Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:325/12.2BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:02/11/2021
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:IRC
OMISSÃO PROVEITO
DISPENSA REMANESCENTE TAXA JUSTIÇA
Sumário:I. De acordo com o estatuído no artigo 20.º do CIRC, consideram-se proveitos ou ganhos os derivados de operações de qualquer natureza, em consequência de uma acção norma ou ocasional, básica ou meramente acessória.
II. O que conta é o momento em que se obtém o rendimento ou a utilização do rendimento, por só aí é que existe capacidade contributiva, não podendo exigir-se um imposto a quem não tem capacidade contributiva por não dispor do rendimento
III. Actuando a AT no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe fazer prova de todos os pressupostos do seu agir (artigo 74.º, n.º 1, da LGT), coligindo os elementos de prova da liquidação que não se baseia em declaração do contribuinte, designadamente, do recebimento do preço da cedência do direito de opção de compra.
IV. Ponderando que a questão apreciada não apresenta elevada complexidade, tendo inclusivamente versado sobre matéria já amplamente tratada pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, a simplicidade formal da tramitação dos autos, o comportamento processual das partes, o valor da causa, e não perdendo de vista que deve existir correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 2.º da CRP, considera-se adequado dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que corresponderia ao excesso sobre o valor tributário de € 275.000,00.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

1. A Fazenda Pública veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A... SGPS, SA contra a liquidação adicional de IRC, concernente ao exercício de 2006.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«I - A questão controvertida prende-se com o facto do Tribunal “a quo" ter decidido pela procedência, relativamente à liquidação adicional n.° 2011 8..., no valor de € 657.767,07, acrescido de juros compensatórios no valor de € 106.540,24; liquidação adicional essa, integrada na demonstração de acerto de contas n.º 2011 6... do IRC do exercício de 2006, impugnada nos autos, e com a qual não concordamos.

II - A predita liquidação adicional de IRC teve na sua génese, a ordem de serviço n.° 01201010911, a qual, por sua vez, foi aberta na sequência de uma acção inspectiva à Sociedade Imobiliária O..., SA, sendo que, no âmbito desta a Inspecção Tributária acedeu a uma cópia do contrato de cedência, celebrado no ano de 2006, entre a A..., SGPS, SA, na qualidade de Cedente (doravante designada por Recorrida) e L... - Exploração Turística e Hoteleira, SA, na qualidade de Cessionária, pelo preço de € 3.800.000,00.

III - No âmbito da acção inspectiva levada a cabo à Recorrida, a Inspecção Tributária constatou que esta não registou o proveito de € 3.800.000,00, nos termos do art.° 20° do CIRC.

IV - Porém, o presente recurso incide apenas na parte respeitante ao alegado erro sobre os pressupostos, por inexistência de capacidade contributiva na percepção de rendimentos sujeitos a tributação.

V - A sociedade, ora Recorrida, à data da prática dos factos, era detentora da totalidade do capital social da Sociedade Imobiliária O..., SA, sendo que esta última registou a seu favor a aquisição de prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5..., em 22/08/1969.

VI - Em 09/06/1981, procedeu-se ao registo da constituição da propriedade horizontal do prédio nas fracções A, B e C, sendo esta última destinada a hotel.

VII - Em Fevereiro do ano de 2003, a fracção autónoma C foi adquirida e registada pelo Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., gerido pelo B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, SA.

VIII - Na mesma altura, foi celebrado o contrato-promessa de compra e venda da referida fracção C, onde se encontrava instalado um estabelecimento comercial denominado “H..." entre Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B... e A..., SGPS, SA (ora Recorrida).

IX - No dia 12/02/2003, é celebrado o contrato de opção de compra entre os representantes da Recorrida e da sociedade B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, SA, pelo qual esta declarou conferir à Recorrida o direito de opção de compra da fracção autónoma C.

X - No dia 12/02/2003, é celebrado o contrato de opção de compra entre os representantes da Recorrida e da sociedade B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, SA, pelo qual esta declarou conferir à Recorrida o direito de opção de compra da fracção autónoma C.

XI - Ainda em 12/02/2003, foi celebrado contrato de arrendamento pelos representantes da Sociedade Imobiliária O... e B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, SA, segundo o qual a primeira declarar tomar de arrendamento a fracção autónoma C do predito prédio urbano, para desenvolvimento de actividades hoteleiras.

XII - Em 06/04/2006, foi celebrado contrato de cessão de direito de opção de compra entre a Recorrida (Cedente) e a sociedade L... - Exploração Turística e Hoteleira, SA (Cessionária), pelo preço de € 3.800.000,00.

XIII - Ocorreu, assim, com a celebração do contrato supra referido, uma cedência da posição da ora Recorrida, decorrendo expressamente do mesmo que a Cessionária pagaria à Cedente (ora Recorrida) o indicado preço.

XIV - Ora, é com base no preço de € 3.800.000,00, acordado no referido contrato pelas partes intervenientes (Cedente e Cessionária), que a Recorrida deveria ter declarado na respectiva declaração fiscal tal proveito, de acordo com o previsto no art.° 20° do CIRC, (redacção da norma à data da prática dos factos), o qual foi omitido na sua contabilidade.

XV - Efectivamente, e no que respeita ao pagamento do preço acordado, o contrato de cessão do direito de opção de compra, no considerando G é, bem explícito, ao mencionar:

“No âmbito das negociações globais estabelecidas entre as partes e ainda a sociedade O... ficou acordado que a CESSIONÁRIA pagará à CEDENTE as indicadas quantias (...),

XVI - Ora, o Serviço da Inspecção Tributária da Autoridade Tributária, da consulta do Relatório da Inspecção Tributária à sociedade O... constatou que esta teria efectuado uma operação (distinta da que resultou da liquidação adicional à sociedade ora Recorrida) de igual valor, tendo como base a factura n.° 188459, de 07/12/2007, por si emitida à L..., SA, contendo a seguinte descrição: “Benfeitorias no H... conforme Mapa de Imobilizado”.

XVII - A sociedade O... contabilizou esta factura debitando a conta Clientes 21110235 L..., SA, por crédito da conta 7942 Alienação de Imobilizações Corpóreas.

Ou seja, no ano de 2007, quando se deu a transmissão do imóvel por parte do B..., a Sociedade O... facturou aos H..., SA, pelo valor de € 3.800.000,00, as obras de benfeitorias registadas no seu imobilizado.

XVIII - Assim, o que está em causa é, claramente, duas operações distintas que têm como elo de ligação o mesmo valor (€ 3.800.000,00): por um lado, temos em 06/04/2006, o preço do contrato de cessão do direito de opção de compra pela Recorrida a favor da L..., SA; por outro lado, em 07/12/2007, temos a emissão de uma factura no mesmo valor emitida pela sociedade Imobiliária O..., SA à L..., SA.

XIX - Na realidade, o contrato de cessão do direito de opção de compra realizado pela Recorrida a favor da L..., SA, titula uma cedência de posição contratual valorizada em € 3.800.000,00, que a Recorrida não contabilizou como proveito. 

XX - No que respeita ao pagamento da cessão de posição contratual, a Recorrida não trouxe aos autos qualquer prova documental que comprove que tal pagamento tenha sido concretizado pela sociedade Imobiliária O..., SA.

XXI - Importa aliás, relevar que a douta sentença apesar de objecto de recurso pelo seu decisório, manifesta que o teor do contrato de cessão do direito de opção de compra “padece de imprecisões relevantes”, além de que "tal factura foi efectivamente emitida, mas não pela impugnante e sim pela sociedade O..., como a AT aferiu em sede de inspecção desta última, situação que, por si só, levanta dúvidas em termos de rigor do teor do contrato”

XXII - Assim, e pelos factos supra expostos, afigura-se-nos que, a liquidação adicional de IRC do exercício de 2006, deverá ser mantida na esfera jurídica da Recorrida.

Nestes termos, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência a douta sentença ora recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo por Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA.»

3. O recorrido notificado para o efeito, não apresentou contra-alegações.

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer, nos termos constantes de fls. 211 a 212 (da numeração dos autos de suporte físico), no sentido da recorrente ser convidada a completar ou esclarecer as suas conclusões de recurso.

Pese embora a pertinência de tal promoção, a verdade é que das conclusões e motivação do recurso consegue-se retirar aquilo que a Recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo, pelo que julga-se desnecessário proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.

II – QUESTÃO A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir pela ilegalidade da liquidação, por erro sobre os pressupostos, quanto ao efectivo recebimento de rendimentos sujeitos a tributação.


*

III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«1) Está descrito, na conservatória do registo predial de Lisboa, sob o número 5…, o prédio urbano, sito na Avenida F..., n.°s 52, 52-A, 52-B, 52-C, 52-D e 52-E e Rua B..., n.°s 1, í-A, í-B, í-C e í-D, inscrito na matriz da freguesia de Alvalade sob o art.° 5... (fls. 120).

2) A aquisição do prédio mencionado em 1), por arrematação em hasta pública, foi registada a favor da Sociedade Imobiliária O..., SA, pela inscrição G-i, correspondente à AP. 1, de 22.08.1969 (cfr. fls. 120).

3) Foi registada a constituição da propriedade horizontal do prédio mencionado em 1), pela inscrição F-i, correspondente a Ap. 1, de 1981.06.09, nas frações A, B e C, destinando-se esta última a hotel (fls. 120 e 121).

4) A aquisição, por compra, da fração C mencionada em 3), foi registada a favor do Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., gerido por B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliários, SA, sendo sujeito passivo a Sociedade Imobiliária O..., SA, pela inscrição, provisória por dúvidas, correspondente à Ap. 43, de 14.03.2003, convertida em definitiva, conforme Ap. 37, de 01.07.2003 (cfr. fls. 122; veja-se ainda a escritura de compra e venda, de 12.02.2003, constante de fls. 136 verso a fls. 138, do processo administrativo).

5) A impugnante era detentora, pelo menos entre 2003 e 2011, da totalidade do capital social da Sociedade O... (fls. 43).

6) Através de documento escrito, datado de 12 de fevereiro de 2003, designado de "Contrato de opção de compra", assinado por representantes da impugnante e da sociedade B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, SA, enquanto gestora do Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., esta declarou conferir à impugnante o direito de opção de compra, para si ou sociedade que esta viesse a indicar, da fração autónoma designada pela letra C, do prédio urbano, sito na Avenida F..., n.°s 52-A, 52-B e 52-C, em Lisboa (cfr. fls. 73 e 74, do processo administrativo).

7) Através de documento escrito, datado de 12 de fevereiro de 2003, designado de "Contrato de arrendamento", assinado por representantes da Sociedade O... e da sociedade B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, SA, enquanto gestora do Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., esta declarou dar de arrendamento à primeira e a primeira declarou tomar de arrendamento a fração autónoma designada pela letra C, do prédio urbano, sito na Avenida F..., n.°s 52-A, 52-B e 52-C, em Lisboa, para desenvolvimento de atividades hoteleiras, pelo prazo de cinco anos renovável, com

8) Até 2006, O estabelecimento de hotelaria, que funcionava na fração C mencionada em 3), era explorado pela Sociedade O..., tendo esta designadamente realizado no mesmo diversas obras.

9) Através de documento escrito, datado de 06 de abril de 2006, designado de "Cessão de Direito de Opção de Compra", a impugnante e a sociedade L... declararam que a primeira cedia à segunda e esta aceitava o direito de opção consignado no contrato mencionado em 6), pelo preço de 3.800.0,00 Eur, constando do referido documento designadamente o seguinte:

"...CONSIDERANDO QUE:


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10) A 7 de dezembro de 2007, a Sociedade O... emitiu a fatura n.° 188459, à sociedade L..., no montante de 3.800.000,00 Eur., acrescido de IVA à taxa de 21%, com a descrição "Benfeitorias no H... conforme mapa de imobilizado", valor tributado, em 2007, como rendimento desta sociedade (cfr. fls. 46, 47 e 52, dos autos, e fls. 169 e 170, do processo administrativo).

11) Foi outorgada, a 10 de dezembro de 2007, no cartório notarial da notária M..., escritura pública de compra e venda, sendo primeira outorgante a sociedade B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliários, enquanto gestora do Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., e segundo outorgante o B..., SA, tendo a primeira declarado vender ao segundo e este declarado comprar-lhe a fração C mencionada em 3), tendo ainda o segundo outorgante declarado que a fração seria dada em locação financeira à sociedade L... (fls. 152 verso a 156, do processo administrativo).

12) A aquisição, por compra, da fração C mencionada em 3), foi registada a favor do B..., SA, sendo sujeito passivo o Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., gerido por B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliários, SA, pela inscrição correspondente à Ap. 21, de 11.06.2008 (cfr. fls. 122 e 123).

13) A locação financeira da fração C mencionada em 3), pelo prazo de 20 anos, com início a 10.12.2007, foi registada a favor da sociedade L..., sendo sujeito passivo o B..., SA, pela inscrição correspondente à Ap. 22, de 11.06.2008 (cfr. fls. 123).

14) A Sociedade O... foi objeto de ação ínspetiva, em cumprimento da Ordem de Serviço n.° 01201004960, pela Direção de Finanças de Lisboa (cfr. fls. 36, dos autos, e fls. 157, do processo administrativo).

15) Da ação inspetiva mencionada em 14) resultou um Relatório de Inspeção Tributária (RIT), datado de 5 de setembro de 2011, do qual consta designadamente o seguinte:

“…


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..." (fls. 36 a 54, dos autos, e fls. 157 a 166, do processo administrativo).

16) A impugnante foi objeto de ação inspetiva, em cumprimento da Ordem de Serviço n.° 01201010911, pela Direção de Finanças de Lisboa (cfr. fls. 23, dos autos, e fls. 120, do processo administrativo).

17) No âmbito da ação inspetiva mencionada em 16), foi remetido ofício, pelos serviços da Administração Tributária (AT), via correio postal registado, dirigido à impugnante, designado de "carta-aviso", datado de 21 de dezembro de 2010, constando do mesmo designadamente o seguinte:

..." (cfr. fls. 122 a 124, do processo administrativo).

18) No âmbito da ação inspetiva mencionada em 16), na sequência de ausência do administrador da impugnante, foi afixado na porta da sede da impugnante, a 29 de dezembro de 2010, documento, designado de "Notificação com Hora Certa", de acordo com o qual se determinava que no dia seguinte a respetiva signatária iria regressar ao local para efeitos de notificação da impugnante do início do procedimento inspetivo (fls. 118 e 119, do processo administrativo).

19) No âmbito da ação inspetiva mencionada em 16), foi elaborado, pelos serviços da AT, documento, designado de "Certidão de Verificação de Hora Certa", datado de 30.12.2010, do qual consta designadamente o seguinte:


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..." (cfr. fls. 117, do processo administrativo).

20) Foi requerida, no âmbito da ação inspetiva mencionada em 16), a 01 de junho de 2011, pela inspetora tributária, prorrogação do prazo do procedimento inspetivo por três meses, indicando-se necessidade de realização de cruzamento de informação e diligências junto de terceiras entidades (cfr. fls. no, do processo administrativo).

21) A impugnante foi notificada da prorrogação do prazo da ação inspetiva mencionada em 20).

22) Da ação inspetiva referida em 16) resultou um Relatório de Inspeção Tributária, datado de 22 de julho de 2011, com seis anexos, do qual consta designadamente o seguinte:

“…


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..." (fls. 23 a 34, dos autos, e fls. 49 a 85, do processo administrativo)

23) Na sequência do RIT mencionado em 22) foi emitida, a 12 de setembro de 2011, peia AT, em nome da impugnante, a liquidação adicional de IRC n.° 2011 8..., relativa ao ano de 2006, no valor de 657.767,07 Eur. e a dos respetivos juros compensatórios, no valor de 106.540,24 Eur., tendo como data limite para pagamento voluntário 24 de outubro de 2011 (cfr. fls. 22 a 26, do processo administrativo).

24) A 17 de junho de 2011 foi levantado auto de notícia, contra a impugnante, para integrar o processo de inquérito n.° 2262/2010.6IDLSB, do qual consta designadamente o seguinte:

"... Aos dezassete dias do mês de Junho de 2011 (...) verifiquei pessoalmente que o contribuinte A... SGPS, SA (...) praticou as seguintes infracções no exercício de 2006:

1 – Omitiu proveitos no montante de 3.800.000,00 €, nos termos do artigo 20º do Código do Imposto Sobre 0 Rendimento das Pessoas Colectivas..." (fls. 130 e 131, do processo administrativo).

25) No âmbito do processo comum, com o número de processo mencionado em 24), foi proferido, a 12.07.2013, despacho de suspensão do processo até ao trânsito em julgado da decisão dos presentes autos (fls. 89 a 91).

26) Foi instaurado, no serviço de finanças de Lisboa 8, o processo de execução fiscal n.° 31..., correspondendo a dívida exequenda à liquidação mencionada em 23) (fls. 27 e 28, do processo administrativo).


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Não existem factos não provados, em face das possíveis soluções de direito, com interesse para a decisão da causa.

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MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

A convicção do tribunal, no que respeita aos factos provados, assentou na prova documental junta aos autos, conforme indicado em cada um desses factos.

Especificamente quanto ao facto 8), a convicção do tribunal fundou-se, desde logo, na existência de um contrato de trespasse, entre a Sociedade O... e a sociedade L..., celebrado em maio de 2006 e referido, designadamente, no RIT respeitante à Sociedade O... (cfr. fls. 4.7, dos autos, bem como fls. 146 a 148 verso e fls. 171 verso a 174, do processo administrativo, consubstanciado no contrato- promessa de trespasse, e fls. 150 a 151 verso e fls. 175 a fls. 177, do processo administrativo, consubstanciado no contrato de trespasse), e no contrato de arrendamento celebrado entre a Sociedade O... e da sociedade B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, SA, enquanto gestora do Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B... (cfr. 139 a 141, do processo administrativo), decorrendo de todos estes instrumentos contratuais que a atividade hoteleira em causa era desenvolvida pela Sociedade O.... Por outro lado, a prova testemunhal produzida, coerente e convincente, com conhecimento direto dos factos, foi inequívoca nesse sentido. Especificando, as testemunhas J..., à época técnico oficial de contas da Sociedade O..., M..., à época administrador da Sociedade O…, e L..., advogada, que acompanhou o processo de aquisição do H..., foram coerentes e convincentes no que respeita ao facto de a exploração do hotel ser feita pela Sociedade O.... Aliás, no caso da primeira testemunha foi inclusivamente esclarecido que a impugnante não tinha qualquer atividade operacional, por força, designadamente, do facto de ser uma SGPS. Por outro lado, as duas primeiras testemunhas foram claras, quanto às obras feitas no Hotel pela Sociedade O..., como reflexo da exploração do estabelecimento em causa.

No tocante ao facto 21), trata-se de facto não controvertido, como resulta da posição assumida pela impugnante, no art.° 2.º, da petição inicial.»


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2. DE DIREITO

Está aqui em causa a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC do exercício de 2006, no valor total de € 764.307,31, anulando este acto tributário, no entendimento ­­­­que a liquidação padece de erro sobre os pressupostos, porquanto nada é dito nem aferido em termos de efectivo recebimento da quantia em causa, relativa à cedência de direito de opção, pelo valor de € 3.800.000,00.

A Recorrente insurge-se contra a decisão da primeira instância, em suma, alegando que a liquidação adicional de IRC do exercício de 2006, deverá ser mantida na esfera jurídica da Recorrida, por o contrato de cessão do direito de opção de compra realizado pela Recorrida a favor da L..., SA titular uma cedência de posição contratual valorizada em € 3.800.000,00, que a Recorrida não contabilizou como proveito, e que a Recorrida não trouxe aos autos qualquer prova documental que comprove que tal pagamento tenha sido concretizado pela sociedade Imobiliária O..., SA.

A liquidação impugnada teve origem em correcção efectuada no âmbito de acção de inspecção tributária, na qual a AT concluiu que o rendimento de € 3.800.000,00, relativo à cedência de posição no contrato de opção de compra do H..., pela A..., S.A. a favor da sociedade L..., S.A., não se encontra registado, ocorrendo, assim, uma omissão de rendimentos na contabilização do proveito, conforme o disposto no artigo 20.º do CIRC.

Vejamos, então.

De acordo com o estatuído no artigo 20.º do CIRC, consideram-se proveitos ou ganhos os derivados de operações de qualquer natureza, em consequência de uma acção norma ou ocasional, básica ou meramente acessória.

Por sua vez, o n.º 1, do artigo 18.º do CIRC dispõe: «Os proveitos e os custos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios.»

E, o artigo 1.º do mesmo diploma legal, preceitua que o IRC incide sobre os rendimentos obtidos no período de tributação.

Também o artigo 4.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) dispõe que os impostos assentam na capacidade contributiva revelada nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património.

Assim, o que conta é o momento em que se obtém o rendimento ou a utilização do rendimento, por só aí é que existe capacidade contributiva, não podendo exigir-se um imposto a quem não tem capacidade contributiva por não dispor do rendimento (vide neste sentido ac. do STA de 26/06/2002, proc. n.º 026811, disponível em www.dgsi.pt/).

Como resulta do probatório a Administração Tributária considerou a existência de rendimento sujeito a tributação nos termos do artigo 20.º do CIRC, decorrente da Impugnante ter celebrado em 06/04/2006, com “L... – Exploração Turística e Hoteleira, S.A.”, um contrato de cedência de direito de opção, pelo valor de € 3.800.000,00, facto que configura uma venda e como tal rendimento sujeito a tributação, que a impugnante não declarou nesse exercício.

A Impugnante na sua petição inicial sustentou, com fundamento no cláusula do aludido contrato, o erro sobre os pressupostos tributários, em suma, porque inexiste capacidade contributiva, na sua vertente positiva, porque nada recebeu. Como se viu obteve ganho de causa na primeira instância.

O artigo 405.º do CC estabelece o princípio da autonomia privada, dando às partes, dentro dos limites da lei, a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previsto no CC ou incluir nestes as clausulas que lhes aprouver. Por outro lado, o artigo 406.º do CC estipula que os contratos devem ser pontualmente cumpridos, querendo-se com isto dizer que «…todas as clausulas contratuais devem ser observadas, que o contrato deve ser cumprido ponto por ponto e não apenas que ele deve ser executado no prazo fixado, como poderia depreender-se do sentido usual do vocábulo pontualmente.» (Pires de Lima e A. Varela in Código Civil Anotado, Coimbra Editora, I Vol., Pág. 354).

Considerando as posições das partes, não fosse a questão do ónus da prova que se coloca em primeiro lugar, a solução da questão em discussão levaria à interpretação da declaração negocial das partes ao celebrarem o contrato de cedência de direito de opção, para o que regulam os artigos 236.º a 239.º do Código Civil (CC).

Porém, a questão que nos é colocada no presente recurso, consiste em saber se a AT motivou cabalmente a correcção aritmética à matéria tributável da Recorrida, no ano de 2006, que sustenta a liquidação adicional de IRC em apreço.

A Recorrente defende que tal ónus se encontra cumprido, em face do teor do considerando “G” do contrato de cessão do direito de opção de compra. E que, em 2007, quando se deu a transmissão do imóvel, a sociedade O... facturou à L..., SA, pelo valor de € 3.800.000,00, as obras de benfeitorias registadas no seu imobilizado, retirando daqui que estão em causa duas operações distintas, que têm como elo de ligação o mesmo valor.

Antes de mais, importa fazer o enquadramento do ónus da prova aplicável.

O artigo 74.º da LGT dispõe sobre o ónus da prova e refere que:

1 – O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.

2 – Quando os elementos de prova dos factos estiverem em poder da administração tributária, o ónus previsto no número anterior considera-se satisfeito caso o interessado tenha procedido à sua correcta identificação junto da administração tributária.

3 – Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação.

Em conformidade, aliás, com o princípio consagrado no artigo 342.º do Código CC, que preceitua que aquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado (cfr. artigo 116.º do CPA).

Por outro lado, de acordo com o artigo 75.º, n.º 1, da LGT presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei bem como os dados e apuramentos inscritos na contabilidade.

Tal presunção cessa designadamente se as declarações do contribuinte, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo, bem como, salvo nos casos em que for legítima a recusa de prestação de informações, se o contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária (artigo 75.º, n.º 2, alíneas a) e b), da LGT).

No caso dos autos, cabe notar que actuando a AT no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabia à Administração Tributária fazer prova de todos os pressupostos do seu agir (artigo 74.º, n.º 1, da LGT), coligindo os elementos de prova da liquidação que não se baseia em declaração do contribuinte, designadamente, do recebimento do preço da cessão, nos termos da cláusula terceira, n.º 1 do contrato de cedência de direito de opção de compra.

A sentença recorrida alinhou o seguinte discurso fundamentador para, nesta matéria, julgar procedente a impugnação:

Como decorre da factualidade assente, o prédio em causa era, num primeiro momento, da propriedade da Sociedade O..., que o alienou ao Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., gerido por B... - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliários. Por seu turno, a impugnante celebrou com esta última sociedade um contrato de opção de compra do imóvel em causa.

Resulta igualmente da factualidade assente que a Sociedade O... continuou a explorar o hotel até 2006, o que, aliás, nunca é posto em causa pela AT, como se verifica face à análise do RIT relativo àquela sociedade.

Da mesma forma, a AT nunca pôs em causa a efetividade das obras realizadas pela Sociedade O... e que estiveram subjacentes à fatura de 3.800.000,00 Eur., emitida a favor da sociedade L....

Feito este introito, cumpre agora analisar o teor do RIT que constitui fundamento à liquidação em crise, sendo de salientar dois aspetos.

Assim, por um lado, consta do mesmo que a impugnante em 2006 não declarou quaisquer proveitos, o que não é controvertido.

Por outro lado, a AT, partindo única e exclusivamente do teor do contrato celebrado com a L..., SA, concluiu que o valor de 3.800.000,00 Eur. constituiu proveito da impugnante, auferido em 2006 e não declarado.

Ora, desde já se adiante que assiste razão à impugnante.

Desde logo, atentando no teor do próprio contrato verifica-se que padece de imprecisões relevantes que, de per si, implicam que o mesmo tivesse de ser analisado em conjunto com outros elementos adicionais (que não constam do RIT) para motivar qualquer correção.

Com efeito, atentando nos considerandos F) e G) do contrato (nos quais é feita uma referência ao valor de 3.800.000,00 Eur. - 1.900.000,00 Eur.*2), ao mesmo tempo que se refere que o valor em causa deveria ser pago à impugnante, pela L..., SA, indica-se que o mesmo seria pago "... mediante factura relativa a benfeitorias que será emitida em nome da CESSIONÁRIA [L..., SA]". Ora, como já foi referido, tal fatura foi efetivamente emitida, mas não pela impugnante e sim pela sociedade O..., como a AT aferiu em sede de ação inspetiva a esta última, situação que, por si só, levanta dúvidas em termos de rigor do teor do contrato. Por outro lado, a cláusula terceira, no seu n.° 1, refere que o preço será pago de acordo com as condições referidas no considerando G) e no momento definido no seu n.° 2.

Tendo em conta este contexto, desde logo, não se consegue extrair da factualidade constante do RIT elementos suficientes que suportem conclusão retirada, no sentido de ter ocorrido, em 2006, omissão de rendimento auferido ao abrigo do art.° 20.º, do Código do IRC.

Com efeito, a existência de um contrato, de per si, não é suficiente para se concluir pela efetiva existência do rendimento, não constando do RIT qualquer elemento complementar (por exemplo, de pagamentos feitos pela L... à impugnante) que evidenciasse que a impugnante auferiu efetivamente tal rendimento e no ano específico de 2006.

Por outro lado, os considerandos e as cláusulas do contrato em causa padecem das contradições referidas, que, como já mencionado, a AT não podia ignorar, dado que ela própria verificou a existência da fatura em causa emitida pela Sociedade O….

É ainda de sublinhar, tal como refere a impugnante, que a cláusula terceira do contrato em causa, no seu número 2, define o momento do pagamento do valor em causa (data da escritura de compra e venda da fração autónoma), nada sendo dito quanto a esta circunstância no RIT, sendo certo que consta do processo administrativo a referida escritura pública de compra e venda e a mesma data de dezembro de 2007.

Ou seja, tal como defendido pela impugnante, a liquidação em crise padece de erro sobre os pressupostos, porquanto nada é dito nem aferido em termos de efetivo recebimento da quantia em causa pela impugnante, no exercício de 2006. sendo que os elementos de que a AT dispunha e a que a impugnante faz referência têm ínsitas grandes limitações, que, sem diligências instrutórias complementares (exigíveis, face ao princípio do inquisitório previsto no art.° 58°, da LGT), não podem fundar a tributação nos termos efetuados.

Como tal, a AT não logrou ilidir, como era seu ónus, a presunção de veracidade da contabilidade da impugnante, trazendo apenas ao processo administrativo um elemento que, de per si, não evidencia a efetiva existência de rendimentos no exercício de 2006.

Diga-se, desde já, que acompanhamos sem reserva os argumentos fundamentadores da decisão recorrida.

Efectivamente, atenta a prova recolhida em sede de inspecção tributária, observa-se que a Administração não prova os pressupostos de facto em que fez assentar a liquidação sindicada, visto que, fundando-se a correcção numa clausula contratual, impunha-se a demonstração que a Recorrida recebeu o preço, designadamente, através de extractos bancários, para prova do proveito (artigo 20.º do CIRC).

Porém, como muito bem salienta a Mma. Juiz a quo, a cláusula terceira do contrato em causa define o momento do pagamento do valor em causa na data da escritura de compra e venda, que ocorreu no ano de 2007, e que no RIT nada é dito quanto a esta circunstância, nem quanto ao efectivo recebimento da quantia em causa pela impugnante, no ano de 2006.

Concluindo, a AT não cumpriu com o ónus que sobre si impendia no sentido de provar os factos que integram o fundamento previsto na lei para que seja ela a liquidar o imposto que o contribuinte deixou de liquidar, demonstrando a existência e conteúdo do facto tributário, pelo que, a liquidação dos autos está ferida de ilegalidade, impondo-se assim acompanhar a decisão recorrida quando determinou a anulação da liquidação impugnada.

Nesta conformidade, deverá ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida, no segmento recorrido.


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O n.º 7 do artigo 6.º do RCP, dispõe: Nas causas de valor superior a € 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.

Esta norma está relacionada com o que se prescreve na tabela I, ou seja, que para além de € 275.000 ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada €25.000 ou fração 3 unidades de conta no caso da coluna A, 1,5 unidade de conta no caso da coluna B, e 4,5 unidade de conta no caso da coluna C.

O remanescente da taxa de justiça, ou seja, o valor da taxa de justiça correspondente à diferença entre € 275.000 e o efetivo valor da causa, para efeitos de determinação daquela taxa, deve ser considerado na conta final, se por acaso não for determinada a dispensa do seu pagamento.

Como pondera Salvador da Costa: «A referência à complexidade da causa e à conduta processual das partes significa, por um lado, a sua menor complexidade ou maior simplicidade, e, por outro, a atitude das partes na prática dos actos processuais necessários à adequada decisão da causa, isto é, margem de afirmações ou alegações de índole dilatória.

A este propósito, é necessário ter em conta que a taxa de justiça é um dos elementos essenciais do financiamento dos tribunais e do acesso ao direito e aos tribunais.

A atitude das partes com vista à dispensa ou não do remanescente da taxa de justiça deve ser apreciada à luz dos princípios da cooperação e da boa fé processual, a que se reportam os artigos 7.º, n.º 1, e 8.º da CPC.» (in As Custas Processuais, análise e comentário, 7.ª Edição, Almedina, nota 6.8. ao artigo 6.º, pág. 141).

A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar que justifica-se dispensa do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no n.º 7, do artigo 6.º do RCP, se não se suscitarem questões de grande complexidade e se também o respectivo montante se mostrar manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe (vide por todos Ac. do STA de 01/02/2017, proc. n.º 0891/16 e de 08/03/2017, proc. n.º 0890/16, disponíveis em www.dgsi.pt/; e acórdão do Tribunal Constitucional n.º 471/2007, de 25/09/2007, processo n.º 317/07).

Importa, pois, apreciar, para além do requisito relativo ao valor da causa que efectivamente se verifica, uma vez que esta tem o valor tributário de € 764.307,31, se existem razões objectivas para a dispensa do pagamento, designadamente atendendo à complexidade da causa e à conduta processual das partes nos presentes autos.

Analisando a conduta processual das partes, verificada a tramitação dos autos constata-se que a mesma se limita ao que lhes é exigível e legalmente devido, não se destacando qualquer especial cooperação dos litigantes com o tribunal.

Quanto à complexidade da causa, o Regulamento das Custas Processuais não estabelece critérios específicos, pelo que, socorremo-nos do artigo 530.º do Código de Processo Civil (CPC), que dispõe considerarem-se de especial complexidade as ações e os procedimentos cautelares que:

a) Contenham articulados ou alegações prolixas;

b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou

c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meio de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas.

Tendo presente os critérios indiciários supra elencados e o circunstancialismo em que foi lavrado o acórdão, constata-se que a especialidade da causa é de molde a afastar o excesso do pagamento sobre o valor de €275.000,00.

Efectivamente, ponderando que a questão apreciada não apresenta elevada complexidade, tendo inclusivamente versado sobre matéria já amplamente tratada pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, a simplicidade formal da tramitação dos autos, o comportamento processual das partes, o valor da causa, e não perdendo de vista que deve existir correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 2.º da CRP e atendendo ainda ao direito de acesso à justiça acolhido no artigo 20.º igualmente da CRP, considera-se adequado dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que corresponderia ao excesso sobre o valor tributário de € 275.000,00.

Assim, ao abrigo do disposto no n.º 7, do artigo 6.º, do RCP, dispensa-se a Recorrente do pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que corresponderia ao excesso sobre o valor tributário de € 275.000,00.


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Conclusões/Sumário:

I. De acordo com o estatuído no artigo 20.º do CIRC, consideram-se proveitos ou ganhos os derivados de operações de qualquer natureza, em consequência de uma acção norma ou ocasional, básica ou meramente acessória.

II. O que conta é o momento em que se obtém o rendimento ou a utilização do rendimento, por só aí é que existe capacidade contributiva, não podendo exigir-se um imposto a quem não tem capacidade contributiva por não dispor do rendimento

III. Actuando a AT no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe fazer prova de todos os pressupostos do seu agir (artigo 74.º, n.º 1, da LGT), coligindo os elementos de prova da liquidação que não se baseia em declaração do contribuinte, designadamente, do recebimento do preço da cedência do direito de opção de compra.

IV. Ponderando que a questão apreciada não apresenta elevada complexidade, tendo inclusivamente versado sobre matéria já amplamente tratada pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, a simplicidade formal da tramitação dos autos, o comportamento processual das partes, o valor da causa, e não perdendo de vista que deve existir correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 2.º da CRP, considera-se adequado dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que corresponderia ao excesso sobre o valor tributário de € 275.000,00.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença na parte recorrida.

Custas a cargo da Recorrente, com dispensa do remanescente da taxa de justiça, na parte em que exceda € 275.000.

Notifique.


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Após trânsito em julgado, remeta cópia do presente acórdão ao Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juiz Local Criminal de Lisboa – Juiz 7, – proc. n.º 2262/10.6IDLSB (ofício fls. 349 do suporte electrónico).

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Lisboa, 11 de Fevereiro de 2021.

A Juíza Desembargadora Relatora,
Maria Cardoso
(assinatura digital)
(A Relatora consigna e atesta, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, o voto de conformidade com o presente Acórdão dos restantes integrantes da formação de julgamento, as Exmas. Senhoras Juízas Desembargadoras Catarina Almeida e Sousa e Hélia Gameiro Silva).