Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03151/09
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:07/15/2009
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:APLICAÇÃO DE COIMA
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO ADMINISTRATIVA
CONTAGEM DO PRAZO DE 20 DIAS
INAPLICABILIDADE DO CPC E DO DISPOSTO NO ARTº 279º AL. E) DO C. CIVIL
Sumário:1)Embora o CPC não constitua direito subsidiário do Regime Geral das Contra-ordenações (RGCO), aquele compêndio normativo aplica-se aos antecedentes da elaboração do acórdão no tribunal de recurso sendo de aplicar no caso de junção de documentos com as alegações de recurso as normas do CPC (artºs. 523º, 524º e 706º), e sendo ainda certo que por atenção ao princípio da verdade material insíto quer no C.P. quer do C.P.P.( diplomas esses que constituem o direito subsidiário do referido RGCO) sempre seria de efectuar um juízo sobre a utilidade desse documentos para o apuramento da referida verdade material.

2) No caso o documento oferecido não podia ser junto com a petição inicial e mostra-se impositivo face à decisão recorrida da 1ª instância e, assim sendo , é de admitir a sua junção.

3) O prazo de impugnação da decisão do órgão administrativo que aplicou a coima é de 20 dias e deve ser computado, nos termos do disposto no artº.60, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, e ao mesmo, porque que não tem natureza judicial, não se lhe aplicam as regras privativas dos prazos judiciais, como são as constantes dos artºs.144, nº.1, e 145, nº.5, do C. P. Civil, ( até porque o Código de processo civil não constitui direito subsidiário do RGIT) suspendendo-se, no entanto nos dias que forem sábados, domingos e feriados.

4) Tal prazo é substantivo, peremptório e de caducidade e ao mesmo não se aplica a regra de que se terminar em férias judiciais, a prática do acto se transfere para o primeiro dia útil após o termo destas, a que se refere o artigo 279°, alínea e), 2ª parte do Código Civil, pois que os Serviços de Finanças não cumprem férias judiciais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo

1- RELATÓRIO
Isto ………….. – S………………, Ldª, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pela Mmª Juíza do TAF que rejeitou liminarmente o requerimento de interposição de recurso que havia interposto da decisão que lhe aplicou coima no processo de contra-ordenação n°…………… do Serviço de Finanças de Lisboa 1, no valor de 1.389,67€, acrescida das custas processuais, dela vem interpor recurso para este TCAS concluindo a sua alegação com as seguintes conclusões:
“ a) É falso, porque não corresponde à verdade o facto provado a alínea D da sentença ora em crise.
b) Sendo falsa a informação, de que a P.I apenas deu entrada no serviço de Finanças de Lisboa 1 em 17/01/2006, constante de documento emitido por aquele órgão da administração pública, incidente que desde já se invoca para todos os legais efeitos.
c) A ora recorrente foi notificada da decisão que aplicou a coima em 07/12/2006, a impugnação judicial foi legalmente remetida via CTT em 05/01/2006, conforme registo cuja cópia se junta.
d) O prazo, para a prática do acto é de 20 dias, sendo substantivo e peremptório, suspende-se aos Sábados, Domingos e feriados.
e) Pelo que, a P.I foi apresentada dentro do prazo legalmente estipulado para o efeito, devendo o recurso ser admitido.
Nestes termos respeitosamente requer, com o sempre muy suprimento de V.Exas. se dignem conceder provimento ao presente Recurso, e em consequência, ordenar a admissão do recurso interposto pela arguida Isto ………… – S………….., Lda da fixação da coima.

O Ministério Público junto do Tribunal recorrido, contra-alegou, concluindo como segue:
a) A arguida foi notificada da decisão que lhe aplicou a coima em 5/12/2005;
b) Querendo recorrer de tal decisão para o tribunal tributário, dispunha do prazo peremptório de 20 dias para o fazer (art. 80, n° 1, do RGIT); o qual na situação dos autos, terminava em 4/1/2006;
c)Tendo apresentado o recurso em 5/1/2006, a mesmo é intempestiva;
d) Por via de tal intempestividade, caducou o direito que a arguida pretendia exercer;
e) O douto despacho recorrido fez uma correcta interpretação e aplicação das pertinentes normas legais aos factos, motivo pelo qual deverá ser mantido
V. Excelências, negando provimento ao recurso, farão a costumada justiça”.

O EMMP, junto deste TCA-Sul, emitiu parecer do seguinte teor:
“ Falece razão à recorrente, por esta, por manifesto lapso, considerar que foi notificada da decisão de fixação da coima a 7/12/2006 –conclusão C); dos autos consta ter sido notificada a 5/12/2006 –conforme documento junto a fls. 5.A.
Toda a argumentação da recorrente fica insustentável face aos elementos factuais atrás referidos, tendo sido correctamente interpretados no despacho recorrido, que faz também uma correcta interpretação e integração dos preceitos legais aplicados.
O despacho não merece censura.
O recurso não merece provimento”

Foram colhidos os Vistos legais

2- FUNDAMENTAÇÃO
Na decisão recorrida julgou-se provada a seguinte matéria de facto:
A) Em 19-11-2005, no âmbito do processo de contra-ordenação n°…………….. do Serviço de Finanças de Lisboa 1, foi proferido despacho pelo Chefe de Finanças, que aplicou à arguida uma coima no montante de €3.703,73 (três mil setecentos e três euros e setenta e três cêntimos), acrescida de custas processuais, cominada nos artigos 114°, n°2 e 26°, n°4 do RGIT, pela prática de infracção ao disposto nos artigos 26°, n°1 e 40°, n°1, alínea a) do CIVA, por entrega fora do prazo legal da declaração periódica de IVA e respectivo meio de pagamento, relativos ao período de tributação de 2003/01(cfr. decisão de fixação de coima, a fls. 465 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);
B) Em 25-11-2005, por carta registada com aviso de recepção, foi o despacho identificado em A) notificado à recorrente, para, no prazo de vinte dias, proceder ao pagamento da coima fixada e das respectivas custas, ou, no mesmo prazo, apresentar recurso judicial da decisão de aplicação da coima (cfr. fls. 4 a 5 A dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas);
C) O aviso de recepção referido em B) mostra-se assinado e datado no dia 5-12-2005 (cfr. aviso de recepção, a fls. 5 A dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);
D) A petição do presente recurso de contra-ordenação, dirigida a este Tribunal, deu entrada no Serviço de Finanças de Lisboa 1 em 17-1-2006 (cfr. informação oficial, a fls. 18 dos autos).

3- DO DIREITO
Para indeferir liminarmente a petição de recurso a Mmª Juíza “a quo”, expendeu o seguinte discurso argumentativo :
“ (...) É a seguinte a redacção do n°1 do artigo 80° do RGTT, aprovado pela Lei n°15/2001, de 5 de Junho, sob a epígrafe Recurso das decisões de aplicação das coimas:
«1 - As decisões de aplicação das coimas e sanções acessórias podem ser objecto de recurso para o tribunal tributário de 1a instância, no prazo de 20 dias após a sua notificação, a apresentar no serviço tributário onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação».
A comunicação ao arguido das referidas decisões de aplicação de coimas revestirá a forma de notificação (artigos 46°, n°2 do RGCO e 79° do RGIT) e esta será feita nos termos das disposições correspondentes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CIPT) (artigos 35° e seguintes), conforme dispõe o artigo 70°, n°2 do RGIT.
O mencionado prazo de 20 dias para interposição de recurso judicial da decisão de aplicação de coima inicia-se com o seu conhecimento pelo arguido, o qual resultará da notificação a que alude o artigo 80°, n°1do RGIT.
Tendo na notificação sido utilizada a carta registada com aviso de recepção, tal prazo conta-se desde a data da assinatura do mesmo (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 29-3-2005, proferido no Processo n°478/05, disponível em www.dgsi.pt).
Trata-se de prazo substantivo, peremptório e de caducidade, contando-se nos termos do artigo 60°, n°s 1 e 2 do RGCO.
Não tendo natureza judicial, ao referido prazo não se aplicam as regras privativas dos prazos judiciais, como são as constantes dos artigos 144°, n°1 e 145°, n°5 do Código de Processo Civil (CPC), mas o mesmo suspende-se aos sábados, domingos e feriados (cfr. Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, m Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 2001, p. 451).
Se tal prazo terminar em férias judiciais, a prática do acto transfere-se para o primeiro dia útil após o termo destas, nos termos do artigo 279°, alínea e), 2a parte do Código Civil (neste sentido, e entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 6-5-1998 e de 21-4-1999, proferidos, respectivamente, nos Processos n°s 22496 e 23468, com sumário disponível em www.dgsi.pt).
Ora, computado nos termos supra expostos, o prazo de interposição do presente recurso teve o seu termo final no dia 4-1-2006 (primeiro dia útil após as férias judiciais), pelo que, tendo a respectiva petição dado entrada no Serviço de Finanças de Lisboa 1 apenas em 17-1-2006 (cfr. alínea D) da factualidade assente), conclui-se que é o mesmo, manifestamente, extemporâneo, por ter sido interposto muito para além do prazo legal fixado no artigo 80°, n°1 do RGIT.
Razão pela qual se impõe a sua rejeição liminar, o que se julgará de imediato, ao abrigo do disposto no artigo 63°, n°1 do RGCO, aplicável por força do disposto no artigo 3°, alínea b) do RGIT.
Nestes termos e nos das disposições legais citadas, rejeita-se liminarmente o presente recurso judicial, interposto por «Isto …………- S……………., Lda. (...)”.

DECIDINDO NESTE TCA
QUID JURIS?


A primeira questão que se impõe enfrentar, consiste em saber da possibilidade legal da junção e manutenção dos documentos que a recorrente acompanhou com as alegações de recurso e, que constituem fls. 40 a 44. Entendemos que nesta matéria ( disciplina dos antecedentes da elaboração do acórdão no tribunal de recurso têm aplicação as normas do CPC (artºs. 523º, 524º e 706º), muito embora este compêndio normativo não constitua direito subsidiário do Regime Geral das Contra-ordenaçãoes RGCO, sendo certo que por atenção ao princípio da verdade material insíto quer no C.P. quer do C.P.P.( diplomas esses que constituem o direito subsidiário do referido RGCO sempre seria de efectuar um juízo sobre a utilidade desse documentos para o apuramento da referida verdade material.
Como é evidente o que importa é a verificação do pressuposto de que os factos documentados possam ser relevantes/pertinentes à decisão a proferir. Ora, no caso, patenteia-se que os documentos apresentados com as alegações de recurso têm como razão da sua apresentação o entendimento da recorrente que a petição de recurso deu entrada no Serviço de Finanças de Lisboa 1., onde foi instaurado o processo de contra-ordenação, no prazo de vinte (20) dias, atento o disposto no artº.80, nº.1, do R. G. I. Tributárias e, para tanto esgrime a recorrente, na sua alegação, que o requerimento de interposição de recurso foi remetido em 05.01.2006, conforme o atesta o registo dos CTT, cuja cópia agora junta.

Ora, à luz das soluções jurídicas possíveis de serem dadas ao caso que aqui se controverte, àquele documento não podia ser junto com a petição inicial e mostra-se impositivo face à decisão recorrida da 1ª instância e, assim sendo , é de admitir a sua junção.

Com suporte no documento junto, pela recorrente, com as alegações do presente recurso, impõe-se, aditar ao probatório, uma nova alínea, com o seguinte teor:

E) Em 05.01.2006. a recorrente solicitou ao Chefe de Repartição do Serviço de Finanças de Lisboa 1, que enviasse ao TAF de Lisboa, seis processos de impugnação judicial de recurso da decisão administrativa de aplicação de coima, entre os quais consta o processo de contra-ordenação n°……………… (cf. cópia certificada do registo dos CTT e fotocópia do requerimento).

3- DO DIREITO:
Resulta do probatório e a recorrente não o contradiz que o Serviço de Finanças de Lisboa 1, a notificou da decisão de fixação da coima documentada a fls. 4 , em 05.12.2005 e, que nela se refere que dispõe de 20 dias, para proceder ao pagamento da coima aplicada ou recorrer judicialmente (v.g. recibo de AR, junto aos autos a fls.5), o que está em consonância com o disposto no artº 80º nº 1 do RGIT.
É consabido que aquele prazo é computado nos termos do disposto no artº.60, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, e que não tem natureza judicial, isto é, não se lhe aplicam as regras privativas dos prazos judiciais, como são as constantes dos artºs.144, nº.1, e 145, nº.5, do C. P. Civil, ( até porque o Código de processo civil não constitui direito subsidiário do RGIT) suspendendo-se aos sábados, domingos e feriados (cfr. Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 2001, pág.451; assento. S.T.J. de 2/94, de 10/3/1994, 1ª série A do D.R., de 7/5/1994; ac.ST.A.-29.Secção, 19/5/1999, rec.23404, outrossim trata-se de um prazo substantivo, peremptório e de caducidade.
E, ao contrário do sustentado na decisão recorrida se tal prazo terminar em férias judiciais, a prática do acto não se transfere para o primeiro dia útil após o termo destas, pois nos termos do artigo 279°, alínea e), 2ª parte do Código Civil, para que tal suceda é necessário que o acto sujeito a prazo tenha de ser praticado em juízo, o que não sucede no caso pois o artº 80º do RGIT refere que o recurso judicial das decisões administrativas que aplicam coimas é interposto “no prazo de 20 dias após a sua notificação, a apresentar no serviço tributário onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação” . Ora os Serviços de Finanças não têm férias judiciais e daí a não aplicação do normativo do artº 297º al. e) do C. Civil.

In casu, e como já se disse, a ora recorrente foi notificada no dia 05.12.2005 (cfr. A/R junto a fls.5) para pagar a coima ou interpor recurso no prazo de 20 dias, prazo esse que se inicia partir de 06.12.2006, e que contado nos termos supra referidos, tem o seu terminus no dia 03.01.2006 que foi dia útil.
Ora, como a recorrente alega e veio demonstrar, no documento que apresenta com a alegação recursória, praticou o acto no dia 05.01.2006, isto é, fê-lo quando o prazo de interposição de recuso já se encontrava precludido, excepção peremptória de conhecimento oficioso e que obsta ao conhecimento do mérito da causa (cfr.artº.63, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas; ac.T.C.A.-2ª.Secção, 9/2/99, Antologia de Acórdãos, ano II, ns.2, pág.274 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3a. edição, 1997, pág.457.
Esta decisão segue a linha jurisprudencial do Ac. do STA de 17/02/2007 relatado pelo Sr. Conselheiro Jorge Lino, proferido no recurso 991/06 disponível na base de dados da DGSI.
Em conclusão: não colhem os argumentos aduzidos pela recorrente para sustentar que estava em tempo para interpor o recurso, improcedendo, por isso, as conclusões de recurso e a decisão de 1ª Instância mostra-se acertada não obstante não se perfilhar, integralmente, a fundamentação em que assentou.

4- DECISÃO:
Termos em que acordam os juízes deste TCA- SUL em negar provimento ao recurso, e em confirmar a sentença recorrida, com a presente fundamentação.

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 1UC (art.ºs 92.º n.º1 do RGCO e 87.º n.º1 b) do CCJ).
ASCENSÃO LOPES
MANUEL MALHEIROS
EUGÉNIO SEQUEIRA