Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:311/19.1BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:09/16/2021
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:NULIDADES DA SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
FATURAÇÃO FALSA
ÓNUS DA PROVA
NOTAS DE CRÉDITO/REQUISITOS
VARIAÇÃO DE PRODUÇÃO
Sumário:I-No domínio da faturação falsa, compete à AT demonstrar que os indícios por si recolhidos no decurso da ação inspetiva são sérios e suficientes para concluir pela inexistência ou simulação de uma relação económica que sustente as faturas.

II-Não é exigível que a AT efetue uma prova direta da simulação, pelo que cumprindo esse ónus e ilidindo a presunção de veracidade da declaração do sujeito passivo consagrada no artigo 74.º, n.º 1 da LGT, passa a competir a este o ónus da prova da realidade subjacente à fatura, infirmando os indícios recolhidos pela entidade fiscalizadora

III-As faturas, per se, não permitem atestar que os serviços nela elencados foram realizados pela empresa emitente dessas faturas, o mesmo sucedendo quanto aos recibos, ainda para mais quando se encontram desacompanhados dos respetivos meios de pagamento, quando as contas bancárias não refletem essas saídas monetárias, e inclusive a empresa fornecedora é uma entidade não declarante.

IV-Para prova da materialidade das operações é curial que seja demonstrado qual foi o meio de pagamento, e em conformidade, juntar documentação atinente ao efeito, concretamente, cópia dos comprovativos de transferência bancária ou cheques.

V-De harmonia com o consignado no artigo 78.º, nº5 do CIVA, quando o valor tributável de uma operação ou o respetivo imposto sofrerem retificação para menos, a regularização a favor do sujeito passivo só pode ser efetuada quando este tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto.

VI-Assim, não tendo sido carreados aos autos documentos que permitissem atestar as realidades em contenda, concretamente, prova, efetiva, da devolução ao cliente dos montantes já recebidos e bem assim que o cliente tenha tomado conhecimento das mesmas, a ausência de tal prova, compromete, per se, a possibilidade de regularização declarativa do imposto correspondente à anulação das faturas na sua totalidade ou por redução da base tributável.

VII-Se o cerne da questão está concatenado com a falta de prova da correspondente liquidação de IVA, e se a prova carreada aos autos, concretamente, os alegados inventários não permitem atestar que no primeiro trimestre do ano de 2016, a Recorrente faturou serviços executados no ano anterior, permitindo, tão-só, identificar os trabalhos realizados nesses anos, com alusão genérica ao projeto inerente, existe uma falha da prova do nexo entre os valores neles constantes, com as faturas emitidas, donde, tal insuficiência probatória tem de ser valorada contra a Recorrente. Ademais, tendo tal insuficiência sido apontada em sede de conclusão do Relatório Inspetivo, poderia/deveria em sede de impugnação colmatar as insuficiências probatórias, fazendo a devida alocação e demonstração da liquidação do IVA.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I-RELATÓRIO

A...-G..., LIMITADA, apresentou recurso da sentença proferida a 13 de abril de 2021 no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Castelo Branco, a qual julgou improcedente a impugnação por aquela deduzida contra das seguintes liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e juros compensatórios: a) Liquidação n.º 20190271..., referente ao período de 201403T, no valor de EUR 40.854,60, e de juros compensatórios no valor de EUR 7.942,58; b) Liquidação n.º 20190271..., referente ao período de 201409T, no valor de EUR 22.679,42; c) Liquidação n.º 20190271..., referente ao período de 201505, no valor de EUR 16.440,38, e de juros compensatórios no valor de EUR 496,06; d) Liquidação n.º 201902715..., referente ao período de 201512, no valor de EUR 61.500,00.

A Recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

A) Impõe-se à Administração Tributária abalar a presunção de veracidade da declaração do imposto e dos respectivos documentos de suporte, atento o princípio da declaração vigente no nosso direito (artigo 75º da LGT), só depois passando a competir ao contribuinte o ónus de provar a veracidade do declarado, o que quer dizer que se a Administração Tributária não fizer prova do bem fundado da formação do seu juízo, a questão relativa à legalidade do seu agir terá de ser resolvida contra ela, sem necessidade de ir analisar se a Impugnante logrou ou não provar, em tribunal, a veracidade da declaração.

B) Ora, o Tribunal limita-se a dar como provada a factualidade assente entre os pontos 2 a 19 e como não provada a factualidade constante dos pontos A) e B), não se pronunciando sobre a existência ou não da dita sociedade.

C) Neste particular, salvo melhor opinião, existe omissão de pronúncia por parte do Tribunal a quo. Como é sabido, existe nulidade da decisão com fundamento na omissão de pronúncia quando se verifica que uma questão devia ser conhecida e a mesma não teve qualquer tratamento, apreciação ou decisão. Esta questão deveria ter sido apreciada, naturalmente, com prevalência sobre as demais, pois que a sua apreciação tem implicações da determinação do ónus da prova que impende sobre a entidade recorrida.

D) Esta omissão, impõe a modificação da decisão sobre a matéria de facto, devendo o Tribunal pronunciar-se sobre a questão, aditando-se ao elenco dos factos provados o seguinte ponto: A S... - Sociedade Agroflorestal, Lda tem NIF válido.

E) Por responder ficou a questão da invalidade e/ou inexistência de NIF da S.... E assim sendo, dúvidas não restam, pois, de que, em face do estatuído no artigo 615.º nº 1, alínea d) do C. do Processo Civil, a sentença recorrida encontra-se afectada por vícios que originam a sua nulidade, com fundamento em omissão de pronúncia.

F) Por outro lado, as declarações da testemunha J..., Contabilista Certificado da Impugnante, cujo depoimento, conforme ata de inquirição de testemunhas de 04/03/2020, foi gravado em suporte digital através do sistema de gravação do SITAF e decorreu entre as 14:14 horas e as 14:50 horas e as declarações de parte do legal representantes da sociedade, J..., o qual, conforme ata de inquirição prestou depoimento que se gravado através do sistema de gravação do SITAF entre as 15:08 horas e as 15:40 horas, são consentâneas com aquela prova documental, a qual o Tribunal não relevou.

G) Os recibos são a prova do pagamento e quitação dos valores constantes das facturas. Salvo o devido respeito, o Tribunal subestima o valor probatório dos recibos emitidos pela S..., quando, um devedor que cumpra a obrigação tem direito à quitação e o recibo emitido pelo credor, vendo assim, o seu crédito satisfeito, que constitui meio de prova por excelência do pagamento (cfr. artigo 787º C. Civil).

H) Os recibos que a S... emitiu e entregou à Recorrente são documentos particulares cuja genuinidade não foi posta em causa e têm força probatória plena quanto às declarações e respectivos factos (cfr. artigos 376° nºs 1 e 2 e 358° nº 2 C. Civil). E tendo força probatória plena, esta só podem ser contrariados nos termos previstos no artigo 347º C. Civil, isto é, "... meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto".

I) Além da indicação de que existem indícios de emissão de faturação falsa, o processo não comporta qualquer outra prova de que tal efetivamente aconteceu no plano fático. Referiram ambas as testemunhas arroladas pela AT (O... e R..., cujos depoimentos, conforme Ata de Inquirição, se encontram gravados em suporte digital através do sistema de gravação do SITAF, entre as 15:41 horas e as 16:11 horas e as 16:12 horas e as 16:29 horas) que a Inspeção à contabilidade da Impugnante ocorre, porque a Direção de Finanças de Lisboa comunica-lhe e/ou dá a informação de que existem indícios de emissão de faturação falsa, por parte da empresa S....

J) Perguntado, porém, se tiveram conhecimento de alguma Inspeção à atividade da empresa S..., a Sra. Inspetora disse não saber, porquanto tal seria da competência da Direção de Finanças de Lisboa.

K) No caso concreto, apesar de ter sido referido que não foi possível identificar os pagamentos, a verdade é que não sabe a AT se foi ou não possível identificar os recebimentos. Sendo certo que do processo não existe qualquer prova nesse sentido.

L) A AT, depois da comunicação recebida por parte da Direção Geral de Finanças de Lisboa, não desenvolveu, nem requereu qualquer outra diligência, limitando-se a dizer que o NIF do prestador de serviços é inválido ou inexistente, pretendendo depois inverter o ónus da prova.

M) Ora, salvo o devido respeito, a mera invocação de que existem indícios de emissão de faturação falsa por parte da sociedade S..., não basta para afirmar a existência de faturação falsa do contribuinte aqui inspeccionado, se não forem acompanhados de outros elementos que justifiquem esse juízo de descredibilização.

N) Incumbia à AT demonstrar que os indícios de falsidade são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que as facturas são falsas. Só assim, a mesma poderia cumprir com o seu encargo probatório (artigo 342º do C. Civil). Deveria a AT ter evidenciado todas as diligências probatórios encetadas, para apuramento não só que não existe indícios dos pagamentos, mas também não existem indícios de recebimento por parte da empresa S....

O) Pois, só assim, salvo melhor opinião, poderia ocorrer a inversão do ónus da prova, bem como o dever de provar. Sendo que, neste particular, a Recorrente junto aos autos os recibos de todas as faturas emitidas pela dita empresa S....

P) Pelo que, como se disse não pode a Impugnante aceitar que se proceda a qualquer correção, em sede de IVA, relativamente aos negócios estabelecidos com a fornecedora S.... E, nesta medida, aditando-se à matéria dada como provada que a sociedade a S... - Sociedade Agroflorestal, Lda tem NIF válido, deveria, ainda, o Tribunal ter dado como provada a factualidade constante dos pontos A) e B).

Q) Com respeito ao ponto C) dos factos não provados, como referiram as testemunhas arroladas pela impugnante, J..., J... e J..., o montante das notas de crédito prende-se com serviços relacionados com rechegas, queimas de sobrantes e podas sanitárias relativamente às quais foi feito pedido de pagamento diferente para mais em relação ao serviço executado.

R) As testemunhas revelaram um conhecimento direto dos fatos relatados. Designadamente a testemunha, J..., cujo depoimento, conforme ata de inquirição encontra-se gravado em suporte digital através do sistema de gravação do SITAF e decorreu entre as 14:51 horas e as 15:06 horas.

S) De uma forma clara e isenta, a testemunha refere que as notas de crédito foram emitidas após fiscalização do IFAP e DRAPAL dos projetos em curso. Com efeito, após verificar que alguns dos trabalhos facturados não estavam realizados, indicou que os mesmo não seriam pagos, razão pela qual a empresa recorrente procedeu à emissão das respetivas notas de crédito.

T) Assim, contabilisticamente a situação apenas poderia ser tratada, através da emissão de notas de crédito, para acerto dos valores incorretamente facturados. E o facto de não estar contabilisticamente lançado o pagamento e o recebimento, também não pode justificar a sua não aceitação. Tanto mais que, por um lado, estamos perante notas de crédito, o que no limite significa que poderia não existir, ainda, à data qualquer pagamento.

U) Neste particular, existe, salvo melhor opinião, erro de julgamento e falta de fundamentação. Pois, o Tribunal ignora por completo a documentação junta pela entidade recorrente, sem sede de audiência prévia. É certo que o Tribunal pode apreciar livremente as provas e decidir segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto. Porém, deve explicitar as concretas razões e/ou fundamentos pelos quais decidiu ignorar tal prova em desfavor da sociedade recorrente.

V) Relativamente ao ponto D) dos factos não provados, refere o Tribunal que a Recorrente não apresentou qualquer prova de tal factualidade. O que não corresponde à verdade, uma vez que juntou, o inventário e os identificados Documentos n.º 17 e 18. Além de que, em declarações de parte, o legal representante da sociedade, J..., cujo depoimento se encontra gravado através do sistema de gravação do SITAF entre as 15:08 horas e as 15:40 horas, confirmou os mesmos.

W) Conforme resulta da sentença, ora em crise, a testemunha J..., confirmou os mesmos, por referência ao inventário que se encontra junta, prova essa que o Tribunal desconsidera pura e simplesmente.

X) O Tribunal a quo ao formar a sua convicção, ainda que queira desvalorizar o depoimento da testemunha indicada, não pode deixar de valorizar a prova documental junta, designadamente o Inventário e os Documentos n.º 17 e 18.

Y) Sendo que o Tribunal não adianta as razões pelas quais não valorou, quer o Inventário junto, quer os Documentos n.º 17 e 18, juntos com a impugnação. É sabido que o Tribunal deve explicar e/ou fundamentar as razões porque deu prevalência a uns elementos de prova e não a outros.

Z) Tendo presente o dever de fundamentação e os objectivos que o mesmo visa alcançar, o julgador deve empenhar-se na sua explicitação. Através da fundamentação, o juiz deve passar de convencido a convincente.

AA) O Tribunal a quo limitou-se, na motivação da decisão de facto, a dizer que não valorou o depoimento da testemunha J..., não adiantando as razões pelas quais não valorou a prova documental junta, ou seja o Inventário e os documentos n.º 17 e 18, bem como porque razão não valorizou o depoimento do legal representante sobre esta questão.

BB) Em face de tudo o que deixámos exposto, relativamente aos pontos C) e D) da matéria dada como não provada (a qual entendemos que deveria ter sido dada como provada) concluímos que o Tribunal a quo incumpriu com o dever de examinar criticamente a prova testemunhal e documental, omitindo o dever de fundamentação, pelo que a sentença enferma de nulidade nos termos do artigo 125º n.º 1 do CPPT e 615º n.º 1 alínea b) do C. de Processo Civil.

CC) A sentença recorrida viola as normas constantes do artigo 75º da LGT; artigo 125º do CPPT; artigos 342º, 347º,349º 358º n.º 2, 376º n.º 1 e 2 e 787º do C. Civil e artigo 615º n.º 1 alíneas b) e c) do C. Processo Civil.

NESTE TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, deverá o presente recurso ser aceite, devendo ser a sentença revogada em conformidade, sendo assim feita uma correta aplicação da lei e a mais elementar JUSTIÇA.”


***

Notificada da interposição de recurso pela A...-G..., LIMITADA, a ATA apresentou contra-alegações de recurso com as seguintes conclusões:

1. Prescreve a alínea b) do nº 1 do artigo 640º do CPC que “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.”

2. Por seu turno, a alínea a) do nº 2 do preceito normativo em causa refere que “ No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.( nosso bold e itálico).

3. Sucede que, no caso em apreço, na parte relativa ao segmento do recurso fáctico que incide sobre a matéria de facto, a recorrente efetua uma incorreta delimitação do âmbito probatório do recurso, porquanto, nas concretas passagens da gravação que identifica e que seriam suscetíveis de ser reapreciadas pelo Tribunal de recurso, verifica-se que as mesmas ou não se reportam à matéria de facto que alega que resultou provada do depoimento da testemunha – situação que se verifica com o depoimento da testemunha J..., pois do extrato da gravação compreendido entre as 14:14 horas e as 14:50 horas a testemunha nada referiu acerca da factualidade que a recorrente identifica como tendo resultado provada do depoimento desta - ou não se reportam à testemunha identificada pela recorrente- situação que se verifica no caso do depoimento da testemunha J..., que a recorrente alega que consta do extrato da gravação compreendido entre as 15:08 horas e as 15:40 horas, sendo certo, que este extrato da gravação não se reporta a esta testemunha, logo, contrariamente ao alegado pela recorrente, neste extrato da gravação não é confirmada a factualidade que alega ter sido provada no depoimento da testemunha J....

4. Temos assim, que a recorrente não indica com exatidão, as concretas passagens das gravações em que funda a sua discordância – situação que é transversal a todo o recurso da recorrente, relativamente a todas as testemunhas que identifica para efeitos de reapreciação da sua pretensão recursiva - identificando incorretamente passagens da gravação que não correspondem ao depoimento da testemunha que identifica ( como é o caso da testemunha J...) ou que não evidenciam a prova da factualidade que alega ter resultado provada ( como é o caso da testemunha J...).

5. Perante o manifesto erro na indicação das concretas passagens da gravação relativas aos depoimentos das testemunhas em apreço, torna-se impossível a este Venerando Tribunal efetuar uma reapreciação conjunta da prova testemunhal e da prova documental identificada pela recorrente, derivada da manifesta falta de correspondência entre uma e a outra.

6. Por outro lado, não se perca de vista que a síntese da factualidade que a recorrente alega ter resultado dos depoimentos das testemunhas J... e J..., é elaborada pelo punho da recorrente não nos permitindo aferir do concreto teor dos depoimentos que foram prestados pelas testemunhas, uma vez que tais sumulas da autoria da recorrente correspondem à sua visão do depoimento prestado, não refletindo o verdadeiro teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas que identifica.

7. Dito de outro modo, na síntese que a recorrente apresenta, não estão refletidas as palavras que concretamente foram produzidas pelas testemunhas, podendo conduzir a deturpações dos depoimentos ou interpretações subjetivas dos mesmos que não refletem a verdade do discurso produzido pelas testemunhas.

8. Nestes termos, tal como é expressamente cominado pelo preceito legal vertida na alínea a) do nº 2 do artigo 640º do CPC, deve este Venerando Tribunal abster-se de conhecer a argumentação recursiva apresentada pela recorrente por manifesta deficiência na identificação concreta das passagens da gravação relativas às testemunhas J... e J... a qual é também extensível à prova documental que a recorrente identifica e que pretende seja reapreciada de forma conjunta com a prova testemunhal que identificou de forma incorreta.

9. Atenta a fundamentação de facto que foi levada ao probatório, com especial enfoque para os pontos 7, 10, 12, 14, 16, 18, 20 e 27 e a fundamentação de direito que presidiu à tomada de decisão, não se vislumbra que a decisão recorrida padece do alegado vicio de omissão de pronúncia no que concerne à questão relativa à existência da sociedade S... e ao NIF desta ser inexistente ou inválido, motivo pelo qual deverá improceder este fundamento do recurso.

10. A recorrente tenta, sem sucesso, “confundir” este Tribunal sobre a questão central que norteou os presentes autos, invocando, para tanto, supostas questões que alegadamente teriam sido omitidas pelo Tribunal “ a quo” na sua fundamentação de facto e de direito.

11. Ora, conforme resulta da douta decisão sob recurso e bem assim de todo o acervo documental constante dos autos, com especial enfoque para o Relatório de Inspeção Tributária, para as faturas identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório, e bem assim para a tomada de posição das partes intervenientes refletidas nas respetivas peças processuais, a questão central dos presentes autos prende-se, na sua essência, em saber se as operações subjacentes às faturas identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório, são operações reais e se a ora recorrente logrou provar a materialidade das mesmas, ou se pelo contrário, a AT recolheu indícios fundados de que tais operações não são verdadeiras, respeitando a operações simuladas.

12. A alegada questão de se averiguar se a sociedade S... existia ou se tinha um NIF inexistente ou inválido, contrariamente ao que a recorrente pretende incutir a este Venerando Tribunal, não consubstancia uma questão central, antes consubstanciando uma factualidade que é intrínseca à questão central que foi exaustivamente apreciada pelo Tribunal “ a quo” através da análise critica e conjugada de toda a prova produzida nos presentes autos ( prova documental e prova testemunhal).

13. Com efeito a inexistência ou invalidade do NIF da sociedade S... e a existência ou não desta sociedade, fazem parte do vasto conjunto de indícios fundados que foram recolhidos pela AT no âmbito dos procedimentos inspetivos que desencadeou junto daquela sociedade e da ora recorrente e que lhe permitiram concluir que as faturas emitidas pela S... – Sociedade Agroflorestal, Lda. –que se encontram devidamente identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório, não são verdadeiras, respeitando a operações simuladas.

14. Para além do vasto conjunto de provas documentais que foram recolhidas pela AT serem demonstrativas que as operações subjacentes às faturas em apreço, não são reais, estando perante a existência de faturação falsa, cumpre referir que tais evidências documentais foram reforçadas em sede de produção de prova testemunhal, através do depoimento das testemunhas O... e R... ( vide a título de exemplo, o depoimento da testemunha O... do minuto 1:31:21 ao minuto 1:32:04, do minuto 1:32: 57 ao minuto 1:33:28 e do minuto 1:33:38 ao minuto 1:33:53; vide também depoimento da testemunha R... do minuto 2:04:21 ao minuto 2:05:36 , do minuto 2:04:21 ao minuto 2:05:36).

15. Tendo por base a globalidade da prova produzida – prova documental e prova testemunhal – dúvidas não poderão subsistir que a impugnante, nem no âmbito do procedimento de inspeção, nem em sede de exercício do direito de audição, nem na fase de produção de prova testemunhal – onde foram inquiridos, além do mais, o CC da sociedade impugnante e o seu representante legal – não logrou demonstrar o pagamento efetivo das prestações de serviços tituladas pelas faturas emitidas pela sociedade S..., no exercício de 2014, no montante de 1.031.700,00 .

16. Quando o Contabilista Certificado da sociedade impugnante - F... - foi inquirido sobre a razão pela qual os pagamentos relativos às faturas emitidas pela sociedade S..., no valor de 1.031.700,00€, não se encontravam refletidos na contabilidade da sociedade impugnante, a resposta do mesmo foi claramente surpreendente “ existiriam algumas transferências ou todas, ou parte ou na totalidade, não sei, se calhar o sócio gerente será a pessoa responsável para dizer isso, nunca tive acesso às contas bancárias” – vide depoimento da testemunha do minuto 25:36 ao minuto 25:50.

17. Perante a globalidade da prova – documental e testemunhal – que o Tribunal “ a quo” valorou para fundamentar de facto e de direito a sua decisão, impõe-se concluir que a decisão sob recurso não padece de qualquer vicio que comprometa a sua manutenção na ordem jurídica, designadamente, o invocado vicio de omissão de pronúncia, pelo que o presente recurso, no que toca a este fundamento tem necessariamente de improceder.

18. No caso em apreço, a ora recorrente não logrou afastar os indícios fundados que serviram de base fundamentadora para que a AT não aceitasse a dedução do IVA, relativo às faturas emitidas pela sociedade S... à sociedade recorrente.

19. Conforme é expressamente referenciado na douta decisão sob recurso – da globalidade da prova produzida – prova documental e testemunhal – resultou inequivocamente demonstrado que no âmbito da ação inspetiva, a recorrente foi notificada para, além do mais, juntar os documentos de suporte dos movimentos atinentes àquele fornecedor, designadamente faturas, recibos e comprovativos de pagamento (cfr. ponto 20 do probatório). Porém, a Impugnante não apresentou à AT qualquer documentação comprovativa do pagamento das faturas emitidas por aquela sociedade e que suporte os recibos – que, aliás, foram emitidos na data da respetiva fatura – e as contas bancárias não refletem a existência de tais pagamentos (tudo como decorre do relatório de inspeção tributária, de fls. 27 do probatório).

20. Acresce referir, que as passagens da gravação que são identificadas pela recorrente como sendo relativas aos depoimentos das testemunhas O... e R... e que segundo a recorrente terão decorrido entre as 15:41 horas e as 16:11 horas e as 16:12 horas e as 16:29 horas, não correspondem (mais uma vez) à verdade, porquanto, nos excertos que são identificados pela recorrente, quem prestou depoimento naqueles lapsos temporais de gravação da prova, foi o Contabilista Certificado da recorrente, motivo pelo qual, as considerações que são efetuadas pela recorrente para efeitos de prova, por referência às testemunhas O... e R..., não poderão ser tidas em consideração, uma vez que os excertos das passagens da gravação que são identificados, reportam-se a depoimentos de diferente testemunha.

21. No caso em apreço, atento o elevado montante dos serviços faturados no exercício de 2014 – veja-se no montante de 1.031.730,00€ - seria expetável, segundo as regras da experiência comum, e de uma gestão minimamente diligente e criteriosa, que a recorrente cuidasse de saber se a sociedade S... possuía ou não, estrutura empresarial para poder prestar os serviços contratualizados.

22. Atentas as regras da experiência comum, impõe-se concluir que tal diligência era de fácil concretização por parte da ora recorrente e revelaria que a mesma era zelosa e diligente no desenvolvimento do seu objeto social, mormente quando está em causa um volume de faturação com elevada expressão económica e com inevitáveis repercussões nos resultados fiscais, designadamente, ao nível da dedução do IVA e da dedutibilidade de custos em sede de IRC.

23. Não se perca de vista que, o que está em causa nos presentes autos, é a falta de comprovação das operações económicas realizadas entre a sociedade impugnante e a sociedade S..., tituladas pelas faturas emitidas por esta no exercício de 2014, no valor de 1.031.730,00 €, com um número de contribuinte inexistente, sem se encontrar registado para efeitos fiscais, desprovido de qualquer estrutura empresarial para prestar os serviços identificados nas faturas emitidas e as inevitáveis repercussões nos resultados fiscais, em sede de dedução de IVA ( e também de dedutibilidade de custos/gastos em sede de IRC, sendo certo que esta questão não integra o objeto dos presentes autos).

24. Merece também aqui destaque o depoimento da testemunha J..., representante legal da sociedade recorrente, que no seu depoimento de parte, a instâncias do mandatário da recorrente, quando lhe foi perguntado se enquanto gerente da recorrente, surgiram dúvidas quanto à existência da S..., o mesmo respondeu o seguinte: “porque é que haveria de ter dúvidas? Se houver alguém que me quiser prestar serviços, desde que tenha trabalhadores e me venha fazer e tenha contribuinte, eu aceito. Só lhe pago depois do trabalho feito. Não me interessa como é que ela está”. – vide depoimento de parte do minuto 1:03:47 ao minuto 1:04:20.

25. Ora, tal depoimento não deixa de ser curioso, porquanto, no caso em apreço, ficou devidamente demonstrado, através de prova documental e testemunhal, que a sociedade S... não tinha NIF, não tinha qualquer estrutura empresarial, não deu início de atividade perante a AT e nunca entregou qualquer declaração de rendimentos ou declarações relativas a eventuais trabalhadores.

26. Perante a falta de comprovação documental dos pagamentos que a recorrente efetuou à sociedade S..., inexistência de movimentos bancários que reflitam os mesmos, acrescida dos indícios fundados da simulação das operações económicas, impõe-se concluir pela improcedência dos fundamentos invocados pela recorrente e consequentemente pela manutenção da douta decisão recorrida no ordenamento jurídico.

27. Contrariamente ao alegado, o Tribunal “ a quo” tendo por base a prova documental e testemunhal produzida, fundamentou de forma clara e pormenorizada as razões pelas quais julgou não provada a matéria de facto constante da alínea C) , motivo pelo qual, também nesta sede, deve improceder a argumentação e pretensão recursiva da recorrente.

28. Contrariamente ao alegado, a apreciação da globalidade da prova produzida nos presentes autos – documental e testemunhal – não deixou outra alternativa ao Tribunal “ a quo” se não a de julgar não provada a matéria de facto constante da alínea D) sendo certo que à semelhança do que se verificou com as demais alíneas da matéria de facto julgada não provada, também nesta alínea D) o Tribunal “ a quo” fundamentou de forma muito clara as razões pelas quais considerou tal matéria de facto como não provada.

29. No exercício de 2015, a recorrente emitiu as notas de crédito, constantes do Anexo IV do relatório de inspeção, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, relativas a faturas emitidas em 2014, ao cliente “A... Assoc.Prod. Florestais do Alto Alentejo” e com base nas mesmas regularizou imposto a seu favor, no montante de 16.440,38 €, que inscreveu no campo 40 da declaração periódica de IVA do mês de maio de 2015, tendo diminuído o valor dos proveitos desse exercício em 274.006,08 €, através da contabilização destas notas de crédito a débito na conta 717111 – “Devoluções de vendas – Taxa reduzida” – vide relatório de inspeção, designadamente, fls. 34 a 36 e fls. 103 a 108 do PA.

30. A emissão e respetiva contabilização das notas de crédito em apreço, teve repercussões fiscais, designadamente em sede de IVA.

31. A instâncias da RFP, foi perguntado à testemunha O... o seguinte: segundo o depoimento do TOC e do representante legal da sociedade impugnante, as faturas tiveram de ser anuladas por imposição do IFAP, porque teria sido efetuada uma fiscalização por esta entidade e chegado à conclusão que determinados serviços não foram efetuados, e perante isto a sociedade impugnante anulou as faturas e emitiu notas de crédito. O que é que neste procedimento faltou em termos tributários, para que este procedimento adotado pela sociedade impugnante estivesse coadunado com a sua realidade financeira? Tendo a testemunha respondido o seguinte: “ A verdade é que essas prestações de serviços foram pagas. O cliente assumiu que houve essa prestação de serviços” – vide depoimento da testemunha do minuto 1:38:56 ao minuto 1:40:13.

32. Perante esta resposta, a instâncias da RFP, a testemunha O..., foi inquirida do seguinte: a sociedade A... - que era a principal cliente da sociedade impugnante e da qual o representante legal desta também fazia parte dos órgãos decisores – assumiu que pagou à sociedade impugnante? Tendo a testemunha respondido o seguinte: “Consegui identificar o pagamento dessas faturas nos extratos bancários da A... (ou seja, sociedade impugnante). A devolução é que eu não consegui identificar, nem o contribuinte a veio identificar, embora lhe tenha sido solicitado – vide depoimento da testemunha O... do minuto 1:40:14 ao minuto 1:40:35.

33. Perante esta resposta a instâncias da RFP, a testemunha voltou a ser inquirida do seguinte modo: a A... não tinha na sua contabilidade comprovativos da devolução dos montantes titulados nas faturas? Tendo a testemunha respondido o seguinte: “Não, não tem” – vide depoimento da testemunha O... do minuto 1:40:39 ao minuto 1:41:02.

34. Foi ainda perguntado à testemunha o seguinte: “ A senhora inspetora pediu à A... esses documentos? Tendo a testemunha O... respondido o seguinte: “ Visto que a contabilidade das duas entidades ( sociedade impugnante e sociedade A...) era executada pelo mesmo contabilista foi aberto um despacho para ver na contabilidade da A... como é que estavam registadas essas faturas e as notas de crédito e as notas de crédito não estavam lá registadas”. - vide depoimento da testemunha O... do minuto 1:4:03 ao minuto 1:41:19.

35. A instâncias da RFP foi perguntado à testemunha O..., se a impugnante teria dificuldade em fornecer esses elementos? Tendo a testemunha respondido o seguinte” se tivesse havido devolução do dinheiro, claro que era fácil” - vide depoimento da testemunha O... do minuto 1:41:29 ao minuto 1:41:57.

36. A instâncias da RFP a testemunha R... foi inquirida sobre qual tinha sido o problema detetado pela AT junto da sociedade impugnante, relativamente às notas de crédito que foram emitidas em consequência da anulação das faturas, tendo esta testemunha respondido o seguinte: “ no caso concreto há umas prestações de serviços, que são faturadas em 2014, são reconhecidas em rendimentos, os valores são recebidos pela sua totalidade, existe no extrato bancário a transferência dos valores e depois no ano a seguir, pagas essas faturas são anuladas, perante esta evidência, perguntou-se à empresa qual a razão de ser e fez-se aquilo que se tem de fazer: apurar a verdade material dos factos e pedir à A... se na sua contabilidade tem reconhecido aquelas notas de crédito. A conclusão é que não estava na A... nada reconhecido e ainda mais complexo é que contabilisticamente a A... ( sociedade impugnante) tinha contabilizado a devolução do dinheiro à A..., mas em termos bancários não existia qualquer devolução. A A... não tinha refletido na sua contabilidade essas devoluções” - vide depoimento da testemunha R... do minuto 2:10:58 ao minuto 2:12:55.

37. Quando esta testemunha foi inquirida sobre se a AT pediu à sociedade A... e à sociedade impugnante, os documentos comprovativos das devoluções, a testemunha R... respondeu o seguinte: “ Foi feito um pedido à A... e foi feito esse cruzamento. Verificou-se que houve uma anulação de serviços que foram reconhecidos num determinado exercício e depois não houve qualquer movimento bancário de devolução dos valores” – vide depoimento da testemunha R... do minuto 2:12:58 ao minuto 2:13:31.

38. Perante esta resposta a Meritíssima Juiz de Direito inquiriu a testemunha R..., tendo-lhe perguntado:” não lhe foi explicado a existência de acerto de contas entre a A... e a A...? Tendo a testemunha respondido o seguinte “ mas o problema que estava aqui era na devolução dos valores, ou seja, não havia devolução dos valores e no outro lado também não estava reconhecido” - vide depoimento da testemunha R... do minuto 2:13:31 ao minuto 2:13:47.

39. Temos assim, que perante a globalidade da prova produzida – prova documental conjugada com a prova testemunhal, designadamente o depoimento das testemunhas O... e R... - torna-se inquestionável a legalidade da atuação da AT e consequentemente da liquidação adicional de IVA.

40. Em conformidade com o relatório de inspeção tributária, nos exercícios de 2015 e 2016, a impugnante efetuou movimentos contabilísticos na conta SNC 733 - “Variações nos Inventários da Produção – Produtos e trabalhos em curso”, por contrapartida da conta 3611 – “Produtos e Trabalhos em Curso” – vide relatório de inspeção, designadamente fls. 36 a 40 do PA.

41. Sucede que na sequência da realização do procedimento de inspeção, verificou-se que a impugnante não possuía na sua contabilidade, os documentos de suporte a estes lançamentos.

42. Na sequência da notificação do projeto de relatório, a impugnante apresentou os inventários finais, relativos a 31.12.2015 e 31.12.2016 – vide relatório de inspeção de folhas 45 a 47 do PA, já juntas com a contestação.

43. Analisando os referidos documentos, os serviços de inspeção concluíram que não possível relacionar, inequivocamente, os montantes ali consignados, com as faturas emitidas em 2016, nem a impugnante conseguiu identificou as mesmas.

44. Contrariamente ao que a impugnante pretende incutir a este Tribunal, os inventários apresentados, não permitem validar, que relativamente aos serviços, em concreto, foram emitidas as faturas correspondentes e liquidado o respetivo IVA. Pelos mesmos motivos, também não é possível validar o que a impugnante contabilizou como variação da produção negativa.

45. Esta factualidade ficou demonstrada pela prova documental produzida e foi reforçada pelos depoimentos das testemunhas O... R... (vide depoimento da testemunha O... do minuto 1:42:33 ao minuto 1:43:28 e vide depoimento da testemunha R... do minuto 2:14:22 ao minuto 2:16:01 e ainda do minuto 2:16:02 ao minuto 2:16:32).

- A douta decisão recorrida, não enferma dos vícios que lhe são imputados pelo ora recorrente, motivo pelo qual não merece qualquer reparo ou censura, devendo manter-se no ordenamento jurídico, com as consequências legais daí decorrentes.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências deve ser negado provimento ao presente recurso e em consequência manter-se a decisão recorrida.”


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O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA e emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

1. O capital social da Impugnante, “A... – G..., S.A.”, é detido, em partes iguais, por A..., J... e E..., tendo aqueles dois primeiros sócios sido designados gerentes – cfr. informação do Portal da Justiça de fls. 540 e 541 do processo em suporte informático.

2. 2. Em 01.09.2013 a Impugnante e a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” outorgaram um “Contrato de Prestação de Serviços”, pelo qual esta se obrigou a proceder a trabalhos de limpeza de matos com grade e correcção de níveis de fertilidade em 210ha e instalação de cultura melhoradora em 163ha na Área Agrupada de L... – cfr. contrato de fls. 579 e 580 do processo em suporte informático.

3. Em 01.10.2013 a Impugnante e a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” outorgaram um “Contrato de Prestação de Serviços”, pelo qual esta se obrigou a proceder a trabalhos de limpeza de matos com grade em 195ha, instalação de cultura melhoradora em 125ha e correcção de níveis de fertilidade em 341ha na Área Agrupada de M... – cfr. contrato de fls. 581 do processo em suporte informático.

4. Em 15.08.2013 a Impugnante e a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” outorgaram um “Contrato de Prestação de Serviços”, pelo qual esta se obrigou a proceder a trabalhos de limpeza de matos com grade em 330ha, instalação de cultura melhoradora em 215ha, ripagem/covas para plantas em 300ha, podas sanitárias e recolha de sobrantes em 401ha e correcção de níveis de fertilidade em 461ha na Área Agrupada de Vale Madeiros – cfr. contrato de fls. 582 do processo em suporte informático.

5. Em 06.01.2014 a Impugnante e a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” outorgaram um “Contrato de Prestação de Serviços”, pelo qual esta se obrigou a proceder a trabalho de poda de formação em 2547ha na Zona de Intervenção Florestal de S. Bartolomeu da Serra – cfr. contrato de fls. 585 do processo em suporte informático.

6. Em 06.01.2014 a Impugnante e a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” outorgaram um “Contrato de Prestação de Serviços”, pelo qual esta se obrigou a proceder a trabalho de poda de formação em 1082ha na Zona de Intervenção Florestal do Viso e Anexas – cfr. contrato de fls. 586 do processo em suporte informático.

7. Em 29.01.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu a factura n.º 1400/000004, em nome da Impugnante, referente a serviços de “limpmatosgrade”, “instalação cultura melhorada”, “ripab covasplant”, “poda sanitária”, “recolha de sobrantes”, “correcção níveis fertilidade do solo” e “trabalho referente a AA Vale Madeiros”, no valor total de EUR 431.070,00 e IVA no valor de EUR 25.864,20 – cfr. factura de fls. 196 do processo em suporte informático.

8. Em 29.01.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu o recibo n.º 2014000004 no qual declara que recebeu a importância total de EUR 456.934,20, referente à factura identificada no ponto anterior do probatório – cfr. recibo de fls. 197 do processo em suporte informático.

9. Em 03.02.2014 a Impugnante e a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” outorgaram um “Contrato de Prestação de Serviços”, pelo qual esta se obrigou a proceder a trabalhos de limpeza de matos com corta matos em 516ha na Área Agrupada de V... e Anexas – cfr. contrato de fls. 583 e 584 do processo em suporte informático.

10. Em 26.02.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu a factura n.º 1400/000009, em nome da Impugnante, referente a serviços de “limpmatosgrade”, “instalação cultura melhorada”, “correcção níveis fertilidade do solo” e “trabalho referente a AA M...”, no valor total de EUR 134.495,00 e IVA no valor de EUR 8.069,70 – cfr. factura de fls. 198 do processo em suporte informático.

11. Em 26.02.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu o recibo n.º 2014000009 no qual declara que recebeu a importância total de EUR 142.564,70, referente à factura identificada no ponto anterior do probatório – cfr. recibo de fls. 199 do processo em suporte informático.

12. Em 28.03.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu a factura n.º 1400/000015, em nome da Impugnante, referente a serviços de “limpmatosgrade”, “instalação cultura melhorada”, “correcção níveis fertilidade do solo” e “trabalho referente a AA L...”, no valor total de EUR 115.345,00 e IVA no valor de EUR6.920,70 – cfr. factura de fls. 200 do processo em suporte informático.

13. Em 28.03.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu o recibo n.º 2014000015 no qual declara que recebeu a importância total de EUR 122.264,70, referente à factura identificada no ponto anterior do probatório – cfr. recibo de fls. 201 do processo em suporte informático.

14. Em 12.09.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu a factura n.º 1400/000039, em nome da Impugnante, referente a serviços de “Poda de Formação” e “Trabalhos referentes Zif do Viso e Anexas”, no valor total de EUR 97.380,00 e IVA no valor de EUR 5.842,80 – cfr. factura de fls. 202 do processo em suporte informático.

15. Em 12.09.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu o recibo n.º 2014000039 no qual declara que recebeu a importância total de EUR 103.222,80, referente à factura identificada no ponto anterior do probatório – cfr. recibo de fls. 203 do processo em suporte informático.

16. Em 12.09.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu a factura n.º 1400/000040, em nome da Impugnante, referente a serviços de “Limpeza de matos com corta matos” e “Trabalhos referente AA V... e anexas”, no valor total de EUR 100.620,00 e IVA no valor de EUR 6.037,20 – cfr. factura de fls. 204 do processo em suporte informático.

17. Em 12.09.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu o recibo n.º 2014000040 no qual declara que recebeu a importância total de EUR 106.657,20, referente à factura identificada no ponto anterior do probatório – cfr. recibo de fls. 205 do processo em suporte informático.

18. Em 12.09.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu a factura n.º 1400/000038, em nome da Impugnante, referente a serviços de “Poda de formação” e “Trabalhos referente Zif de S. Bartolomeu da Serra”, no valor total de EUR 152.820,00 e IVA no valor de EUR 9.169,20 – cfr. factura de fls. 206 do processo em suporte informático.

19. Em 12.09.2014 a “S... Sociedade Agroflorestal, Lda” emitiu o recibo n.º 2014000038 no qual declara que recebeu a importância total de EUR 161.989,20, referente à factura identificada no ponto anterior do probatório – cfr. recibo de fls. 207 do processo em suporte informático.

20. Em 28.11.2018, no âmbito da acção inspectiva, a Impugnante foi notificada, na pessoa do sócio gerente J..., para no prazo máximo de oito dias, proceder à exibição, entre outros, dos seguintes elementos “Cópia de todos os documentos de suporte (facturas, recibos e comprovativos de pagamento) relativos aos movimentos do fornecedor “S... – SOCIEDADE AGROFLORESTAL LDA”, NIPC 5..., bem como os respectivos contratos e outra documentação inerente aos serviços prestados” e “Inventário Final dos Produtos e Trabalhos em Curso nos exercícios de 2015 e 2016.” – cfr. notificação de fls. 191 a 194 do processo em suporte informático.

21. Em 26.12.2018 o TOC J... enviou uma mensagem de correio eletrónico para a inspectora tributária, com o seguinte teor:

“(…)

Junto anexamos os documentos referentes a empresa S...:

- Extractos da conta corrente do ano 2014. Nos anos seguintes não houve qualquer movimento com esta empresa;

- Cópia das facturas, bem como as contas correntes dos pagamentos efectuados;

- Contratos de prestação de serviços celebrados com a S..., Lda;

- Os contratos acima celebrados foram efectuados com o Dr. J...;

Nota: os restantes elementos solicitados serão enviados o mais rápido possível

(…)” – cfr. mensagem de correio electrónico de fls. 578 do processo em suporte informático.

22. Em 12.02.2019 a inspectora responsável dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças da Guarda elaborou o “Projecto de Relatório de Inspecção Tributária”, que consta de fls. 259 a 293 dos autos, o qual foi, por despacho de 13.02.2019, superiormente sancionado – cfr. projecto de relatório de inspecção tributária de fls. 259 a 293 do processo em suporte informático.

23. Em 15.02.2019 foram assinados os avisos de recepção dos ofícios destinados a notificar a Impugnante, na pessoa dos representantes legais, para, querendo, exercer o direito de audição sobre o projecto de relatório de inspecção tributária – cfr. ofício e aviso de recepção de fls. 254 a 258 do processo em suporte informático.

24. Em 04.03.2019 deu entrada na Direcção de Finanças da Guarda o requerimento apresentado pela Impugnante, pelo qual esta se pronunciou em sede de audiência prévia, relativamente ao projecto de relatório de inspecção tributária e no qual pede, além do mais, que seja admitido, no prazo de 15 dias, a juntar documentos ao processo de inspecção – cfr. requerimento de fls. 463 a 468 do processo em suporte informático.

25. Em 08.03.2019 foi assinado o aviso de recepção do ofício, elaborado pela Directora de Finanças da Guarda, sob o assunto “Projecto de relatório de inspecção tributária – direito de audição”, destinado a notificar a Impugnante nos seguintes termos:

“(…)

O direito de audição foi parcialmente exercido por escrito, dentro do prazo notificado.

Assim, e atendendo ao que, entretanto, foi solicitado, o prazo de 15 dias (Quinze) para o exercício do direito de audição notificado, pelo nosso ofício n.º 30148 de 13.02.2019, é alargado por mais 10 (dez) dias, sendo-lhes assim concedido o prazo máximo previsto por lei.

(…)” – cfr. ofício e aviso de recepção de fls. 252 e 253 do processo em suporte informático.

26. Em data não apurada a Impugnante apresentou um requerimento pelo qual declara juntar “os elementos que protestou juntar, ou seja, os Inventários dos trabalhos efectuados, em conformidade com os elementos contabilísticos (Anexo I)” – cfr. requerimento e documentos de fls. 460 a 462 do processo em suporte informático.

27. Em 25.03.2019 a inspectora tributária da Direcção de Finanças da Guarda elaborou o relatório de inspecção tributária que aqui se dá por reproduzido e transcreve parcialmente:

“(...)

III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticos
III.1. Prestações de serviços do fornecedor S...
Ø Faturas contabilizadas

Durante os exercidos de 2014 o sujeito passivo tinha na sua posse e contabilizou as seguintes faturas d0 tomecedor 'S... – SOCIEDADE AGROFLORESTAL, Lda’ NIF/NIPC 5... que constam do Anexo II ao presente relatório:

Ø Do fornecedor S...

A presente ação teve origem na comunicação remetida pela DF de Lisboa que dava conhecimento de que no exercício de 2014 o sujeito passivo tinha na sua contabilidade faturas omitidas pela sociedade S... – SCOEIDADE AGROFLORESTAL, LDA”, NIPC/NlF 5..., que se concluiu ser inexistente:

Encontra-se em curso ao abrigo da OI201601120 da Direção de Finanças de Lisboa ação inspetiva ao ano de 2014 para a sociedade S... - Sociedade Agroflorestal, Lda, NIF 5... que não declarou início de atividade para efeitos de IRC e IVA

Na sequência das diligências efetuadas verificou-se ainda que não foram encontrados quaisquer responsáveis por aquela sociedade bem como a mesma não possui qualquer estrutura empresarial para prestar os serviços mencionados nas futuras que se encontram na posse de terceiros.

No decurso da mencionada ação verificou-se que a empreso A...- Sociedade Aqroflorestal NIF 5... com sede na Guarda, contabilizou faturas emitidas freta S..., Lda, cujos montantes totalizem 1 031.730,00 ouros, a que acresceu IVA liquidado, à taxa reduzida de 6%. no montante do 61.903,80 euros.

Foram efetuados pedidos de colaboração à A..., Lda sobre o relacionamento comercial mantido com a S... no ano de 2014, a que a mesma respondeu, constatando-se que algumas questões não foram devidamente esclarecidas e outras ainda aguardam resposta.

Refira-se que na S... não se irá proceder a qualquer correção para efeitos fiscais, dado que, pelos elementos analisados estamos perante a emissão de faturas que sustentam indícios de operações simuladas.”

Da ação inspetiva levada a cabo pelos serviços de inspeção da DF de Lisboa, ao exercício de 2014 e à sociedade “S... – SOCIEDADE AGROFLORESTAL, LDA”, apuraram-se os seguintes factos / retiraram-se as seguintes conclusões:

· A S... não se registou em sede de IRC e IVA para o exercício de qualquer atividade;

· Conforme certidão permanente, o sujeito passivo tem o seguinte objeto: “Elaboração e estudos e projectos de silvicultura e actividades afins, bem como a gestão e exploração de áreas florestais, arrendamento de terras e aluguer de equipamento para implementação dessa actividade”;

· Conforme certidão permanente, a gerência da S... é exercida unicamente pelo sócio E..., NIF 1..., com domicílio, atual, na R S... – Alto das Vinhas – 2970-141 Sesimbra. No âmbito do pedido de colaboração à A... efetuado pela Direção de Finanças de Lisboa, foi dito pelo contabilista certificado que os contratos foram efetuados com o Dr. J...;

· Por consulta às bases de dados da AT veirifica-se que a S... não se encontra enquadrada, em sede de IRC e IVA, pelo exercício de qualquer atividade. Consequentemente, não cumprir qualquer obrigação declarativa ou de pagamento;

· Nos anos de 2013 e seguintes nenhuma aquisição de bens e/ ou serviços por parte da S... foi comunicada na aplicação e-fatura;

· Nenhum contribuinte declarou, nos anexos A e B da declaração de rendimentos (Mod. 3 do IRS), ter auferido qualquer rendimento pago pela S... no ano de 2013 e seguintes;

· Consultadas as bases de dados da Segurança Social para o ano de 2013 e seguintes relativamente ao sujeito passivo S..., não retomaram quaisquer resultados, pelo que se conclui não ter esta empresa registado nos anos em causa qualquer trabalhador;

· A S... é um contribuinte que não declarou para efeitos fiscais o início de qualquer atividade e não foi detetada qualquer evidência da existência de estrutura empresarial, nomeadamente recursos humanos e equipamentos, susceptível do exercício dos serviços silvícolas e de consultoria a que a faturação emitida em seu nome alude ou de qualquer outra atividade;

· Da resposta enviada pela A... foi ainda possível concluir:

o Analisada a resposta da A... confirma-se o envio da faturação emitida no ano de 2014 pela S... espelhada no respetivo extrato de conta corrente;

o No que se refere aos pagamentos nenhuma documentação comprovativa dos mesmos foi apresentada. Regista-se o facto do extrato da conta corrente do fornecedor evidenciar a contabilização do recibo na mesma data das fatura correspondente;

o Quanto aos contratos de prestações de serviços apresentados por fatura emitida, com a identificação fiscal dos outorgantes A..., Lda., e S... constatou-se que os relacionados com as faturas n.ºs 1400/000004, 1400/000009 e 1400/00015 se encontram datados, respectivamente, de 15 de agosto de 2013, 01 de outubro de 2013 e 01 de setembro de 2013, ou seja em data anterior à da constituição da S..., datada de 27 de Dezembro de 2013;

o Nenhum dos contratos celebrados entre a A..., Lda., e S... identifica devidamente os responsáveis das empresas intervenientes, constando destes meras rubricas;

o De acordo com os contratos celebrados a S... comprometeu-se a efetuar serviços silvícolas, nos quais se obriga a utilização de utensílios próprios e assume responsabilidade pelo pagamento da segurança social, medicina e segurança no trabalho, não ficando sujeito a horário de trabalho, nem a trabalho subordinado. Referem ainda que os serviços prestados serão calculados com base no número de hectares;

o Os contratos relacionados com as faturas n.ºs 1400/000004, 1400/000009, 1400/000038 e 1400/000039 são totalmente omissos relativamente ao valor acordado para cada diferente serviço a realizar, à enumeração das tarefas a realizar e sua calendarização, o que é de todo estranho, questionando, assim, a utilidade efetiva dos mesmos;

o A fatura nº 1400/000015 tem anexa a descrição dos trabalhos realizados, na qual se refere a débito o total da adjudicação e a crédito os montantes pagos por adiantamento de início de trabalhos e demais pagamentos faseados por tarefas realizadas, da qual se conclui que os trabalhos se iniciaram, com a gradagem de matos, em 01 de outubro de 2013, em data anterior à constituição da S... e terminaram em 03 de fevereiro de 2014, tendo ocorrido a “liquidação de saldo” em 28 de março de 2014, que coincide com a data da fatura;

o A fatura n.º1400/000040 tem também igualmente anexa a descrição dos trabalhos realizados, na qual se refere a débito o total da adjudicação e a crédito os montantes pagos por adiantamento de início de trabalhos e demais pagamentos faseados por tarefas realizadas, da qual se conclui que os trabalhos se iniciaram, com a gradagem de matos (combustível), em 24 de fevereiro de 2014 e terminaram em 01 de setembro de 2014, tendo ocorrido a “liquidação de saldo” em 12 de setembro de 2014, que coincide com a data da fatura;

o A contabilidade da A..., Lda., não evidencia o pagamento faseado de qualquer fatura emitida pela S..., coincidindo a data de contabilização das faturas com o respetivo recibo;

o As faturas n.ºs 1400/000004 e 1400/00009 datadas, respetivamente, de 29 de janeiro e 26 de fevereiro de 2014, foram contabilizadas em 30 de março do ano a que respeitam, têm a seguinte anotação “chegaram ao escritório dia 7/5/2014 via CTT”;

o Todos os contratos indicam que foram celebrados na localidade de Santiago do Cacém que não corresponde à sede de qualquer dos intervenientes;

o Apesar de ter sido solicitado, não foi confirmada a situação cadastral da S..., informação que a AT disponibiliza, que confirmaria não ter este contribuinte procedido ao seu enquadramento fiscal no ano de 2014 e seguintes, limitando-se a confirmar que segundo o Portal da Justiça, a empresa em causa se constituiu no dia 27 de dezembro de 2013;

o Nestes termos, a A..., Lda., contabilizou no ano de 2014 faturação emitida, à data, por um não sujeito passivo de IRC e IVA, que consequente terá tido reflexo nos resultados fiscais, em termos de gastos e dedução de IVA;

o No que à documentação comprovativa do pagamento das faturas emitidas pela S..., no ano de 2014 se refere, o notificado refere o seguinte: “solicitamos ao banco os extratos de 2014, os quais ainda não nos foram entregues, logo que nos sejam enviados faremos a marcação dos movimentos tidos”.

o Da conjugação da informação conhecida sobre o emitente S..., e da análise das faturas emitidas em seu nome no ano de 2014 para a A..., Lda., bem como da falta ou incoerência dos esclarecimentos solicitados à entidade recetora sobre o emitente e serviços faturados, conforme atrás relatado, existem fundados indícios de que estes serviços não tenham sido efetivamente realizados pela S...;

o A A... contabilizou faturação emitida de um contribuinte não registado para efeitos fiscais;

o A AT disponibiliza aos sujeitos passivos o enquadramento fiscal, em sede de IVA, de clientes e fornecedores;

o Foi solicitado à A... que precisasse o enquadramento fiscal do seu fornecedor S..., o que não foi feito. Para o efeito, foi enviado o registo do contrato de constituição da S... no Portal da Justiça, o que não responde ao solicitado;

o A A..., Lda., contabilizou, no ano de 2014, faturas emitidas em nome da S..., cujos serviços silvícolas totalizam 1.031.730,00 euros;

o O elevado montante de serviços faturados implicava necessariamente conhecimento pela A..., Lda., da estrutura empresarial da entidade emitente, da qual não existe qualquer evidência, além da faturação emitida em seu nome;

o Não foi demonstrado pela A..., Lda., ter conhecimento de que o prestador dos serviços dispunha de adequada estrutura empresarial susceptível do exercício da atividade declarada, por um não sujeito passivo.

No âmbito da presente ação foi ainda notificado o sujeito passivo, em 28 de novembro de 2018, para apresentação dos seguintes elementos:

“- Cópia de todos os documentos de suporte (faturas, recibos e comprovativos de pagamento) relativos aos movimentos do fornecedor ‘S... - SOCIEDADE AGROFLORESTAL LDA' NIPC 5..., bem como os respetivos contratos e outra documentação inerente as serviços prestados.”

Em resposta à mesma veio 0 sujeito passivo apresentar cópia dos contratos efetuados a 15 de agosto de 2012, 01 de setembro de 2012; 01 de outubro de 2013 06 de janeiro de 2014 e 03 de fevereiro de 2014 e extrato de conta corrente na contabilidade que reflete o pagamento das faturas.

Esses mesmos elementos também foram enviados á Direção de Finanças de Lisboa, reiterando-se a apreciação efetuada.

Não vem no entanto juntar comprovativo dos pagamentos efetuado, nem as contas bancárias refletem esses pagamentos.

Por isso não foram apresentados elementos novos que alteram as conclusões da ação inspetiva levada a cabo pela DF de Lisboa.

Ø Correção em sede de IVA - dedução indevida de imposto

Nos termos do artigo 19.º do Código do IVA, nos seus números 1, al. a) e n.º 4, não pode deduzir-se imposto nos seguintes casos:

1 – Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram:

a) O imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos;

(…)

”3 – Não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura.

4 – Não pode igualmente deduzir-se o imposto que resulte de operações em que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado, quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento de que o transmitente dos bens ou prestador de serviços não dispõe de adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a atividade declarada. “

Como atrás foi descrito, concluíram os serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Lisboa, que o presumível fornecedor “S... – SOCIEDADE AGROFLORESTAL, LDA”, NIF 5..., não dispõe de estrutura empresarial suscetível de prestar os serviços constantes das faturas na posse do sujeito passivo.

Também os elementos existentes na contabilidade, e que foram apresentados aos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Lisboa, são insuficientes para concluir de forma diferente.

O sujeito passivo, embora notificado para o efeito (ANEXO I) não veio apresentar elementos novos que permitissem comprovar a efetividade das operações, designadamente, os meios de pagamento ou outros documentos inerentes às operações.

Nestes termos também não se demonstra que o sujeito passivo suportou o IVA constante das faturas, uma vez que não identificou a quem, como, em que datas e montantes efetuou os pagamentos.

Com base nas faturas do fornecedor “S... – SOCIEDADE AGROFLORESTAL, LDA”, NIF/NIPC 5..., o sujeito passivo deduziu imposto (IVA) nos montantes a seguir discriminados:

O montante da correção em sede de IVA, resultante da não dedutibilidade do imposto nos termos do artigo 19.º, n.º 1, 3 e 4 do Código do IVA, no ano de 2014, é de 61.903,80 €, imputável ao 1º e 3.º trimestres, conforme anteriormente discriminado.

(…)
III.5. Exercício de 2015: Notas de crédito não justificadas
No exercício de 2015 o sujeito passivo emitiu as seguintes notas de crédito, relativas a faturas emitidas em 2014, ao cliente “A... Assoc. Prod. Florestais do Alto Alentejo”, e que constam no ANEXO IV ao presente relatório:


«Imagem no original»

Com base nessas notas de crédito o sujeito passivo:

ü regularizou imposto a seu favor, no montante de 16.440,38€, que inscreveu no campo 40 da declaração periódica de IVA do mês de maio de 2015;

ü diminuiu o valor dos proveitos desse exercício em 274.006,08€, através da contabilização destas notas de crédito a débito na conta 717111 – “Devoluções de vendas – Taxa reduzida”.

Relativamente a estas notas de crédito foram apurados os seguintes factos:

ü Não se encontra devidamente justificada a emissão destas notas de crédito. Embora em observações esteja mencionada qual a fatura que a nota de crédito retifica, tal não é suficiente para justificar a sua emissão.

ü Estas notas de crédito dizem respeito a faturas de 2014, refletidas nos rendimentos de 2014 e que nesse exercício deram origem a liquidação de IVA nos termos do artigo 1.º, n.º1, al. a) e artigo 4.º do código do IVA. Ou seja, existiu, nesse exercício, uma prestação de serviços reconhecida pelo sujeito passivo.

ü As faturas emitidas em 2014, e agora anuladas, foram recebidas pelo sujeito passivo, conforme refletem os extratos de conta corrente do cliente e também os extratos bancários, onde estão refletidos os recebimentos inerentes a estes serviços prestados;

ü Embora o extrato de conta corrente de 2015 do cliente A... reflita a devolução dos montantes faturados, por contrapartida de um crédito na conta 121-Bancos de 491.076,29 €, não se identifica este movimento no extrato bancário. Ou seja, não existem provas efetivas da devolução ao cliente dos montantes já recebidos;

ü Aliás, não consta das notas de crédito, ou dos documentos juntos Às mesmas, qualquer comprovativo de que o cliente tenha tomado conhecimento das mesmas;

ü Foi solicitado ao cliente “A... Assoc.Prod. Florestais do Alto Alentejo” o extrato de conta corrente do seu fornecedor “A...”, no exercício de 2015. Neste extrato não estavam registadas as notas de crédito aqui referidas, nem existiam saldos a débito ou a crédito, ou seja, estava saldado.

Da emissão e respetiva contabilização destas notas de crédito resultam consequências em sede de IVA e IRC.

Ø Em sede de IVA

Dispõe o artigo 78.º do CIVA, nos seus n.ºs 2 e 5:

2 – Se, depois de efectuado o registo referido no artigo 45.º, for anulada a operação ou reduzido o seu valor tributável em consequência de invalidade, resolução, rescisão ou redução do contrato, pela devolução de mercadorias ou pela concessão de abatimentos ou descontos, o fornecedor do bem ou prestador do serviço pode efectuar a dedução do correspondente imposto até ao final do período de imposto seguinte àquele em que se verificarem as circunstâncias que determinaram a anulação da liquidação ou a redução do seu valor tributável.

(…)

5 – Quando o valor tributável de uma operação ou o respectivo imposto sofrerem uma rectificação para menos, a regularização a favor do sujeito passivo só pode ser efectuada quando este tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da rectificação ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que se considera indevida a respectiva dedução.”

Atendendo aos factos anteriormente descritos, verifica-se que a regularização de IVA efetuada não cumpre o disposto no artigo 78.º, n.º 2 e 5 do CIVA.

O montante da correção em sede de IVA, por falta de cumprimento no estipulado no artigo 78.º, n.º 2 e 5 do CIVA, é de 16.440,38 €, imputável ao mês de maio de 2015.

(…)
III.6. Contabilização de variação da produção. Consequências em sede de IRC e IVA.

Nos exercícios de 2015 e 2016 o sujeito passivo efetuou os seguintes movimentos contabilísticos na conta SNC 733 – “Variações nos Inventários da Produção – Produtos e trabalhos em curso”, por contrapartida da conta 3611 – “Produtos e Trabalhos em Curso”:

Com o seguinte reflexo na conta 3611:




Os documentos de suporte a estes lançamentos são inexistentes

Por via destes movimentos contabilistas o sujeito passivo reconheceu, em 2015, um rendimento de 1.025.000.00 € Em 2016 abateu aos restantes rendimentos contabilizados na conta 7, o montante de 373 000.00 €, diminuindo o valor dos rendimentos declarados.

Não tendo sido exibidos do imediato os documentos de suporte a estes lançamentos, foi o sujeito passivo notificado, em 26 de novembro de 2018, para, no prazo de 8 dias apresentar o inventário final de produtos e trabalhos em curso dos exercícios de 2015 e 2016 (ANEXO I). Até ao momento não veio o sujeito passivo apresentar o referido inventário nem qualquer outro justificativo para o valor inscrito nesta conta.

Atendendo à natureza da atividade do sujeito passivo, que consiste na prestação de serviços relacionadas com a silvicultura e exploração florestal, estes valores não se referem a obras ou produção em curso mas a prestações de serviços iniciadas e com gastes suportados no exercício, para as quais ainda não foi emitida a respetiva fatura.

Na sua substância, este movimento contabilístico destinou-se a refletir nos resultados do exercício os rendimentos correspondentes aos gastos já incorridos com prestações de serviços, mas para as quais ainda não tinha sido emitida fatura.

Efetivamente, dispõe a Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) 20, relativamente aos réditos nas prestações de serviços, no seu parágrafo 20, que ”quando o desfecho de uma transação que envolva a prestação de serviços possa ser fiavelmente estimado, o rédito associado com a transação deve ser reconhecido com referência à fase de acabamento da transação à data do balanço”.

Também o artigo 18.º do CIRC , que dispõe sobre a periodização do lucro tributável, refere que “Os réditos relativos a prestações de serviços consideram-se em geral realizados, e os correspondentes gastos suportados na data em que o serviço é concluído, excepto tratando-se de serviços que consistam na prestação de mais de um acto ou numa prestação continuada ou sucessiva, que são imputáveis proporcionalmente à sua execução” (art.18.º, n.º3, al. b)).

No entanto, tal reconhecimento não deveria ter sido feito na conta 73 destinada as variações nos inventários da produção dos produtos e trabalhos em curso (os produtos e trabalhos em curso são os inventários que se encontram em processo de fabrico ou produção), mas sim numa conta 72 - Prestação de Serviços (por contrapartida da conta 2721 - Devedores por acréscimos de rendimentos), refletindo- -se desta forma a percentagem de acabamento.

Embora o reconhecimento contabilístico efetuado pelo sujado passivo não se encontre correto de acordo com as regras de normalização contabilística, devendo ser objeto de sancionamento contra-ordenacional nos termos do artigo 121.º do RGlTA, em sede de IRC admite-se que o rédito tenha sido reconhecido.

De qualquer forma tendo o sujeito passivo de possuir um documento de suporte para o que designou de 'produtos e trabalhos em curso' de forma a ser possível controlar a que trabalhos diziam respeito e a sua posterior faturação.

Não tendo procedido de tal forma resultam correções em sede de IRC e IVA, tal como descrito nos pontos seguintes.

Ø 2015: Correção em sede de IVA – falta de liquidação de imposto.

Relativamente ao valor do 1.025,000,00 €, contabilizado como variação da produção em 2015, como já foi referido o mesmo corresponderá a prestações de serviços cujos gastos foram incorridos neste exercício de 2015.

Através deste lançamento contabilístico veio o sujeito passivo reconhecer o rendimento destas prestações de serviços.

No entanto, as prestações do serviços estão sujeitas a IVA nos termos do artigo 1.º, n.º 1, al. a) do código do IVA. O sujeito passivo não apresentou elementos que pudessem comprovar se foram emitidas as faturas correspondentes a estes serviços e que foi liquidado o IVA correspondente. Neste contexto, tem de se atender ao disposto do artigo 7.º do Código do IVA relativamente a exigibilidade do imposto:


Artigo 7.º

Facto gerador e exigibilidade do imposto


1 – Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o imposto é devido e torna-se exigível:

(…)

b) Nas prestações de serviços, no momento da sua realização.

(…)

3 – Nas transmissões de bens e prestações de serviços de carácter continuado, resultantes de contratos que dêem lugar a pagamentos sucessivos, considera-se que os bens são postos à disposição e as prestações de serviços são realizadas no termo do período o que se refere cada pagamento, sendo imposto devido e exigível pelo respectivo montante.

(…)

9 – No caso das transmissões de bens e prestações de serviços referidas no n.º 3, em que não seja fixada periodicidade de pagamento ou esta seja superior a 12 meses, o imposto é devido e torna-se exigível no final de cada período de 12 meses, pelo montante correspondente.

(…)”

Assim, encontra-se em falta a liquidação de IVA respeitante a estes serviços, por aplicação da taxa reduzida (por os serviços prestados pelo sujeito passivo se enquadrarem na verba 4 da lista I anexa ao código do IVA) no montante de 61.500,00€, imputável ao último período de tributação de 2015: 1.025.000,00€ x 6% = 61.500,00€

(…)

IX. Direito de audição
Através dos ofícios n.º 30147. 30148 e 30149 de 13-02-2019 foram notificados o sujeito passivo e os seus representantes legais nos termos do artigo 60º da LGT e artigo 60° do RCPITA, para no prazo de 15 dias querendo, exercer o direito de audição sobre o conteúdo do Projeto de Relatório.
Em petição que deu entrada nestes serviços em 04 de março de 2019 veio o sujeito passivo exercer o direito de audição.
Nessa petição requeria o sujeito passivo o prazo de 15 dias para juntar documentos adicionais
Em face disso foi alargado o prazo para o exercício do direito de audição por mais 10 (dez) dias (sendo-lhe assim concedido o prazo máximo previsto na lei).
Em 18 de março veio o sujeito passivo entregar alguns desses elementos.
Seguidamente procede-se á analise dos factos alegados pelo sujeito passivo nas petições apresentadas
Ø III.1 — Correção à matéria tributável por contabilização de gastos suportados em documento emitido por sujeito passivo com o NIF inexistente ou inválido
Diz o sujeito passivo que “As correções da dedução de IVA e do gasto contabilizado em sede de IRC, tendo por base as facturas emitidas pelo fornecedor S... – Soc. Agroflorestal Lda. deve-se, na opinião da Sra. Inspetora, ao facto do s.p. não ter comprovado através da informação disponibilizada pela A.T., nos termos do art.º 23.º-A do Cód. Do IRC que o n.º de contribuinte existia e era válido.”
As correções efetuadas resultantes das faturas emitidas pelo fornecedor S... – Soc. Agroflorestal, Lda., resultaram de um conjunto de factos descritos no capítulo III.1, sendo que resultam do não cumprimento das disposições legais, entre as quais o artigo 23.º-A do Código do IRC, e não da “opinião da Sra. Inspetora”.
Vem acrescentar o sujeito passivo que “contratou com a S..., na data constante dos contratos” e que os trabalhos foram realizados. Diz também que “não surgiram quaisquer dúvidas sobre a existência e a legalidade da fornecedora perante a A.T., considerando por um lado os elementos constantes do Portal da Justiça e, por outro, quando nas faturas, além da razão social constam a sede, capital social, matrícula na C.R.C. de Lxª, NIPC, e-mail, carimbo comercial e licenciamento de software concedido pela T... (…)” (sublinhado nosso).
Refira-se a este respeito que, para consultar a legalidade da fornecedora perante a AT, deve ser consultado o portal da AT e não o Portal da Justiça.
Vem também referir que “Também não tem que saber sobre o fluxo do dinheiro a partir do momento que por si foi colocado à disposição da S.... (… )
Ora, não foi apresentado pelo sujeito passivo, nem agora nem no decurso da ação inspetiva nem na resposta ao pedido de colaboração efetuado pela Direção de Finanças de Lisboa, qualquer comprovativo de que colocou à disposição da S... os montantes por esta faturados (ou qualquer montante).
Ou seja no exercício do direito de audição não vem apresentar quaisquer factos novos que permitam alterar as conclusões do relatório, pelo que as correções proposta se mantêm.
(…)

«Imagem no original»

Como poderá o sujeito passivo controlar o que tem que faturar relativamente a cada projeto se não discrimina, por projeto, os trabalhos efetuados?

Com estes elementos não se torna possível validar que relativamente a estes serviços em concreto, foram emitidas as faturas correspondentes e liquidado o respetivo IVA.

Pelos mesmos motivos, também não é possível validar o que o sujeito passivo contabilizou como variação da produção negativa.

Assim, mantêm-se as correções inicialmente propostas, quer em ser de IRC, quer em sede de IVA.

(…)” – cfr. relatório de fls. 148 a 189 do processo em suporte informático.

28. O relatório identificado no ponto anterior do probatório foi superiormente sancionado por despacho que aqui se dá por reproduzido e transcreve parcialmente: “Sanciono o presente relatório, atento o resultado e o parecer do Sr. chefe de equipa, após apreciação das alegações apresentadas pelo contribuinte no uso do direito de audição prévia, as quais foram parcialmente atendidas. (…)” – cfr. despacho aposto na primeira página do relatório de inspecção tributária a fls. 148 do processo em suporte informático.

29. Em 03 e 08 de Abril de 2019 foram assinados os avisos de recepção dos ofícios destinados a notificar a Impugnante, na pessoa dos legais representantes, do relatório de inspecção tributária – cfr. ofícios e avisos de recepção de fls. 142 a 146 do processo em suporte informático.

30. Em 08.04.2019 foi emitida, em nome da impugnante, a liquidação de IVA com o n.º 20190271..., referente ao período 201403T, pela qual foi apurado IVA a pagar, até 22.05.2019, no valor de EUR 40.854,60, e ainda a liquidação dos respectivos juros compensatórios no valor de EUR 7.942,58 – cfr. fls. 12 a 14 do processo em suporte informático.

31. Em 09.04.2019 foi emitida, em nome da impugnante, a liquidação de IVA com o n.º 20190271..., referente ao período 201409T, pela qual foi apurado IVA a pagar, até 22.05.2019, no valor de EUR 22.679,42 – cfr. fls. 15 e 16 do processo em suporte informático.

32. Em 09.04.2019 foi emitida, em nome da impugnante, a liquidação de IVA com o n.º 20190271..., referente ao período 201505, pela qual foi corrigido o valor do excesso a reportar existente na conta corrente de IVA, sendo a correcção no valor de EUR 16.440,38, e apurado IVA a pagar, até 22.05.2019, no valor de EUR 3.343,14, e foi ainda emitida a liquidação dos respectivos juros compensatórios no valor de EUR 496,06 – cfr. fls. 17 a 20 do processo em suporte informático.

33. Em 11.04.2019 foi emitida, em nome da impugnante, a liquidação de IVA com o n.º 201902715..., referente ao período 201512, pela qual foi corrigido o valor do excesso a reportar existente na conta corrente de IVA, sendo a correcção no valor de EUR 61.500,00, e apurado IVA no valor de EUR 22.269,00, que foi objecto de acerto de contas, do qual resultou o montante de EUR 13.097,24 a pagar, até 23.05.2019 – cfr. fls. 21 a 23 do processo em suporte informático.

34. Em 02.07.2019 foi apresentada, neste Tribunal, via SITAF, a petição inicial dos presentes autos – cfr. comprovativo de entrega de fls. 1 a 3 do processo em suporte informático.”

A sentença recorrida deu por factos não provados os seguintes:

A) Os trabalhos a que se reportam as facturas identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório foram realizados.

B) A Impugnante entregou à S... – Sociedade Agroflorestal, Lda o preço das facturas identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório.

C) A Impugnante facturou à “A... – Associação de Produtores Florestais do Alto Alentejo” trabalhos referentes a podas sanitárias que não foram executadas.

D) No primeiro trimestre do ano de 2016 a Impugnante facturou serviços executados no ano anterior no montante de EUR 1.025.000,00.”


***

Em matéria de motivação, consta da sentença recorrida o seguinte:

“A convicção do tribunal quanto à matéria de facto provada assentou na análise da documentação constante do processo administrativo e dos autos conforme discriminado supra no probatório.

A matéria de facto não provada constante das alíneas A) e B) foi alegada pela Impugnante nos artigos 8.º, alíneas c) e g), da petição inicial, tendo aquela arrolado prova testemunhal e requerido declarações de parte para prova dos mesmos.

A Impugnante limita-se a alegar que os trabalhos a que respeitam as facturas identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório foram executados. Das testemunhas inquiridas, nenhuma demonstrou ter conhecimento da execução dos trabalhos a que se reportam tais facturas. Apenas o legal representante da Impugnante abordou tal matéria de forma conclusiva e lacónica. Mais, a Impugnante não apresentou qualquer outro documento para suportar a efectiva execução dos trabalhos nem arrolou quaisquer testemunhas oculares, meios de prova esses que não seriam impossíveis de apresentar caso os trabalhos tivessem sido efectivamente prestados. Não se ignora que os trabalhos remontam ao ano de 2014, porém o hiato de cinco anos que mediou até à apresentação da petição inicial não será, em princípio, um obstáculo a essa prova (nem a Impugnante alega qualquer factualidade nesse sentido) – quanto muito tal hiato temporal poderia ter algum reflexo na quantidade dos meios de prova passíveis de ser apresentados em Tribunal e, eventualmente, na qualidade dos depoimentos, porém tal seria sempre apreciado em conformidade com o desfasamento temporal existente. Na realidade, os autos evidenciam que não foi feito qualquer esforço probatório no sentido da demonstração efectiva da execução dos trabalhos. Assim, na ausência de qualquer outro elemento que permita corroborar o escasso depoimento do legal representante da Impugnante quanto a esta matéria, e tendo este um natural interesse desfecho na lide, não é possível dar como provada a execução dos trabalhos a que se reportam as facturas identificadas no pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório.

No que respeita à matéria de facto não provada constante da alínea B) é de notar que a Impugnante alega que “(…) não tem que saber o fluxo do dinheiro a partir do momento que por si foi colocado à disposição da S....” (alínea g) do artigo 8.º da petição inicial). Contudo, a Impugnante falha aqui um aspecto essencial: a administração põe, fundadamente, em causa a ocorrência do pagamento das facturas identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório. De facto, pese embora a administração tenha solicitado à Impugnante para juntar os documentos de suporte das facturas e recibos a que se referem os pontos 7, 8 e 10 a 19 do probatório, a verdade é que a Impugnante nunca juntou tais comprovativos (cfr. pontos 20 e 21 do probatório). Uma vez que estão em causa facturas de valores avultados o pagamento das mesmas deveria ter sido realizado pela Impugnante por transferência bancária ou cheque, em cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 63.º-C da Lei Geral Tributária. Porém, concluiu-se na inspecção tributária que as contas bancárias da Impugnante não reflectem o pagamento de tais facturas. Não obstante a prova desta matéria de facto ser eminentemente documental, o legal representante da Impugnante e a testemunha J... foram ouvidos quanto à mesma tendo respondido de forma que criou neste Tribunal a convicção de que tais pagamentos não terão ocorrido. Com efeito, a testemunha J..., que era à data técnico oficial de conta da Impugnante, quando confrontado com a inexistência de documentos atinentes ao pagamento das facturas respondeu de forma insegura que “existiriam alguns reflexos” desses pagamentos na contabilidade e que as empresas efectuavam o pagamento por transferência bancária (declarações prestadas aos 25m10s a 25m27s de gravação). Mais respondeu, como bem evidencia a Fazenda Pública em sede alegações, que “…existiriam algumas transferências ou todas, ou parte ou na totalidade, não sei precisar, se calhar o sócio gerente será a pessoa responsável para dizer isso, nunca tive acesso às contas bancárias.” (declarações prestadas aos 25m36s aos 25m52s da gravação). Esta testemunha ficou claramente embaraçada e incomodada com a questão, o que não deixa de ser uma reacção inesperada tendo em conta que exercendo as funções técnico oficial de contas, é a mesma responsável pela regularidade da contabilidade da Impugnante, o que implica, desde logo e além do mais, lançar todos os documentos de suporte dos gastos incorridos e efectuar a reconciliação bancária, operações que sendo devidamente executadas permitiriam dotar a testemunha do conhecimento necessário ao esclarecimento da questão que lhe havia sido colocada (de qualquer modo, mesmo que a testemunha afirmasse a existência de documentos comprovativos de pagamento sempre se revelaria imprescindível a sua junção aos autos). Por sua vez, o legal representante da Impugnante, J..., instado pelo Ilustre Mandatário, afirmou ter pago as facturas à S... – Sociedade Agroflorestal, Lda (declarações prestadas aos 1h04m25s a 1h04m29s da gravação). Porém, quando confrontado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública com a inexistência de comprovativos de pagamento, refere de forma vaga e genérica, sobre os pagamentos “acho que não foi nenhum à S... era mais aos empreiteiros” (declarações prestadas aos 1h21m36s da gravação). Tal afirmação não se afigura verosímil nem sustentada nas facturas e recibos em apreço que foram emitidas não por um empreiteiro, mas pela própria S... – Sociedade Agroflorestal, Lda. Acabou o depoente por afirmar de forma lacónica que têm “carradas” de páginas de transferências bancárias e que, referindo-se aos comprovativos de pagamento, “procurando se calhar há” (declarações prestadas aos 1h22m06s a 1h22m56s da gravação). Sendo assim, este depoimento é incongruente, inconsistente e, desde logo, manifestamente insuficiente para dar como provada a factualidade em questão.

A matéria de facto constante da alínea C) não resultou provada por insuficiência probatória. A testemunha J..., engenheiro florestal de profissão, que prestou serviços à “A... – Associação de Produtores Florestais do Alto Alentejo”, revelou ser o próprio quem recebia os levantamentos feitos no terreno com a descrição dos trabalhos executados pelas empresas contratadas pela sua entidade empregadora (a referida A...), entre as quais a Impugnante. Porém, quanto aos trabalhos em causa nas notas de crédito limitou-se a afirmar, sempre de forma vaga e sem concretizar trabalhos ou os locais onde deveriam ter sido prestados, que após uma fiscalização do IFAP foi detectada a existência de operações facturadas e não executadas. Quanto a este ponto, o técnico oficial de contas da Impugnante revelou que teria sido a A... a pedir a rectificação das facturas, porém esta declaração não é compatível com a ausência de registo das notas de crédito na contabilidade da A.... Como apurou a administração, a conta corrente de fornecedora da Impugnante na contabilidade da A... não evidencia a existência daquelas notas de crédito, o que não deixa de causar surpresa tendo em conta que a testemunha afirmou que era também técnico oficial de contas da A... – cfr. ponto 27 do probatório. Estes depoimentos foram prestados de forma vaga e imprecisa. Ora, estando em causa projectos submetidos ao IFAP, deverá existir, em princípio, um maior rigor no controlo dos trabalhos executados e da documentação atinente aos projectos. Porém, não é junto qualquer documento comprovativo de tal pedido ou das conclusões do IFAP no sentido da existência de trabalhos facturados em excesso.

A matéria de facto não provada constante da alínea D) foi alegada pela Impugnante no artigo 16.º da petição inicial. Em juízo a Impugnante não apresentou qualquer documento para prova de tal factualidade, designadamente facturas, orçamentos ou projectos que permitissem associar os trabalhos executados no ano de 2015 a alguma(s) da(s) factura(s) emitida(s) no ano seguinte. As testemunhas inquiridas nada esclareceram quanto a esta matéria. Aliás, a testemunha J... afirmou que o único documento de suporte ao registo do montante de EUR 1.025.000,00 é o inventário que lhe foi fornecido pela gerência.”


***

III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA e respetivos JC referentes aos períodos de 201403T, 201409T, 201505, 201512, tudo no valor global de €88.413,04.

Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto, no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações da impugnação definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões da impugnação cumpre apreciar:

-Se a decisão recorrida padece de nulidade por falta de fundamentação;

-Se a decisão é nula por omissão de pronúncia;

-Se o Recorrente impugnou a matéria de facto respeitando os requisitos contemplados no artigo 640.º do CPC;

-Se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por errada interpretação dos pressupostos de facto e de direito, no atinente:

o à dedução indevida de IVA relacionada com o fornecedor S...;

o à errada contabilização das notas de crédito no ano de 2015;

o e à correção respeitante à variação de produção.

Vejamos, então.

Comecemos pelas nulidades da sentença.


Iniciando a análise pela arguida nulidade por falta de fundamentação.


A Recorrente defende que relativamente aos pontos C) e D) da matéria dada como não provada, o Tribunal a quo incumpriu com o dever de examinar criticamente a prova testemunhal e documental, omitindo, no seu entendimento, o dever de fundamentação, pelo que a sentença enferma de nulidade nos termos do artigo 125.º n.º 1 do CPPT e 615.º n.º 1 alínea b) do CPC.


Apreciando.


Dispõe o artigo 123.º, nº2, do CPPT que: “O juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões.”


Mais preceitua o artigo 125.º do CPPT, sob a epígrafe de “nulidades da sentença” que:

“ 1 - Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.”

Dir-se-á, neste particular, que esta norma corresponde ao regulamentado no normativo 615.º, nº1, alínea b), do CPC, segundo o qual “é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e direito que justifiquem a decisão”.

De convocar, ainda neste conspecto, o comando constitucional contemplado no artigo 205.º da CRP o qual prevê que: “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.

Com efeito, a nulidade da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando do artigo 607.º, nº 3, do CPC, que impõe ao juiz não só o dever de discriminar os factos que considera provados, como também de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.

Como doutrina Alberto dos Reis (1), “[u]ma decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas; é uma peça sem base.”

Mais importa ter presente que, no atinente à falta de fundamentação de facto, a doutrina tem entendido que o vício em análise apenas se verifica quando ocorre falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito, o mesmo sucedendo com a Jurisprudência dos Tribunais Superiores a qual aduz que “[P]ara que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário (2)”.


No caso em apreço, compulsado o teor da decisão recorrida verifica-se que no item III estão elencados os factos provados deles constando, expressa e individualmente, o meio probatório que permitiu a fixação da aludida factualidade.


No atinente à factualidade não provada, elencada em quatro alíneas, o Tribunal a quo evidencia quais os quatro factos que entende não resultarem provados, justificando tal juízo de entendimento, de forma pormenorizada e bem fundamentada, na motivação da matéria de facto.


Sendo que no concreto particular da factualidade elencada em C) e D), inexiste a apontada falta de fundamentação, quer no atinente à prova testemunhal, a qual aprecia criticamente, quer no concernente à prova documental, explicitando quais as razões que estão na génese da valoração da prova.


Com efeito, e atentando na aludida motivação da matéria de facto, verifica-se que o Tribunal a quo, de forma cuidada, convoca as razões que lhe permitem decidir nesse sentido, convocando a prova testemunhal, particularizando os depoimentos, a forma como foram prestados, e explicitando porque motivo os mesmos não relevaram para efeitos da prova pretendida pela Recorrente. O mesmo sucedendo no atinente à prova documental.


Note-se que, no concreto particular da alínea D), da factualidade não provada, e contrariamente ao expendido pela Recorrente, o Tribunal a quo, fundamentou porque razão se teria de considerar como não provado que “no primeiro trimestre de 2016 a Impugnante facturou serviços executados no ano anterior no montante de EUR 1.025.000,00”, evidenciando que a prova carreada aos autos não era suficiente, e que a Impugnante não apresentou “[q]ualquer documento para prova de tal factualidade, designadamente facturas, orçamentos ou projectos que permitissem associar os trabalhos executados no ano de 2015 a alguma(s) da(s) factura(s) emitida(s) no ano seguinte. As testemunhas inquiridas nada esclareceram quanto a esta matéria. Aliás, a testemunha J... afirmou que o único documento de suporte ao registo do montante de EUR 1.025.000,00 é o inventário que lhe foi fornecido pela gerência.”


Adensando, depois tais razões na fundamentação de direito, concretamente nos itens intitulados de “vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de factos quanto à liquidação de IVA do mês de Maio de 2015” e “vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de factos quanto à liquidação de IVA do mês de Dezembro de 2015”, com concreta densificação do inventário, e da sua insuficiência, na página 41 da decisão recorrida.

Ora, face ao supra aludido não assiste qualquer razão à Recorrente quando aduz que a decisão recorrida padece de nulidade por falta de fundamentação, porquanto, contrariamente ao por si propugnado, a mesma contempla toda a factualidade relevante para dirimir o litígio nos moldes em que foi decidido, explicitando, na motivação da matéria de facto, e ulteriormente, na fundamentação de direito quais os motivos porque entendeu existir insuficiência probatória, nesse e para esse efeito. Note-se que, se a interpretação dos pressupostos de facto ao regime jurídico vigente não traduz a solução perfilhada pelo Tribunal a quo, tal situação em nada traduz nulidade, quando muito erro de julgamento (3).

Conclui-se, assim, que do teor da decisão recorrida é perfeitamente possível alcançar o quadro factual e jurídico subjacente ao sentido decisório contido na mesma decisão, tendo sido definida concretamente a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com evidência da factualidade considerada não provada, convocando e apreciando os meios probatórios produzidos.

Subsequentemente, essa mesma decisão, subsumiu a factualidade assente ao quadro jurídico que entendeu relevante para o efeito, fundamentando juridicamente a decisão em causa, permitindo, aos respetivos destinatários exercer, de forma efetiva e cabal, a sua análise e a sua crítica.

E por assim ser não pode, pois, sustentar-se que a decisão em crise seja nula por falta de fundamentação de facto e de direito, pois que os pressupostos de facto e de direito que conduziram ao sentido decisório acolhido na decisão recorrida se mostram nele evidenciados de forma objetiva, lógica e racional, com a devida apreciação crítica da prova produzida nos autos, quer documental, quer testemunhal.

Improcede, assim, a arguida nulidade por falta de fundamentação.

Atentemos, ora, na arguida nulidade por omissão de pronúncia.

A propósito da omissão de pronúncia dispõe o já citado artigo 125.º, nº1, do CPPT que constitui nulidade a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar.

Preceituando, por seu turno, a primeira parte da alínea d), do nº 1, do artigo 615.º do CPC, que a decisão é nula, quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

Na verdade, a nulidade da decisão por omissão de pronúncia sucede apenas quando a mesma deixe de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal.

Dir-se-á, neste particular e em abono da verdade que, as questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. De notar para o efeito que, as questões não são passíveis de qualquer confusão conceptual com as razões jurídicas invocadas pelas partes em defesa do seu juízo de valoração, porquanto as mesmas correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa preceituada no citado normativo 615.º, nº 1, alínea d), do CPC.

Conforme doutrinado por ALBERTO DOS REIS “[s]ão, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (4).

Vejamos, então.

Defende a Recorrente que o Tribunal a quo, incorreu em nulidade por omissão de pronúncia visto que se limitou a dar como provada a factualidade assente entre os pontos 2 a 19 e como não provada a factualidade constante dos pontos A) e B), não se pronunciando sobre a principal questão que era a de saber se no que se refere à sociedade S... nos encontramos perante um NIF inexistente ou inválido.

Apreciando.

Contrariamente ao invocado pela Recorrente, a decisão recorrida não padece da arguida nulidade por omissão de pronúncia, desde logo, porque o supra aludido não constituía uma questão decidenda- como resulta perentório da leitura do Relatório Inspetivo- mas sim um dos fatores indiciantes da faturação falsa, essa sim questão autónoma.

De todo o modo, atentando, desde logo, no presente excerto da decisão recorrida conclui-se que, contrariamente ao aduzido pela Recorrente, o indício atinente à inexistência da sociedade foi analisado e valorado, mormente em sede de densificação da ilisão do ónus probatório, relevando, expressamente, que foi detetado “no âmbito da acção inspectiva realizada à “S... – Sociedade Agroflorestal, Lda” que esta possuía um número de pessoa colectiva inexistente e ainda que “não foram encontrados quaisquer responsáveis por aquela sociedade, bem como a mesma não possui qualquer estrutura empresarial para prestar os serviços mencionados nas faturas que se encontram na posse de terceiros.” (cfr. capítulo III.1. do relatório de inspecção tributária identificado no ponto 27 do probatório). No âmbito de tal acção inspectiva foram detectadas as facturas emitidas em nome da aqui Impugnante.”

Ora, como é bom de ver, atentando na transcrição supra dimana inequívoco que o indício respeitante à inexistência e registo da sociedade foi, devida e expressamente abordado pelo Tribunal a quo, sendo que se o mesmo foi, correta ou incorretamente, abordado não traduz nulidade por omissão de pronúncia, quando muito erro de julgamento, e que será analisado em sede própria.

Em face de todo o exposto e sem necessidade de outros considerandos dimana evidente que não padece de nulidade por omissão de pronúncia a decisão recorrida, visto que conheceu de todas as questões que devia conhecer, resolvendo-as, ainda que a descontento do Recorrente (5).

Prosseguindo, ora, com o erro de julgamento de facto.

A Recorrente aduz, desde logo, que o Tribunal a quo não fez uma adequada valoração da prova testemunhal e bem assim da prova documental, requerendo aditamentos por complementação e por substituição.

Defende, em concreto, que a realidade fática consignada como não provada deveria constar como provada, convocando, para o efeito, o depoimento das testemunhas inquiridas nos autos, complementando com prova documental que chama à colação.

Mais requerendo que seja aditado como facto assente que “ A S...-Sociedade Agroflorestal, Lda tem NIF válido.”

Para o efeito, importa começar por aferir se a Recorrente cumpriu os requisitos consignados no artigo 640.º do CPC.

Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (6).

Sendo que quanto à prova testemunhal tem de existir uma indicação exata das passagens de gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, porquanto além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova.

In casu, conforme se extrai do teor das alegações recursivas e suas conclusões, no atinente à prova testemunhal, dimana que a Recorrente não cumpriu o ónus a que estava adstrita.

No caso sub judice, e conforme bem evidencia a Recorrida, não foram cumpridas as referidas formalidades legais, pois ainda que convoque o depoimento das testemunhas inquiridas, a verdade é que não indica, com a devida particularização no competente registo áudio, as passagens concretas desses mesmos depoimentos. Com efeito, no atinente às testemunhas e declarações de parte que invoca, alude apenas aos tempos da respetiva gravação, referenciando, tão-só, os momentos de início e terminus da gravação.

É certo que esse ónus consistente na indicação exata das passagens relevantes dos depoimentos gravados, não deve ser feito pelo Tribunal ad quem em termos absolutamente formais, devendo, nessa medida, ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Contudo, tem de existir uma exigência mínima de particularização, ou seja, o Recorrente tem de fazer uma indicação que possibilite ao Tribunal de recurso o acesso, sem dificuldade, ao excerto da prova visado, mormente, com a alusão a trechos da gravação que transcreve.

Não podendo, simplesmente, fazer alusão a um depoimento no seu todo, com nítida dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento.

Como doutrinado no Aresto do Supremo Tribunal de Justiça, prolatado no âmbito do processo nº 77/06.5TBGVA.C2.S2, de 03 de outubro de 2019 cujo sumário se extrata, designadamente, “[t]endo os recorrentes indicado, nas suas alegações de recurso, apenas o início e o termo de cada um dos depoimentos das testemunhas e das declarações de parte, sem acompanhar essa indicação de qualquer transcrição dos excertos das declarações e depoimentos tidos pelos recorrentes como relevantes para o julgamento do objeto do recurso, impõe-se concluir que os recorrentes não cumpriram o núcleo essencial do ónus de indicação das passagens da gravação tidas por relevantes, nos termos prescritos nº art. 640º, nº 2, al. a) do CPC (…)”

Relevando, depois que “[a] indicação dos tempos em que os excertos dos depoimentos das testemunhas tidas por relevantes se encontram gravados no suporte técnico que contém a gravação da prova produzida na audiência de julgamento, revela-se essencial, sob pena de fazer-se recair sobre o tribunal e os recorridos o ónus de procederem à audição de toda a prova gravada.

Isto porque os recorrentes, no caso dos autos, limitaram-se apenas e tão só a indicar, nas suas alegações de recurso, o início e o termo de cada um dos depoimentos das testemunhas e das declarações de parte, alterando o dia e as horas conforme os casos, (cfr. fls. 1481, 1484 a 1494), o que, desacompanhado de qualquer transcrição dos excertos das declarações e depoimentos tidos pelos recorrentes como relevantes para o julgamento do objeto do recurso, torna extramente difícil, quer a respetiva localização por parte do Tribunal da Relação, quer o exercício do contraditório pelos recorridos.

Acresce que, contrariamente ao pretendido pelos recorrentes, está vedado ao relator a possibilidade de proferir despacho de aperfeiçoamento relativamente ao recurso da decisão da matéria de facto, na medida em que, em matéria de recursos, o art. 652.º, nº1, al. a), do CPC, limita essa possibilidade às «conclusões das alegações, nos termos do nº 3 do artigo 639º “.

Pelo que, face a todo o exposto, e acompanhando a aludida jurisprudência, no atinente à prova testemunhal, rejeita-se a impugnação da matéria de facto.

Atentemos, ora, nos aludidos aditamentos por complementação e substituição por reporte ao meio probatório documental.

Vejamos, então.

A Recorrente sustenta, desde logo, que face às faturas e aos recibos carreados aos autos, e bem assim atentos os depoimentos das testemunhas, ter-se-ia de dar como provada a seguinte realidade fática:

a) Que a Impugnante contratou com a S... nas datas constantes dos contratos;

b) A localidade de Santiago do Cacém, apesar de aí não se situar a sede de qualquer dos contratantes, corresponde à residência de um dos seus gerentes;

c) A execução dos trabalhos, os quais foram realizados, estão à vista de quem os queira ver, e obedeceram às normas comunitárias e internas nomeadamente as emitidas pelo IFAP;

d) Tais trabalhos são identificados nas faturas por si emitidas, pelo que não surgiram quaisquer dúvidas sobre a existência e a legalidade da fornecedora perante a A.T., considerando por um lado os elementos constantes do Portal da Justiça e, por outro, quando nas faturas para além da razão social constam a sede, capital social, matrícula na C.R.C. de Lx.3, NIPC, e-mail, carimbo comercial e licenciamento de software concedido pela T...- Faturação Micro V.2012.1.10.51.

e) A Impugnante desconhece o fluxo do dinheiro, a partir do momento que por si foi colocado à disposição da S....”

Relativamente à prova testemunhal face ao supra aludido, não cumpre tecer qualquer comentário adicional, sendo certo que as visadas faturas e recibos não são suficientes para o aditamento supra evidenciado.

Senão vejamos.

Ab initio, importa, desde logo, relevar que a maioria das asserções supra evidenciadas não tem a roupagem de um facto, consubstanciando-se em meras conclusões, juízos opinativos e coadunados com o próprio thema decidendum.

Com efeito, a seleção da matéria de facto só pode integrar acontecimentos ou factos concretos, que não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos, sendo que as asserções que revistam tal natureza devem ser excluídas do acervo factual relevante ou indeferido o seu aditamento.

“[q]uestão de facto é (..) tudo o que se reporta ao apuramento de ocorrências da vida real e de quaisquer mudanças ocorridas no mundo exterior, bem como à averiguação do estado, qualidade ou situação real das pessoas ou das coisas” e que “(..) além dos factos reais e dos factos externos, a doutrina também considera matéria de facto os factos internos, isto é, aqueles que respeitam à vida psíquica e sensorial do indivíduo, e os factos hipotéticos, ou seja, os que se referem a ocorrências virtuais”. (7)

“As afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado.” (8).

Concretizemos, então, porque assim o entendemos.

As alíneas a), d) e e) são meras conclusões relacionadas com a prova a realizar nos presentes autos, ou seja, da efetividade das operações, não podendo, por isso, integrar o acervo fático dos autos. Contemplando, inclusive, a alínea d) diversos juízos de valor e opinativos referentes à realidade em contenda e que, também, por essa razão não podem integrar o probatório.

No concernente à alínea b), ainda que contemple juízos de valor os quais careciam, desde logo, de ser expurgados a verdade é que, da invocada prova documental, concretamente, faturas e recibos não é possível inferir-se que a residência de um dos seus gerentes se situava em Santiago de Cacém.

Quanto à alínea c), no atinente à menção “ a execução dos trabalhos, os quais foram realizados”, como é bom de ver mais não representa que a conclusão sobre o thema decidendum, no fundo, a interpretação que a Recorrente pretende que o Tribunal ad quem retire, razão pela qual não pode integrar qualquer factualidade. No concernente à segunda parte da oração, consubstanciada no facto de os trabalhos serem realizados à vista de todos e em cumprimento de todas as normas legais, em nada releva para a apreciação do dissídio em questão, porquanto, não permitem, per se, retirar a efetividade das operações.

E por assim ser improcede, o aludido aditamento.

Prosseguindo.

A Recorrente requer, outrossim, que o Tribunal ad quem adite o seguinte facto:

“ A S...-Sociedade Agroflorestal, Lda tem NIF válido”.

Porém, não evidencia qual o meio probatório atinente a tal assunção, sendo certo que o mesmo teria de revestir, necessariamente, caráter documental. Aliás, perscrutando o teor integral das alegações constata-se que a Recorrente solicita tal aditamento na sequência da arguida omissão de pronúncia, e como se o mesmo fosse uma consequência direta de tal alegação.

Face ao exposto, rejeita-se, igualmente, o aludido aditamento.

Continuemos.

A Recorrente requer que o Tribunal ad quem dê como provados os factos não provados elencados em A) e B) do probatório, convocando o depoimento das testemunhas e bem assim as faturas e os recibos.

Vejamos.

Relativamente ao depoimento das testemunhas, e face a todo o expendido anteriormente eximimo-nos de expender quaisquer outras considerações, reiterando a insusceptibilidade de análise da impugnação da matéria de facto com base nesse meio probatório.

Vejamos, ora, a questão atinente à prova documental.

A Recorrente defende, neste particular, que as faturas e recibos emitidos pela empresa S... são suficientes para se dar como provada a realidade fática espelhada em A) e B) da factualidade não provada.

Porém, assim o não entendemos.

Senão vejamos.

As faturas e recibos a que a Recorrente faz alusão não permitem dar como provado que “Os trabalhos a que se reportam as facturas identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório foram realizados.” E bem assim que, A Impugnante entregou à S... – Sociedade Agroflorestal, Lda o preço das facturas identificadas nos pontos 7, 10, 12, 14, 16 e 18 do probatório.”

E isto porque as faturas, per se, não permitem atestar que os serviços nela elencados foram realizados pela empresa emitente dessas faturas, o mesmo sucedendo quanto aos recibos ainda para mais quando se encontram desacompanhados dos respetivos meios de pagamento e quando a mesma não tem qualquer estrutura, sendo não declarante.

Contrariamente ao sustentado pela Recorrente, sendo colocada em causa a efetividade dos serviços descritos nas faturas, os recibos, por si só, não podem ser considerados meios idóneos para atestar o pagamento.

É curial que seja demonstrado qual foi o meio de pagamento, e em conformidade, juntar documentação atinente ao efeito, concretamente, cópia dos comprovativos de transferência bancária ou cheques. Note-se, neste concreto particular, e conforme analisaremos em sede própria, que a Recorrente foi notificada para proceder à junção de tal documentação e a verdade é que nunca procedeu à sua junção, nem em sede administrativa, nem em sede judicial.

Não relevando, para o efeito, a circunstância de não ter sido colocada em causa a genuinidade dos documentos, porquanto só no âmbito dos documentos autênticos, que não é o caso vertente, a força probatória pode ser ilidida com base na sua falsidade (artigo 372.º do CC). Note-se que a lei não consagra uma força probatória especial à quitação exarada no recibo, consignando, desde logo, o artigo 787.º do CC que, no seu exercício do seu direito, aquele que cumpre a obrigação, se nisso tiver interesse legítimo, pode exigir que aquela conste de documento autêntico ou autenticado.

Com efeito, nos termos do n.º2 do artigo 342.º do CC, o cumprimento, porque extintivo das obrigações, tem de ser demonstrado pelo devedor, sendo que uma das formas de cumprimento é o pagamento, competindo assim ao devedor, o ónus de provar tal facto. Não constituindo, per se, um recibo prova da veracidade do seu conteúdo.

Ademais, e conforme veremos em sede de apreciação do erro de julgamento de direito, a Recorrente não só não juntou os documentos que atestam os pagamentos, como as contas bancárias não refletem essas saídas monetárias e pagamentos.

E por assim improcede a aludida impugnação da matéria de facto.

Continuando na análise da impugnação da matéria de facto.

No atinente à alínea C) da factualidade não provada, e que a Recorrente pretende que seja considerada como provada, a mesma convoca o depoimento das testemunhas e bem assim a prova documental junta em “sede de audiência prévia”, mas a verdade é que se no atinente à prova testemunhal já se realizaram todas as considerações competentes, no respeitante à prova documental a Recorrente limita-se a fazer uma remissão absolutamente genérica para a documentação junta em sede de audição prévia, não precisando quais os documentos que relevariam para o efeito e em que moldes os mesmos poderiam ser determinantes para a assunção como factualidade provada que “ A Impugnante facturou à “A...-Associação de Produtos Florestais do Alto Alentejo” trabalhos referentes a podas sanitárias que não foram executadas.”

Ademais, e contrariamente ao que parece ser o entendimento da Recorrente, a questão, conforme analisaremos adiante na fundamentação de direito, não se resume, tout court, a uma incorreta contabilização das notas de crédito, mas sim à realidade que lhe está subjacente, tendo, inclusive, sido colocados em causa os requisitos atinentes às formalidades, concretamente, conhecimento por parte dos adquirentes, e a verdade é que os mesmos não foram, de todo, apartados.

Improcede, assim, o aludido aditamento por substituição.

Atentemos, ora, na alínea D) que a Recorrente pretende que passa a constar como factualidade assente.

Defende, neste particular, que ter-se-ia de considerar como provado que “No primeiro trimestre do ano de 2016, a Impugnante facturou serviços executados no ano anterior no montante de EUR 1.025.000,00”, dimanando tal prova da documentação junta aos autos, e não valorada pelo Tribunal a quo, concretamente, Documento nº 17, 18 e os inventários e asseverada pelas declarações de parte do legal representante da sociedade, e pelo depoimento da testemunha J....

Mas, a verdade é que não só o Tribunal não desvalorizou tal documentação, como a mesma não é de molde a consignar como provada tal realidade de facto, porquanto não permite realizar a devida correspondência e nexo de imputação.

Com efeito, e como sustenta o Tribunal a quo, na sua motivação da matéria de facto, a Recorrente não carreou aos autos qualquer documentação que fosse idónea para demonstrar a realidade que pretende provar, concretamente, não carreou aos autos “[f]acturas, orçamentos ou projetos que permitissem associar os trabalhos executados no ano de 2015 a alguma(s) da(s) factura(s) emitida(s) no ano seguinte.”

Note-se que o documento 16 mais não representa que um mapa resumo realizado sem o respetivo suporte e os documentos 17 e 18 são documentos denominados como “Inventários dos trabalhos efectuados a 31.12.2015” e “Inventários dos trabalhos efectuados a 31.12.2016”, com uma mera enumeração concernente aos “trabalhos referentes aos projectos”, aos quais falha as premissas base de demonstração, não permitindo estabelecer o imprescindível nexo entre os valores neles constantes com as faturas emitidas. Note-se que tal invocação já tinha sido objeto de apelo pela AT no seu Relatório de Inspeção Tributária e a Recorrente não procedeu à junção de prova adicional, ou demonstração do aludido nexo.

Assim, face ao exposto indefere-se o aludido aditamento por substituição.

Face ao exposto, tudo visto e ponderado, a matéria de facto mantém-se nos exatos moldes em que foi fixada pelo Tribunal a quo.

Aqui chegados, estabilizada a matéria de facto, analisemos o erro de julgamento por errada apreciação dos pressupostos de facto e de direito.


***

Comecemos pela prestação de serviços do fornecedor S....

A Recorrente sustenta que a mera invocação de que existem indícios de emissão de faturação falsa por parte da sociedade S..., não basta para afirmar a existência de faturação falsa, se não forem acompanhados de outros elementos que justifiquem esse juízo de descredibilização.

Até porque, sublinha não foi possível identificar os pagamentos, não tendo a AT identificado os recebimentos, sendo que do processo não existe qualquer prova nesse sentido.

Mais relevando que, a AT se limita a dizer que o NIF do prestador de serviços é inválido ou inexistente, não desenvolvendo, nem requerendo qualquer outra diligência adicional, concretizando uma errónea inversão do ónus da prova.

Dissente a AT sublinhando que nenhuma censura pode ser apontada ao juízo de entendimento do Tribunal a quo, porquanto foram recolhidos indícios suficientes de que as operações subjacentes às faturas em apreço, não são reais, estando perante a existência de faturação falsa.

Mais salientando que, nem no âmbito do procedimento de inspeção, nem em sede de exercício do direito de audição, nem em sede judicial, a Recorrente logrou demonstrar o pagamento efetivo das prestações de serviços tituladas pelas faturas emitidas pela sociedade S..., no exercício de 2014, no montante de 1.031.700,00 €, razão pela qual as correções mostram-se legítimas, devendo manter-se o juízo de entendimento do Tribunal a quo.

O Tribunal a quo fundamentou o juízo de improcedência relevando que, por um lado, foram recolhidos indícios suficientes e fundados por parte da AT e que, por outro lado, a Recorrente não logrou demonstrar a efetividade das operações constantes nas faturas emitidas pela sociedade S..., sublinhando, neste concreto particular, não foi feita a prova do pagamento das faturas e a Recorrente nada mais alegou e demonstrou no sentido de afastar os demais elementos obtidos pela administração, em nada relevando observações genéricas concatenadas, designadamente, com a inexistência de obrigação de saber da estrutura do seu fornecedor.

Apreciando.

Vejamos, então, se lhe assiste razão.

Comecemos por aquilatar a natureza e a mecânica do IVA.

O IVA é um imposto plurifásico, que assenta numa estrutura de entrega e respetiva dedução, pelos vários intervenientes na cadeia, até ao consumidor final, que o suporta, sem o poder deduzir.

Na verdade, o IVA funciona pelo método indireto subtrativo, de acordo com o qual o sujeito passivo deduz, ao imposto liquidado nos seus outputs, o imposto liquidado nos respetivos inputs.

O objetivo de neutralidade vertido na Diretiva IVA 2006/112 (Diretiva IVA) determina que:“Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço” (vide 2.º parágrafo, do n.º 2, do artigo 1.º).

O direito à dedução é um princípio fundamental do sistema comum do IVA que não pode, em princípio, ser limitado e que é exercido imediatamente para a totalidade dos impostos que oneraram as operações efetuadas a montante (9).

Com efeito, o regime das deduções visa libertar integralmente o empresário do peso do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem, em princípio, elas próprias sujeitas ao IVA (10).

O direito à dedução do IVA está, porém, sujeito ao cumprimento de requisitos de cariz substantiva e formal (11).

No concernente à definição, âmbito e abrangência do direito à dedução, importa chamar à colação o teor do Aresto do STA, proferido no processo nº 01148/11, com data de 03 de julho de 2013, no qual é feita uma análise bastante aprofundada e minuciosa sobre esta questão, e a cuja fundamentação se adere.

Os mecanismos de dedução do IVA, estão consagrados nos artigos 19.º a 25.º do CIVA.

Nos termos do artigo 19.º, do CIVA, especificamente do seu n.º 1, al. a), decorre que os sujeitos passivos de IVA podem deduzir, ao imposto incidente sobre as suas operações tributáveis, o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos de IVA.

Porém, também de acordo com o artigo 19.º do CIVA, desta feita o seu n.º 3, dimana que:

“Não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente.”.

Por seu turno, o artigo 20.º, n.º 1, al. a), do mesmo código, determina igualmente que só é dedutível o imposto suportado relativo a bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados para a transmissão de bens e prestações de serviços sujeitas a IVA e dele não isentas.”

Chegados aqui e resumindo, da leitura destas normas retira-se que só o imposto que tenha, efetivamente, incidido sobre bens adquiridos para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas, pode ser deduzido o IVA incidente sobre as operações tributáveis.

Sendo certo que, para efetivar o ónus da prova em sede de direito à dedução do IVA, é jurisprudência assente que basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respetiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, passando ulteriormente a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de exercer o direito à dedução do IVA, provando, assim, que as operações se realizaram efetivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.

Para o efeito, atente-se no teor do Aresto proferido pelo STA, em Plenário, no âmbito do processo nº 0591/15, datado de 17 de fevereiro de 2016, cujo sumário se extrata na parte que os autos releva:

“II - Para que a AT, ao abrigo do disposto no nº 3 do art. 19.º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240º do CCivil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende.

III - Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.”.

Vistos os conceitos de direito que relevam para o caso dos autos e densificada a questão do ónus da prova, importa transpor o direito para o caso em apreço, competindo aferir se a AT reuniu, conforme ajuizou o Tribunal a quo, os elementos necessários para legitimar a sua atuação e que permitam concluir pela dedução indevida de IVA.

Ora, atentando na fundamentação supra expendida, não se afigura que o entendimento do Tribunal a quo, mereça qualquer censura, porquanto analisou corretamente o quadro jurídico vigente com a devida transposição para o caso vertente.

Expliquemos porque, assim, o entendemos.

Para o efeito, comecemos por atentar no Relatório de Inspeção Tributária e nos indícios apurados relativamente ao fornecedor S... indiciado como emitente de faturação falsa.

Da ação inspetiva levada a cabo pelos serviços de inspeção da DF de Lisboa, ao exercício de 2014 e à sociedade “S... – SOCIEDADE AGROFLORESTAL, LDA”, apuraram-se os seguintes factos:

· A S... não se registou em sede de IRC e IVA para o exercício de qualquer atividade;

· Conforme certidão permanente, o sujeito passivo tem o seguinte objeto: “Elaboração e estudos e projectos de silvicultura e actividades afins, bem como a gestão e exploração de áreas florestais, arrendamento de terras e aluguer de equipamento para implementação dessa actividade”;

· Conforme certidão permanente, a gerência da S... é exercida unicamente pelo sócio E..., NIF 1..., com domicílio, atual, na R S... – Alto das Vinhas – 2970-141 Sesimbra.

· No âmbito do pedido de colaboração à A... efetuado pela Direção de Finanças de Lisboa, foi dito pelo contabilista certificado que os contratos foram efetuados com o Dr. J...;

· Por consulta às bases de dados da AT verifica-se que a S... não se encontra enquadrada, em sede de IRC e IVA, pelo exercício de qualquer atividade.

· Não cumpriu qualquer obrigação declarativa ou de pagamento;

· Nos anos de 2013 e seguintes nenhuma aquisição de bens e/ ou serviços por parte da S... foi comunicada na aplicação e-fatura;

· Nenhum contribuinte declarou, nos anexos A e B da declaração de rendimentos (Mod. 3 do IRS), ter auferido qualquer rendimento pago pela S... no ano de 2013 e seguintes;

· Consultadas as bases de dados da Segurança Social para o ano de 2013 e seguintes a empresa não registou nos anos em causa qualquer trabalhador;

· Não declarou para efeitos fiscais o início de qualquer atividade;

· Não foi detetada qualquer evidência da existência de estrutura empresarial, nomeadamente recursos humanos e equipamentos, susceptível do exercício dos serviços silvícolas e de consultoria a que a faturação emitida em seu nome alude ou de qualquer outra atividade;

No âmbito da ação inspetiva à Recorrente e face aos esclarecimentos prestados pela própria, foi apurado o seguinte:

· Quanto aos contratos de prestações de serviços apresentados por fatura emitida, com a identificação fiscal dos outorgantes A..., Lda., e S... constatou-se que os relacionados com as faturas n.ºs 1400/000004, 1400/000009 e 1400/00015 se encontram datados, respectivamente, de 15 de agosto de 2013, 01 de outubro de 2013 e 01 de setembro de 2013, ou seja em data anterior à da constituição da S..., datada de 27 de Dezembro de 2013;

· Nenhum dos contratos celebrados entre a A..., Lda., e S... identifica devidamente os responsáveis das empresas intervenientes, constando destes meras rubricas;

· De acordo com os contratos celebrados a S... comprometeu-se a efetuar serviços silvícolas, nos quais se obriga a utilização de utensílios próprios e assume responsabilidade pelo pagamento da segurança social, medicina e segurança no trabalho, não ficando sujeito a horário de trabalho, nem a trabalho subordinado. Referem ainda que os serviços prestados serão calculados com base no número de hectares;

· Os contratos relacionados com as faturas n.ºs 1400/000004, 1400/000009, 1400/000038 e 1400/000039 são totalmente omissos relativamente ao valor acordado para cada diferente serviço a realizar, à enumeração das tarefas a realizar e sua calendarização, o que é de todo estranho, questionando, assim, a utilidade efetiva dos mesmos;

· A fatura nº 1400/000015 tem anexa a descrição dos trabalhos realizados, na qual se refere a débito o total da adjudicação e a crédito os montantes pagos por adiantamento de início de trabalhos e demais pagamentos faseados por tarefas realizadas, da qual se conclui que os trabalhos se iniciaram, com a gradagem de matos, em 01 de outubro de 2013, em data anterior à constituição da S... e terminaram em 03 de fevereiro de 2014, tendo ocorrido a “liquidação de saldo” em 28 de março de 2014, que coincide com a data da fatura;

· A fatura n.º1400/000040 tem também igualmente anexa a descrição dos trabalhos realizados, na qual se refere a débito o total da adjudicação e a crédito os montantes pagos por adiantamento de início de trabalhos e demais pagamentos faseados por tarefas realizadas, da qual se conclui que os trabalhos se iniciaram, com a gradagem de matos (combustível), em 24 de fevereiro de 2014 e terminaram em 01 de setembro de 2014, tendo ocorrido a “liquidação de saldo” em 12 de setembro de 2014, que coincide com a data da fatura;

· As faturas n.ºs 1400/000004 e 1400/00009 datadas, respetivamente, de 29 de janeiro e 26 de fevereiro de 2014, foram contabilizadas em 30 de março do ano a que respeitam, têm a seguinte anotação “chegaram ao escritório dia 7/5/2014 via CTT”;

· Todos os contratos indicam que foram celebrados na localidade de Santiago do Cacém que não corresponde à sede de qualquer dos intervenientes;

· Apesar de ter sido solicitado, não foi confirmada a situação cadastral da S..., informação que a AT disponibiliza, que confirmaria não ter este contribuinte procedido ao seu enquadramento fiscal no ano de 2014 e seguintes, limitando-se a confirmar que segundo o Portal da Justiça, a empresa em causa se constituiu no dia 27 de dezembro de 2013;

· A contabilidade da A..., Lda., não evidencia o pagamento faseado de qualquer fatura emitida pela S..., coincidindo a data de contabilização das faturas com o respetivo recibo;

· Foram feitos pedidos expressos à Recorrente para apresentação de toda a documentação tendente a fazer prova do pagamento das faturas emitidas pela S..., no ano de 2014 tendo o mesmo evidenciado, num primeiro momento, que “solicitamos ao banco os extratos de 2014, os quais ainda não nos foram entregues, logo que nos sejam enviados faremos a marcação dos movimentos tidos”.

· Adicionalmente, foram envidados novos esforços, tendo a Recorrente apresentado cópia dos contratos efetuados a 15 de agosto de 2012, 01 de setembro de 2012, 01 de outubro de 2013 06 de janeiro de 2014 e 03 de fevereiro de 2014 e extrato de conta corrente.

· As contas bancárias não refletem os pagamentos constantes nas faturas emitidas pela sociedade S....

Face aos indícios supra elencados, concluiu a AT que não obstante a contabilização, no ano de 2014, de faturas emitidas em nome da S..., cujos serviços silvícolas totalizam 1.031.730,00 euros, a verdade é que não demonstrou a efetividade das operações constantes nas aludidas faturas, donde não demonstrou que suportou o IVA constante das faturas, encontrando-se, por isso, legitimada a correção no valor de €61.903,80, ao abrigo do artigo 19.º, nº1, 3 e 4 do CIVA.

E a verdade é que, atentando nos aludidos indícios, e validando o juízo de entendimento do Tribunal a quo entende-se que os mesmos são de molde a justificar e desconsiderar a efetividade dos serviços contemplados nas faturas emitidas pela sociedade S....

Vejamos, então, porque assim o entendemos.

Com efeito, transpondo as regras do ónus da prova para o caso dos autos, concluímos que a AT reuniu diversos factos, que fez constar do Relatório de Inspeção Tributária e que, no seu conjunto, permitem sustentar um juízo de forte probabilidade no sentido de que as referidas operações seriam fictícias, o que a levou a desconsiderar o IVA, alegadamente, suportado.

Conforme já devidamente enunciado anteriormente, a AT não precisa de fazer prova da simulação apenas trazer à colação indícios suficientes para colocar em causa a veracidade da escrita.

No caso vertente, como visto, é convocada, desde logo, a inexistência de estrutura empresarial, consubstanciada na circunstância de inexistirem meios humanos e materiais para o exercício da atividade.

É certo que são fatores exógenos que indiciam comportamento relapso do fornecedor e não da própria Recorrente, porém, também é verdade que a entidade fiscalizadora não deve descurar essa informação só pelo simples facto de se tratar de conduta de terceiro. Tal constatação pode e deve representar um ponto de partida para uma ação de inspeção, mas não exime a AT de demonstrar os elementos, os factos que permitem concluir pela existência de indícios seguros de faturação falsa e legitimar as correções por operações simuladas.

Noutra formulação, a qualidade dos emitentes só quando é desacompanhada de outros elementos fáticos que revelem falsificação das faturas é que é manifestamente insuficiente para ilidir a presunção de veracidade de que goza a contabilidade do comprador, o que não é o caso dos autos.

Ter-se-á, portanto, de valorar enquanto circunstância indiciante a alegada inexistência de estrutura empresarial da fornecedora.

Adicionalmente, não se pode descurar a circunstância evidenciada no Relatório de Inspeção Tributária de que não obstante a apresentação de contratos, a verdade é muitos deles são inclusive anteriores à própria constituição da sociedade visada, sem a cabal identificação dos responsáveis das empresas intervenientes e com desconformidade da respetiva sede societária de quaisquer dos intervenientes.

Acresce que, quer no âmbito da ação inspetiva quer no decurso do processo judicial, não foram apresentados quaisquer comprovativos de pagamentos das faturas.

Note-se que, a AT diligenciou, expressamente, para o efeito requerendo os respetivos documentos comprovativos, mormente, cópia dos cheques, das transferências bancárias e nenhuma dessa prova foi carreada aos autos, quer em sede administrativa, quer em sede judicial, limitando-se a juntar o extrato de conta corrente do aludido fornecedor.

A corroborar, o supra exposto, o Recorrente não só não juntou os documentos que atestam os pagamentos, como as contas bancárias não refletem essas saídas monetárias e pagamentos.

Aqui chegados, não precisando a AT de fazer prova da falsidade/simulação das faturas, mas apenas evidenciar a consistência do seu juízo, afigura-se que, in casu, invocou factos que traduzem uma probabilidade séria de as operações constantes nas faturas serem simuladas, ilidindo, assim, o ónus probatório que sobre si impendia.

De relevar, in casu, que a AT pautou toda a sua atuação pelo inquisitório, com pedidos de esclarecimentos e diligências evidenciadas no Relatório de Inspeção Tributária, com total colaboração, assegurando o contraditório e visando, inequivocamente, a descoberta da verdade material, não se vislumbrando, de todo, qualquer deficit instrutório.

Destarte, tendo a AT cumprido o ónus probatório que recaía na sua esfera jurídica, competia à Recorrente ter apresentado prova capaz de destruir esses indícios, demonstrando que os serviços elencados nas faturas em causa são reais, isto é, que as faturas emitidas pela sociedade S... têm subjacentes operações com materialidade, o que, in casu, não logrou fazê-lo, como resulta expresso da factualidade não provada.

Note-se que no atinente aos pagamentos e conforme bem evidenciou o Tribunal a quo essa prova não resulta dos autos, sendo esse fator exponencial para efeitos de ilisão da materialidade das operações. Com efeito, a apresentação dos meios de pagamento reveste grau de importância elevada em termos de prova da efetividade das operações (12). Ademais, importa ter presente que mesmo nas situações em que partes visadas e interessadas procedem à junção de cheques -o que não sucede tão-pouco nos presentes autos-tal “[n]ão permite inferir, desde logo e sem mais, pela materialidade ou não materialidade das operações, sendo premente aferir-se do seu circuito comercial e cotejá-lo com a demais prova carreada para os autos. (13)”

De reiterar o já aduzido aquando da impugnação da matéria de facto no atinente aos recibos e à prova dele emanada, e para o qual, ora, remetemos por forma a evitarmos um juízo repetitivo, no sentido de que os mesmos desacompanhados de qualquer outro elemento não permitem fazer prova dos pagamentos.

Até porque, não são realidades confundíveis, a quitação ou recibo -documento particular onde o credor declara que recebeu a prestação- e o título original do crédito -o documento necessário para exercer o direito literal e autónomo nele mencionado- e que pode consistir, por exemplo, numa letra, numa livrança ou num cheque. Destarte, um recibo, por si só, não constitui prova da veracidade do seu conteúdo, sendo certo que, in casu, não se pode descurar que os recibos foram emitidos na mesma data das faturas.

Mais importa sublinhar que em nada logra provimento, face a todo o expendido anteriormente, a alegação de que a AT não envidou todos os esforços para atestar do pagamento, porquanto, como visto, diligenciou na obtenção de esclarecimentos e documentação junto da Recorrente, e esta não efetivou a sua demonstração de forma cabal, fidedigna e segura, não podendo eximir-se ao seu ónus com a mera alegação de, eventuais, desconhecimentos de reconciliações bancárias.

Aliás, o Relatório de Inspeção Tributária é perentório no sentido de que as contas bancárias não refletem esse pagamento, ou seja, de que inexistem os competentes fluxos financeiros, não tendo, por seu turno e conforme legalmente lhe competia, a Recorrente logrado demonstrar a efetivação de pagamento.

Acresce que a premissa alvitrada pela Recorrente no sentido de que “A Impugnante desconhece o fluxo do dinheiro, a partir do momento que por si foi colocado à disposição da S...”, carece da competente aderência à realidade em contenda, e isto porque, contrariamente ao que faz crer a Recorrente não foi demonstrada a premissa base, ou seja, de que o dinheiro foi colocado à disposição da empresa visada.

Aliás, a Recorrente no atinente à sociedade C..., Lda, também indiciada de faturação falsa, no exercício de audição prévia procedeu à junção dos competentes documentos comprovativos de pagamento, no caso, transferências bancárias, pelo que poderia/deveria ter adotado semelhante procedimento, pelo que não tendo feito, sibi imput.

De relevar, in fine, e no sentido propugnado pela Recorrida que, encontramo-nos, in casu, perante um volume de faturação de €1.031.730,00, cujo impacto económico na sociedade não pode deixar de estar devidamente documentado.

Assim, face ao supra expendido, nenhuma censura pode ser apontada ao Tribunal a quo, no sentido de decretar a manutenção das correções, porquanto, e conforme dimana inequívoco da factualidade não provada, não resulta provada a materialidade das operações e o seu pagamento.

Improcede, assim, o recurso no atinente à correção no valor de €61.903,80.

Vejamos, ora, a correção referente às notas de crédito contabilizadas no exercício de 2015.

A Recorrente defende que o Tribunal a quo, incorreu em erro de julgamento, ao julgar improcedente o alegado vício de violação de lei por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, relevando, desde logo, que as notas de crédito foram emitidas após fiscalização do IFAP e DRAPAL dos projetos em curso.

Materializando, para o efeito, que após verificar que alguns dos trabalhos faturados não estavam realizados, indicou que os mesmos não seriam pagos, razão pela qual Recorrente procedeu à emissão das respetivas notas de crédito, sendo que o facto de não estar contabilisticamente lançado o pagamento e o recebimento, não pode justificar a sua não aceitação.

A Recorrida propugna pela manutenção da correção e juízo de improcedência do Tribunal a quo, porquanto não resultou provada a devolução ao cliente dos montantes já recebidos, e bem assim que o cliente tomou conhecimento das mesmas.

O Tribunal a quo fundou o seu juízo de entendimento com base no seguinte:
“[r]equisito indispensável à regularização do IVA pelo sujeito passivo é a prova de que o adquirente tomou conhecimento da rectificação da factura ou de que este foi reembolsado do imposto pagou em excesso. Sem esta prova, é de considerar indevida a respectiva dedução do IVA.
Esta exigência formal permite administração verificar os pressupostos de que depende o exercício do direito à dedução do IVA e, desse modo, efectuar o controlo da evasão e fraude fiscal que possam surgir neste contexto.
(…) a administração concluiu que a emissão das notas de crédito não estava devidamente justificada, não existia prova de que a “A... – Associação de Produtores Florestais do Alto Alentejo” tivesse tomado conhecimento das mesmas nem tão pouco prova da devolução dos montantes. Em consequência, concluiu a administração que não foi respeitado o n.º 5 do artigo 78.º do CIVA e decidiu desconsiderar as notas de crédito em apreço.
Por aplicação do regime jurídico exposto ao caso concreto, conclui-se que a Impugnante apenas poderia regularizar o IVA se tivesse na sua posse prova de que a “A... – Associação de Produtores Florestais do Alto Alentejo” tomou conhecimento da retificação das facturas (neste caso, das notas de crédito) ou de que reembolsou o imposto no valor total de EUR 16.440,38.
Compulsada a petição inicial verifica-se que a Impugnante nada alega no sentido de demonstrar tal requisito. A alegação da Impugnante foca-se no alegado motivo
justificativo das notas de crédito, que se prenderia com a existência de trabalhos de poda sanitária que teriam sido facturados mas que não teriam sido efectivamente prestados.
Ora, também este facto não resultou provado nos autos, como resulta da alínea C) da matéria de facto não provada.
Conclui-se, assim, que as notas de crédito emitidas pela Impugnante com o fim de
rectificar facturas emitidas em nome do cliente “A... – Associação de Produtores Florestais do Alto Alentejo” não foram levadas ao conhecimento do cliente nem existe qualquer evidência de que tivesse sido reembolsado o imposto (elemento apurado no âmbito da acção inspectiva e que não foi contraditado em juízo). Em consequência, não está preenchido o pressuposto formal de que depende a regularização do IVA (cfr. n.º 5 do artigo 78.º do CIVA), pelo que a sua dedução pelo sujeito passivo é indevida.
Face ao exposto, e sem necessidade de mais considerações, improcede, também,
nesta parte o vício alegado pela Impugnante, o que determina a manutenção da liquidação do mês de Maio de 2015 na ordem jurídica.”

Ora, face ao supra expendido e atento o recorte fático dos autos, nenhuma censura merece o entendimento do Tribunal a quo.

Senão vejamos.

Atentando no Relatório de Inspeção Tributária verifica-se que a AT constatou que a Recorrente no exercício de 2015, havia contabilizado notas de crédito, referentes a faturas emitidas em 2014 ao cliente “A..., Lda”, no valor total de €290.446,46, tendo regularizado imposto a seu favor, no montante de 16.440,38€, que inscreveu no campo 40 da declaração periódica de IVA do mês de maio de 2015.

Sendo que a fundamentação que alicerçou a correção sub judice, foi a seguinte:

ü Não se encontra devidamente justificada a emissão destas notas de crédito. Embora em observações esteja mencionada qual a fatura que a nota de crédito retifica, tal não é suficiente para justificar a sua emissão.

ü Estas notas de crédito dizem respeito a faturas de 2014, refletidas nos rendimentos de 2014 e que nesse exercício deram origem a liquidação de IVA nos termos do artigo 1.º, n.º1, al. a) e artigo 4.º do código do IVA. Ou seja, existiu, nesse exercício, uma prestação de serviços reconhecida pelo sujeito passivo.

ü As faturas emitidas em 2014, e agora anuladas, foram recebidas pelo sujeito passivo, conforme refletem os extratos de conta corrente do cliente e também os extratos bancários, onde estão refletidos os recebimentos inerentes a estes serviços prestados;

ü Embora o extrato de conta corrente de 2015 do cliente A... reflita a devolução dos montantes faturados, por contrapartida de um crédito na conta 121-Bancos de 491.076,29 €, não se identifica este movimento no extrato bancário. Ou seja, não existem provas efetivas da devolução ao cliente dos montantes já recebidos;

ü Não consta das notas de crédito, ou dos documentos juntos às mesmas, qualquer comprovativo de que o cliente tenha tomado conhecimento das mesmas;

ü Foi solicitado ao cliente “A... Assoc.Prod. Florestais do Alto Alentejo” o extrato de conta corrente do seu fornecedor “A...”, no exercício de 2015, sendo que nesse extrato não estavam registadas as notas de crédito aqui referidas, nem existiam saldos a débito ou a crédito.

Concluindo, assim, que a regularização de IVA efetuada não cumpre o disposto no artigo 78.º, n.º 2 e 5 do CIVA.

Vejamos, então.

Neste particular importa convocar o artigo 78.º do CIVA, sob a epígrafe “regularizações” o qual dispõe o seguinte:

“1 - As disposições dos artigos 36.º e seguintes devem ser observadas sempre que, emitida a fatura, o valor tributável de uma operação ou o respetivo imposto venham a sofrer retificação por qualquer motivo.

2 - Se, depois de efetuado o registo referido no artigo 45.º, for anulada a operação ou reduzido o seu valor tributável em consequência de invalidade, resolução, rescisão ou redução do contrato, pela devolução de mercadorias ou pela concessão de abatimentos ou descontos, o fornecedor do bem ou prestador do serviço pode efetuar a dedução do correspondente imposto até ao final do período de imposto seguinte àquele em que se verificarem as circunstâncias que determinaram a anulação da liquidação ou a redução do seu valor tributável.

3 - Nos casos de faturas inexatas que já tenham dado lugar ao registo referido no artigo 45.º, a retificação é obrigatória quando houver imposto liquidado a menos, podendo ser efetuada sem qualquer penalidade até ao final do período seguinte àquele a que respeita a fatura a retificar, e é facultativa, quando houver imposto liquidado a mais, mas apenas pode ser efetuada no prazo de dois anos.

4 - O adquirente do bem ou destinatário do serviço que seja um sujeito passivo do imposto, se tiver efetuado já o registo de uma operação relativamente à qual o seu fornecedor ou prestador de serviço procedeu a anulação, redução do seu valor tributável ou retificação para menos do valor faturado, corrige, até ao fim do período de imposto seguinte ao da receção do documento retificativo, a dedução efetuada.

5 - Quando o valor tributável de uma operação ou o respetivo imposto sofrerem retificação para menos, a regularização a favor do sujeito passivo só pode ser efetuada quando este tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que se considera indevida a respetiva dedução.”

Como doutrinado no Acórdão deste Tribunal, prolatado no processo nº 177/18.9BECTB, datado de 23 de abril de 2020:

“A anulação de facturas por iniciativa do respectivo emitente ocorre quando por algum motivo ele, fornecedor de bens ou prestador de serviços, considera que a factura não foi correctamente emitida.

Caso a anulação ocorra antes da contabilização e declaração da operação tributável, a mesma reveste-se de um procedimento meramente administrativo ou interno; caso ocorra após a contabilização e declaração da operação, a regularização do IVA a favor do emitente passa pela emissão de uma nota de crédito devendo o emitente munir-se de prova de que o adquirente tomou conhecimento da anulação da factura na sua totalidade ou por redução da base tributável (art.º 78.º n.º 5, do CIVA), que poderá consistir (mas não só) na devolução da nota de crédito devidamente assinada e carimbada pelo adquirente.”

Ora, in casu, no sentido propugnado pelo Tribunal a quo, não tendo sido carreados aos autos documentos que permitissem atestar as realidades em contenda, concretamente, prova, efetiva, da devolução ao cliente dos montantes já recebidos e bem assim que o cliente tenha tomado conhecimento das mesmas, a ausência de tal prova, compromete, per se, a possibilidade de regularização declarativa do imposto correspondente à anulação das faturas na sua totalidade ou por redução da base tributável.

Note-se que como já foi declarado, designadamente, no Acórdão do TJUE C-672/17, Tratave, de 6 de dezembro de 2018: “O princípio da neutralidade e os artigos 90.° e 273.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, que prevê que a redução do valor tributável do imposto sobre o valor acrescentado (IVA), em caso de não pagamento, não pode ser efetuada pelo sujeito passivo enquanto este não tiver previamente comunicado a sua intenção de anular uma parte ou a totalidade do IVA ao adquirente do bem ou serviço, que seja sujeito passivo do imposto, para efeitos de retificação da dedução do montante de IVA que este pôde efetuar.”

De relevar, in fine, que não logra provimento a argumentação da Recorrente no sentido de que nos encontramos perante obras que estão sujeitas à fiscalização de organismos públicos, como a DRAPAL e IFAP, porquanto tal circunstância não desonera a Recorrente da prova e dos formalismos inerentes à regularização do IVA e melhor evidenciados anteriormente.

Ademais, e conforme evidenciado pelo Tribunal a quo, atentando nas alegações constantes na p.i., mormente, nos artigos 10.º a 12.º, verifica-se que a mesma centra a sua argumentação na justificação para a emissão e contabilização das notas de crédito, nada relevando quanto aos pressupostos sindicados pela AT, e concatenados com o citado artigo 78.º do CIVA.

E por assim ser nenhuma censura merece o entendimento do Tribunal a quo, o qual se valida inteiramente.

Subsiste, então, por analisar a correção concernente à variação de produção.

A Recorrente defende que o Tribunal a quo apreciou indevidamente a aludida questão, sendo que a prova documental carreada aos autos, concretamente os documentos 17 e 18, permitem alicerçar juízo contrário.

A Recorrida, por seu turno, propugna que contrariamente ao defendido pela Recorrente os inventários apresentados não permitem validar, que relativamente aos serviços, em concreto, foram emitidas as faturas correspondentes e liquidado o respetivo IVA. Razão pela qual, não é, igualmente, possível validar que a Recorrente contabilizou como variação da produção negativa.

O Tribunal a quo, fundamentou a manutenção da correção e a sua legalidade com base no seguinte:
“A Impugnante não põe em causa este erro detectado pela administração e na petição inicial é a mesma quem alega que aquele montante registado na conta 733 se reporta a serviços já executados e não facturados.
Independentemente daquele erro na movimentação das contas, o facto é que a contabilidade tem de evidenciar documentos de suporte ao reconhecimento do montante de EUR 1.025.000,00 de trabalhos executados e não facturados. Em sede de audiência prévia a Impugnante juntou um documento, alegadamente, de suporte àquele registo contabilístico, intitulado “Inventário dos trabalhos efectuados a 31-1-2015”. Em face de tal documento a administração concluiu que a informação constante do mesmo “não permite relacionar inequivocamente estes montantes com as faturas emitidas em 2016, nem o sujeito passivo vem identificar as mesmas.” (cfr. ponto III.2 do capítulo IX Direito de audição do relatório de inspecção tributária constante do ponto 27 do probatório).
E, de facto, assim é. O documento junto pela Impugnante em sede de audiência prévia (integralmente reproduzido no relatório de inspecção tributária), é composto por um quadro com os trabalhos executados, por cada tipo de serviço, e por uma lista com a identificação dos projectos a que alegadamente aqueles trabalhos se reportariam. Contudo, da análise do documento não é possível associar os trabalhos executados a cada um dos projectos nem, consequentemente, às facturas emitidas.
Deste modo, foi fundadamente posta em causa a contabilidade da Impugnante, pelo que a presunção de veracidade de que a mesma goza cessa nos termos do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT. Em consequência, é sobre a Impugnante que recai o ónus da prova de que aquele montante EUR 1.025.000,00 respeita a trabalhos executados no ano de 2015 que foram facturados em 2016.
Note-se que a administração não põe em causa que aquele valor respeite a trabalhos já executados, ou seja, não é controvertido que a Impugnante, no ano de 2015, tenha realizados trabalhos naquele indicado montante. A administração aceita que tais trabalhos foram executados, no entanto como a Impugnante não demonstrou a posterior facturação dos mesmos ficou por comprovar a correspondente liquidação de IVA, imposto que se concluiu estar em falta.
Compulsada a petição inicial, verifica-se que a Impugnante se limita a alegar que aquele montante de EUR 1.025.000,00 se reporta a serviços que estavam em curso a 31 de Dezembro e que seriam facturados no primeiro trimestre do ano seguinte (2016).
Porém, não junta qualquer documento (facturas ou outros documentos que permitam associar os serviços executados a um cliente) para prova do alegado e da instrução dos autos não resultou provado que tais trabalhos tivessem sido facturados (alínea D) da matéria de facto não provada).
Assim, como bem conclui a administração tributária, embora tenha sido reconhecido o rendimento associado aos trabalhos já executados, não foi pela Impugnante cumprida a correspondente obrigação de liquidação de IVA. Esta obrigação nasce, no caso das prestações de serviços, no momento da sua realização (cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º do CIVA). Impunha-se, então, liquidar o IVA referente aos trabalhos executados e não facturados pela Impugnante, no montante de EUR 1.025.000,00, o que foi feito pela administração tributária à taxa legal de 6%.”

A fundamentação que subjaz à correção em causa e constante no Relatório de Inspeção Tributária assentou no seguinte:

Conforme dimana do ponto 27 do probatório, a AT, a Recorrente no exercício de 2015, realizou os seguintes movimentos contabilísticos:

Creditou a conta SNC 733 “variações nos inventários da produção – produtos e trabalhos em curso”, por contrapartida da conta 3611 “produtos e trabalhos em curso”, no montante de EUR 1.025.000,00.

Por seu turno, no exercício de 2016, debitou a conta SNC 733 “variações nos inventários da produção – produtos e trabalhos em curso”, por contrapartida da conta 3611 “produtos e trabalhos em curso”, no montante de EUR 373.000,00.

Relevando, a AT, que para além da incorreção dos movimentos contabilísticos, a realidade fática supra aludida não se encontrava devidamente suportada, aduzindo, neste concreto particular, que “na sua substância, este movimento contabilístico destinou-se a refletir nos resultados do exercício os rendimentos correspondentes aos gastos já incorridos com prestações de serviços, mas para as quais ainda não tinha sido emitida fatura. (…) tal reconhecimento não deveria ter sido feito na conta 73 destinada as variações nos inventários da produção dos produtos e trabalhos em curso (os produtos e trabalhos em curso são os inventários que se encontram em processo de fabrico ou produção), mas sim numa conta 72 - Prestação de Serviços (por contrapartida da conta 2721 - Devedores por acréscimos de rendimentos), refletindo- -se desta forma a percentagem de acabamento.

Mais evidenciando que, “embora o reconhecimento contabilístico efetuado pelo sujado passivo não se encontre correto de acordo com as regras de normalização contabilística, devendo ser objeto de sancionamento contra-ordenacional nos termos do artigo 121.º do RGlTA, em sede de IRC admite-se que o rédito tenha sido reconhecido.” Sublinhando, no entanto, que “De qualquer forma tendo o sujeito passivo de possuir um documento de suporte para o que designou de 'produtos e trabalhos em curso' de forma a ser possível controlar a que trabalhos diziam respeito e a sua posterior faturação.”

Concluindo, neste âmbito, que “[r]elativamente ao valor do 1.025,000,00 €, contabilizado como variação da produção em 2015, como já foi referido o mesmo corresponderá a prestações de serviços cujos gastos foram incorridos neste exercido de 2015. Através deste lançamento contabilístico veio o sujeito passivo reconhecer o rendimento destas prestações de serviços.

No entanto, as prestações do serviços estão sujeitas a IVA nos termos do artigo 1.º, n.º 1, al. a) do código do IVA. O sujeito passivo não apresentou elementos que pudessem comprovar se foram emitidas as faturas correspondentes a estes serviços e que foi liquidado o IVA correspondente

Assim, encontra-se em falta a liquidação de IVA respeitante a estes serviços, por aplicação da taxa reduzida (por os serviços prestados pelo sujeito passivo se enquadrarem na verba 4 da lista I anexa ao código do IVA) no montante de 61.500,00€, imputável ao último período de tributação de 2015: 1.025.000,00€ x 6% = 61.500,00€ (…)”.

Ora, face ao supra expendido e tendo presente o recorte probatório dos autos, e independentemente de existir a aludida incorreção contabilística- a qual, de resto, não é controvertida, porquanto este movimento contabilístico destinou-se a refletir nos resultados do exercício os rendimentos correspondentes aos gastos já incorridos com prestações de serviços, mas para as quais ainda não tinha sido emitida fatura- a verdade é que o cerne da questão está concatenado com a falta de prova da correspondente liquidação de IVA, porquanto a prova carreada aos autos, concretamente, os alegados inventários não permitem atestar que no primeiro trimestre do ano de 2016, a Recorrente faturou serviços executados no ano anterior no montante de €1.025.000,00, conforme resulta expresso da factualidade não assente.

Com efeito, e conforme já tivemos oportunidade de expender em sede de motivação da matéria de facto, os Inventários dos trabalhos a 31.12.2015 e a 31.12.2016, permitem apenas identificar os trabalhos realizados nesses anos, com alusão genérica ao projeto inerente, porém nada mais que isso permitem extrapolar, falhando a prova do nexo entre os valores neles constantes, com as faturas emitidas.

Prova essa que competia à Recorrente realizar, e cuja falha/insuficiência já tinha sido apontada em sede de conclusão do Relatório Inspetivo, pelo que poderia/deveria em sede de impugnação colmatar as insuficiências probatórias, fazendo a devida alocação e demonstração da liquidação do IVA.

E nada disso foi feito, note-se que a Recorrente na sua p.i. limita-se a conclusivamente nos artigos 15.º a 17.º da p.i. a evidenciar que “[l]abora de uma forma contínua tendo trabalhos parcialmente executados no fim do ano mas ainda não faturados, o que ocorrerá no 1º trimestre do ano seguinte após a conclusão do mesmos”.

Para depois, por reporte aos documentos 17 e 18, concluir que “ A Impugnante em 31-12-2015 tinha obras a decorrer nos projetos identificados no Doc.º junto com o nº 17 no montante de €1 025 000,02 e em 31-12-2016 obras a decorrer nos projetos identificados no valor de €652 000,00, pelo que deverão ser aceites os valores contabilísticos de acordo com os inventários apresentados”.

Ora, seria imperioso que a Recorrente apresentasse os documentos de suporte para o que designou de “produtos e trabalhos em curso” por forma a controlar-se e atestar-se a que trabalhos diziam respeito, e sua ulterior faturação, sendo, como visto, os inventários insuficientes para esse efeito, porquanto não permitem relacionar com as faturas emitidas, não sendo possível, per se, discernir em que obra tais serviços foram realizados.

Assim, face a todo o expendido anteriormente e à insuficiência probatória não suprida, quer em fase administrativa, quer em fase judicial, nenhuma ilegalidade pode ser apontada à correção gizada, donde, nenhuma censura merece a decisão recorrida, razão pela qual, improcede, igualmente, o recurso, neste particular.

Tudo visto e ponderado, improcede na globalidade o recurso apresentado, mantendo-se a decisão recorrida na íntegra.


***

IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

Custas pela Recorrente

Registe. Notifique.


Lisboa, 16 de setembro de 2021


[A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Cristina Flora e Tânia Meireles da Cunha]

Patrícia Manuel Pires


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(1) Código de Processo Civil, Vol. V, p. 139.
(2) Vide, designadamente, Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo nº 09420/16, de 29.06.2016.
(3) A propósito da especificação dos fundamentos de facto e de direito na decisão, diz-nos Alberto dos Reis que é preciso distinguir-se entre a “falta absoluta de motivação, da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.”, In Ob. citada, Vol. V, pág. 140.
(4) Ob, cit., Volume V, pág. 143.
(5) Vide Acórdão do STA, proferido no processo nº 01109/12, de 07 de novembro de 2012 e bem assim Aresto do mesmo Tribunal proferido no processo nº 829/12.7 BELRA.
(6) António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, CPC anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013.
(7) HENRIQUE ARAÚJO: “A matéria de facto no processo civil”, publicado no site do Tribunal da Relação do Porto, acessível em www.trp.pt
(8) AC. do Tribunal da Relação do Porto, de 11 de julho de 2018, proferido no processo nº 1193/16.1T8PRT.P1
(9) Vide neste sentido, designadamente, Acórdãos TJUE Mahagében e Dávid, C 80/11 e C 142/11; Bonik, C 285/11; e Petroma Transports C 271/12, e demais jurisprudência aí citada, todos disponíveis em http://curia.europa.eu
(10) Para o efeito, atente-se, designadamente, nos Acórdãos Dankowski, C 438/09; Tóth, C 324/11; Petroma, C-271/12, Senatex, C 518/14, Paper Consult, C 101/16, e jurisprudência aí referida disponíveis em http://curia.europa.eu.
(11) Vide, designadamente, o já citado Aresto Paper Consult, C 101/16.
(12) Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº1095/12, de 31.10.2019 e 08666/15, de 25.05.2017.
(13) Vide citados de 31.10.2019 e 25.05.2017.