, tendo em 22/8/2006 sido apresentada nova proposta com o mesmo objetivo, a qual foi devolvida por ausência de fornecimento de elementos complementares solicitados.

Em 10/10/2006 foi apresentada nova Proposta de Fonte Cibernética, tendo as correspondentes especificações sido apresentadas em 17/10/2006, e merecido a correspondente aprovação em 31/10/2006, sucessão de atrasos que, em bom rigor, não podem ser imputados predominantemente ao Município.

Se é certo que, por insuficiências do projeto da Fonte apresentada, o Município suspendeu os correspondentes trabalhos de instalação, tal, no entanto, não colidiria com o prosseguimento dos restantes trabalhos do Parque Urbano.

Em qualquer caso, a sentença recorrida, como se disse, julgou a ação parcialmente procedente e condenou o Município a pagar à A., aqui recorrida a quantia de 405.553,29€, acrescida de juros à taxa legal de 11,07% até 20/1/2009 e os que se venham a vencer até integral e efetivo pagamento, nos seguintes termos:
“...A pretensão indemnizatória deduzida pela Autora contra o Réu reside no circunstancialismo factual de a empreitada que executou para este se haver prolongado no tempo e por período além daquilo que estava contratualizado, prolongamento que se deveu a causas que lhe são totalmente alheias e que motivaram atrasos na execução bem como foram causa de prejuízos patrimoniais com perda de faturação e de produtividade
”Perante a factualidade fixada, designadamente as alíneas O) P) Q) R) BB) CC) DD) GG) QQ) RR) ZZ) GGG) HHH) III) LLL) MMM) NN) e OOO) “temos como causas objetivas de alteração ao Plano de Trabalhos apresentado pela autora e aprovado pelo Réu, o surgimento de três aspetos fulcrais à obra, a saber o achamento do poço e a posterior construção de uma galeria sobre o mesmo, a fonte cibernética e a cobertura de edifício de apoio que importaram uma destabilização àquele porque criadora de entraves ao de curso lógico previsto”;
“O Réu invoca uma deficiente planificação desde o princípio da obra mas também ele não denotou agilização bastante para resolver as questões imprevista a instalar na obra..”,
Quanto à fonte cibernética “...a instalar na obra, o Réu veio a suspender tal instalação para reanálise..”
Quanto à cobertura em falta no edifício do apoio ao Parque foi a omissão de projeto detetada em Outubro de 2006 e somente me 4/7/2007 veio a ser somente celebrado o contrato adicional...”;
Contudo, “ ...outros momentos houve em que a Autora não se coibiu de recuperar os atrasos na execução
“Partindo dos valores calculados como sobrecustos diretos e indiretos correspondentes a 12 meses além do prazo contratualmente previsto...façamos a correspondência daqueles 250 dias de prorrogação legal concedida que se traduzem em 8 meses...” o que totaliza 405 553,20€”

Conclui o Tribunal “a quo” que “existindo atrasos geradores de sobrecustos ocorrerá a possibilidade de indemnização nas situações de maior onerosidade nos termos previstos no art. 196º do RJEOP/99.

Entendeu o assim o tribunal a quo que se terão verificado sobrecustos da responsabilidade do Município que terão penalizado o empreiteiro, conclusão, simplista e não demonstrada.

No que aqui releva, mais se discorreu na decisão recorrida:
a) “...qualquer plano de execução pode, e deve, sofrer modificações por alteração anormal e imprevisível da circunstâncias em que as partes hajam fundado a decisão de contratar ( cfr. Art. 437º nº 1 do CC)”;
b)”...Porém, em tal hipótese, deverá haver lugar a revisão de preços, cfr. arts. 198º e 199º. No caso em apreço não logrou o Tribunal apurar se houver lugar a revisão de preços e de que modo ...”;
c)“...A mera concessão de uma prorrogação já é motivo suficiente para a revisão de preços se o equilíbrio económico e financeiro da proposta tiver, em consequência, sofrido alteração. Nesse caso, para repor esse equilíbrio e para que o empreiteiro não sofra agravamento de encargos na execução da empreitada, haverá revisão. A revisão não serve para cobrir prejuízos mas antes para atualizar os preços em função dos encargos inicialmente não previstos com alongamento do prazo da execução da empreitada. Tal, porém, não quer dizer que o alargamento não possa ter provocado na esfera económica e empresarial do empreiteiro danos próprios...”;
d)“ ...Quer isto dizer, enfim, que os fundamentos da revisão não anulam, nem inibem o acionamento dos fundamentos da indemnização, porque pertencem a conjuntos diferentes…”;

Analisemos os vícios recursivamente suscitados:
Da nulidade da sentença
Entende o Recorrente que relativamente à factualidade com interesse para a decisão, não foram incluídos na decisão factos alegados que deveriam ter sido dados por provados.

O objeto da Ação assenta predominantemente na circunstancia de terem sido verificados atrasos de execução da obra, sendo que cada uma das partes imputa no essencial a responsabilidade dos mesmos à contraparte.

Há que reconhecer, desde logo, que a justificação dada pelo Tribunal relativamente à matéria de facto fixada, e atenta a natural divergência das partes, se mostra insuficiente.

Efetivamente, afirmou-se a esse respeito singelamente em 1ª Instância o seguinte:
“A convicção do Tribunal assentou nos documentos juntos pelas partes aos autos e que não foram objeto de qualquer forma de impugnação. No demais atendeu-se ao que resultou do depoimento das testemunhas produzido em audiência final sendo o mesmo apreciada de acordo com a livre convicção do julgador e as regras da experiência comum designadamente por apelo ao constante dos documentos e confrontações.”

Ressalta que na seleção da matéria de facto não foi pois dado cumprimento ao nº 4 do art. 607º CPC, o qual refere expressamente que “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”

Em bom rigor o tribunal fixou conclusivamente os factos, tendo decidido do mesmo modo.

Em qualquer caso, o referido, só por si, não determinará necessariamente a nulidade do julgado, conquanto se mostre adequado e possível proceder em sede de recurso à correção e adequação da matéria dada como provada à prova disponível.

Refira-se, no entanto, e a titulo de exemplo face às insuficiências da matéria dada como provada, que o tribunal a quo entendeu, com relevância para o que veio a decidir, que “No caso em apreço não logrou o Tribunal apurar se houve lugar a revisão de preços e de que modo”, tendo descartado prova que se encontrava disponível.

Efetivamente, foram juntos aos Autos, com a Contestação do Município (Doc. 44 e 45), duas faturas de revisão de preços emitidas pelo aqui Recorrido, datadas de 5/12/2007 e 21/1/2008, no montante de 18.056,23€ e 74.321,93€, o que significa que nunca o tribunal a qual poderia concluir pela inexistência de Revisão de preços.

Correspondentemente, impugna o Recorrente a matéria de facto, nos termos infra analisados:
a) Na Alínea SS) dos factos provados diz se que: “A cobertura do edifício de apoio ao Parque não se encontrava prevista no projeto patenteado a concurso tendo sido detetada a falha em outubro de 2006 ”

É o próprio Recorrido quem, em telefax de 13/10/2017 (Doc. 30 da Contestação) refere que “Vimos por este meio alertar que no artigo 3.1, referente à cobertura do edifício de apoio, não está contemplado na proposta o painel Sandwich com tipo “Ondutherm”. Como este material se encontra nas peças desenhadas e pressupondo a intenção de execução do referido trabalho, informamos que o nosso melhor preço é de 87,30/m2”.

Assim, admite-se introduzir a seguinte Redação no facto provado SS):
“A cobertura do edifício de apoio ao Parque não estava comtemplada na proposta, embora constasse das peças desenhadas, pelo que não estava medida no caderno de encargos”.

b) “A matéria levada às alíneas GGG) III) e OOO) da factualidade assente não constituem factos, mas conclusões, que não são suscetíveis de integrar os “factos” assentes”.
Devem, pois, ser suprimidas da factualidade provada as referidas Alíneas GGG) III) e OOO).”

Para permitir uma mais eficaz visualização dos referidos factos, infra se reproduzem aqui os mesmos:
“GGG) As indefinições no projeto inicial e projetos adicionais necessários conduziram a mobilizações e desmobilizações de meios humanos e equipamento que não se encontravam programadas no Plano de Trabalhos;
III) As suspensões parciais na obra, na zona da fonte cibernética e zona do poço e galeria, implicaram replanificação dos trabalhos e perda de rentabilidade dos meios humanos e equipamentos deslocados para a obra;
OOO) Com os mesmos meios humanos e equipamento a Autora executou metade da produtividade esperada pelo que quase duplicou os seus custos de mão-de-obra, materiais, equipamentos e estrutura de base bem como com a engenharia civil, segurança da obra, ambiente, qualidade e estaleiro;”

Admite-se que os referidos factos se mostram conclusivos, em face do que serão suprimidos da matéria dada como provada, nos termos do Artigo 662.º (art.º 712.º CPC 1961) – “Modificabilidade da decisão de facto 1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”

“c) O facto assente sob a Alínea OO) dos factos assentes: na alínea NN) anterior diz se que “No plano de Trabalhos encontrava-se prevista a instalação da fonte entre outubro de 2006 e janeiro de 2017” e no seguimento na referida alínea OO) Tais trabalhos iniciaram-se após a sua aprovação” que segundo o facto assente sob alínea MM) se diz que ocorreu em 31/10/2006,
O que cria ou pode criar a convicção que o primitivo A. instalou a fonte cibernética no período que ele próprio indicou e que consta da Alínea NN) (entre final de outubro de 2006 e Janeiro de 2007).”
Ora, o facto assente sob a alínea OO) não corresponde à verdade ou é pouco rigoroso, pois, como se vê da ata de reunião de obra de 03/07/2007 como doc. nº41 junto com a contestação, documento não impugnado assinada pelos representantes da primitiva A., nessa data, 03/07/2007 (9 meses depois da aprovação), escreveu se: “O empreiteiro informou que somente durante a próxima semana é que o fornecedor da fonte se deslocará à obra. A fiscalização solicitou que sejam entregues individualmente para cada componente da fonte cibernética.”

Em face do que precede, entende o Recorrente que “deverá ser suprimida Alínea OO) dos factos provados”

Refere-se nos referidos factos:
“NN) No Plano de Trabalhos encontrava-se prevista a instalação da fonte entre outubro de 2006 e janeiro de 2007;
OO) Tais trabalhos iniciaram-se após a sua aprovação;”

Neste caso, entende-se que a redação dos aludidos factos se mostra percetível, não induzindo em erro, em face do que se manterá a mesma.

“c) (Alínea c) repetida no original) “As Alíneas HH) a MM) elencam factos relativos à proposta da primitiva A. de variante da fonte cibernética projetada, mas porque o Tribunal a quo ignorou factos comprovados nas atas de reuniões de obra (assinadas por recorrente e recorrida), designadamente as atas nº 13, nº 15, nº 17 juntas à contestação como docs. 21, 23 e 25, não se mostra esclarecida a verdade dos factos, o que seguramente influiu na decisão final;
Devem ser aditados os seguintes factos que se mostram provados pelos docs. 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 28 juntos com a contestação que são atas de reuniões de obra assinadas pelas partes, de modo a esclarecer os atos de ambas as partes e, assim, a matéria relativa à fonte cibernética provada e que consta das Alíneas HH) a MM):
“Na reunião de obra de 27/6/2006, o empreiteiro disse que iria apresentar um memorando relativamente a uma proposta alternativa” doc. 21 junto com a contestação do ora recorrente
“Na reunião de obra de 26/7/2006 o empreiteiro entregou elementos referentes à fonte cibernética” doc. 22 junto com o articulado referido
“Na reunião de obra de 8/8/2006 o dono de obra solicitou documentação referente à fonte cibernética nomeadamente fichas técnicas do equipamento a aplicar na mesma forma a poder tomar uma decisão” doc . 23 idem
“Na reunião de obra de 22/8/2006, relativamente à fonte cibernética, o empreiteiro entregou as fichas técnicas referentes à fonte cibernética da proposta inicial e entregou uma nova proposta acompanhada de demonstração em obra” doc, 24 idem
“Na reunião de obra de 13/9/2006 a fiscalização devolveu o pedido de aprovação da fonte cibernética, uma vez que não foram fornecidos os elementos pedidos “O empreiteiro entregou proposta definitiva do projeto alternativo da fonte cibernética” doc.25 idem
“Na reunião de obra de 17/10/2006 o empreiteiro forneceu todos os elementos solicitados” doc. 26 idem
“Na reunião de obra de 10/10/2006 a fiscalização, após parecer favorável do projetista e do responsável da divisão de águas e saneamento básico, concorda com a variante da fonte cibernética prevista no caderno de encargos apresentada pelo empreiteiro” doc. 28 idem.”

Os “Factos” enunciados, meramente descritivos de diligencias intercalares e instrumentais aí referidas, não acrescentariam à matéria de facto quaisquer elementos relevantes para a decisão proferida ou a proferir, pelo que não serão incorporados na matéria de facto Provada.

“d) Os factos dados por assentes nas Alíneas UU) e RRR) que indicam a localização do edifício de apoio ao Parque na extremidade sudoeste e a entrada de equipamentos e trabalhadores na obra no extremo sudoeste não corresponde à realidade, pois como é público e notório o edifício de apoio do Parque está implantado a sul do parque e a entrada de equipamentos e trabalhadores era feito pelo estaleiro colocado a Noroeste situado a Noroeste.
Devem, pois, serem corrigidos em conformidade as Alíneas UU) e RRR), respetivamente substituindo-se “extremidade sudoeste” por “sul” e “extremo sudoeste” por “Noroeste”.

As aludidas referências não sendo essenciais ao sentido da decisão proferida e a proferir, em qualquer caso, no respeito pela verdade material, admite-se incorporar nos factos respetivos, as correções propostas.

“e) As Alíneas CC), GG) e VV) não correspondem à verdade e não podem estar sustentados em documentos válidos constantes do processo, porque efetivamente só foi aprovado uma suspensão da obra a referida na alínea QQ) dos factos provados.
Devem, pois, ser suprimidas do conjunto da factualidade dada por provada”

Efetivamente, não resultando da prova disponível que as suspensões enunciadas nos três factos referidos tenham ocorrido, e a terem-se verificado, que tenham sido da responsabilidade do Município, que não por mera afirmação conclusiva do tribunal a quo, não suportada em qualquer prova identificada, serão suprimidos da matéria de facto os referidos factos.

“f) À carta do primitivo Autor, ora recorrido, integralmente transcrita sob a Alínea ZZ, o ora recorrente deu resposta por ofício da mesma data e que juntou à contestação com doc. 29.
Deve, assim, ser aditado novo facto que deverá transcrever o referido ofício do Município que foi junto à contestação e se encontra nos autos.”

Em nome da verdade material, introduzir-se-á um facto ZZ1, no qual se referenciará que, “relativamente ao facto anterior respondeu o Município por oficio nos termos fac-similados no Doc. 29 da Contestação”.

Do erro de julgamento,
Tal como recursivamente suscitado, mostra-se que a decisão objeto de Recurso não teve em consideração factualidade que se mostraria essencial à compreensão da matéria controvertida, o que acabou por comprometer uma visão necessariamente equidistante que se imporia que tivesse sido adotada.

Aqui chegados, dispõe o art 189º do Dec lei 59/99:
“1 O dono da obra tem direito de rescindir o contrato se a suspensão pelo empreiteiro não houver respeitado o disposto no artigo 185.º
2 O empreiteiro tem o direito de rescindir o contrato se a suspensão for determinada ou se mantiver:
a) Por período superior a um quinto do prazo estabelecido para a execução da empreitada, quando resulte de caso de força maior;
b) Por período superior a um décimo do mesmo prazo, quando resulte de facto não imputável ao empreiteiro e que não constitua caso de força maior.
3 Verificando se a hipótese prevista na alínea a) do número anterior, a indemnização a pagar ao empreiteiro limitar se á aos danos emergentes.
4 Quando não se opere a rescisão, quer por não se completar em os prazos estabelecidos no n.º 2, quer por a não requerer o empreiteiro, terá este direito a ser indemnizado dos danos emergentes, bem como, se a suspensão não resultar de caso de força maior, dos lucros cessantes. “

E o art. 196º do diploma referido estabelece:
“1- Se o dono da obra praticar ou der causa a facto donde resulte maior dificuldade na execução da empreitada, com agravamento dos encargos respetivos, terá o empreiteiro direito ao ressarcimento dos danos sofridos.
2 No caso de os danos provados excederem 20% do valor da empreitada, assiste ao empreiteiro, além disso, o direito de rescindir o contrato”.

Já o art. 198º nº 1 prescreve que
“Quando as circunstâncias em que as partes hajam fundado a decisão de contratar sofram alteração anormal e imprevisível, de que resulte grave aumento de encargos na execução da obra que não caiba nos riscos normais, o empreiteiro terá direito à revisão do contrato para o efeito de, conforme a equidade, ser compensado do aumento dos encargos efetivamente sofridos ou se proceder à atualização dos preços.”

O transcrito nº 4 do art. 189º reporta-se à situação em que não é acionada a rescisão do contrato por parte do empreiteiro, quando o dono de obra tiver aprovado a suspensão da obra fora dos condicionalismos do art. 185º .

Há pois uma questão que importa aqui sublinhar e que se prende com a circunstância de não ter ficado demonstrado que a obra tenha sido suspensa por diversas vezes por responsabilidade direta do dono de obra, uma vez que apenas se deu como provado que “o Réu apresentou à Autora uma ordem de suspensão dos trabalhos relativas à fonte cibernética em 13/02/2007” (Facto QQ), sendo que, mesmo esta suspensão teve apenas caráter parcial, não colidindo com o normal prosseguimento do restante contratualizado.

Acresce que a aqui Recorrida não logrou demonstrar quaisquer danos emergentes relativamente aos quais se impusesse a sua indemnização, nomeadamente à luz do nº 4 do art. 189º do DL nº 59/99.

Por outro lado, mesmo face à responsabilidade decorrente do Artº 196º do DL nº 59/99, assenta a mesma na responsabilidade civil do dono da obra causadora de danos ao empreiteiro, o que igualmente o aqui Recorrente não logrou demonstrar, que não por meras referências conclusivas que acabaram, nos mesmos termos, por ser acolhidas pelo tribunal a quo.

Efetivamente, a verificar-se Responsabilidade Civil, assentaria a mesma em dolo ou mera culpa do Município o que se não mostrou provada.

Não só não se provou dolo ou mera culpa do Município, como não se provaram os concretos danos e a sua medida, o que sempre determinaria a inaplicabilidade do art.º 196º do DL 55/99, o qual impõe como pressuposto uma maior onorosidade para o empreiteiro “Se o dono da obra praticar ou der causa a facto donde resulte maior dificuldade na execução da empreitada, com agravamento dos encargos respetivos (…)”.

Finalmente, não se reconhece igualmente, perante a factualidade dada como provada, que se mostra aplicável o art. 198º do DL 59/99, que, neste caso pressuporia a “Alteração de circunstâncias”, perante a “(…) alteração anormal e imprevisível, de que resulte grave aumento de encargos na execução da obra que não caiba nos riscos normais”, situação que determinaria que o empreiteiro tivesse direito “à revisão do contrato para o efeito de, conforme a equidade, ser compensado do aumento dos encargos efetivamente sofridos ou se proceder à atualização dos preços.”

Acresce que mal se compreenderia que os conclusivamente invocados danos decorrentes da prorrogação do prazo contratual inicial consequentes de contratos adicionais merecessem ser indemnizados, quando estes contratos foram correspondente e autonomamente pagos ao empreiteiro, sendo que este foi ainda, ao contrário do afirmado em 1ª Instância, remunerado acrescidamente em sede de revisão de preços.

Não cabem ainda pois na previsão do art.º 198º do DL 59/99, os invocados danos decorrentes de prorrogações de prazo, consequentes da necessidade de avaliação das apresentadas propostas variantes feitas pelo empreiteiro relativamente à fonte cibernética, cuja proposta inicial havia evidenciado insuficiências notórias por parte do Município, por não corresponder às peças desenhadas constantes do contrato de empreitada.

Por outo lado, não pode o empreiteiro vir em sede contenciosa a reclamar danos decorrentes de erros e omissões do Projeto, quando, a verificarem-se, sempre teriam de ter sido suscitados no prazo de 66 dias a contar da consignação, nos termos do Artº 14º do DL 55/99, onde, sendo caso disso, são discriminados todos os procedimentos a adotar por ambas as partes, não havendo quaisquer indícios que tal reclamação tenha sido feita.

Assim, importa concluir que a Sentença Recorrida, tendo assentado, em boa medida, em factualidade insuficiente e parcial, o que veio a condicionar negativamente a decisão proferida, e não tendo sido demonstrado que o equilíbrio económico e financeiro da proposta tenha vindo a sofrer alterações significativas, que não tenham sido salvaguardadas por via dos contratos adicionais e Revisão de Preços, tal determina que se conceda provimento ao Recurso e se revogue a sentença Recorrida, julgando-se improcedente a Ação.

* * *

Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao Recurso, revogar a Sentença Recorrida, e julgar improcedente a Ação.

Custas pela Recorrida

Lisboa, 9 de março de 2023
Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes

Lina Costa