Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07489/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/10/2014
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:ANULAÇÃO DE VENDA/ NATUREZA DO PRAZO/ TEMPESTIVIDADE/ JUNÇÃO DE DOCUMENTOS
Sumário:I . A junção de documentos com as alegações de recurso só é lícita relativamente: aqueles cuja junção apenas se tornou necessária em resultado do julgamento em 1ª instância; aqueles cuja apresentação não tenha sido possível até ao encerramento da discussão da causa na 1ª instância; aqueles que se destinem a provar factos posteriores à petição e à resposta ou contestação; aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior à apresentação das referidas peças processuais.

II. No caso, o incidente de anulação de venda foi deduzido ao abrigo do disposto no artigo 257º, nº1, alínea c) do CPPT, nos termos do qual a anulação de venda pode ser requerida no prazo de 15 dias, esclarecendo o nº2 do mesmo preceito que o prazo se conta a partir da data da venda, a qual teve lugar em 20/11/07.

III. Se tomarmos em consideração o prazo de 15 dias, contados a partir do dia 21/11/07 (inclusive), temos que o termo desse prazo coincide com o dia 05/12/07. O dia 05/12/07 foi precisamente a data em que a p.i de anulação de venda foi remetida, via correio registado, para o Serviço de Finanças, pelo que, nos termos do disposto no artigo 150º, nº2, alínea b) do CPC (na redacção vigente à data dos factos), ex vi artigo 2º, al. e) do CPPT, há que considerar a data da efectivação do registo como aquela em que a peça processual se considera apresentada.

IV. Os prazos para requerer a anulação de venda efectuada em processo de execução fiscal – que, nos termos do artigo 103º da LGT, tem natureza judicial – são prazos judiciais, contados nos termos do artigo 144º do CPC (artigo 138º do NCPC), por força do disposto no artigo 20º, nº2 do CPPT. Assim sendo, atenta a natureza do prazo em análise, ao mesmo sempre seria aplicável o disposto no artigo 145º, nº 5 do CPC (139º, nº5 do NCPC), isto é, a possibilidade de praticar o acto dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, possibilidade esta dependente do pagamento de uma multa.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. Relatório

Cipriano ………………., m.i nos autos, inconformado com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja que, no âmbito da execução fiscal nº ………………, julgou improcedente o pedido de anulação de venda, por entender verificada a caducidade do direito de acção, dela interpôs recurso jurisdicional.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:


“1º

O recorrente a 05/12/07, por carta registada, fez dar entrada no SF de Finanças de Vila Viçosa de um pedido de anulação de venda, do dia 20/11/07, de um imóvel urbano, de sua propriedade, que havia sido adjudicado à Caixa Geral de Depósitos.


Na carta de envio foi pedido ao senhor Chefe do SF que desse entrada ao requerimento e devolvesse a cópia/recibo.


Foram alegados vários vícios, formais e materiais, que eventualmente conduziriam à procedência do referido incidente.


O requerimento enviado dia 5/12/2007, por correio registado, considera-se efectuado no dia do registo do correio.


Não no dia ou nos dias posteriores quando da recepção na secretaria ou in casu no SF.


É o que emana do artigo 150º do CPC e norma correspondente artº 26º do CPPT.


A douta sentença de que se recorre considerou improcedente o pedido de anulação por se ter verificado caducado o direito do requerente a praticar o acto,


A senhora juíza, a quo, refere que a data de entrada a 6/12/2007, da peça processual do pedido de anulação de venda, teria sido intempestivo, dado que o terminus do prazo teria ocorrido a 5/12/2007.


Ocorreu lapso manifesto do Serviço de Finanças que não terá averbado o envio pelo correio registado e a junção da carta de envio da peça processual;

10º

O recorrente fez prova nos autos, juntando o documento de registo correio, devidamente averbado do dia 5/12/07 e ainda o envelope de recepção da cópia/recibo e requereu a rectificação, da decisão.

11º

Ocorreu omissão de pronúncia à junção de documentos;

12º

Foram os serviços de Finanças que informaram devidamente os autos e induziram a senhora juiz em erro que foi manifesto na decisão e prejudicaram o recorrente na apreciação do seu pedido de anulação de venda, porque tempestivo.

13º

A senhora juíza incorreu em manifesto erro ao considerar o pedido intempestivo por ter entrado no dia 6/12/2007, desconhecendo que havia sido enviado por carta registada no dia 05/12/2007.

14º

Foram violadas as normas plasmadas nos artigos 150º do CPC e 26º do CPPT.

Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre muito douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento, revogando-se a decisão recorrida por manifesto erro material, na apreciação e contagem do prazo de anulação da venda, devendo a mesma ser revogada, ordenando-se o prosseguimento dos autos, para apreciação do pedido dele constante.”

Com o requerimento de interposição de recurso, apresentado em simultâneo com um pedido de rectificação de erro da sentença (cfr. fls. 146), foi junto um documento: o original do talão de aceitação/ correio registado/ correspondências, a que corresponde o nº RO ……………. PT, cujo carimbo nele aposto pelos CTT tem a data de 05/12/07 (fls. 147);

A Mma. Juiz, aquando da apresentação do requerimento de interposição de recurso e junção do documento consistente no referido talão de aceitação, proferiu um despacho com o seguinte teor: “Àquele que invocar o direito cabe a sua demonstração pelo que se determina a notificação do autor do autor para apresentar prova do facto alegado no requerimento que antecede”.

Em consequência, foi junta cópia da frente de um envelope timbrado do Ministério das Finanças/ Direcção-Geral dos Impostos, com o carimbo aposto do Serviço de Finanças de Vila Viçosa, no qual, na parte reservada ao destinatário, consta a indicação Jorge …………..(advogado), Edifício …………….., 3º andar, Sala ………, ………. ………….


*

Sobre o requerimento apresentado a fls. 146, recaiu o seguinte despacho (cfr. fls. 160):

“(…)

Instaurados que foram os presentes autos em 06/12/2007, neles veio a ser proferida sentença em 19/03/2013.

Não se conformando com o seu teor veio o Autor requerer a rectificação de erro nela inserido.

Apreciando à luz das normas processuais vigentes verifica o Tribunal que no caso vertente não pode ter lugar a rectificação porquanto não se nos deparamos com qualquer uma das circunstâncias a que alude o art. 614º, nº1 do CPC. Ou seja, não se encontra alegada a existência de erro de escrita ou de cálculo ou inexactidão devida a omissão ou lapso manifesto.

Pelo exposto não se procederá à rectificação.

Notifique.

***

(…)

Posto isto, por deter legitimidade, estar em tempo e ser admissível, defere-se a interposição de recurso apresentada.

Notifique”


*

Não foram apresentadas contra-alegações.

*

Os autos foram com vista ao Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal.

*

Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir já que a tal nada obsta.

*

Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir:

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim sendo, a questão que constitui objecto do presente recurso, consiste em saber se o incidente de anulação de venda, deduzido ao abrigo do disposto no artigo 257º, nº1, alínea c) do CPPT, é tempestivo, o que pressupõe dar resposta à matéria de facto impugnada, concretamente quanto à data em que a respectiva p.i foi apresentada.

Antes, importa, ainda, que nos debrucemos sobre os documentos juntos já após a prolação da sentença recorrida.


*

2. Fundamentação

2.1. Matéria de Facto

2.1.1. O Tribunal a quo considerou relevante o seguinte circunstancialismo (que passamos a numerar):

1 - O processo de execução fiscal nº………………… foi instaurado por dívidas de IVA relativas aos períodos 0403T, 0406T e 0409T contra a sociedade comercial Mármores ………………, Lda.;

2 - Verificou o órgão de execução fiscal que a sociedade executada não detinha quaisquer bens susceptíveis de penhora;

3 – Seguidamente foram efectuadas diligências com vista a apurar da identificação dos gerentes da mesma, concluindo tratar-se de Cipriano ………………….. e João ……………….;

4 – Foram então preparados os autos com vista à reversão, designadamente com notificação de Cipriano …………………. para o exercício do direito de audição, via pessoal, em 06/04/05;

5 – Em 18/04/05 foi proferido despacho de reversão da citada execução contra o gerente Cipriano ………………….;

6 – Em 20/04/05 foi citado em reversão para a aludida execução por via postal registada para o seu domicílio fiscal sito em Rua …………, nº 20, ………………..;

7 – Devido ao não pagamento da dívida exequenda e já ascendendo esta a 235.217,18 €, determinou o órgão da execução fiscal, em 26/10/05, a constituição de hipoteca legal sobre a fracção A do prédio urbano sito na freguesia de …………, concelho de …………., inscrito na matriz sob o artigo ……….;

8 – Em 07/11/05 no âmbito da execução foi efectuada penhora do mesmo imóvel, ficando seu fiel depositário o aqui requerente Cipriano ………….., e nessa data notificado;

9 – Em 11/09/07, persistindo a falta de pagamento da quantia exequenda foi determinada a venda do imóvel penhorado mediante proposta em carta fechada, a afixação de editais e publicação em jornais mais lidos na localidade e através da internet;

10 – Foi, ainda, determinada a notificação do fiel depositário relativamente à venda;

11 – A abertura das propostas apresentadas foi marcada, e teve lugar, em 20/11/2007 com a presença do requerente, sendo o imóvel adjudicado à Caixa Geral de Depósitos que efectuou o depósito do preço;

12 – Em 06/12/07 o requerente deu entrada no Serviço de Finanças de Vila ………….. à petição que deu origem aos presentes autos.

5.1.

Resultou a convicção do tribunal da análise dos documentos constantes destes autos, designadamente apenso que constitui cópia parcial do processo de execução fiscal.

6.

FACTOS NÃO PROVADOS

Considerando a decisão a proferir não se entendeu necessária a produção da prova dos factos alegados”.

2.2. O direito

Como já ficou devidamente enunciado, a decisão recorrida veio a julgar improcedente o pedido de anulação de venda, por entender verificada a caducidade do direito de acção.

Para assim concluir, a Mma. Juíza alinhou o seguinte discurso argumentativo que, em parte, aqui se deixa transcrito. Assim:

“(…)

Nos termos do art. 257º, nº1, alínea c) do CPPT, que serve de fundamento à petição inicial, a anulação da venda pode ser requerida “no prazo de 15 dias, nos restantes casos previstos no CPC”, nomeadamente art. 909º, nº1, al. b), indicado na fundamentação de direito da petição inicial.

Tal prazo deve contar-se desde a data da venda ou da data em que o requerente tenha conhecido o facto que lhe serve de fundamento. Assim dispõe o nº 2 daquele preceito legal.

Os fundamentos invocados pelo autor enquadram-se na alínea c) do citado preceito legal como já mencionado.

Escalpelizando este fundamento, refere que a venda é susceptível de anulação se toda a execução for anulada por falta ou nulidade da citação do executado.

Assim, retomando o prazo contido na alínea c) do art. 257º do CPPT e o disposto naquele outro normativo extrai-se que tal vício somente pode ser invocado pelo interessado no prazo de 15 dias a contar da ocorrência da venda ou do conhecimento do facto que serve de fundamento ao pedido.

Concretizando agora no vício alegado pelo requerente haverá que concluir já ter decorrido tal prazo, isto é, já haviam decorrido os 15 dias após a realização do acto da venda (…).

Nesta perspectiva, tem de concluir-se, como invocado, pela extemporaneidade da interposição da acção.

(…)”.

Insurge-se o Recorrente contra o assim decidido, nos termos que constam das alegações e conclusões de recurso, ou seja, porque, contrariamente ao que foi considerado, a p.i de anulação de venda foi remetida ao Serviço de Finanças, por correio registado, em 5/12/07 e não apresentada em 06/12/07 (data constante do carimbo aposto na p.i, pelo SF de ………….).

Tendo em conta que a junção de documentos com o recurso apenas pode ter lugar a título excepcional, importa começar por apreciar se a mesma é, ou não, admissível.

Vejamos, então.

Nos termos do disposto no artigo 693º-B do CPC (referimo-nos à norma anterior ao Novo CPC), as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o artigo 524º, no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância e nos casos previstos nas alíneas a) a g) e i) a n) do nº 2 do artigo 691º .

Quer isto dizer, concretamente e para o que aqui importa, que a junção de documentos com as alegações de recurso só é lícita relativamente:

- aqueles cuja junção apenas se tornou necessária em resultado do julgamento em 1ª instância;

- aqueles cuja apresentação não tenha sido possível até ao encerramento da discussão da causa na 1ª instância;

- aqueles que se destinem a provar factos posteriores à petição e à resposta ou contestação;

- aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior à apresentação das referidas peças processuais - cfr. Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª edição, 2011, pág. 342.

Ora, lidas as alegações e conclusões de recurso, parece-nos claro que o Recorrente apoia a junção dos documentos, nesta fase, por considerar que a mesma apenas se tornou necessária em resultado do julgamento em 1ª instância, por aí se ter decidido pela verificação da caducidade do direito de acção, concretamente por a p.i ter sido apresentada em 6/12/07, quando, como sustenta o Recorrente, a mesma foi remetida ao SF, por correio, em 5/12/07, o que não podia deixar de estar evidenciado nos autos através do envelope de remessa daquele articulado (lê-se no requerimento de interposição de recurso que “os Serviços de Finanças cometeram o erro de não averbarem que o recebimento da petição tinha sido via correio registado”).

Por conseguinte, entende-se estar verificada uma das circunstâncias que a lei considera, a título excepcional, como justificativas da apresentação de documentos com as alegações de recurso (aqui, com o requerimento de interposição de recurso), donde decorre que a junção dos mesmos deve ser admitida, para conhecimento da tempestividade do exercício do direito de acção, questão esta, aliás, do conhecimento oficioso.


*

Isto dito, avancemos.

Neste momento, impõe-se que nos debrucemos sobre a matéria de facto, em concreto sobre o ponto 12 dos factos provados, nos termos do qual “Em 06/12/07 o requerente deu entrada no Serviço de Finanças de Vila Viçosa à petição que deu origem aos presentes autos”.

Como é evidente, a pretensão do Recorrente de ver evidenciado o dia da remessa por correio registado da petição inicial respeitante ao incidente de anulação de venda, não apenas é um facto essencial à decisão da causa (por contender com a análise da tempestividade da acção), como é um facto que se mostra comprovado face ao documento junto, correspondente ao talão de aceitação/ correio registado/ correspondências, com o nº RO 7362 8523 8 PT.

Por conseguinte há que eliminar o ponto 12 dos factos provados tal como ele consta do probatório e fixar o seguinte facto com o nº 12.

12 – A p.i que deu origem aos presentes autos foi remetida ao Serviço de Finanças de ……….. em 05/12/07, através de correio registado (cfr. talão de aceitação/ correio registado/ correspondências, com o nº RO 7362 8523 8 PT, cujo carimbo nele aposto pelos CTT data de 05/12/07, a fls. 147).

Procedem, pois, as conclusões do recurso na parte em que se pretendia a alteração da matéria de facto, no que respeita à data e via pela qual a p.i foi dirigida ao Serviço de Finanças.


*

Estabilizada a matéria de facto, resta-nos apreciar e decidir se a decisão recorrida errou ao considerar verificada a caducidade do direito de acção ou, dito de outro modo, se o incidente de anulação de venda, deduzido ao abrigo do disposto no artigo 257º, nº1, alínea c) do CPPT, é tempestivo, considerando que a p.i foi remetida por correio registado datado de 5/12/07.

Não está em causa que o incidente de anulação de venda foi, como referimos, deduzido ao abrigo do disposto no artigo 257º, nº1, alínea c) do CPPT, nos termos do qual a anulação de venda pode ser requerida no prazo de 15 dias, esclarecendo o nº2 do mesmo preceito, no que para aqui importa, que o prazo se conta a partir da data da venda.

Ora, in casu, a venda teve lugar em 20/11/07, tal como decorre do ponto 11 do probatório. Se tomarmos em consideração o prazo de 15 dias, contados a partir do dia 21/11/07 (inclusive), temos que o termo desse prazo coincide com o dia 05/12/07.

O dia 05/12/07 foi precisamente a data em que a p.i de anulação de venda foi remetida, via correio registado, para o Serviço de Finanças de …………, pelo que, nos termos do disposto no artigo 150º, nº2, alínea b) do CPC (na redacção vigente à data dos factos), ex vi artigo 2º, al. e) do CPPT, há que considerar a data da efectivação do registo como aquela em que a peça processual se considera apresentada.

Diga-se, ainda, que os prazos para requerer a anulação de venda efectuada em processo de execução fiscal – que, nos termos do artigo 103º da LGT, tem natureza judicial – são prazos judiciais, contados nos termos do artigo 144º do CPC (artigo 138º do NCPC), por força do disposto no artigo 20º, nº2 do CPPT. Neste sentido, vide o acórdão do STA, de 23/11/04, no processo nº 713/04.

Assim sendo, atenta a natureza do prazo em análise, ao mesmo sempre seria aplicável o disposto no artigo 145º, nº 5 do CPC (139º, nº5 do NCPC), isto é, a possibilidade de praticar o acto dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, possibilidade esta dependente do pagamento de uma multa.

Portanto, no caso, mesmo que a p.i tivesse sido apresentada, como considerou a decisão recorrida, em 06/12/07 (data constante no carimbo aposto na p.i), sempre haveria que tomar em devida conta o disposto nos artigos citados, devendo ser considerada a possibilidade prevista no nº 6 do artigo 145º do CPC (na versão anterior à Lei nº 41/2013, de 26 de Junho), nos termos do qual “Praticado o acto em qualquer dos três dias úteis seguintes sem ter sido paga imediatamente a multa devida, logo que a falta seja verificada, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar a multa, acrescida de uma penalização de 25 % do valor da multa, desde que se trate de acto praticado por mandatário”.

Por conseguinte, e sem necessidade de mais amplas considerações, conclui-se que, ao contrário do decidido, o incidente de anulação de venda foi tempestivamente apresentado. Nestes termos não pode manter-se a decisão que julgou procedente a excepção da caducidade do direito de acção.


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Revogada a sentença recorrida, que apenas conheceu da aludida excepção da caducidade do direito de acção, caberia a este Tribunal, em substituição, conhecer do mérito da causa que aquela não conheceu, nos termos do disposto no artigo 665º, nº 2 do CPC (anterior 715º, nº 2 do CPC), aplicável por força do disposto no artigo 2º alínea e) do CPPT, desde que nenhum motivo a tal obstasse.

No caso, porém, tal não se verifica.

Com efeito, na p.i foi requerida a produção de prova testemunhal, sobre a qual não foi emitida pronúncia, sendo certo, que foi requerida a junção do PEF que não se mostra juntos aos autos. Todos estes, elementos que o Requerente reputa de relevantes para prova dos factos por si alegados, os quais, como vimos, não foram tidos em conta.

Ora, a matéria de facto relevante para o conhecimento do mérito da acção, que é, agora, a questão que se coloca, deve ser seleccionada pelo juiz da 1ª instância, sendo que o Tribunal superior só em casos de excepção poderá afastar o juízo valorativo das provas feito por aquele. Na verdade, ao tribunal “ad quem”, enquanto tribunal de recurso (mormente quando está em questão a impugnação da decisão de facto) cabe reapreciar ou reexaminar (com vista à sua alteração) a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto, não lhe cabendo proceder ao julgamento de facto sem que em sede de 1ª instância se tenha realizado tal julgamento, pois tal implicaria o inviabilizar da garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. Ou seja, o tribunal “ad quem” só pode efectuar um novo julgamento de facto e de direito se a decisão proferida pelo tribunal “a quo” contiver o enquadramento de facto e de direito e a competente decisão, o que, no caso, não acontece.

Conclui-se, pois, não ser possível conhecer do mérito dos presentes autos, em substituição do tribunal a quo, atenta, desde logo, a falta de fixação da matéria de facto com relevância para a decisão da causa.

3. Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, revogar a decisão recorrida que, nos termos apontados, julgou verificada a caducidade do direito de acção do presente incidente de anulação de venda, ordenando-se a remessa dos autos ao Tribunal de 1ª Instância para aí seguirem os seus trâmites e se conheça do mérito do referido incidente, se outros motivos a tal não obstarem.

Sem custas.

Lisboa, 10 de Julho de 2014


Catarina Almeida e Sousa

Joaquim Condesso

Anabela Russo