Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1080/07.3BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/25/2020
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IVA;
LIQUIDAÇÃO ADICIONAL;
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO.
Sumário:I.O direito à fundamentação dos actos tributários tem assento no artigo 268.º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa e encontra-se concretizado pelo legislador ordinário no artigo 77.º da LGT e artigo 125.º do CPA (na redacção aplicável à data dos factos).

II.O acto tributário de liquidação adicional efectuado nos termos do artigo 87.º do CIVA encontra-se suficientemente fundamentado quando exprime em termos claros, suficientes, congruentes e inteligíveis o critério legal e a motivação da mesma.

III.A fundamentação de uma liquidação de juros compensatórios deve dar a conhecer, pelo menos, o montante de imposto sobre o qual incidem os juros, a taxa ou taxas aplicáveis e o período da sua contagem.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO


I.RELATÓRIO


A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença proferida pelo TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL (TAF) DE BEJA, que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por «B..................., LDA» contra a liquidação adicional de IVA, no valor de 35.001,08€, e liquidação de juros compensatórios, no valor de 4.568,36€, referentes ao período de 03/03T.

A Recorrente apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:
«l - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a impugnação à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, por ter considerado que são indicados os factos e motivos que levaram a AT a pedir os elementos para corrigir a rubrica "IVA Dedutível", mas a AT não fundamenta de direito e a ausência de enunciação das normas legais acarretaram a não aceitação da dedução do IVA, impede o conhecimento integral do itinerário valorativo e cognoscitivo seguido pelo autor do acto, e impossibilita uma defesa adequada por parte do contribuinte / impugnante.
Frise-se que, em sede de contestação a Fazenda Pública, vem trazer à colação um discurso fundamentador muito mais assertivo com fundamentação de direito. Porém, a fundamentação tem de ser contemporânea ao acto, não pode ser proferida a posteriori.
Ora, a insuficiente fundamentação equivale à falta de fundamentação.
Termos em que julgo verificada a falta de fundamentação, procedendo por aqui a impugnação.
II - Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em saber se houve falta de fundamentação e/ ou fundamentação a posteriori ou não, pois para o Tribunal a quo a Administração Tributária, doravante AT, não fundamentou de direito e, para a AT, o que está em causa não foi a liquidação adicional proveniente da correcção de IVA das correcções efectuadas no âmbito da inspecção tributária, doravante RIT, uma vez que esta foi anulada, mas sim as provenientes das declarações entregues pela impugnante relativa ao mesmo período, pelo que não existe fundamentação a posteriori nem falta de fundamentação.
III - A impugnante foi inspeccionada através das OI200601243 e OI200601244, acção externa, com inicio em 09/08/2006 e terminus em 22/09/2006, uma vez que foram detectadas várias declarações de IVA em falta, designadamente a do período 0306T.
IV - A impugnante e o TOC foram notificados para entregar as DP's de IVA bem como os livros de escrita e documentos contabilísticos.
V - Em 08/05/2003, a impugnante entregou a declaração periódica, doravante DP, de IVA, relativa ao período de 0303T, com o n.° .................. (declaração entregue dentro do prazo), tendo declarado no campo 24 o montante de € 17.174,17, constando do campo 93 o montante a pagar de € 1.634,87. (bold e sublinhado nosso) - vide fls. 73 do PAT
VI - Em 09/08/2006, data que coincide com o início do procedimento inspectivo, a impugnante entregou a DP de substituição de IVA, com o n.° .................., Modelo C, entrega fora de prazo, referente ao período 0303T, tendo declarado, no campo 24 o montante de € 52.555,25 e no campo 93 um montante a pagar de € 1.634,87. - (bold e sublinhado nosso) - vide fls. 74 do pat
VII - Em 18/08/2006, durante o decurso do procedimento inspectivo, a impugnante entregou nova DP de substituição, com o n.° ................... Modelo C, referente ao período 0303T, tendo declarado, no campo 24 o montante de € 17.174,17 e no campo 93 um montante a pagar de € 36.635,95. - (bold e sublinhado nosso) - vide fls. 75 do PAT
VIII - As DP's mencionadas nos pontos anteriores foram entregues na sequência das irregularidades detectadas no procedimento inspectivo e comunicadas à impugnante, que as regularizou voluntariamente.
IX - Em 25/09/2006, a impugnante entregou nova DP de substituição, com o n.° .................., referente ao período 0303T, declarando, no campo 24 o montante de € 52.324,17 e no campo 93 um montante a pagar de € 1.485,95. (bold e sublinhado nosso) - vide fls. 78 do pat
X - No âmbito do procedimento inspectivo, os serviços de inspecção notificaram a impugnante, o TOC e a sociedade L.................., Lda, como NIF .................., fornecedora dos serviços adquiridos pela impugnante, para apresentar os contratos, os autos de medição e os meios de pagamento.
XI - Em 10/10/2006, foi elaborado o Termo de Declarações do TOC da impugnante que declarou quanto aos autos de medição que "Não houve oportunidade no tempo respectivo de reunir o requisitado, pois tratam-se de documentos não relevantes para a efectivação da escrita, e como tal, não estavam presentes aquando da inspecção tributária.
Em relação aos meios de pagamento solicitados, afirmar só poder apresentar os elementos constantes e verificados aquando da inspecção tributária, visto serem os únicos constantes nos documentos de apoio à escrita." - vide fls. 139 do pat Com o termo de declarações o TOC não apresentou quaisquer documentos.
XII - A sociedade L.................., Lda respondeu à notificação, por carta datada de 26/10/2006, tendo entregue os contratos de adjudicação nas obras de Alfornelos e Restelo com a impugnante, não possuindo os autos de medição porquanto não havia necessidade de os guardar. Quanto ao meio de pagamento utilizado era em dinheiro ou encontro de contas. - vide fis 141 e ss do PAT
XIII - Consequentemente, os serviços de inspecção desconsideraram as facturas, cujas cópias constam dos Anexos 22 a 31 do relatório de inspecção, como documentos de suporte de IVA dedutível, tendo sido efectuadas as devidas correcções.
XIV - A impugnante exerceu o direito de audição em 04/12/2006, não tendo junto qualquer documento.
XV - Em sede de IVA e quanto ao período 0303T, foi elaborado o DCU do qual resultou a liquidação Adicional - Fl - n.° .................., no montante de € 35.150,00 e a liquidação de juros compensatórios n.° .................., no montante de € 5.030,78.
XVI - Em virtude de existirem várias liquidações para o mesmo período e créditos no montante de algumas dessas liquidações, foi solicitada à Direcção de Serviços do IVA o acerto da Conta Corrente da impugnante, o qual se encontra veiculado no of. n.° 75010 de 25/07/2007. –vide fls. 170 a 172 do PAT
XVII - Do acerto da Conta corrente e quanto ao período 0303T, foi anulada a liquidação adicional resultante da inspecção, com o n.º .................., no montante de € 35.150.00 e da liquidação de juros compensatórios com o n.º .................., no montante de € 5.030.78, bem como a anulação da regularização de crédito. RC, no montante de € 35.150,00. (bold e sublinhado nossos)
Quer dizer, os serviços do IVA, ao analisarem a conta corrente da impugnante anularam as liquidações subjacentes ao procedimento inspectivo, as quais se refere o ponto anterior.
XVIII - Mas, as liquidações ora impugnadas não foram aquelas mas sim, as liquidações com os n.°s .................., Liquidação adicional de IVA no montante de € 35.001,08 e a liquidação de juros compensatórios com o n.° .................., no montante de € 4.568.36, as quais resultam das várias DP's de substituição entregues pela impugnante durante o procedimento inspectivo. (bold e sublinhado nosso)
XIX - Quer dizer, as liquidações objecto de litigância não resultam das devidas correcções pela inspecção, mas sim das DP's entregues pela impugnante com vista a suprir as irregularidades detectadas durante a acção inspectiva, sendo que o valor da liquidação em crise, no montante de €35.001,08, emitida em 01/09/2006, resulta da diferença entre o resultado da declaração de substituição no montante de € 36.635,95, entregue em 18/08/2006 e o resultado da declaração entregue em 09/08/2006, no montante de € 1.634,87. (bold e sublinhado nosso) - vide ponto 11), 12)
XX - E a falta de fundamentação alegada pela impugnante e corroborada pela douta sentença do Tribunal a quo não se verifica, pois conforme se constata foi a própria impugnante quem declarou os montantes que originaram as devidas liquidações, não sendo provenientes do acto tributário, ou seja, de correcções, pelo que inexiste a falta de fundamentação.
XXI - E inexiste a alegada falta de fundamentação porque as liquidações emitidas provenientes do acto tributário, RIT, foram anuladas, conforme o of n.° 75010 do DSCIVA, quando analisaram a conta corrente da impugnante.
XXII - E muito menos houve fundamentação a posteriori como alega o Tribunal a quo.
XXIII - Neste desiderato, ao decidir a douta sentença do Tribunal a quo pela falta de fundamentação errou no seu julgamento, porque as liquidações impugnadas resultam não da acção inspectiva mas sim, das DP's substituídas pela impugnante, pelo que a impugnante sabia porque razão estava a substituir as DP's de IVA, razão pela qual não existe qualquer falta de fundamentação, devendo esta ser revogada por outra.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a Impugnação improcedente, com as devidas consequências legais.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA»


**

Não foram apresentadas contra-alegações.


**

O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de não ser conhecido do recurso, nos termos do artigo 639.º, n.º 3 do CPC, aplicável por força do artigo 2.º, alínea e) do CPPT.
**

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
**

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

A questão colocada pela recorrente nas suas conclusões de recurso, é a de saber se a sentença incorreu em erro de julgamento ao considerar que a liquidação adicional de IVA, sindicada nos presentes autos, padece do vício de forma por falta de fundamentação.


**


Nos presentes autos o Ministério Público promoveu a notificação à recorrente para apresentar novas conclusões das alegações de recurso. Por se ter entendido que as conclusões formuladas « (…) não podem ser uma reprodução do que se alega, sob pena de se ter de considerar que não foram formuladas conclusões.».

Como é sabido, quanto à exigência de conclusões, dispõe o artigo 639.º, do CPC:

«1. O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos porque pede a alteração ou anulação da decisão.

(…)

3. Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras ou complexas ou nelas não se tenha procedido às especificações a que alude o nº2 do artigo 639º, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de não conhecer do recurso, na parte afetada.

Considerando-se que a falta absoluta de alegações ou de conclusões gera o indeferimento do recurso (artigo 641.º, nº 2, al. b), do CPC).

No caso em apreço, respondendo ao convite formulado, veio a recorrente apresentar novas conclusões de recurso que contêm em si aquele mínimo do qual se possa extrair as questões a submeter ao conhecimento deste Tribunal.

Razão pela qual, nada obsta a apreciação do recurso que nos vem dirigido.


**

II. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
«1. A impugnante, é uma sociedade comercial por quotas que exerce a atividade de Construção de Edifícios – CAE: 41200– Acordo;

2. Em Março de 2003, a impugnante encontrava-se enquadrada no regime normal Trimestral de IVA – cfr. fls. 161 do processo instrutor em apenso aos autos;
3. Em 08/05/2003, a impugnante procedeu à entrega da declaração periódica do período de 03/03T, com nº .................., tendo apurado o montante de imposto a favor do Estado de € 1.634,87, o qual foi pago em 15/05/2003 - cfr. fls. 73 e 163 do processo instrutor em apenso aos autos;
4. A coberto das Ordens de Serviço nº OI200601243/4, foi iniciado em 09/08/2006, procedimento de inspeção externo à impugnante, aos exercícios de 2002 e 2003, os quais foram concluídos em 22/09/2006 – cfr. fls. 45 dos presentes autos;
5. No decorrer do procedimento de inspeção, foram efetuadas notificações, quer ao representante da impugnante, quer ao Técnico Oficial de Contas, solicitando os seguintes elementos:

«imagem no original»


- cfr. fls. 53 a 56 dos autos;

6. A fatura nº 31, do período de 03/03T, emitida pela impugnante a “B……, Lda.”, indica como data de vencimento “31-03-2003”; no descritivo menciona “Execução de Trabalhos em v/ obra”; pelo valor de “€ 185.000,00 e IVA no valor de € 35.150,00”; apresentando o total do documento o valor de “€ 220.150,00” – cfr. fls. 79 do processo instrutor em apenso aos autos;
7. No decorrer do procedimento de inspeção, em 09/08/2006, a ora impugnante, enviou declaração de substituição de IVA nº .................., aumentando a base tributável de IVA – cfr. fls. 74 do processo instrutor em apenso aos autos;
8. Em 18/08/2006, a ora impugnante, entrega nova declaração de substituição, via internet, a DP nº .................., referente ao período de imposto 03/03T, reduzindo o IVA dedutível de € 52.555,25 para € 17.554,17 - cfr. fls. 75 do processo instrutor em apenso aos autos;
9. Em 25/09/2006, a impugnante remete novas declarações de substituição, entregando as respetivas cópias à AT, DP nº .................., aumentando para o período de 03/03T o IVA dedutível para € 52.704,17 – cfr. 76 e 79 do processo instrutor em apenso aos autos;
10. O procedimento de inspeção, apresentou correções ao IVA de 03/03T, com a seguinte fundamentação:
A ação inspetiva foi concluída em 26/09/2006 às 15.30 horas, no entanto, o SP entregou nestes serviços de inspeção tributária no mesmo dia pelas 14 horas, novas declarações de alteração de IVA e de IRC, relativas aos anos de 2002 e 2003 e juntou documentos para justificar os custos não documentados em sede de IRC e o IVA deduzido indevidamente, que tinham sido objeto de regularizações voluntárias, por parte do SP. Assim, para averiguar a veracidade dos documentos juntos, procedemos do seguinte modo: - notificamos a empresa emitente das faturas, “ L.................., Lda., para identificar as obras onde foram prestados os serviços, contratos de medição, bem como os respetivos meios de pagamento, juntando cheques relativamente aos exercícios de 2002 e 2003, no entanto, a notificação foi devolvida com a indicação “Mudou-se”; - Enviamos uma notificação a “E................., na qualidade de Administrador da empresa – B................., Lda.” a solicitar vários elementos relacionadas com as prestações de serviços noa anos em análise e que não se encontravam na contabilidade, no entanto, a notificação foi devolvida com a indicação de “não reclamado”. – Foi notificado – A.................- na qualidade de TOC, a solicitar vários elementos, o qual respondeu em termo de declarações “Não ter tido tempo para reunir os elementos requisitados, por não se tratarem de documentos relevantes para a efetivação da escrita, e como tal não estarem presentes aquando da inspeção. Em relação aos meios de pagamento afirma só poder apresentar os elementos constantes e verificados aquando inspeção tributária, visto serem os únicos constantes nos documentos de apoio à escrita. – Foi enviada uma notificação a C................., na qualidade de Administrador da empresa – L.................., Lda. para identificar as obras onde foram prestados os serviços contratados, autos de medição, bem como os respetivos meios de pagamento, juntando cheques relativamente aos exercícios de 2002 e 2003. Em resposta o SP enviou 2 contratos de adjudicação, alegando não ter os restantes elementos solicitados pelas razões expostas na carta enviada. Relativamente aos cheques solicitados, refere que os pagamentos eram genericamente efetuados a dinheiro ou encontro de contas. (…). Face ao exposto, conclui-se: As faturas não identificam o tipo de trabalhos prestados e obra onde foram desenvolvidas (cfr. anexos 22 a 31); Não identificam os autos de medição, nem os mesmos se encontram junto à fatura. Não ficou provado o efetivo pagamento do serviço prestado, tendo respondido, que os mesmos foram feitos em conta corrente ou dinheiro; - O SP objeto da ação inspetiva “B................., Lda.”- embora notificado para provar a efetividade dos trabalhos prestados por “L.................., Lda.”, bem como o respetivo meio de pagamento não compareceu. O TOC foi notificado para apresentar os documentos contabilísticos de suporte à efetiva prestação de serviços bem como os meios de pagamento, respondeu não se tratarem de elementos relevantes para escrita (…) Pelo que somos de opinião que se devem manter nas correções voluntárias efetuadas pelo SP, durante a ação inspetiva constantes das declarações relativamente a IRS e IRC. E correções aritméticas para o IVA deduzido indevidamente nos exercícios em referência (…)” – cfr. fls. 48 a 50 dos autos;
11. Ainda, como fundamento a A.T. considerou ter sido violado o disposto no art. 26º do CIVA – cfr. fls. 52 dos autos;
12. No quadro VIII- Direito de Audição – Fundamentação, do Relatório Inspetivo, retira-se o seguinte entendimento” (…) tendo exercido esse direito em 04/12/2006, limitou-se apenas a relatar os factos ocorridos durante a ação inspetiva, nomeadamente, a entrega de declarações de substituição, onde constava a falta de documentos de suporte dos valores contabilizados e declarados. Posteriormente, a entrega de novas declarações de substituição a alterar novamente os valores declarados, justificados com dos documentos supostamente em falta. Assim o sujeito passivo não juntou ao processo quaisquer elementos novos susceptiveis de correção (…)” – cfr. fls. 52 dos autos;
13. A A.T. concluiu assim que, relativamente ao exercício de 2003, foi deduzido indevidamente, IVA, nos seguintes montantes:
Ano 2003/Períodos Imposto deduzido indevidamente
1º Trimestre

2º Trimestre 3º Trimestre 4º Trimestre TOTAL

€ 35.000,00
€ 24.000,00
€ 34.000,00
€ 24.000,00
€ 117.000,00

- cfr. fls. 51 dos autos;

14. Em 01/09/2006, é remetida notificação à, ora impugnante, para proceder ao pagamento de € 35.001,08, até 31/10/2006, referente à liquidação adicional de IVA nº .................., de 03/03T, reportada à declaração corretiva no valor de € 36.635,95 e, ao valor a considerar da declaração substituída no valor de € 1.634,87 – cfr. fls. 17 dos autos;
15. Em 01/09/2006, é remetida notificação à ora impugnante, para proceder ao pagamento do valor de € 4.568,36, até 31/10/2006, da liquidação de juros compensatório nº .................., de IVA de 03/03T, sendo que da fundamentação consta o seguinte:

- cfr. fls. 18 dos presentes autos;
16. A impugnante apresentou, então, reclamação graciosa contra as liquidações de imposto e juros compensatórios do período de 03/03T, a qual veio a ser arquivada por despacho do Diretor de Finanças Adjunto, de 30/11/2007, com a seguinte fundamentação:

«imagem no original»


- cfr. fls. 14 a 16 dos autos.

II. 2 - DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Não existem outros factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.
II. 3 - MOTIVAÇÃO
A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos não impugnados, juntos aos autos e expressamente referidos no probatório supra .
O depoimento da testemunha oferecida pela impugnante, o Sr. V................, técnico oficial de contas da impugnante, à data dos factos, em nada, alterou a convicção formada pela restante prova (documental) que consta dos autos. O seu depoimento foi credível.»


**

B. DO DIREITO

O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IVA n.º .................. e liquidação de Juros Compensatórios n.º .................., respectivamente nas quantias de 35.001,08€ e 4.568,36€, referentes ao período de 03/03T, por vício de forma por falta de fundamentação. Para assim decidir, entendeu a Meritíssima Juiz que o acto tributário de liquidação de imposto não contêm « (…) qualquer indicação concreta aos artigos do CIVA infringidos, não é feita referência às normas que não permitem a dedução do IVA ». E mais, adiante não deixou de sublinhar que « (…) em sede de contestação a Fazenda Pública, vem trazer à colação um discurso fundamentador muito mais assertivo e compatível com fundamentação de direito. Porém, a fundamentação tem de ser contemporânea ao ato, não pode ser proferida a posteriori.».

A recorrente discorda do tratamento fáctico-jurídico dado pelo Tribunal «a quo» e contrapõe, dizendo que o acto de liquidação de IVA sindicado não teve origem nas conclusões de procedimento de Inspecção Tributária levado quanto ao exercício de 2002, mas sim das Declarações Periódicas entregues pela Impugnante (doravante recorrida) tendentes a suprir as irregularidades detectadas durante o procedimento de inspecção, e como tal o acto de liquidação de imposto está devidamente fundamentado.

Conforme assinalado já, a questão a resolver no presente recurso é, pois, a de saber se a liquidação de IVA, sindicada padece ou não do vício de forma por falta de fundamentação.

Para responder a esta questão há um enquadramento geral a que é conveniente proceder-se.

O direito à fundamentação dos actos tributários tem assento no artigo 268.º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa e encontra-se concretizado pelo legislador ordinário no artigo 77.º da LGT e artigo 125.º do CPA (redacção à data da elaboração do Relatório de Inspecção).

No que respeita à distinção entre fundamentação formal e fundamentação material, importa ter presente que: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa.

Distinguindo a dimensão formal e a dimensão substancial do dever de fundamentação, Vieira de Andrade, diz que a diferença está «em que o dever formal se cumpre pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis; enquanto a fundamentação material exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo.» (“O Dever de Fundamentação Expressa de Actos Administrativos”, Almedina, 2003, pág. 231).

Constata-se ainda que é pacífica na jurisprudência que o direito à fundamentação do acto tributário, ou em matéria tributária, constitui uma garantia específica dos contribuintes e, como tal, visa responder às necessidades do seu esclarecimento, procurando-se informá-lo do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto por forma a permitir-lhe conhecer as razões de facto e de direito que determinaram a sua prática e porque motivo se decidiu num sentido e não noutro. E tal como a jurisprudência vem repetindo, a fundamentação é um conceito relativo, que varia em função do tipo legal de acto administrativo e visa responder às necessidades de esclarecimento do administrado, procurando-se através dela informá-lo do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto e permitir-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática e os motivos por que se decidiu num sentido e não noutro. (Neste sentido, entre muitos outros: Acórdão do STA de 12.03.2014, proferido no processo n.º 01674/13, disponível no endereço www.dgsi.pt)

No mesmo sentido se orienta José Carlos Vieira de Andrade « (…) a fundamentação visa esclarecer concretamente as razões que determinaram a decisão tomada e não encontrar a base substancial que porventura a legitime», já que, ainda segundo o mesmo Autor , o dever formal de fundamentação cumpre-se «pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis, enquanto a fundamentação substancial exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo». (Ob. cit. páginas 231 e 239).

Por outras palavras, e em suma: um acto só possa considerar-se fundamentado quando tanto o Tribunal como o administrado (colocado na posição de um destinatário normal) podem ficar esclarecidos acerca das razões que estiveram na base desse acto e que o motivaram. ( Neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 30.01.02, proferido no processo n.º 44.288, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Bem se compreende que assim seja, pois, como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.02.2006, proferido no processo nº 1114/05, o dever legal de fundamentação « (…) tem, a par de uma função exógena - dar conhecimento ao administrado das razões da decisão, permitindo-lhe optar pela aceitação do ato ou pela sua impugnação -, uma função endógena consistente na própria ponderação do ente administrador, de forma cuidada, séria e isenta.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Revertendo ao caso concreto dos presentes autos, constatamos que o acto de liquidação de IVA apresenta a seguinte fundamentação:

« (…) efectuada nos termos do artigo 82.º do CIVA em resultado do processamento da declaração correctiva e relativamente a um período de imposto para o qual já tinha sido enviada declaração periódica

Valor da declaração correctiva 36.635,95

Valor da declaração substituída 1.634,87.

(…) 3. Resultado da comparação das duas declarações 35.001,08».

Face ao discurso transcrito, não se poderá dizer que a Administração Tributária não tenha esclarecido em concreto, a recorrida, dos motivos da sua decisão, em termos claros e congruentes, o que lhe permitiu, de resto, reagir, como o fez, apontando-lhe erros de qualificação e de quantificação ao rendimento colectável fixado, que serviu de base à liquidação em crise.

Sendo assim, encontra-se fundamentado (formalmente) o acto tributário de liquidação sindicado. Todavia, o Tribunal «a quo», assim não entendeu, razão pela é conceder provimento ao recurso e de revogar a sentença recorrida.

DO CONHECIMENTO EM SUBSTITUIÇÃO

O conhecimento em substituição encontra legitimação no artigo 665. º do CPC, onde se estatui que os poderes de cognição do tribunal de recurso incluem todas as questões que ao tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, cumprindo ao tribunal de recurso, assegurado que seja o contraditório e prevenindo o risco de decisões-surpresa, resolvê-las sempre que disponha dos elementos necessários.

Nos presentes autos foi dado prévio cumprimento ao dever de assegurar o contraditório (fls.220) a que alude o nº 3 do artigo 665.º do CPC.

Neste contexto, nada obsta à apreciação das questões suscitadas pela Impugnante na petição inicial e não apreciadas pelo Tribunal «a quo».

Na sua petição inicial, a Impugnante invocou o vício de violação de lei, consubstanciado na ofensa do princípio da proporcionalidade, inscrito no artigo 7.º do RCPIT, artigo 55.º da LGT e artigo 46.º do CPPT, na medida em que foi-lhe concedido pela Administração Tributária um prazo para proceder à entrega da documentação solicitada no âmbito do procedimento de inspecção inferior ao previsto na lei.

Antecipa-se, sem dificuldade, não lhe assistir razão.

Senão vejamos.

Determina o Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPIT) no seu artigo 9.º, sob a epígrafe da «Princípio da cooperação», que «A inspecção tributária e os sujeitos passivos ou demais obrigados tributários estão sujeitos a um dever mútuo de cooperação.»

Da conjugação dos artigos 29.º, nº.4, do RCPIT e 23.º, nº.1, do CPPT, resulta que no âmbito do procedimento de inspeção tributária, e ao abrigo dos princípios da colaboração (cfr. artigo 45.º, do CPPT, artigo 9º, do RCPIT, e artigo 59.º, da LGT), a Administração Tributária pode solicitar aos contribuintes que forneçam informações e documentos relevantes para, designadamente, comprovar a veracidade dos valores inscritos nas declarações fiscais apresentadas, devendo, para tanto, conceder um prazo que não pode ser inferior a 10 dias.

Não se mostra controvertido que a Administração Tributária não respeitou o prazo estipulado no artigo 29.º, n.º4, do RCPIT, porém, na data fixada pela Administração Tributária para entrega da documentação, não obstante, o Técnico Oficial de Contas ter declarado em «Termo de Declarações», que: « Não houve oportunidade no tempo respectivo de reunir o requesitado, pois tratam-se de documentos não relevantes para a efectivação da escrita, e como tal, não estavam presentes aquando da inspecção. Em relação aos meios de pagamento solicitados, afirma só poder apresentar os elementos constantes e verificados aquando da inspecçao tributária, visto serem os únicos constantes nos documentos de apoio à escrita.» não requereu a prorrogação para cumprimento do solicitado e de resto, conforme se extrai do declarado, ainda que tivesse sido concedido o prazo estipulado por lei, sempre a documentação não seria apresentada porque considerada irrelevante.

Ademais, a inobservância do prazo em questão, não constitui qualquer vício susceptível de inquinar o procedimento inspetivo e, consequentemente, o acto de liquidação resultante do procedimento.

É de concluir, portanto, que não colhe a argumentação da Impugnante.

Na petição de impugnação vem ainda invocada a violação do Direito ao acesso ao Direito e aos Tribunais na medida em que perante a anulação das liquidações n.ºs .................. e .................., a Administração Tributária não poderia manter as liquidações impugnadas com o fundamento utilizado naquelas outras liquidações.

Mas não sem razão.

Convém começar por recordar que na sequência do procedimento de inspecção a que alude o ponto 4. do probatório, foi emitida a liquidação de IVA n.º .................., no montante de 35.150,00€ e a liquidação de juros compensatórios n.º .................., no montante de 5.030,78€. relativas ao período de 0303T. Porém, estas liquidações subjacentes ao procedimento inspectivo foram anuladas na sequência do acerto da Conta Corrente efectuado pela Direcção de Serviços do IVA, por existirem várias liquidações para o mesmo período e créditos no montante de algumas dessas liquidações.

Assim, contrariamente, ao pretende fazer querer a Impugnante, o acto de liquidação n.º .................. (aqui sindicado) no montante de 35.001,08€, foi emitido, como já vimos, ao abrigo do artigo 82.º do CIVA, e resulta da diferença entre o resultado da declaração de substituição entregue em 18.08.2006 [Na Base Tributável o montante de 285.211,14€; b) O imposto relativo à base tributável no montante de € 54.190,12; c) No campo 20 deduziu o montante de 380,00 €; d) No campo 24 deduziu o montante de € 17.174,17; e) No campo 93 declarou o montante a pagar de € 36.635,95 – vide fls. 75 do PAT] e o resultado da Declaração Periódica entregue em 09.08.2006 [a) Na Base Tributável o montante de € 285.211,14; b) O imposto relativo à base tributável no montante de € 54.190,12; c) No campo 24 deduziu o montante de € 52.555,25; d) No campo 93 declarou o montante a pagar de € 1.634,87].

Aliás, nem se compreende a referência efectuada nos artigos 63º a 66º da petição inicial à alegada prestação de serviços pela sociedade «L................, Lda» no ano de 2002, uma vez que a liquidação sindicada se reporta ao ano de 2003. Mas ainda que se admita tratar-se de mero lapso de escrita, não logrou a Impugnante provar o efectivo pagamento dos serviços prestados nem tão pouco a factura n.º 31 de 31/03/2003, que corresponde ao período em análise, no campo destinado à descrição refere “Execução de trabalhos em v/obra”, o que preenche os requisitos mencionados no artigo 35.º, n.º 5 al. b) do CIVA.

Invoca por último a Impugnante que se verifica « duplicação de colecta», também aqui não lhe assiste razão. Como sabemos, para que estejamos perante a figura da duplicação de colecta, para efeitos do artigo 204º, do CPPT, é necessário que se verifique que um tributo esteja pago por inteiro e que se exija da mesma ou de diferente pessoa um outro tributo de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo (cfr. artigo 205º do CPPT).

Como facilmente de percebe, o alcance da duplicação de colecta é obstar a que seja repetida a cobrança de um mesmo tributo. Ora, não se provando documentalmente que haja sido efectuado o pagamento nem que lhe seja exigido novo pagamento de IVA referente ao mesmo período temporal, não há identidade do facto tributário nem do tributo.

Diz ainda, a Impugnante que a liquidação de Juros compensatórios não se encontra fundamentada, por não darem a conhecer o nexo de causalidade entre o seu comportamento e o retratamento da liquidação, a censurabilidade da sua conduta e o cálculo e a taxa de juros aplicável.

Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 09.03.2016, proferido no processo n.º 805/15: «O direito à fundamentação, relativamente aos actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, decorria já do art. 1º, nº 1, als. a) e c) do DL nº 256-A/77, de 17/6 e tem hoje consagração constitucional de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias consagrados no Título II da parte 1ª da CRP - art. 268º (Vejam-se a abundante jurisprudência do STA atinente a esta matéria bem como Gomes Canotilho e Vital Moreira, «Constituição da República Portuguesa Anotada», 1993, pp. 936 e Vieira de Andrade, «O Dever de Fundamentação Expressa dos Actos Administrativos», 1990, pp. 53 e ss.) - tendo o respectivo princípio constitucional sido densificado nos arts. 124º e 125º do CPA, no art. 21.º do CPT e, posteriormente, nos arts. 77º nºs. 1 e 2 da LGT (acto administrativo tributário).

E dado que este dever legal de fundamentação tem, «a par de uma função exógena - dar conhecimento ao administrado das razões da decisão, permitindo-lhe optar pela aceitação do acto ou pela sua impugnação -, uma função endógena consistente na própria ponderação do ente administrador, de forma cuidada, séria e isenta.» (ac. deste STA, de 2/2/2006, rec. nº 1114/05), então, essa fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio acto (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do acto um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.

A falta ou insuficiência de fundamentação do acto, vício de natureza formal (e não substancial), verifica-se, pois, quando o respectivo acto não exterioriza de modo claro, suficiente e congruente, as razões por que apresenta determinado conteúdo decisório: o acto só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto administrativo (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto, sendo, portanto, essencial que o discurso contextual lhe dê a conhecer todo o percurso da apreensão e valoração dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido e não em qualquer outro. Ela visa «esclarecer concretamente as razões que determinaram a decisão tomada e não encontrar a base substancial que porventura a legitime, já que o dever formal de fundamentação se cumpre “pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis, enquanto a fundamentação substancial exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo”. O discurso fundamentador tem de ser capaz de esclarecer as razões determinantes do acto, para o que há-de ser um discurso claro e racional; mas, na medida em que a sua falta ou insuficiência acarreta um vício formal, não está em causa, para avaliar da correcção formal do acto, a valia substancial dos fundamentos aduzidos, mas só a sua existência, suficiência e coerência, em termos de dar a conhecer as razões da decisão.» (Cfr. Vieira de Andrade – ob. cit. pág. 239, na citação do ac. do STA, de 11/12/2002, rec. 01486/02.)» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt) .

Significa isto que é essencial que o discurso expresso e externado pelo autor do acto dê a conhecer ao seu destinatário, pressuposto este como um destinatário normal ou razoável, todo o percurso da apreensão e valoração dos pressupostos de facto e de direito que foram a sua motivação orgânica ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido e não em qualquer outro.

Relativamente aos juros compensatórios, entendemos que as exigências de fundamentação podem ser reduzidas ao mínimo, mas que esse mínimo de fundamentação deve conter a referência ao imposto sobre que são liquidados os juros bem como a indicação da taxa aplicada e o período de tempo em que são devidos esses juros sem necessidade, no entanto, de referência à norma que possibilita a liquidação dos mesmos, pois só assim o sujeito passivo saberá como foi feita essa liquidação para se poder conformar ou não com a mesma. A simples referência, nas notas de liquidação, à norma constante do CIVA, sem indicação dos elementos acabados de referir, não satisfaz as exigências legais de fundamentação.

Acontece, porém, que a fundamentação da liquidação dos juros compensatórios aqui questionada, é constante da nota de liquidação de fls. 18, nas quais consta o período de tempo (2003/05/15 a 2006/08/18) em que os juros são exigíveis, a taxa aplicável ( a equivalente à taxa dos juros legais fixada nos termos do n.º1 do artigo 559.º Código Civil), o montante do imposto sobre que incidem os juros (35.001,08 €) e que foram «liquidados nos termos dos artigos 89.º do CIVA e 35,º da LGT, por ter sido retratada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto por facto imputável ao sujeito passivo.» Perante este quadro, concluímos, que no presente caso está cumprido o dever legal de fundamentação.

Improcede, por isso, a impugnação, com a consequência de manutenção dos actos tributários sindicados.

IV.CONCLUSÕES

I.O direito à fundamentação dos actos tributários tem assento no artigo 268.º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa e encontra-se concretizado pelo legislador ordinário no artigo 77.º da LGT e artigo 125.º do CPA (na redacção aplicável à data dos factos).

II.O acto tributário de liquidação adicional efectuado nos termos do artigo 87.º do CIVA encontra-se suficientemente fundamentado quando exprime em termos claros, suficientes, congruentes e inteligíveis o critério legal e a motivação da mesma.

III.A fundamentação de uma liquidação de juros compensatórios deve dar a conhecer, pelo menos, o montante de imposto sobre o qual incidem os juros, a taxa ou taxas aplicáveis e o período da sua contagem.

V.DECISÃO

Face ao exposto, acordam, os Juízes que integram a 1ª Subsecção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e, conhecendo em substituição, julgar improcedente a presente impugnação judicial.

Custas a cargo da Recorrida.


Lisboa, 25 de Junho de 2020


[Ana Pinhol]

[Isabel Fernandes]

[Jorge Cortês]