Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:92/06.9BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:01/13/2022
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:ANULAÇÃO OFICIOSA
ARTIGO 662º, Nº 2 DO CPC
Sumário:Estamos perante uma situação que reclama uma solução de último recurso para este Tribunal Superior, isto é, a anulação oficiosa da decisão proferida na 1.ª instância, por não constarem do processo todos os elementos que permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, considerando-se indispensável a ampliação desta – cfr. artigo 662º, nº 2 do CPC.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I – RELATÓRIO

A Fazenda Pública veio interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por M …………………………, na sequência da formação do acto tácito de indeferimento da reclamação graciosa que apresentou contra o acto de demonstração da compensação e da liquidação de juros compensatórios, respeitante a IRS (mais-valias) do ano de 2000, do qual resultou a pagar a importância de €167.504,56.

Já na pendência da impugnação foi deduzido o incidente de habilitação de herdeiros, assumindo as Requerentes, P …………………., M ………………. e T ………………….., a posição da Autora, M ……………………………………….

A Recorrente terminou a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões:

«A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos identificados que julga parcialmente procedente a impugnação deduzida pela Impugnante M ………………………… contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), referente ao ano de 2000, nº…………………….., no valor de €140.442,16, e respectiva liquidação de juros compensatórios n.º …………………. no valor de € 28.044,14.

B. Discorda a Fazenda Pública do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, e com o devido respeito, porquanto procede a uma errónea apreciação dos factos pertinentes para efeitos de decisão, com consequente erróneo enquadramento jurídico, conforme infra demonstraremos.

C. O tribunal a quo assenta a sua decisão nos factos constantes das alíneas A) a Q) do probatório, sendo que aqui impugnamos os factos que constam das alíneas B), C), D), E) e F).

D. Quanto ao facto constante da alínea B) não resulta da prova documental produzida nos autos, nem da prova testemunhal, que a “H……………………….” corresponda ao prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo …….., da freguesia de B…………., concelho de …………., não tendo sido estabelecida conexão efectiva susceptível de relacionar as alegadas obras ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …… da freguesia de B…………, e muito menos de estabelecer a correspondência entre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ………. e o prédio denominado “Herdade …………”;

E. E as testemunhas sempre se referiram no decurso do seu depoimento a “Monte ……….” e a “Monte ……….”, sem que possa das suas declarações derivar a afirmação de que o prédio urbano inscrito sob o artigo 683 corresponda ao “Monte ………….”, desconhecendo-se, pois, a que prédio em concreto, dos prédios que fazem parte integrante do prédio misto, dizem respeito as obras referidas nas alíneas B) e C) do probatório.

F. E à mesma consideração aqui sujeitamos os factos constantes das alíneas G) e H) do probatório, pois, não obstante constar das mesmos terem sido realizadas obras no prédio urbano designado “F………..” inscrito na matriz sob o artigo …., verificamos, por um lado, não resultar factualmente provada a conexão entre o prédio “F……” ou “Monte …………..” e o prédio inscrito sob o artigo matricial ………., e mais não resultar do depoimento de tais testemunhas afirmada tal correspondência entre a identificação matricial e o Monte …………, menção que sempre seria insuficiente face à ausência de prova documental de tal ligação.

G. Ainda, analisados os documentos 7 a 10 para que remete a alínea H) do probatório, verificamos não resultar dos mesmos a devida especificação e discriminação dos concretos e precisos trabalhos/obras realizados nos alegados prédios alienados, configurando-se de molde a não sustentar os encargos de valorização a que apela o artigo 48.º do CIRS.

H. Já o facto assente na alínea D) do probatório, para além da incindibilidade relativamente ao facto B) supra impugnado, não nos permite alcançar a especificação e discriminação dos concretos trabalhos decorridos e respectivas circunstâncias de modo e lugar necessária à comprovação dos encargos de valorização.

I. Além disso, apelando a douta sentença ao documento 6 da p.i. e a depoimento de testemunha, verificamos que as obras referidas no documento n.º 6 são “obras de conservação e melhoramento na habitação do caseiro” conforme proposta que faz parte integrante do doc. 6, da factura não resulta qualquer especificação das mesmas, pois refere-se a factura no seu descritivo a “Faturação referente a obras de conservação e melhoramento no Monte ………. S.........”, remetendo para o Orçamento de 14/07/1996, não sendo perceptível onde decorreram as obras de acordo com o depoimento a que apela a douta sentença, o que se imporia determinar; ainda, o doc. 6 não faz qualquer referência também a cozinha ou a mais do que uma casa de banho, o que adensa a confusão factual patente no probatório.

J. Por fim, impugna-se o facto constante da alínea F) do probatório por não resultar do depoimento da testemunha indicada, conforme 05:05 minutos da gravação áudio referente à testemunha J……….. ………….., que tenha sido construído no prédio rústico inscrito sob o artigo 1-O uma piscina e uma casa para os caseiros, sendo ademais tal consideração inócua face à não determinação das obras ocorridas em concreto e dos precisos termos da sua alegada concretização.

K. Acresce que, faz a douta sentença apelo a factos, no segmento da motivação da sentença, que não constam do probatório, não podendo os mesmos sustentar a decisão, os quais se transcrevem: “De notar que, para a formação da convicção do Tribunal quanto às características e extensão das obras realizadas no prédio misto designado “Herdades de …… e ..........”, foi também relevado o depoimento prestado pela testemunha R ……………………….., amigo de António Abecassis, companheiro da Impugnante, que relatou ter visto fotografias do local antes das obras e que “era um monte em ruínas” e que se recordava com clareza de visitar o “Monte ……………” após a conclusão das obras, há cerca de vinte anos atrás (1998), que tinha quartos, sala, casas de banho, declarando esta testemunha que: “era uma casa moderna, onde era agradável estar”.(sublinhado e realce nossos)

L. Mais não determinando o Tribunal a quo, face à impugnação dos factos constantes das alíneas B) a F) do probatório, de que forma é estabelecido o nexo de causalidade entre os prédios em concreto alienados e as alegadas obras não discriminadas de forma individualizada e sem referência aos prédios nos quais ocorreram, sendo que dos documentos juntos aos autos resultam apenas vagas referências ao Monte …………….. e Monte das ...........

M. Fundadas dúvidas que se intensificam quando analisamos, em confronto com os demais factos, os factos constantes das alíneas I) e J) do probatório, pois da descrição constante do registo predical sob o n.º ………/970902 ficou a constar o prédio misto composto pelo prédio rústico, constituído pelos restantes hectares não desanexados, e pelo prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …………., e o prédio alienado foi o descrito sob o n.º ………./000224, desconhecendo-se, pois, em que prédios foram afinal concretizadas as alegadas obras na origem dos pretendidos encargos de valorização, realçando-se o facto de a desanexação ter ocorrido após a realização das obras.

N. E note-se no depoimento da testemunha J ……………………, que, depois de afirmar terem as obras decorrido nas duas propriedades Monte ………… e Monte das .........., declarou terem as obras decorrido maioritariamente no Monte ……….. (aos 03:45 da gravação áudio), afirmando de seguida, aos 04:15 da gravação áudio referente à testemunha identificada, que a propriedade de ………… foi a última a ser vendida.

O. Ora, se as duas propriedades onde alegadamente foram realizadas obras foram vendidas separadamente, o que se poderá perceber pela desanexação ocorrida e que determinou a cisão do prédio em 24/02/2000, percebe-se também que a propriedade de …………., onde terão sido realizadas, de acordo com tal testemunho, a maior parte das obras, foi a última a ser vendida, pelo que, só poderá corresponder ao prédio misto descrito no registo predial sob o artigo …………/970902, e não ao prédio misto alienado e em causa nos presentes autos.

P. Efectivamente, decorre de tal testemunho, aos 04:20 da gravação áudio, que o Monte das .......... era o local onde tinham os casões, as máquinas agrícolas, e o ………… era onde estava o prédio, a casa onde teriam sido feitas as obras; e a descrição predial correspondente ao n.º ………../000224 faz menção ao prédio misto ..........”, e corrobora tais declarações e conclusões, pelo que, não resulta claro terem sido realizadas as alegadas obras no prédio alienado.

Q. Ainda, admite o tribunal a quo obras no valor estimado entre €400.000,00 e €500.000,00, sem que do probatório resulte a afirmação de obras em valor superior, e da respectiva quantificação, não podendo, desse modo, admitir-se conclusão não suportada em concretos factos que constem do probatório, mais se encontrando vedada a consideração e aceitação de uma estimativa de valor que oscila entre os € 400.000,00 e os 500.000,00 para efeitos de encargos de valorização com os alegados prédios [não identificados, como visto supra], para além da indevida não consideração de que, mesmo que tal valor fosse admitido, sempre teria de ser considerado o valor correspondente à quota parte da impugnante nos bens imóveis em questão.

R. Ora, de acordo com o disposto na alínea a) do artigo 48.º do CIRS (na numeração e redacção vigente à data dos factos) são admissíveis os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados, pelo que, serão despesas elegíveis as despesas de que resulte uma ligação incindível com o bem imóvel alienado, bem como as despesas que se mostrem comprovadamente realizadas, o que não foi demonstrado pela douta sentença, nem foi comprovado pela impugnante nos presentes autos.

S. Do exposto, da impugnação dos factos constantes do probatório, e da interpretação a fazer do preceito legal constante na alínea a) do n.º 1 do artigo 48.º do Código do IRS, só podem ser admitidas as despesas que sejam comprovadamente realizadas, e que possam ser individualizadas, de forma a estabelecer-se uma efectiva e comprovada relação de conexão com um concreto bem imóvel alienado.

T. Assim, não podia a douta sentença admitir, por não comprovados, os valores alegadamente referentes a obras decorridas nos prédios alienados, não resultando ademais da douta sentença factos que sustentem a consideração do valor de € 400.000,00 a 500.000,00 de despesas estimadas, nem o admitindo a norma da alínea a) do artigo 48.º do Código de IRS.

U. Nestes termos, a douta sentença ao julgar procedente a presente impugnação fê-lo incorrendo em erro de julgamento de facto, atenta a errónea apreciação dos factos pertinentes para a decisão, mais incorrendo em erro de julgamento de direito por violação do disposto na alínea a) do artigo 48.º do CIRS.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao recurso, deverá a douta sentença ser revogada, com o julgamento improcedente da impugnação, com as legais consequências.

Sendo que V. Exas. decidindo farão a Costumada Justiça.»


*


As Recorridas, apresentaram contra-alegações em defesa do não provimento do recurso e da manutenção do julgado sem, no entanto, formularem conclusões.

*


Neste TCA, o Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento do recurso.

*


Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.

*


II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

É a seguinte a matéria de facto constante da sentença recorrida: «

A. Em 02/09/1997 a Impugnante adquiriu, por morte de F ………….. ou F ………………., metade do prédio misto designado “Herdades de ……….. e ..........”, descrito na conservatória do Registo Predial de S......... sob o nº………/970902, composto por uma parte rústica, correspondente ao prédio rústico inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 1, da Secção O, da Freguesia de ……….., Concelho de S......... e por três prédios urbanos, correspondentes aos prédios urbanos inscritos na matriz sob os artigos……, …..e ……….da mesma Freguesia e Concelho - cf. cópia da escritura de habilitação de herdeiros a fls. 18-20 e certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de S......... a fls. 98-98v do suporte físico dos autos;

B. O prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ……, da Freguesia de ……, Concelho de S........., designado “Herdade …………”, implantado no prédio referido em A) supra não era habitável e estava “a cair” antes de terem sido realizadas obras nos anos de 1996, 1997 e 1998 – cf. depoimentos das testemunhas M a…….e J………….. …………;

C. As obras realizadas nos anos de 1996, 1997 e 1998 no prédio urbano referido na alínea anterior foram feitas pelo empreiteiro R ..................... – cf. depoimentos das testemunhas M ……………. e J ……………………..;

D. As obras referidas na alínea anterior consistiram em demolição de dependências, em picar e rebocar paredes; na reparação de cobertura, substituição de madeiras e telha em mau estado e colocação de isolamento em “Onduline”; na colocação de portas interiores em platex pintadas e exteriores em alumínio; na colocação de janelas em alumínio com veda-luz; na colocação de pavimentos; na construção de cozinha e casas de banho e duas ou três abóbadas em tijolo “burro”, sala e quartos; na construção de ramal de abastecimento de água; na instalação de rede de água interior, rede de esgoto e poço absorvente e rede de energia elétrica e na limpeza de paredes e caiação – cf. Doc. n.º 6, junto com a petição inicial, a fls. 24-26 do suporte físico dos autos e depoimentos das testemunhas R …………………….., M …………………… e J …………………………;

E. As obras referidas na alínea anterior, com exceção da construção de duas ou três abóbadas em tijolo “burro”, sala e quartos, foram realizadas pelo preço de ESC.8.190.000$00 (EUR40.851,54) - cf. Doc. n.º 6, junto com a petição inicial, a fls. 24-26 do suporte físico dos autos;

F. No prédio rústico inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 1, da Secção O, da Freguesia de………., Concelho de S......... foram também realizadas obras, nos anos de 1996 a 1998, pelo empreiteiro referido em C) supra que consistiram na construção de jardim e de piscina; na construção de casa para os caseiros, na recuperação de uma capela e na construção da estrada de acesso ao “Monte …………..”, numa extensão de cerca de 4/5 km – cf. depoimentos das testemunhas R ………………., M …………. e J ……………..;

G. Nos anos de 1997 e 1998 foram ainda realizadas obras no prédio urbano designado “..........” inscrito na matriz sob o artigo …….., da Freguesia de ………….., Concelho de S........., pelo empreiteiro R ……………, de S………….. – cf. Proposta e orçamento, a fls. 21-22 do suporte físico dos autos e depoimentos das testemunhas M…………………….. e J……………………….;

H. As obras referidas na alínea anterior consistiram na demolição de dependências agrícolas; em picar, reparar e rebocar paredes de dependências agrícolas e na reparação de coberturas, substituição de madeiras podres e telhas de dependências agrícolas e foram realizadas pelo preço de ESC9.973.289$00 (EUR49.746,55) – cf. Proposta, e orçamento a fls. 21-22 do suporte físico dos autos, Doc. n.º 7 a Doc. n.º 10, juntos com a petição inicial, a fls. 27-34 do suporte físico dos autos e depoimento da testemunha J………………………………….;

I. Em 24/02/2000 foi desanexada do prédio referido em A) supra a área de 480,4965 hectares da parte rústica, bem como os prédios urbanos inscritos na matriz sob os artigos ………. e ….. da mesma Freguesia e Concelho, dando origem ao prédio misto descrito na mesma Conservatória sob o n.º………./000224 e designado “..........”, da Freguesia de S........., composto por uma parte rústica inscrita na matriz predial rústica sob o artigo 1, da Secção O, da Freguesia de ……….., Concelho de S......... e por dois prédios urbanos inscritos sob os artigos …….e ………. da mesma Freguesia e Concelho – cf. certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de S......... a fls. 98 e 96-v do suporte físico dos autos;

J. Em 23/03/2000 a Impugnante e M ………………… venderam o prédio misto referido na alínea anterior, pelo preço de “Trezentos Milhões de Escudos” (EUR1.496.393,69), correspondendo à parte urbana o valor de dez milhões de escudos (EUR49.879,78) e à parte rústica o valor de duzentos e noventa milhões de escudos (EUR1.446.513,90) – cf. cópia da escritura de compra e venda a fls. 100-103 dos autos;

K. Em 06/07/2001 foi confirmado, através da Portaria n.º1242/2001, que as herdeiras de F ………………….., M ………………… e M ……………………., regressaram à posse de uma área de 151,2660 hectares do prédio rústico Corte ……….. e .........., que tinha sido expropriada através da Portaria n.º 442/76, de 22 de julho – cf. Doc. 11, a fls. 95-v do suporte físico dos autos;

L. Em 29/10/2004 foi recebido pela Impugnante o ofício n.º………, enviado pelos serviços da Impugnada, informando-a do projecto de correções à declaração de rendimentos do ano de 2000, elaborado no âmbito de procedimento interno de inspeção – cf. ofício e aviso de receção a fls. 48-49 dos autos;

M. Em 20/11/2004 foi elaborado relatório final de inspeção tributária cujo teor se dá por integralmente reproduzido e no qual pode ler-se: “1- No âmbito da acção de controlo interno das Mais-Valias obtidas com a alienação de bens imóveis do ano de 2000, tendo por base os conhecimentos de Sisa registados nos respectivos Serviços de Finanças, verificou-se que a contribuinte acima identificada alienou, nesse ano de 2000, os prédios urbanos inscritos na respectiva matriz predial da freguesia de …………, Concelho de S........., sob os artigos …….. e ………., bem como o prédio rústico inscrito na respectiva matriz cadastral da mesma freguesia, sob o artigo 1 Secção O, pelo preço total de 748.194,35€, sem que a sua alienação tivesse sido indicada no correspondente anexo “G” à declaração de rendimentos Mod. 3/IRS do ano de 2000.
2- A sujeição a mais-valias decorre do facto de a contribuinte ter adquirido o direito a ½ desses prédios em 25/07/1990, por óbito de F…………………….. Como valor de aquisição consideram-se os respectivos valores patrimoniais, no valor total de 20.518,02€, tendo-se apurado a mais-valia fiscal de 357.785,34€, conforme demonstração em anexo.”- cf. Relatório de Inspeção Tributária a fls. 50 do PAT apenso aos autos;

N. Em anexo ao relatório de inspeção tributária referido na alínea anterior consta demonstração do cálculo do valor sujeito a mais-valias fiscais, na qual pode ler-se:

«Texto no original»

O. Em 21/12/2004 a Impugnante foi pessoalmente notificada da nota demonstrativa de liquidação de IRS n.º …………………, referente ao ano de 2000, no montante de €168.486,30, na qual pode ler-se: “Fica V. Exa. Notificado (a) de liquidação de IRS relativa ao ano a que respeitam os rendimentos, conforme nota demonstrativa junta. Poderá reclamar ou impugnar nos termos e prazos estabelecidos nos artigos 140.º do CIRS e 70.º e 102.º do CPPT” cf. mandado, certidão de notificação e demonstração de liquidação de IRS a fls. 36-38 do PAT apenso aos autos;

P. Em 27/12/2004 foi recebida pela Impugnante a liquidação adicional de IRS n.º ………….……….., no valor de €140.442,16 e a liquidação de juros compensatórios n.º ………………., no valor de €28.044,14, perfazendo o valor a pagar de €167.504,56, com data limite de pagamento até 17/01/2005 – por acordo e cf. Doc. 1 junto com a petição inicial a fls. 8 do suporte físico dos autos;

Q. Em18/04/2005 foi apresentada reclamação graciosa pela Impugnante sem que tivesse sido proferida decisão sobre a mesma até à apresentação da presente impugnação judicial em 16/01/2006 – cf. requerimento a fls. 2 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos e informação e petição inicial a fls. 54 e a fls. 3 do suporte físico dos autos.

1.2. Factos não provados

Compulsados os autos e analisada a prova documental que dos mesmos consta, não existem quaisquer outros factos, atento o objeto do litígio, com relevância para a decisão da causa.

1.3. Motivação

A decisão da matéria de facto provada nas alíneas A), D) (parcialmente), E), G) (parcialmente), H) (parcialmente) e I) a Q), do ponto 1.1. supra, efetuou-se com base no exame dos documentos constantes dos autos e dos processos administrativo tributário e de reclamação graciosa, apensos aos autos, não impugnados, referidos a propósito de cada alínea do probatório.
A decisão da matéria de facto provada nas alíneas B), C), D), F), G) e H) assentou nos depoimentos prestados pelas testemunhas M ………………….. e J ………………, as quais acompanharam, na qualidade de electricista e rendeiro, respetivamente, durante os anos de 1996 a 1998, a realização das obras efetuadas no prédio misto designado “Herdades de ……… e ..........”, descrito na conservatória do Registo Predial de S......... sob o n.º………/970902, que incidiram sobre a parte rústica, correspondente ao prédio rústico inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 1, da Freguesia de ……….., Concelho de S......... e sobre os dois prédios urbanos implantados nesse prédio rústico inscritos na matriz sob os artigos …, …. da mesma Freguesia e Concelho.
Estas duas testemunhas declararam de forma muito clara e assertiva que a maior parte das obras realizadas incidiram sobre o “Monte ……………” e que as edificações que aí se encontravam estavam em estado muito degradado, não possuindo condições de habitabilidade.
A precisão e pormenor com que foram descritas por estas duas testemunhas as obras realizadas quer no interior dessas edificações, que consistiram, designadamente, em demolição de dependências e em ampliações com a construção de quartos, sala, abóbadas, quer no exterior, na parte rústica, onde foi construída uma piscina, bem como um jardim, uma casa para os “caseiros” e uma estrada de acesso à propriedade, tendo ainda sido recuperada uma capela, permitiram ao Tribunal aquilatar as características e extensão dessas obras, que decorreram nos anos de 1996 a 1998.
Acresce que, foi possível situar a realização dessas obras num período que foi nos quatro a dois anos imediatamente anteriores à alienação, em 23 de março de 2000, do prédio misto designado “..........”, descrito na Conservatória do Registo Predial de S......... sob o n.º…………/000224, da Freguesia de .........., Concelho de S........., que foi criado, por desanexação do prédio misto designado “Herdades de ……….. e ..........”, descrito na mesma Conservatória sob o n.º ………./970902, da mesma Freguesia e Concelho.
De notar que, para a formação da convicção do Tribunal quanto às características e extensão das obras realizadas no prédio misto designado “Herdades de ……… e ..........”, foi também relevado o depoimento prestado pela testemunha R …………………., amigo de António Abecassis, companheiro da Impugnante, que relatou ter visto fotografias do local antes das obras e que “era um monte em ruínas” e que se recordava com clareza de visitar o “Monte …………” após a conclusão das obras, há cerca de vinte anos atrás (1998), que tinha quartos, sala, casas de banho, declarando esta testemunha que: “era uma casa moderna, onde era agradável estar”.
De salientar ainda, no que concerne às dúvidas suscitadas pela fazenda Pública, em sede de contestação, quanto à localização/identificação do prédio alienado em 23 de março de 2000 e os documentos n.º 6 a 10, apresentados pela Impugnante com a petição inicial, que as mesmas soçobram perante o documento n.º 12, a fls. 96-103 do suporte físico dos autos (cópia da certidão emitida pela Conservatória do registo Predial de S......... em 2 de agosto de 2006).
Efetivamente consta da fatura n.º 362 de 14/11/1996 que a faturação é referente “a obras de conservação e melhoramento no Monte ………… S.........”; consta ainda da fatura n.º 367, de 30/05/1997 que a faturação é referente “a obras de conservação em dependências agrícolas no Monte das .......... sito no Concelho de S.........”; Consta também da fatura n.º 363, de 30/03/1997, que a faturação é referente “a obras de conservação em dependências agrícolas no Monte das .......... sito no Concelho de S.........” e por fim consta da fatura n.º 369, de 30/07/1997 que a fatura se refere a “obras de conservação em dependências agrícolas no Monte das .......... sito no Concelho de S.........”.
Ora, cruzando estas designações que constam das referidas faturas com a designação do prédio misto descrito na Conservatória do Registo Predial de S......... sob o n.º ………../970902, da Freguesia de .........., Concelho de S........., como “Herdades de …………… e ..........”, o qual era composto por uma parte rústica correspondente ao prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo 1, da Secção O, da referida Freguesia e Concelho e por uma parte urbana composta pelos prédios urbanos inscritos na matriz sob os artigos ………, ………. e ………, da mesma Freguesia e Concelho, não subsistem quaisquer dúvidas que esses documentos se reportam ao prédio que veio a ser alienado em 23 de março de 2000, pela Impugnante e por M …………… e V ………………...
Ressalve-se que, tal como também é evidenciado pela cópia da certidão emitida pela Conservatória do registo Predial de S......... em 2 de agosto de 2006, em 24/02/2000 foi desanexada do prédio misto descrito na referida Conservatória sob o n.º……………/970902, a área de 480,4965 hectares da parte rústica, bem como os prédios urbanos inscritos na matriz sob os artigos ………e ……… da mesma Freguesia e Concelho, dando origem ao prédio misto descrito na mesma Conservatória sob o n.º ………./000224 e designado “..........”, da Freguesia de S........., composto por uma parte rústica inscrita na matriz predial rústica sob o artigo 1, da Freguesia de .........., Concelho de S......... e por dois prédios urbanos inscritos sob os artigos ………. e ………. da mesma Freguesia e Concelho, cf. facto provado na alínea I), do probatório.
Este último prédio veio a ser objeto de alienação, como já referimos, em 23 de março de 2000, cf. facto provado na alínea J) do probatório.
Por último, no que concerne ao montante despendido com as obras em causa, apesar de não se ter apurado o montante exato, resulta dos depoimentos prestados pelas testemunhas M ………………e J ……………….., que esse montante é muito superior ao que se encontra suportado documentalmente de ESC18.163.289$00 (EUR90.598,10), tendo a testemunha J ………………….. afirmado que as obras terão custado, no mínimo, cem mil contos à época (EUR498.797,89).
De facto, considerando estes depoimentos, bem como a globalidade das obras realizadas e tendo presente que, de acordo com as Portarias n.º 1300-C/95, de 31 de outubro, n.º 616-C/96, de 30 de outubro e n.º 1089-E/97, de 31 de outubro, o preço da construção por m2 para a zona III, na qual se inclui o Concelho de S........., era de ESC82.000$00 (EUR409,01), no ano de 1996, de ESC84.200$00 (EUR420,11), no ano de 1997 e de ESC86.000$00 (EUR428,96), no ano de 1998, é possível estimar o valor das obras realizadas entre €400.000,00 e €500.000,00.»


*

- De Direito

A Fazenda Pública insurge-se contra a sentença do TAF de Sintra que, julgando parcialmente procedente a impugnação judicial, anulou o ato tributário de liquidação adicional de IRS, relativo ao ano de 2000, no montante de € 167.504,56 (imposto e juros).

Na origem de tal liquidação adicional esteve uma ação inspetiva que apurou rendimentos resultantes de mais-valias obtidas com a alienação de bens imóveis - dois prédios urbanos e um prédio rústico - sem que tal alienação tivesse sido mencionada na correspondente declaração de rendimentos.

A Mma. Juíza a quo concluiu pela “existência de erro na determinação dos rendimentos/mais-valias sujeitas a IRS” e anulou o ato de liquidação impugnado. No essencial, foi o seguinte o discurso fundamentador adotado pelo Tribunal:

“(…)

Ora, volvendo aos presentes autos verifica-se atenta a matéria de facto provada nas alíneas D), F) e H) do probatório que foram realizadas obras, nos anos de 1996 a 1998, no prédio misto designado “Herdades de ……….. e ..........”, descrito na conservatória do Registo Predial de S......... sob o n.º ……/970902, que incidiram sobre o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 1, da Secção O, da Freguesia de .........., Concelho de S......... e sobre os dois prédios urbanos implantados nesse prédio rústico e inscritos na matriz sob os artigos…….. e ……..da mesma Freguesia e Concelho.

Dessas obras merecem destaque, pela sua extensão e características, as que incidiram sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ………, da Freguesia de .........., Concelho de S........., designado “Monte ………….” e que consistiram na demolição de dependências; em picar e rebocar paredes; na reparação, de cobertura, substituição de madeiras e telha em mau estado e colocação de isolamento em “Onduline”; na colocação de portas interiores em “platex” pintadas e exteriores em alumínio; na colocação de janelas em alumínio com veda-luz; na colocação de pavimentos; na construção de cozinha e casas de banho e duas ou três abóbadas em tijolo “burro”, sala e quartos; na construção de ramal de abastecimento de água, na instalação de rede de água interior, rede de esgoto e poço absorvente e rede de energia elétrica e na limpeza de paredes e caiação.

De igual forma devem ser realçadas, pelas mesmas razões, as obras que incidiram sobre o prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo 1, da Secção O, da mesma Freguesia e Concelho e que consistiram na construção de jardim e de piscina; na construção de casa para os caseiros; na recuperação de uma capela e na construção da estrada de acesso ao “Monte …………….”, numa extensão de cerca de 4/5 km.

Foram assim realizadas no referido prédio misto designado “Herdades de ………… e ..........”, descrito na conservatória do Registo Predial de S......... sob o n.º 0………./970902, obras de conservação, construção e de ampliação, que são suscetíveis de integrar o conceito de encargos de valorização dos bens, plasmado no artigo 48.º, alínea a), do CIRS.

Acresce que, as referidas obras foram comprovadamente realizadas nos últimos cinco anos anteriores à alienação do prédio misto designado “..........”, descrito na mesma Conservatória sob o n.º ………/000224 e que foi desanexado, em 24 de fevereiro de 2000, do prédio misto designado “Herdades de …………. e ..........”.

No que concerne ao valor despendido pela Impugnante na realização das obras em causa verifica-se, atenta a matéria de facto provada nas alíneas E) e H), que foi pelo menos despendida a quantia de ESC18.163.289$00 (EUR90.598,10).

Todavia, tendo presente a matéria de facto provada nas alíneas D), F) e H) do probatório, constata-se que as obras em questão foram realizadas por um valor muito superior ao que se encontra provado documentalmente.

Assim, relevando-se para este efeito os depoimentos prestados pelas testemunhas M ……………… e J ………………, bem como os valores do preço médio de construção por m2, que consta nas Portarias n.º 1300-C/95, de 31 de outubro, n.º 616-C/96, de 30 de outubro e n.º 1089-E/97, de 31 de outubro, para a zona III, na qual se inclui o Concelho de S........., de ESC82.000$00 (EUR409,01), no ano de 1996, de ESC84.200$00 (EUR420,11), no ano de 1997 e de ESC86.000$00 (EUR428,96), no ano de 1998, conclui-se que o valor dessas obras se situa entre €400.000,00 e €500.000,00.

E, sendo assim é forçoso concluir pela existência de erro na determinação dos rendimentos/mais-valias sujeitas a IRS, sendo certo que, face ao disposto no artigo 99.º, alínea a), do CPPT, um dos fundamentos da impugnação judicial consiste precisamente na errónea qualificação e quantificação dos rendimentos, lucros, valores patrimoniais e outros factos tributários, não havendo no caso em apreciação qualquer preclusão do direito da impugnante a ver reconhecido esse erro.

Antes pelo contrário, sendo sobre a Impugnante que recaia o ónus da prova das alegadas “avultadas despesas” realizadas com a valorização do prédio objeto de alienação em 23 de março de 2000, atento o disposto no artigo 74.º, n.º 1, da LGT e 342.º e seguintes do Código Civil, o que resulta, com evidência, da prova produzida nos presentes autos é que a Impugnante logrou provar a realização dessas avultadas despesas.

Deste modo, não merece acolhimento o alegado pela Fazenda Pública, no sentido de que as alegadas despesas suportadas pela Impugnante tinham um momento próprio, para serem invocadas, que seria até 30 de abril de 2001, por ser essa a data a limite para a apresentação da declaração de IRS referente ao ano de 2000.

Por conseguinte, estamos no caso em apreciação perante erro sobre os pressupostos de facto que se traduziu, no caso concreto, na violação do disposto no artigo 48.º, alínea a), do CIRS, na redação em vigor até dezembro de 2002”.

A Fazenda Pública discorda do decidido, fazendo assentar a sua discordância, em larga medida, no julgamento da matéria de facto levado a cabo pelo Tribunal a quo. É por aqui, portanto, que devemos iniciar a análise que nos vem pedida neste recurso jurisdicional.

Vejamos, então.

Desde logo, e conforme consta da conclusão C), insurge-se a Recorrente contra os factos correspondentes às alíneas B), C), D, E) e F) do probatório, os quais impugna.

A este propósito, sustenta a Fazenda Pública que os elementos de prova produzidos (documental e testemunhal) não permitem fazer a cabal correspondência entre a realização das diversas obras e os diferentes artigos matriciais que vieram a ser alienados e que geraram as mais-
-valias subjacentes à liquidação adicional de IRS.

Concretizando, temos que, lido o corpo das alegações e respetivas conclusões, a Fazenda Pública, aceitando o facto correspondente à alínea A) do probatório - nos termos do qual consta que 02/09/97 a Impugnante adquiriu, por morte de F ……………… ou F …………….., metade do prédio misto designado “Herdades de …………. e ..........”, descrito na conservatória do Registo Predial de S......... sob o nº………./970902, composto por uma parte rústica, correspondente ao prédio rústico inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 1, da Secção O, da Freguesia de .........., Concelho de S......... e por três prédios urbanos, correspondentes aos prédios urbanos inscritos na matriz sob os artigos……, ………e ……….. da mesma Freguesia e Concelho – evidencia que os elementos trazidos aos autos não permitem concluir que:

- a Herdade ……….. corresponde ao artigo matricial ……., da Freguesia de .........., S.........;

- o Monte das .......... corresponde ao artigo matricial……, da Freguesia de .........., S..........

Para mais, refere a Fazenda Pública, os elementos juntos aos autos não permitem esclarecer se as obras foram, ou não, realizadas no prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo …….., o qual (juntamente com os artigos ……. e …….) integrava o prédio misto m.i em A) do probatório.

Comecemos por este primeiro aspeto, sendo claro que outros pontos da matéria de facto vêm impugnados, em concreto no que se refere aos montantes gastos em obras.

Esta primeira questão que nos vem dirigida não é de resposta fácil, sendo certo que a mesma se apresenta absolutamente essencial para a boa solução das demais questões que nos vêm colocadas e, nessa medida, para decidir sobre o acerto (ou não) da sentença recorrida.

Como dissemos, a liquidação impugnada resulta de uma ação inspetiva que apurou rendimentos resultantes de mais-valias obtidas com a alienação, em 2000, de bens imóveis - dois prédios urbanos e um prédio rústico (prédio misto, designado ..........) - sem que tal alienação tivesse sido indicada na correspondente declaração de rendimentos.

A Impugnante, aceitando a alienação e a omissão declarativa, entende que o apuramento dos rendimentos de mais-valias não teve em conta “melhoramentos de grande envergadura” nos prédios, “encargos suportados” que não podem ser desconsiderados, atento o disposto nos artigos “10º, nº4. alíena a), 43º e 44º do CIRS”.

Assim, a prova produzida incidiu sobre as concretas obras efetuadas, sua extensão, montantes, e período temporal.

Tenha-se presente – e isto é importante reter – que as mais-valias apuradas se referem, conforme resulta da ação inspetiva, à alienação, em 2000, de um prédio misto, denominado “..........” composto por um prédio rústico (artigo 1/O) e dois urbanos (artigos …… e ……….), todos da Freguesia de .........., S.......... Trata-se de um prédio que, como resulta da alínea A) e da I) do probatório, foi desanexado de um prédio misto denominado Herdades ……….. e .........., herdado pela Impugnante originária e, bem assim, pela sua mãe, por morte de F …………... Tenha--se ainda presente que, em resultado de tal desanexação, manteve-se um prédio misto, com parte rústica e urbana, correspondendo esta ao artigo matricial ……...

Ora, no essencial, importava demonstrar a realização de obras no prédio misto alienado em 2000, o qual - repete-se – inclui os prédios urbanos a que correspondem os artigos matriciais …….. e ……..

Pese embora da prova carreada para os autos (documental e testemunhal, esta última por nós ouvida para efeitos de apreciação da impugnação da matéria de facto) resulte que foram efetuadas obras em prédio(s) urbano(s) que compunham o prédio misto m.i em A) dos factos provados (o qual, em parte, deu origem ao prédio alienado em 2000), a verdade é que, como a Recorrente evidencia, não há elementos que permitam, de forma absolutamente concludente, afirmar que as mesmas tiveram lugar no artigo ….. ou/e no …….. ou, até, no …...

Dito de outra forma, compulsados os documentos indicados na motivação da matéria de facto e, bem assim, a prova testemunhal, os mesmos são insuficientes para permitir estabelecer a correspondência que o TAF fez, no sentido de que a Herdade ……… corresponde ao artigo matricial ……. e que o artigo 6…. corresponde ao prédio designado por ........... Mais. Não há, com efeito, elementos que permitam afastar a possibilidade de as obras em causa terem sido realizadas, ao menos em parte, no prédio correspondente ao artigo 686 que se manteve integrado no Monte/Herdade …….. Aliás, deve realçar-se que, como a Recorrente sublinha (e nós pudemos verificar), a testemunha José Manuel Inverno Cantigas, “depois de afirmar terem as obras decorrido nas duas propriedades Monte …….. e Monte das .........., declarou terem as obras decorrido maioritariamente no Monte ……….. (…), afirmando de seguida, (…), que a propriedade de ………. foi a última a ser vendida. Perante isto, percebe-se a dúvida colocada no sentido de que “se as duas propriedades onde alegadamente foram realizadas obras foram vendidas separadamente, o que se poderá perceber pela desanexação ocorrida e que determinou a cisão do prédio em 24/02/2000, percebe-se também que a propriedade de ……….., onde terão sido realizadas, de acordo com tal testemunho, a maior parte das obras, foi a última a ser vendida, pelo que, só poderá corresponder ao prédio misto descrito no registo predial sob o artigo ……../970902, e não ao prédio misto alienado e em causa nos presentes autos”.

Assim, analisado todo o circunstancialismo de facto convocado nos autos e revista atentamente toda a prova produzida, este Tribunal, constatando uma nítida insuficiência ao nível da matéria de facto, a reclamar a ampliação da mesma, não está em condições de, por si, o fazer, sanando tais falhas.

Admite-se que o circunstancialismo de facto subjacente à presente situação, geradora de mais--valias, não seja de reconstituição simples, fruto de vicissitudes sofridas ao longo nos anos pelos prédios em questão, entre a expropriação, reversão, desanexação, a que acresce o facto de as obras terem tido lugar antes da referida desanexação e, porventura, alguma imprecisão nas denominações usadas (........../ Herdade da ……../ Herdades ……. e ........../ Monte das ..........) quanto aos prédios alienados, intervencionados e mantidos após 2000.

Numa análise prudente, e dada a especificidade das questões envolvidas, entende-se que estamos perante uma situação que reclama uma solução de último recurso para este Tribunal Superior, isto é, a anulação oficiosa da decisão proferida na 1.ª instância, por não constarem do processo todos os elementos que permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, considerando-se indispensável a ampliação desta – cfr. artigo 662º, nº 2 do CPC.

Com efeito, entende-se que o Tribunal de 1ª instância deve, com recurso a outros meios de prova (designadamente pericial), superar as falhas apontadas e fixar com segurança a matéria de facto, de modo a esclarecer as correspondências atrás apontadas. É absolutamente essencial saber que obras foram realizadas nos artigos matriciais que foram vendidos em 2000 (683 e 685), o que, até aqui, não se mostra cabalmente esclarecido.

Só após esta atuação instrutória se podem equacionar as restantes questões que vêm colocadas, pois apreciar sobre a natureza das obras, o seu valor ou sobre a comprovação do seu pagamento, só assume pertinência depois de demonstrada a correspondência entre o local das obras e os concretos artigos matriciais, designadamente os que foram objeto de alienação.

É, pois, a anulação oficiosa da sentença para os apontados fins que aqui se determina, ficando prejudicado o conhecimento do demais que nos vinha colocado.


*




III - Decisão




Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em anular a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos para instrução e ampliação da matéria de facto, conforme supra apontado, após o que deverá ser proferida nova decisão em conformidade com o circunstancialismo apurado.


Sem custas.

Registe e Notifique.

Lisboa,13/01/22


Catarina Almeida e Sousa

Isabel Fernandes

Jorge Cortês