Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1727/10.4BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/04/2020
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:IMI-CONVENÇÃO DE VIENA SOBRE RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS.
Sumário:1. A isenção de tributação consagrada no artº. 23, nº.1, da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, porque não é uma isenção segundo o conceito tradicional, mas um privilégio de direito internacional que afasta a aplicação aos locais de missão da legislação interna em matéria tributária, enquadra-se no fundamento de oposição previsto no artº. 204/1-a), do CPPT.

2. Nos termos do n.º 2 artº. 8º da CRP, as normas de convenção internacional, quando regularmente adotadas pelo Estado Português e publicadas na forma legal, prevalecem sobre o direito interno infraconstitucional, em tudo o que seja conflituante com este, motivo por que os Tribunais devem recusar a aplicação de lei ou norma jurídica que viole tratado internacional a que Portugal se tenha vinculado.

3. Nos termos do artº 23º/1, da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, tanto o Estado acreditante, como o Chefe da Missão estão isentos de todos os impostos e taxas, nacionais, regionais ou municipais, sobre os locais da missão de que sejam proprietários ou inquilinos, excetuados os que representem o pagamento de serviços específicos que lhes sejam prestados, portanto os impostos indiretos.

4. Esta imunidade que se consubstancia na dita isenção de todos os impostos e taxas incidentes sobre os locais da missão de que sejam proprietários ou inquilinos, igualmente é extensiva ao pessoal administrativo e técnico da missão, nos termos do art.º 37º/2, da citada Convenção.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

RECORRENTE: Exmo. Representante da Fazenda Pública.
RECORRIDO: Embaixada ............
OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a oposição deduzida contra a instauração da execução fiscal para cobrança de IMI relativo a 2009.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
A) A douta decisão de que se recorre, não traduz uma correta interpretação e aplicação da lei e do direito, em prejuízo da recorrente, na parte em que considerou que “… o artigo 23º da Convenção de Viena não estabelece, em rigor, uma isenção, enquanto benefício fiscal, que contende com a legalidade concreta do acto de liquidação, mas, antes, um privilégio de direito internacional, equiparável a uma situação de não tributação, na medida em que “isenta” os locais da missão de todo e qualquer imposto, o que impede o estabelecimento da relação tributária. Por essa razão, a violação da norma da Convenção de Viena que consagra esse privilégio constitui fundamento enquadrável na alínea a) do nº 1 do artigo 204º do CPPT”.

B) A norma da alínea a) do nº 1, do art.º 204º do C PPT, preconiza que: “A oposição só poderá ter algum dos seguintes fundamentos: a) Inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respetiva liquidação;”

C) Seguindo os ensinamentos de JORGE LOPES DE SOUSA, in Código de Procedimento e Processo Tributário, Anotado e Comentado, p. 443 e ss.: “…na alínea a) do n.º 1 deste artigo prevê-se como fundamento de oposição à execução fis cal a inexistência do tributo nas leis em vigor à data dos factos a que respeita ou não estar autorizada a sua cobrança à data da liquidação, se se tratar de um tributo relativamente ao qual ela dependa de autorização.

“Está-se, aqui, perante aquilo que doutrinal e jurisprudencialmente se designa por ilegalidade abstracta ou absoluta da liquidação, que se distingue da «ilegalidade em concreto» por na primeira estar em causa a ilegalidade do tributo e não a mera ilegalidade do acto tributário ou da liquidação;

isto é, na ilegalidade abstracta a ilegalidade não reside directamente no acto que faz aplicação da lei ao caso concreto, mas na própria lei cuja aplicação é feita, não sendo, por isso, a existência de vício dependente da situação real a que a lei foi aplicada nem do circunstancialismo em que o acto foi praticado.”

D) Pelo que, dúvidas não podem restar de que, in casu, estamos perante um caso de ilegalidade em concreto e não em abstrato.

E) Na verdade, para estarmos perante ilegalidade em abstrato, terá de ser apreciada a própria lei que é objeto de aplicação e não a liquidação, o u seja, não se reporta ao ato relativo à aplicação da lei ao caso concreto.

F) Ora, o ato de liquidação subjacente à presente execução fiscal, foi emitido em conformidade e seguindo as diretrizes que o Código do IMI impõe. Sucede que nem o CIMI, nem qualquer concreta norma constante do mesmo, padece de ilegalidade, seja por postergação de Lei Fundamental, seja por violação de tratado ou Convenção de Direito Internacional.

G) Assim, não padecendo a lei em vigor, no momento da prática do ato tributário em crise e a este subjacente, de qualquer vício, não poderá ser qualificada como ilegalidade abstrata.

H) O que a oponente pretendeu, ainda que de forma encapotada, sempre foi discutir a legalidade em concreto, o que, na esteira do entendimento uniforme dos nossos tribunais superiores, bem sabemos que não se afigura possível em sede de oposição à execução fiscal. Na verdade, aquando da notificação da nota de liquidação deveria, a ora oponente, ter lançado mão de impugnação judicial pois nessa sede teria cobertura legal atacar o pretendido, erradamente, por esta, em sede de oposição à execução fiscal.

I) Também, não pode deixar de aqui se trazer à colação, o basilar princípio da igualdade, que foi postergado e desrespeitado neste caso concreto da recorrente, desse modo se violando também e de forma ostensiva a Lei Fundamental.

J) De facto, a Convenção de Viena sobre as relações diplomáticas postula uma verdadeira isenção, contrariamente à qualificação jurídica dada pelo tribunal “a quo”, pelo que, mal se compreende que uma isenção resultante de direito interno, máxime benefício fiscal, se o contribuinte não impugnar uma liquidação erradamente emitida, o mesmo já não possa, como não pode, em sede de oposição à execução fiscal alegar a ilegalidade em abstrato, e outrossim, uma isenção resultante de convenção internacional já seja concedida toda esta panóplia de direitos de defesa.

K) Destarte, a sentença recorrida, ao decidir como decidiu, consubstancia postergação de Lei Fundamental, máxime princípio da igualdade e da leg alidade.

L) A douta sentença recorrida, também, não fez uma correta interpretação e aplicação da lei e do direito, em prejuízo da ora recorrente, porquanto, a oposição é uma contra-ação e àquele que invoca um direito cumpre fazer prova do mesmo, pelo que o ónus da prova impende sobre a oponente, ora recorrida.

M) Para provar a factualidade que aduziu na PI da oposição, a oponente, ora recorrida, juntou declarações várias, emitidas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, alegando, nos termos do art.º 371º do Código Civil, que constituem prova plena dos factos neles descritos.

N) A este propósito importa referir, que o documento e a declaração que incorpora consubstanciam realidades distintas, pois um documento é uma coisa e a declaração contida é outra, sendo o primeiro um papel onde se exaram certos dizeres e o segundo a declaração é um ato.

O) Não basta que o documento tenha sido exarado com a observância das formalidades legais e dentro da competência das autoridades públicas, mas também que tenha sido exarado por quem tenha competência em razão do lugar e da matéria.

P) Neste pendor, o exarado nos documentos juntos com a PI de oposição, “… pelo que deverá ser concedida isenção à Embaixada ............ em Lisboa respeitante aos imóveis de que a República de Angola é proprietária sitos (…)” , não pode ser considerado, por extravasar o seu círculo de competências, pois que quem tem competência para decidir sobre a isenção de IMI é o Ministério das Finanças, e neste caso concreto, a AT.

Q) Acresce que, por um lado, a declaração nada prova quanto ao destino dado aos imóveis e por outro não é o órgão competente para reconhecer a isenção, pelo que, nos termos do art.º 363º, n.º 2 do Código Civil, “autênticos são os documentos exarados, com as formalidades legais pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividades que lhe é atribuído (…).” E ainda o art.º 269º, n.º 1 do mesmo Código, “o documento só é autêntico quando a autoridade ou oficial público que o exara for competente, em razão da matéria e do lugar, e não estiver legalmente impedido de o lavrar.”, não tendo competência material, não tem relevância probatória, pelo menos não pode ser considerado documento autêntico.

R) A este respeito veja-se o que diz J.M. Gonçalves Sampaio, in A Prova Por Documentos Particulares, em que cita VAZ SERRA, “Provas”, BMJ, n.º 111, nº 62, “ era um documento autêntico, nos termos do artigo 363.º, n.º 2, o atestado de residência ou de pobreza passado por uma Junta de Freguesia, mas já o não era o atestado em que a Junta declarasse que tinha pago certa dívida, por não ter sido exarado d entro do círculo de actividade.”

S) Assim, parece-nos que, de forma cabal, não fez a oponente quaisquer alegações de factos que logrem provar o direito que se arrogou.

T) Na verdade, a AT não aceita que os imóveis, que estão subjacentes à liquidação de IMI em causa, estejam, efetivamente, isentos, por não preencherem todos os legais pressupostos, recaindo sobre a oponente a prova de que tais legais pressupostos preenchidos de encontram.

U) É mister referir que a AT não aquiesceu ao pretendido, pela oponente, ora recorrida, pelo facto das frações em causa, que subjazem à liquidação de IMI, não prosseguirem as finalidades da missão, tal como definidas no art.º 3.º da Convenção, e por consequência não são locais da missão.

V) Pelo que, sendo a oposição uma contra-acção e àquele que invoca um direito cumpre fazer prova do mesmo, pelo que o ónus da prova impende sobre a oponente, porquanto, não o fazendo, a sua pretensão deveria naufragar in tottum.

W) Assim, ao decidir como decidiu, o respeitoso Tribunal “a quo”, não considerou as regras do ónus da prova, incorrendo em intolerável inversão d aquele ónus e em errónea interpretação e aplicação das normas legais supra aduzidas aos factos.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser admitido e julgado procedente o presente recurso e revogada a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que julgue improcedente a oposição à execução fiscal, com as legais consequências.


CONTRA ALEGAÇÕES.

O Recorrido contra alegou e concluiu:

A. A sentença sob recurso não merece qualquer censura.
B. A Recorrente fundamenta o seu recurso na nulidade da sentença por erro de julgamento, por errada aplicação do direito aos factos, pelo Tribunal a quo. Não lhe assiste razão.
C. Sob a epígrafe de erro de julgamento por errada aplicação do direito aos factos, pretende a Recorrente, na verdade, impugnar a matéria de facto, num recurso interposto para o Supremo Tribunal Administrativo que se cinge, exclusivamente, a matéria de direito. Na realidade, a Recorrente não alega um erro na aplicação do direito aos factos, mas sim um erro de julgamento da matéria de facto.
D. Mesmo quanto a este último, também não lhe assiste razão, pois o tribunal a quo não incorreu em erro de julgamento.

E. Primeiro: o tribunal a quo não violou as regras relativas ao ónus da prova. A Recorrida alegou, em oposição à execução, que os imóveis objecto de tributação em sede de IMI estavam afectos à missão diplomática, o que, sendo um facto público e notório, foi ademais confirmado pelas Declarações emitidas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros. Tanto os factos alegados pela Recorrida como os documentos, por esta juntos, não foram objecto de impugnação pela Recorrente, que os aceitou.
F. Segundo: as declarações juntas aos autos não foram exaradas por entidade incompetente. A isenção que o artigo 32.º da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas encerra é uma norma de Direito Internacional Público (que rege as relações entre os Estados). O Direito Fiscal rege as relações jurídicas tributárias. Cabe ao Ministério dos Negócios Estrangeiros (e não ao Ministério das Finanças) representar o Estado Português nas relações com outros Estados, nomeadamente a República de Angola.
G. A Embaixada ............ em Portugal é uma representação, em Portugal, da República de Angola. O interlocutor com a Embaixada, por Protocolo do Estado, é o Ministério dos Negócios Estrangeiros, não o Ministério das Finanças, nem a AT e muito menos o Serviço de Finanças Lisboa - 8 que tem instaurado, repetidamente e sem sucesso, estes processos de execução fiscal, e que, perdendo na primeira instância, protela, numa evidente má-fé incompatível com a actuação da administração pública, o trânsito em julgado da decisão com recursos inúteis para a última instância.

H. O Ministério dos Negócios Estrangeiros é a entidade competente para conhecer da verificação de uma "isenção" prevista em normas de Direito Internacional Público (ademais assente no princípio da reciprocidade, que é o princípio basilar das relações entre Estados), e da afectação ou não de determinado imóvel à missão diplomática de um outro Estado. Razão pela qual não merece qualquer censura o julgamento do tribunal a quo sobre a prova documental oferecida pela Recorrida, nomeadamente no que diz respeito à utilização e destino dos imóveis objecto da tributação - que o Ministério dos Negócios Estrangeiros atesta serem, todos eles, "para uso habitacional dos membros da Missão Diplomática Angolana".
I. A AT é incompetente para conhecer da "isenção" do artigo 23.º da Convenção de Viena que, erradamente, apelida de isenção de IMI, ou isenção fiscal. Esta não é uma isenção fiscal, mas sim uma subtracção, por norma de direito internacional público (de valor supra-legal), ao poder tributário do Estado português. A isenção que o artigo 23.º, n.º 1, prevê, não é uma isenção tributária, no sentido que lhe é dado na lei fiscal, e que a AT conhece.
J. O artigo 23.º, n.º 1, da Convenção de Viena sobre as Relações Diplomáticas, vigora na ordem interna (Decreto-Lei n.º 48295), vincula internacionalmente o Estado Português (artigo 8.º, n.º 2 da Constituição) e prevalece sobre o direito ordinário interno, nomeadamente sobre o Código do IMI ou o artigo 44.º do EBF.
K. O que significa que a Embaixada ............ em Portugal não é sujeito passivo do imposto que a AT coercivamente exigiu e que cuja inexigibilidade, por ilegalidade, se alegou nos presentes autos. Vigorando a mencionada Convenção na ordem jurídica portuguesa, não existe, sequer, norma de incidência tributária. Noutras palavras, a "isenção" prevista no artigo 23.º, n.º 1 da Convenção "isenta" a República de Angola do pagamento do IMI antes mesmo de sobre esta incidir qualquer norma tributária de direito ordinário. Em termos tais que poderia falar-se, em vez de isenção, numa subtracção ao poder tributário (e, logo, numa expressão que é querida à Fazenda Pública, "ao círculo de competências da AT").
L. O ordenamento jurídico português é um. Não existe um ordenamento jurídico fiscal, outro Constitucional e um terceiro que é o que decorre dos Tratados Internacionais.
M. Considerando que a Convenção de Viena para Relações Diplomáticas vigora no ordenamento jurídico português (com força supra legal e infra constitucional), a isenção prevista no artigo 23.º, n.º 1, da Convenção é independente de qualquer reconhecimento pela Administração Fiscal, tratando-se de benefícios não sujeitos a qualquer condicionantes e automáticos.
N. Face ao Direito Internacional Convencional não poderá existir norma de incidência tributária tendo por sujeito passivo a República de Angola (ou a sua Embaixada em Portugal) e por objecto os imóveis sua propriedade que sejam locais de missão. A República de Angola não é sujeito passivo de imposto em Portugal!
O. Pelo artigo 8.º, n.º 2, da Constituição, a vigência do Direito Internacional Convencional na ordem interna está dependente da verificação de duas condições: a publicação no jornal oficial e a regularidade do processo da sua conclusão por Portugal.

P. Da vigência na ordem jurídica portuguesa da Convenção de Viena, da sua adesão pela República de Angola, do valor supra legal (e infra Constitucional) que o Direito Internacional Convencional ocupa na hierarquia das fontes do direito português, deduz-se que qualquer lei ordinária, anterior ou posterior, que contrarie o disposto naquela Convenção é ineficaz. Ineficácia que se traduz na inaplicabilidade ou seja na recusa da sua aplicação pelos Tribunais, enquanto a Convenção em causa vincular Portugal (cfr. Manual de Direito Internacional Público, André Gonçalves Pereira e Fausto Quadros, 3.ª Edição, Almedina, págs. 119 e ss.).
Q. O conceito de isenção consagrado no artigo 23.º, n.º 1, da Convenção é o de um privilégio de direito internacional, decorrente da imunidade diplomática. Como tal, impede que se estabeleça uma relação tributária em tudo o que diga respeito às missões diplomáticas. Ou seja, impede a aplicação a estas entidades da lei nacional em matéria de definição e fixação da tributação. A norma contida no artigo 23.º, n.º 1 da Convenção afasta a norma tributária que seria aplicável. Consequentemente, o Estado acreditante não pode ser contribuinte no Estado português.
R. O que encontra a sua justificação no facto de pagamento de impostos ser um acto de sujeição, incompatível com a soberania dos Estados. Tal como é incompatível, quer com o privilégio estabelecido na Convenção, quer com a soberania dos Estados, reconduzir o imperativo convencional a um benefício fiscal, nomeadamente para efeitos do artigo 44.º, n.º 1, alínea a), do EBF. Razão pela qual é também inconstitucional qualquer interpretação do artigo 44.º do EBF sempre que o mesmo condicione a plena aplicação do artigo 23.º, n.º 1, da Convenção reconduzindo-o a um benefício fiscal, dependente de um despacho emitido pelo poder tributário do Estado Acreditador e afastando a sua natureza de privilégio de direito internacional.

Termos em que deve ser julgado totalmente improcedente o recurso interposto pela Fazenda Pública, confirmando-se a sentença recorrida, tudo com as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA!»

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela procedência do recurso e revogação da sentença recorrida, referindo em abono da sua posição o ac. deste TCA proferido no processo n.º 1505/06, em matéria de CA do ano de 2000, não se equacionando qualquer questão nova que determine a alteração da Jurisprudência fixada, salvo melhor decisão.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se ao julgar procedente a oposição a sentença errou no julgamento de facto e na respetiva subsunção ao direito.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

A) Em 25 de Maio de 2010, o Serviço de Finanças de Lisboa 8 instaurou, contra a ora oponente, o processo de execução fiscal nº ............, para cobrança coerciva de dívida proveniente de IMI relativo à 1ª prestação do ano de 2009 incidente sobre as fracções autónomas “C” a “Q” do artigo matricial nº ............ ...., da freguesia do Lumiar, correspondente ao prédio sito na Rua ......................, em Lisboa, no montante de €4.107,52 e acrescido (cfr. autuação e certidão de dívida, a fls. 1 a 3 do processo de execução fiscal apenso, e documento de cobrança, a fls. 39 e 40 dos autos);

B) A ora oponente foi citada da instauração da execução fiscal em 5 de Junho de 2010 (cfr. informação oficial e aviso de citação, a fls. 3, 4 e 38 dos autos);

C) Em 1 de Julho de 2010 foi apresentada, no Serviço de Finanças de Lisboa 8, a presente oposição à execução fiscal (cfr. carimbo aposto na p.i., a fls. 6 dos autos);

D) Por escritura pública lavrada, em 16 de Dezembro de 1988, no 21º Cartório Notarial de Lisboa, a República Popular de Angola declarou comprar, livres de ónus e encargos, a E ...................... e esposa e a F...................... e esposa, que declararam vender, 16 fracções autónomas identificadas pelas letras “A”, “B”, “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “L”, “M”, “N”, “O”, “P” e “Q”, correspondentes ao rés-do-chão, 1º, e 2º a 8º andares direitos e esquerdos, perfazendo a totalidade do prédio em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ......................, freguesia do Lumiar, em Lisboa, referido em A) que antecede (cfr. cópia da escritura de compra e venda, a fls. 17 a 28 dos autos);

E) Na escritura pública mencionada na alínea antecedente foi, ainda, declarado que as fracções “A” e “B” se destinavam à instalação dos serviços culturais e administrativos e as demais a habitação de pessoal diplomático, consular ou administrativo da Embaixada ...................... (cfr. cópia da escritura de compra e venda, a fls. 17 a 28 dos autos);

F) Em 24 de Setembro de 2013 foram emitidas, pelo Chefe do Protocolo do Estado, da Secretaria Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, declarações no sentido da existência de reciprocidade de tratamento no que respeita à isenção do IMI sobre imóveis para uso habitacional dos membros da missão diplomática angolana, para efeitos de isenção de IMI relativa às fracções “C” a “Q” (correspondentes à fracção esquerda e à fracção direita sitas do segundo ao oitavo andar) do imóvel identificado em A) que antecede (cfr. declarações, a fls. 90 a 104 dos autos).

*

Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.

*

A decisão da matéria de facto assenta na análise dos elementos constantes dos autos e do processo de execução fiscal apenso, nomeadamente das informações oficiais e dos documentos juntos, não impugnados, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

A Embaixada...................... deduziu oposição contra o processo de execução fiscal n.º ............ instaurado para cobrança de IMI/2009 no valor de € 4.107,52 referente ao artigo matricial n.º ............ ...., letras C a Q, alegando em síntese, a falta de citação por não ter sido observado o n.º 2 do art.º 41º da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, bem como não ter sido citada em representação da República de Angola. Além disso, os imóveis destinam-se a residência do pessoal diplomático e Consular da sua Embaixada e do Consulado Geral de Angola em Lisboa pelo que por força do art. 23º da Convenção de Viena, o Estado acreditante e o Chefe de Missão estão isentos de todos os impostos e taxas adicionais sobre os locais da missão de que sejam proprietários. Assim, Portugal não pode emitir normas de tributação de imóveis pertencentes a Estados estrangeiros aderentes à Convenção de Viena, como é o caso da Republica de Angola.

A Autoridade Tributária defendeu-se por exceção dizendo, em síntese, que a nulidade da citação não é fundamento de oposição e que os fundamentos alegados também não constituem fundamento de oposição.

A sentença julgou procedente a oposição e ordenou a extinção da execução fiscal.

Interposto recurso para o STA, a sentença foi revogada para ampliação da matéria de facto visando a fixação de factualidade relativa ao destino dado às frações em causa.

Cumprido o determinado no douto acórdão do STA, foi proferida nova sentença dando procedência à oposição.

A AT não se conforma. Discorda da factualidade provada na medida em que os documentos em que se alicerçou, emitidos pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, se limitam a referir que existe reciprocidade de tratamento no que respeita à isenção de IMI sobre imóveis para uso habitacional dos membros da Missão Diplomática e Consular do Estado português em Angola...”
Além disso, a Oponente pretendeu discutir a legalidade em concreto da dívida, não o podendo fazer em processo de oposição.

No que respeita ao erro de julgamento alega a AT que a declaração do Ministério dos Negócios Estrangeiros que alude à reciprocidade de tratamento (entre a Embaixada ............ em Portugal e a embaixada da República Portuguesa na República de Angola) segundo a qual, por essa razão, deveria ser concedida isenção à Embaixada ............, não pode ser considerado por extravasar o seu círculo de competências.

Mas não é isso que está em causa nos autos. Não é a questão da reciprocidade no tratamento fiscal das frações adquiridas pela República de Angola para instalação da sua embaixada e dos respetivos serviços, nem a declaração de que, por isso, deveria ser concedida isenção à Embaixada.

O que releva é saber qual o destino das frações em causa, e quanto a isso não restam dúvidas, pois as alíneas E) e F) dos factos provados bem esclarecem, baseando-se no conteúdo da escritura pública de aquisição, que se destinam a instalação dos serviços (frações “A” e “B”) e as restantes a habitação do pessoal diplomático consular ou administrativo.

Diz a AT que o documento e a declaração que incorpora são realidades distintas, pois um documento é uma coisa e a declaração contida é outra.

Isso está certo. Só estão cobertos pela força probatória plena dos documentos autênticos (art. 369º Código Civil) os fatos que referem ter sido praticados pela autoridade ou oficial púbico respetivo. Daí que a declaração do destino das frações, não sendo uma declaração efetuada pelo oficial público, não estaria coberta pela prova plena.

Mas o facto de tal declaração não beneficiar de prova plena (apenas ilidível mediante arguição e prova de falsidade – cfr. art.º 372º/1 do Código Civil) não significa que o facto não esteja provado.

Como resulta do conteúdo da sentença recorrida a fundamentação da douta sentença tomou tal facto como provado, como resulta expressamente da seguinte passagem: “Ora, resulta da matéria de facto considerada provada nos autos (cfr. alínea D supra) que os imóveis objecto de tributação se destinavam a habitação do pessoal diplomático, consular ou administrativo da Embaixada ............ em Portugal.”

De resto, em face do art. 74º/1 LGT e do que dispõe o n.º 1 do art. 23º da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, celebrada em 18 de abril de 1961, aprovada para adesão por decreto n.º 48295, de 27/3/1968, e que nos termos do art. 8º da Constituição vigora na ordem jurídica portuguesa, independentemente de outra formalidade, não é a Oponente que está onerada com o ónus da prova do destino dado às frações, mas sim a AT, que deveria provar a factualidade que lhe confere o direito ao estabelecimento da relação tributária com a República de Angola, ao contrário do expressamente alega, (Conclusão L), já que como bem salientou o Acórdão do STA proferido no processo n.º 187/15, de 17/6/2015, não faz sentido, neste caso, falar em isenção tributária.

Sobre as restantes questões suscitadas neste recurso, este TCA já teve oportunidade de se pronunciar várias vezes, destacando-se o Acórdão proferido em 09/03/2017, no âmbito do processo nº 709/12, em processo semelhante ao dos autos, cuja fundamentação sufragamos na íntegra, e que com a devida vénia transcrevemos:

“Igualmente defende o recorrente que os imóveis que subjazem às liquidações de I.M.I. que constituem a dívida exequenda não prosseguem as finalidades da missão, tal como definidas no artº.3, da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, e, por consequência, não são locais da missão, sendo que o Tribunal “a quo” lavrou em erro de interpretação e aplicação do direito. Em sede de exame do presente vector da apelação deve começar este Tribunal por relembrar que a decisão recorrida enquadrou o fundamento da presente oposição no artº.204, nº.1, al.a), do C.P.P.T., mais concluindo pela ilegalidade abstracta da dívida exequenda, tudo conforme já aludido supra.

O citado preceito tem a seguinte redacção:

ARTIGO 204.º
(Fundamentos da oposição à execução)

1 - A oposição poderá ter algum dos seguintes fundamentos:

a) Inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação;

b) (…)

No artº.204, nº.1, al.a), do C.P.P.Tributário, primeira parte da norma, é enquadrável qualquer ilegalidade substantiva agravada (absoluta ou abstracta) como é a eventual ilegalidade do diploma criador do tributo que constitui a dívida exequenda. Está-se, aqui, perante aquilo que doutrinal e jurisprudencialmente se designa por ilegalidade abstracta ou absoluta da liquidação, a qual se distingue da “ilegalidade em concreto” por na primeira estar em causa a ilegalidade do tributo e não a mera ilegalidade do acto tributário ou da liquidação concretamente levada a efeito. Isto é, na ilegalidade abstracta a ilicitude não reside directamente no acto que faz aplicação da lei ao caso concreto, mas na própria lei cuja aplicação é feita, não sendo, por isso, a existência de vício dependente da situação material a que a lei foi aplicada nem do circunstancialismo em que o acto foi praticado. Por outras palavras, o vício não se refere ao concreto acto de liquidação, mas antes se reportando à ilegalidade da norma em que o mesmo acto tributário se baseia (cfr.A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.590 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.322 e seg.; João António Valente Torrão, C.P.P.Tributário anotado e comentado, Almedina, 2005, pág.787; Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.67 e seg.).
Concluindo, deve considerar-se que cabem no citado conceito de ilegalidade abstracta ou absoluta da liquidação todos os casos de actos que aplicam normas que violam regras de hierarquia superior, designadamente, além das normas constitucionais, as de direito comunitário ou internacional vigente em Portugal, tal como normas legislativas de direito ordinário quando é feita aplicação de normas regulamentares (cfr.ac.S.T.A.-Plenário, 7/4/2005, rec.1108/03; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/4/2012, proc.4796/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/2/2013, proc.6195/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.443 e seg.).
Por último, sempre se dirá que a inexistência de imposto a que faz menção a norma sob exegese se refere à inexistência do tributo nas leis em vigor à data dos factos, a qual, afectando a própria lei, não depende do acto que faz a aplicação ao caso concreto (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 5/7/2007, rec.129/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/2/2013, proc. 6195/12). Já a segunda parte da alínea a), do nº.1, deste artº.204, se refere à falta de autorização de cobrança na data em que ocorreu a liquidação, visando concretizar as normas constitucionais que fazem depender a possibilidade de cobrança de receitas de prévia inscrição no Orçamento do Estado (que inclui o orçamento da segurança social) da discriminação das receitas que, anualmente, o Estado está autorizado a cobrar (cfr.artº. 105, da C.R.P.). Assim, a falta de inscrição orçamental de receita liquidada sujeita a tal inscrição constitui um vício do acto tributário gerador da sua ilegalidade abstracta, equiparável aos vícios de inexistência do tributo nas leis em vigor, consagrados na primeira parte da mesma norma (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/2/2013, proc.6195/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.451).
Revertendo ao caso “sub judice”, a isenção de tributação consagrada no artº.23, nº.1, da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas(1), porque não é uma isenção segundo o conceito tradicional, mas um privilégio de direito internacional que afasta a aplicação aos locais de missão da legislação interna em matéria tributária, enquadra-se no fundamento de oposição previsto no artº.204, nº.1, al.a), do C.P.P.T. E recorde-se que nos termos do artº.8, nº.2, da C.R.P., as normas de convenção internacional, quando regularmente adoptadas pelo Estado Português e publicadas na forma legal, prevalecem sobre o direito interno infraconstitucional, em tudo o que seja conflituante com este, motivo por que os Tribunais devem recusar a aplicação de lei ou norma jurídica que viole tratado internacional a que Portugal se tenha vinculado (cfr.ac.S.T.A.- 2ª.Secção, 17/6/2015, rec.187/15; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 25/6/2015, rec.464/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2014, proc.7445/14; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 1º. Volume, Coimbra Editora, 2007, pág.255 e seg.). Nesta vertente deve, portanto, confirmar-se a decisão do Tribunal “a quo”, a qual igualmente enquadrou o fundamento da oposição deduzida pela entidade recorrida no examinado artº.204, nº.1, al.a), do C.P.P.T. Por último, deve este Tribunal examinar se os imóveis que subjazem às liquidações de I.M.I. que constituem a dívida exequenda não prosseguem as finalidades da missão, tal como definidas no artº.3, da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, e, por consequência, não são locais da missão, conforme defende o recorrente, tudo levando em consideração a factualidade provada.

A citada Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, celebrada em Viena em 18 de Abril de 1961 e que entrou em vigor a 24 de Abril de 1964, nos termos do seu artº.51, é um tratado internacional que regula os direitos e deveres dos Estados na condução das relações diplomáticas entre si e o regime das missões diplomáticas, tendo sido aprovada pelo Estado Português através do dec.lei 48295, de 27/03/1968, e pela ... através da resolução nº.3/91 da Assembleia ... (actual Assembleia Nacional ...), de 16/3/1991.

A expressão missão diplomática designa o conjunto de pessoas nomeadas por um Estado (Estado acreditante) para exercer, sob a autoridade de um chefe de missão, funções de caráter diplomático no território de um Estado estrangeiro (Estado acreditado ou receptor), mas na prática significa o local onde as pessoas designadas pelo Estado acreditante trabalham. De harmonia com o artº.3, da Convenção, as funções de uma missão diplomática consistem, entre outras, em representar o Estado acreditante perante o Estado acreditado ou receptor. Por sua vez, nos termos do artº.1, al.i), da Convenção, os "locais da missão" são “os edifícios, ou parte dos edifícios, e terrenos anexos, seja quem for o seu proprietário, utilizados para as finalidades da missão inclusive a residência do Chefe da Missão” (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2014, proc.7445/14).

O fundamento dos privilégios e imunidades das representações diplomáticas em determinado Estado receptor estão relacionados com um duplo aspecto, por um lado a representação diplomática, isto é, a imunidade soberana (imunidade “ratione materiae”) ligada aos actos oficiais dos Estados estrangeiros e, por outro, com os elementos mais vastos e sobrejacentes, todavia mais condicionantes, dos privilégios e imunidades “funcionais” do pessoal diplomático e das instalações (cfr.Ian Brownlie, Princípios de Direito Internacional Público, Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, pág.369 e seg.).

A Convenção consagra, além do mais, privilégios e imunidades. Importa precisar os conceitos de privilégio e imunidade. A imunidade diplomática traduz o conjunto de prerrogativas reconhecidas pelo Direito Internacional costumeiro e pela cortesia internacional (“comitas gentium”), concedidas aos agentes diplomáticos, na base da reciprocidade e no interesse mútuo dos Estados, que permitem o exercício completo e cabal das suas missões. Já o privilégio significa atribuir aos diplomatas e aos locais de missão um regime jurídico de excepção, isentando-os da aplicabilidade de normas ou regimes jurídicos ou concedendo-lhes vantagens que, por regra, não são concedidos aos nacionais.

Quer as imunidades, quer os privilégios, subtraem os diplomatas e os locais de missão à autoridade e à competência jurisdicional do Estado acreditado. Por isso nem sempre é fácil estabelecer a linha de fronteira entre uns e outros, considerando-se, regra geral, que a imunidade impede a sujeição a uma norma de direito interno, enquanto o privilégio determina a substituição da lei geral por uma regra especial de direito interno.

Tanto o Estado acreditante, como o Chefe da Missão estão isentos de todos os impostos e taxas, nacionais, regionais ou municipais, sobre os locais da missão de que sejam proprietários ou inquilinos, exceptuados os que representem o pagamento de serviços específicos que lhes sejam prestados, portanto os impostos indirectos (cfr.artº.23, nº.1, da Convenção; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2014, proc.7445/14; Ian Brownlie, Princípios de Direito Internacional Público, Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, pág.380). Esta imunidade que se consubstancia na isenção de todos os impostos e taxas incidentes sobre os locais da missão de que sejam proprietários ou inquilinos, igualmente é extensiva ao pessoal administrativo e técnico da missão, nos termos do artº.37, nº.2, da Convenção (cfr.Ian Brownlie, Princípios de Direito Internacional Público, Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, pág.381).

“In casu”, do exame da factualidade provada, decorre o supra citado entendimento de que a isenção/imunidade previstas nos citados artºs.23 e 37, da Convenção, consubstancia a aplicação de norma convencional internacional que afasta a aplicação aos locais de missão da legislação interna em matéria tributária, nos termos do artº.8, nº.2, da C.R.P. Aliás, este entendimento encontra-se vertido em declarações emitidas pelo Estado Português, através do Ministério dos Negócios Estrangeiros e com base no princípio da reciprocidade de tratamento, incidentes sobre os imóveis para uso habitacional dos membros da missãodiplomática ... (cfr.nº.5 do probatório).

Concluindo, está demonstrada a ilegalidade absoluta ou abstracta das liquidações de I.M.I. que constituem a dívida exequenda no âmbito do processo de execução fiscal nº...., fundamento de oposição enquadrável no examinado artº.204, nº.1, al.a), do C.P.P.Tributário. (…)”

Assim, acolhendo integralmente a fundamentação do Acórdão supra transcrito, dever-se-á negar provimento ao recurso da Fazenda Pública e confirmar a sentença recorrida.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da segunda sub-secção de contencioso Tributário deste TCAS em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrida.

Lisboa, 4 de junho de 2020.

(Mário Rebelo)
(Patrícia Manuel Pires)
(Cristina Flora)