Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:96/19.1BCLSB
Secção:CA
Data do Acordão:08/22/2019
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:TRIBUNAL ARBITRAL DO DESPORTO;
NULIDADE DA DECISÃO ARBITRAL;
PROVIDÊNCIAS CAUTELARES;
SUSPENSÃO DE NORMAS REGULAMENTARES APROVADAS PELA FPF; NOTIFICAÇÕES EM PROCESSO ARBITRAL;
CONTAGEM DE PRAZOS.
Sumário:I - O juiz deve pronunciar-se sobre todas as questões que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras. Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou os fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. Na sentença, o juiz terá, igualmente, que discriminar os factos que considera provados e em que faz assentar o seu raciocínio decisório e deve indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas que conduzem à decisão final (cf. art.ºs 46.º, 47.º, n.º 1, als. b), c), 61.º, da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto (LTAD), aprovada pela n.º 33/2014, de 16-06 e alterada pela Lei 74/2013, de 06.09, 94.º, n.ºs 2, 3, 95.º, n.º 1, do CPTA, 607.º, n.ºs 2 a 4 e 608º, n.º 2, do CPC);
II- Só o incumprimento absoluto do dever de fundamentação conduz à nulidade decisória;
III - Nos termos do art.º 41.º, n.º 4, da LTAD, as providências cautelares são intentadas juntamente com o requerimento inicial da arbitragem ou com a defesa;
IV- Conforme o art.º 41.º, n.º 9, da LTAD, as providências cautelares a correr termos no TAD regem-se pelo regime previsto nos art.ºs 362.º a 376.º do CPC, com as devidas adaptações;
V- Com a presente acção visa-se a suspensão de normas regulamentares aprovadas pela FPF. Assim, da leitura conjugada dos art.ºs 4.º, n.ºs 1, 3, al. b) e 54.º, n.º 2, da LTAD, resulta que o prazo de 10 dias que vem indicado no art.º 54.º, n.º 2, da LTAD, não se aplicará ao caso vertente, no qual se impugnam as citadas normas regulamentares;
VI - Para a averiguação da data da notificação do despacho do Presidente do Colégio Arbitral ao ora Recorrente, há que lançar mão ao determinado no art.º 248.º, parte final, do CPC, com as devidas adaptações, por força da remissão dos art.ºs 61.º da LTAD e 23.º do CPTA;
VII - Consequentemente, no termos do citado preceito, tal notificação presumir-se-á feita no 3.º dia posterior ao do envio da carta ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando o não seja (cf. também os art.ºs 38.º, 39.º da LTAD);
VIII – O valor das custas exigidas pelos processos que correm no Tribunal Arbitral do Desporto não ofendem o princípio à tutela jurisdicional efectiva e da proporcionalidade
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I - RELATÓRIO
O Desportivo de ………… interpôs recurso do Acórdão do Tribunal Arbitral do Desporto (TAD) de 06-06-2029, que indeferiu liminarmente a providência cautelar por si requerida.
Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões:”1. Apelante recorre da matéria de Direito;
2. A omissão de pronuncia quanto ao requerimento da A. influiu de forma determinante na decisão da causa, já que ao não se manifestar no sentido do indeferimento/deferimento criou o Colégio Arbitral, na A., situação de dúvida legal, sendo que uma pronuncia quanto ao mesmo teria levado, de imediato, à prática do ato em caso de indeferimento;
3. A A., em 07.06.2019, apresentou junto do Tribunal recorrido o requerimento inicial de arbitragem, isto é, dentro do prazo que lhe havia sido conferido no despacho de 30.05.2019;
4. O Requerimento apresentado pela A., em 04.06.2019, dá cumprimento ao despacho de 30.05.2019, em nada o contraria, e o requerimento de arbitragem apresentado em 07.06.2019, veio completar na plenitude o cumpri mento desse despacho;
5. Pelo que, não deveria o Tribunal recorrido convidar a A. à prática de um acto, dando-lhe determi nado prazo para esse efeito, e antes de transcorrido o prazo concedido decidir como não tivesse dado cumprimento ao despacho;
6. Enferma o acórdão de uma nulidade processual, por omissão da prática de ato capaz de influir de modo determinante na decisão da causa e, por conseguinte, conducente à violação do dever de administrar a justiça imposto a qualquer juiz;
7. As custas processuais determinadas pelo TAD, incluindo a taxa de IVA, são quase três vezes mais o valor discutido na ação, sendo o quadro legal vigente, no tocante às custas do TAD, fortemente desencorajador do recurso à jurisdição do TAD, ou seja, à via legal de resolução do litígio;
8. Além de que, existe uma enormíssima discrepância entre os valores das custas arbitrais e das custas judiciais, não podendo esquecer que nos encontramos no âmbito de uma arbitragem necessária;
9. Portanto, há lugar a uma grave violação do princípio proporcionalidade, comprometendo de forma séria e evidente o princípio da tutela jurisdicional efectiva (art. 20.º, nº 1 e 268.º, nº 4, da CRP); e
10. Destarte, o artigo 2º/1/4 da Portaria nº 301/2015 e a tabela do seu Anexo I violam, no caso presente, os princípios constitucionais da proporcionalidade e do acesso à justiça“.

Os Recorridos, Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e Associação de Futebol ……………. nas contra-alegações formularam as seguintes conclusões: “1. O presente Recurso de Apelação foi interposto pela Recorrente do Acórdão do Tribunal Arbitral do Desporto, datado de 6 de junho de 2019, mediante o qual se decidiu indeferir liminarmente a providência cautelar por inadmissível processualmente.
2. Nos presentes autos, estamos perante um ato normativo ou regulamentar de uma federação desportiva no exercício de um poder de regulamentação, pelo que, caímos no âmbito da designada arbitragem necessária (cf.artigo 4.º, n.º 1 e 2 da Lei do TAD).
3. Em concreto, no que diz respeito à tutela cautelar no âmbito da arbitragem necessária instituída pela TAD, determina o artigo 41º, n.º 2 da Lei do TAD que a competência para decretar as providências cautelares pertence em exclusivo ao TAD.
4. Mais aduz o mencionado artigo 41.º da Lei da TAD que "As providências cautelares são requeridas juntamente com o requerimento inicial de arbitragem ou com a defesa" (cf. art. 41.º, n.º 4).
5. A exigência de apresentação do requerimento de medidas cautelares juntamente com o requerimento inicial de arbitragem, sublinhe-se, resulta de uma forma bastante clara de jurisprudência do Tribunal Arbitral do Desporto - vide, entre outros, Processo n.º 30A/2019 e Processo n.º 27A/2019 que correram termos no TAD.
6. Por conseguinte, para que o TAD pudesse decidir do litígio em causa, para além da providência cautelar, deveria o Demandante ter dado entrada, como se aduziu, da ação principal (art. 41.º, n.º 4 da Lei do TAD).
7. Ora, pelo menos desde o dia 26 de abril de 2019, data em que o Recorrente foi notificado pelo Tribunal Arbitral do Deporto, relativamente à remessa para o mesmo do Processo n.º 1878/18.7BEBRG que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que o Demandante/Recorrente, como conhecedor que deveria ser do procedimento cautelar instituído no âmbito de arbitragens necessárias, deveria ter dado entrada do requerimento inicial de arbitragem, bem sabendo que, a falta daquele requerimento de arbitragem teria como consequência necessária o indeferimento liminar da providência cautelar por processualmente inadmissível.
8. Notificado daquele despachado arbitral n.º 1 o Recorrente, no dia 4 de junho de 2019, dentro do prazo que lhe foi concedido para tal, veio informar os autos que deveria a providência cautelar prosseguir como tal "atento o facto de se terem produzido os efeitos da mesma, com a sua admissão liminar. A fim de, se aproveitar todo o processado, quanto à providência cautelar requerida, e assegurar a manutenção dos efeitos da admissão liminar da mesma, deve esta prosseguir como tutela cautelar". Mais aduziu no mesmo requerimento que "Para assegurar o carácter instrumental da providência cautelar, o requerente irá intentar a acção principal, no prazo de 10 dias, a contar da apresentação deste requerimento" mas nem convolou o requerimento inicial da providência cautelar em requerimento inicial de arbitragem necessária nem, em alternativa, corrigiu o requerimento inicial da providência cautelar, em especial, no que diz respeito ao requisito do periculum in mora e, concomitantemente, deu entrada do requerimento inicial de arbitragem necessária.
9. E não se diga, como pretende a Recorrente que Colégio Arbitral não se pronunciou quanto ao requerimento apresentado pelo mesmo, no dia 4 de junho de 2019, pois tal pronúncia consta, até de forma muito fundamentada, do Acórdão recorrido.
10. Na verdade, dentro do prazo que lhe foi concedido, o Demandante/Recorrente praticou tal ato processual, informando os autos que pretendia que a providência cautelar de suspensão de eficácia da norma prossiga como tal e que para assegurar o carácter instrumental da providência cautelar, o requerente iria intentar a ação principal, no prazo de 10 dias, a contar da apresentação deste requerimento, leia­ se a contar do dia 4 de junho.
11. Por conseguinte, e tendo presente tal requerimento, é dizer, praticado o ato processual dentro do prazo concedido para o efeito, andou bem o Colégio Arbitral ao proferir, no dia 6 de junho de 2019, o Acórdão recorrido.
12. Sendo, ainda, manifesto que a decisão de indeferimento liminar da providência cautelar foi equacionada pelo Recorrente, sobre ele teve a oportunidade de se pronunciar e não constituí, por conseguinte, qualquer decisão surpresa e inusitada.
13. O requerimento inicial de arbitragem necessária, intempestivo, sublinhe-se, como é expressamente referido no despacho arbitral n.º 2, "deu entrada após ter sido proferido Acórdão no âmbito dos presentes autos". Quer isto dizer que, e seguindo a posição daquele despacho arbitral, "resulta igualmente cristalino, conjugadamente dos artigos 613º e 666º, ambos do CPC, aplicável ex vi do artº 61.º da LTAD e art.º 1º do CPTA, que com a prolação do acórdão,ficou imediatamente esgotado o poder jurisdicional do presente colégio arbitral. (...) Nessa conformidade, desentranhe-se e remeta-se o requerimento de arbitragem a que foi dada agora entrada, para competente distribuição e constituição de novo Colégio Arbitral.".
14. Atendendo ao exposto, e como é expressamente referido no despacho arbitral n.º 2, o requerimento de arbitragem necessária apresentado pelo Demandante/Recorrente foi desentranhado do Processo Arbitral n.º 22/2019 e, por conseguinte, foi o mesmo remetido para distribuição e constituição de novo Colégio Arbitral, o que veio efetivamente a suceder, encontrando-se, neste momento, a correr termos no TAD sob o n.º 36/2019.
15. Aqui chegados, não se percebe, até porque o Recorrente não alega, que ato legalmente prescrito foi omitido pelo Colégio Arbitral (vide artigo 195.º, n.º 1 do Código de Processo Civil), pelo que, e sem necessidade de mais delongas, torna-se impossível indagar se a existência de uma alegada omissão (que não se sabe qual é, reitere-se), in casu, influi ou não na decisão da causa.
16. Assim, não existindo nenhum vício que possa ser imputado, andou bem o Colégio de Árbitros ao indeferir liminarmente a providência cautelar por inadmissível processualmente.”

O DMMP apresentou a pronúncia no sentido da improcedência do recurso.
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo à conferência.

II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – OS FACTOS
Nos termos dos art.ºs 149.º, n.º 1, do CPTA e 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 140.º, n.º3, do CPTA, fixam-se os seguintes factos, por provados:
A) O ora Recorrente requereu o decretamento provisório da suspensão de eficácia de duas normas (cf. o respectivo articulado no processo em suporte digital, junto a estes autos).
B) O ora Recorrente não apresentou junto com o seu requerimento cautelar o requerimento inicial da arbitragem necessária (por confissão).
C) O ora Recorrente foi convidado por despacho de 30-05-2019, do Presidente do Colégio Arbitral, a dizer, no prazo de 5 dias, se pretendia convolar o requerimento cautelar em requerimento inicial para requerer a arbitragem necessária ou, antes, se desejava corrigir o requerimento entregue (cf. o respectivo despacho no processo em suporte digital, junto a estes autos).
D) O supra indicado despacho foi comunicado ao ora Recorrente por ofício datado de 30-05-2019, expedido por e-mail e por correio nessa data (cf. o respectivo ofício e notas de expedição no processo em suporte digital, junto a estes autos).
E) O ora Recorrente respondeu em 04-06-2019 indicando que desejava prosseguir o pedido cautelar e que iria entregar o requerimento para a requerer a arbitragem necessária em 10 dias (cf. o respectivo requerimento no processo em suporte digital, junto a estes autos).
F) O Acórdão recorrido foi proferido em 06-06-2019 (cf. fls. 12).
G) Em 06-06-2019 o ora Recorrente entregou junto ao TAD o requerimento inicial para a arbitragem necessária entregue (cf. o respectivo articulado no processo em suporte digital, junto a estes autos).

II. 2. O DIREITO
As questões a decidir neste processo, tal como vêm delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são:
- aferir da nulidade decisória, por a decisão recorrida ser omissa relativamente ao requerimento apresentado pelo Recorrente em 07-06-2019;
- aferir do erro decisório porque o Recorrente cumpriu o convite formulado, dizendo que queria prosseguir com a providência cautelar;
- aferir do erro decisório por o Recorrente ter sido condenado em custas pelo processo que correu no TAD, por um valor claramente excessivo e desproporcional, que ofende o princípio da tutela jurisdicional efectiva.

O juiz deve pronunciar-se sobre todas as questões que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras. Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou os fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. Na sentença, o juiz terá, igualmente, que discriminar os factos que considera provados e em que faz assentar o seu raciocínio decisório e deve indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas que conduzem à decisão final (cf. art.ºs 46.º, 47.º, n.º 1, als. b), c), 61.º, da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto (LTAD), aprovada pela n.º 33/2014, de 16-06 e alterada pela Lei 74/2013, de 06.09, 94.º, n.ºs 2, 3, 95.º, n.º 1, do CPTA, 607.º, n.ºs 2 a 4 e 608º, n.º 2, do CPC).
Não obstante, não tem o juiz que rebater e esmiuçar todos os argumentos e alegações avançados pelas partes, bastando-lhe, para cumprimento do dever de fundamentação, pronunciar-se sobre as concretas questões em litígio, demonstrando que as ponderou. Da mesma forma, tem o juiz que especificar todos os factos alegados e que têm relevo para a decisão, mas não tem que discriminar ou considerar os restantes factos invocados pelas partes, que não tenham relevância na decisão a tomar.
Por seu turno, só o incumprimento absoluto do dever de fundamentação conduz à nulidade decisória. Nestes termos, determina o art.º 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, que é nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de Direito que justificam a decisão. Igualmente, o art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, comina com a nulidade, a sentença que omita pronúncias que sejam devidas, ou para os casos em que o juiz conheça para além das questões de que podia tomar conhecimento.
Ou seja, só ocorre nulidade da decisão por falta de fundamentação se existir uma violação grave desse dever, quer porque na sentença se omita, de todo, o quadro factual em que era suposto assentar, ou este seja ininteligível; quer porque a sentença padeça, em absoluto, de falta de fundamentação de Direito, por não revelar qualquer enquadramento jurídico, ainda que implícito, de forma a deixar, no mínimo, decifráveis os fundamentos da decisão.
Ora, no caso em apreço o Tribunal ponderou as questões em litígio e decidiu-as. Explicou o Tribunal a razão porque não considerava não admissível a providência cautelar e não interposta a acção principal.
Logo, com esta fundamentação não ocorre nenhuma nulidade por omissão de pronúncia.
O Recorrente pode discordar daquela fundamentação, mas a mesma não é reconduzível a uma nulidade decisória.
Por conseguinte, falece a invocada nulidade da decisão.

Nos termos do art.º 41.º, n.º 4, da LTAD, as providências cautelares são intentadas juntamente com o requerimento inicial da arbitragem ou com a defesa.
Conforme o art.º 41.º, n.º 9, da LTAD, as providências cautelares a correr termos no TAD regem-se pelo regime previsto nos art.ºs 362.º a 376.º do CPC, com as devidas adaptações.
Por seu turno, determina o art.º 54.º, n.º 2, da LTAD, que quando se vise a impugnação de um acto, ou o recurso de uma deliberação, ou decisão do órgão de disciplina, ou do órgão de justiça das federações desportivas, de ligas profissionais ou de outras entidades desportivas, o prazo para a apresentação do requerimento inicial para a arbitragem necessária, junto do TAD, é de 10 dias, contados da notificação do acto, deliberação ou decisão (cf. também o art.º 4.º, n.º 3, al. b), da LTAD).
Nos termos do art.º 39.º, n.º 1, da LTAD, o supra indicado prazo de 10 dias é contínuo, não se suspendendo nos sábados, domingos, feriados ou em férias judiciais. Determinam os n.ºs 2 e 4 deste último preceito, que a contagem do prazo inicia-se no dia útil seguinte àquele em que se considere recebida a citação ou a notificação e que quando o prazo para a prática do acto processual terminar em dia em que o Tribunal estiver encerrado, transfere-se o seu termo para o primeiro dia em que o Tribunal estiver aberto.
Como decorre dos autos, o ora Recorrente requereu a suspensão de eficácia de duas normas.
Este requerimento, que foi apresentado num TAF, acabou por dar entrada no TAD após uma decisão de incompetência material.
Porque foi apresentado inicialmente num TAF, o Recorrente não entregou junto com o seu requerimento cautelar o requerimento inicial da arbitragem necessária.
Por isso mesmo, foi o Recorrente convidado, por despacho de 30-05-2019, do Presidente do Colégio Arbitral, a dizer se pretendia convolar o requerimento cautelar em requerimento inicial para requerer a arbitragem necessária ou, antes, se desejava corrigir o requerimento entregue.
O ora Recorrente respondeu em 04-06-2019, indicando que desejava prosseguir o pedido cautelar e que iria entregar o requerimento para a requerer a arbitragem necessária, em 10 dias.
Veio, então, a ser proferido em 06-06-2019 o Acórdão recorrido, que considerou que o ora Recorrente não tinha entregue a acção principal no prazo de 10 dias que vem indicado no art.º 54.º, n.º 2, da LTAD e que não tinha entregue o requerimento cautelar junto com o processo principal, pelo que indeferiu liminarmente o indicado requerimento cautelar.
Diz o ora Recorrente que tal decisão foi errada, pois cumpriu o convite formulado, dizendo que queria prosseguir com a providência cautelar e que em 07-06-2019 veio a apresentar o requerimento inicial para a arbitragem necessária.
Com a presente acção visa-se a suspensão de normas regulamentares aprovadas pela FPF.
Assim, da leitura conjugada dos art.ºs 4.º, n.ºs 1, 3, al. b) e 54.º, n.º 2, da LTAD, resulta que o prazo de 10 dias que vem indicado no art.º 54.º, n.º 2, da LTAD, não se aplicará ao caso vertente, no qual se impugnam as citadas normas regulamentares.
Sem embargo de se admitir que as normas regulamentares em questão constituam um acto (regulamentar) da FPF, que fica abrangido pelo âmbito de competência do TAD, conforme determina o art.º 4.º, n.º 1, LTAD, aquelas mesmas normas já não se enquadram no n.º 3 do mesmo preceito, pois não tem a natureza de acto ou recurso de uma deliberação ou decisão do órgão de disciplina ou do órgão de justiça das federações desportivas, de ligas profissionais ou de outras entidades desportivas.
Portanto, não se acompanha a fundamentação da decisão do TAD quando aplicou ao caso o prazo de 10 dias que vem indicado no 54.º, n.º 2, da LTAD, para a impugnação dos supra referidos actos, deliberações ou decisões.
Mas, igualmente, não se acompanha nem a fundamentação, nem o sentido decisório constante daquela decisão, quando se julgou indeferir o requerimento cautelar, por o ora Recorrente não ter entregue o requerimento inicial para a requerer a arbitragem necessária no prazo que foi fixado pelo despacho do Presidente do Colégio Arbitral.
Como resulta dos autos, o ora Recorrente foi notificado por mail e por ofício, que lhe foi enviado em 30-05-2019, para vir informar, em 5 dias, se pretendia convolar o requerimento cautelar em requerimento inicial para requerer a arbitragem necessária ou, antes, se desejava corrigir o requerimento entregue, por aquele requerimento cautelar não estar acompanhado do requerimento inicial de arbitragem necessária (cf. art.ºs 38.º, 39.º, 41.º, n.ºs 4, 9 e 54.º, n.º 5, da LTAD).
O ora Recorrente respondeu em 04-06-2019, indicando que desejava prosseguir o pedido cautelar e que iria entregar o requerimento para a requerer a arbitragem necessária em 10 dias.
Dos factos reunidos nos autos deriva que ora Recorrente foi notificado do despacho do Presidente do Colégio Arbitral por mail e por ofício, ambos datados de 30-05-2019.
Nos termos do art.º 38.º, n.º 2, da LTAD, ambas as formas de notificação são possíveis, desde que se “proporcione a prova da receção”, sem embargo de a notificação se postal se assumir como “preferencial”.
Do processo em suporte digital junto a estes autos não consta a prova nem do recebimento do mail pelo ora Recorrente, nem do recebimento da carta (pois não terá sido enviada com aviso de recepção).
Assim, para a averiguação da data da notificação do despacho do Presidente do Colégio Arbitral ao ora Recorrente há que lançar mão ao determinado no art.º 248.º, parte final, do CPC, com as devidas adaptações, por força da remissão dos art.ºs 61.º da LTAD e 23.º do CPTA.
Consequentemente, no termos do citado preceito, tal notificação presumir-se-á feita no 3.º dia posterior ao do envio da carta ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando o não seja (cf. também os art.ºs 38.º, 39.º da LTAD).
Logo, há que considerar que o ora Recorrente foi notificado do despacho do Presidente do Colégio Arbitral em 03-06-2019 e que o prazo de 5 dias para apresentar a sua resposta e o requerimento inicial para a arbitragem necessária terminava em 07-06-2019.
Ou seja, conforme decorre do processo em suporte digital junto a estes autos, o ora Recorrente entregou dentro do prazo que lhe foi fixado pelo Presidente do Colégio Arbitral o requerimento inicial para a arbitragem necessária.
Por seu turno, a decisão recorrida foi prolatada antes do termo do prazo que tinha sido conferido ao ora Recorrente para esclarecer ou convolar o requerimento entregue ou para entregar o requerimento inicial do processo principal.
Nesta mesma medida, a decisão recorrida foi errada, pois considerou que o ora Recorrente tinha entregue extemporaneamente o requerimento inicial do processo principal quando essa entrega foi feita dentro do prazo que lhe tinha sido indicado pelo Presidente do Colégio Arbitral.
Quanto à circunstância de o ora Recorrente afirmar no requerimento antes entregue que apresentaria o requerimento inicial do processo principal no prazo de 10 dias, não ilidia a obrigação de o Tribunal Arbitral - após fixar os factos procedimentais relevantes, que omitiu in totum – dever proceder à contagem dos prazos para poder verificar se a entrega deste requerimento no dia 07-06-2019 era atempada, considerando o prazo de 5 dias antes fixado.
Em suma, foi errada a decisão recorrida quando aceitando como certa a afirmação do Recorrente de que entregaria o requerimento no prazo de 10 dias, se eximiu à contagem de quaisquer prazos e concluiu, sem mais, pela extemporaneidade daquela entrega.
Há, pois, que dar procedência ao recurso e revogar a decisão recorrida.

A indicada procedência do recurso prejudicará o conhecimento da invocação relativa ao valor excessivo e desproporcional das custas, pois a revogação daquela decisão implicará que o Tribunal Arbitral não mantenha a condenação do Recorrente em custas, por considerar indeferido o requerimento cautelar.
Sem embargo, sobre este assunto, também já se pronunciou o STA nos P. n.º 0144/17.0BCLSB, de 18-10-2018, n.º 08/18.0BCLSB, de 20-12-2018 ou n.º 033/18.0BCLSB, de 21-02-2019.
Assim, no P. n.º 0144/17.0BCLSB, de 18-10-2018, o STA refere o seguinte: ”Finalmente, no que concerne à isenção das taxas de arbitragem e à violação dos artºs. 13.º, 20.º, nºs. 1 e 2 e 268.º, n.º 4, todos da CRP, que a recorrente, nas conclusões 30 a 33 da sua alegação, imputa ao acórdão recorrido, entendemos que não tem razão.
Efectivamente, resultando dos artºs. 76.º, n.º 2 e 77.º, n.º 3, da Lei do TAD (Lei n.º 74/2013, de 6/9, com as alterações resultantes da Lei n.º 33/2014, de 16/6) que “a taxa de arbitragem corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado” e que esta “é integralmente suportada pelas partes e por cada um dos contra-interessados” e não se encontrando prevista neste diploma, nem na Portaria n.º 301/2015, de 22/9, nenhuma isenção de pagamento dessas taxas, não se pode verificar qualquer desigualdade entre os intervenientes processuais no que a esse pagamento respeita.
E também é insusceptível de infringir os citados preceitos constitucionais a circunstância de, eventualmente, a legislação que introduziu a arbitragem obrigatória se traduzir num agravamento da responsabilidade tributária da recorrente, quando nem sequer é alegado que o novo regime seja de tal modo gravoso que dificulte de forma considerável o acesso aos tribunais.”
Também este TCAS já se pronunciou sobre a questão, considerando infundadas as alegações da desproporcionalidade das custas devidas pela intervenção do TAD, designadamente no Ac. 30/18.6BCLSB, de 22-11-2018, onde se refere o seguinte: “9. Já no que respeita à questão das custas suscitada pelo Recorrente..., trata-se de matéria recorrentemente trazida à apreciação deste TCA, tendo sido já objecto de recurso obrigatório do Ministério Público para o Tribunal Constitucional;
10. De qualquer modo, sempre se referirá que, sem prejuízo de maior aprofundamento nesta matéria, estamos perante um pleito em sede de Jurisdição Arbitral e, como tal, sujeita às regras, nomeadamente de custas, ali definidas pelo legislador e aceites pelas partes;
11. Porém, é certo que os montantes devidos pelas partes em sede de custas, quando comparados com os montantes devidos em sede de Jurisdição Administrativa, poderão revelar-se algo desfasados do regime das custas judiciais;
12. Ora, tal comparação não nos parece totalmente legítima, na justa medida em que as partes pleiteiam em Jurisdições diferenciadas e que, pela sua própria natureza, são, também a nível de regime legal de custas, incomparáveis;
13. Para além de que o TAD se rege por normas próprias de funcionamento, devendo o respectivo regime de custas, além do mais, reflectir e suportar essa realidade;
14. Trata-se de uma verdadeira encruzilhada jurídica na justa medida em que se está perante um Tribunal (TAD) onde, à primeira vista, se dirimem interesses de natureza privada, mas que, no fundo, tendo em conta a natureza jurídica dos intervenientes, nomeadamente as Federações desportivas e o respectivo regime jurídico associado, se tratam de questões de natureza eminentemente pública;
15. Encruzilhada essa que se traduziu nas vicissitudes de natureza constitucional que precederam o difícil processo de criação do TAD e que, infelizmente, ainda acompanham o seu funcionamento;
16. Como seja o caso da especialmente particular opção do legislador em sede do regime legal da arbitragem, mais especificamente ao criar a figura jurídica da "arbitragem necessária", em oposição à denominada "arbitragem voluntária", opção essa que, com todo o respeito, acabou por criar situações como as referidas nos Autos em que as partes são obrigadas a recorrer à arbitragem, quando, na sua essência, a arbitragem deveria, obrigatoriamente, reflectir algo de natureza voluntária...” – em sentido idêntico, vide os Acs. deste TCAS n.º 94/17.0BCLSB em 04-10-2017, n.º 75/18.6BCLSB, de 18-10-2018, n.º 30/18.6BCLSB, de 22-11-2018 ou n.º 79/18.9BCLSB, de 06-12-2018.
Em suma, face à jurisprudência que vem sendo firmada pelo STA e pelo TCAS, que se acompanha, sempre claudicaria esta última alegação de recurso.

III- DISPOSITIVO
Pelo exposto, acordam:
- em conceder provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida quando indeferiu liminarmente a providência cautelar apresentada;
- em determinar o prosseguimento dos autos se a tal nada mais obstar;
- custas pelos Recorridos, em partes iguais.

Lisboa, 22 de Agosto de 2019
(Sofia David)
(António Vasconcelos)
(Mário Rebelo)