Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:8398/15.0BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2021
Relator:ANTÓNIO ZIEGLER
Descritores:MÉTODOS INDICIÁRIOS: ARTº 38º, DO CIRS;
PRESSUPOSTOS DA DETERMINAÇÃO INDIRECTA E ERRÓNEA QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL
Sumário:I) Constituem indícios de falta de veracidade do declarado pelo contribuinte quando se constatam erros e inexactidões na contabilidade que impedem tal determinação directa e exacta da matéria tributável.
II) Presumem-se verdadeiras as declarações efectuadas pelo s.p. de imposto, desde que permitam a liquidação do tributo, caso a ATA não demonstre que se verificaram , ainda que indiciariamente, outros factos tributários assim omitidos.
III) Não constituem elementos a ter em conta no apuramento do lucro tributável, a circunstância de se apurarem diminuições momentâneas na compra de bens , ainda que necessários à actividade da empresa, assim como de alguns custos superiores às vendas, em determinados períodos do exercício , nem resulta demonstrado a omissão de custos incorridos com o intuito de justificar a pretensa diminuição de proveitos, sem qualquer fundamentação que a sustente, que não se pode basear em meros critérios de capacidade produtiva.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
A Fazenda Pública vem deduzir recurso da sentença proferida pelo TAF de Castelo Branco, que considerou procedente a impugnação deduzida por V..... e C....., com os sinais nos autos, contra a liquidação adicional de IRS n.º ....., referente ao exercício de 1994, no montante de 752.094$00, e que, em consequência, anulou esta liquidação, tendo para o efeito apresentado as seguintes conclusões:

a) A douta sentença violou os artigos os artigos 661/1 do CPC. 668/1 alínea d) do CPC factuais artigos 609° e 615° do CPC1. do artigo 125° do CPPT, em virtude do tribunal “a quo” não ter considerado toda a prova carreada aos autos e não se ter pronunciado sobre questões que devia apreciar.
b) Foi desconsiderada pelo tribunal “a quo” a prova carreada aos autos em sede de comissão de revisão, embora a ela faça referência na matéria de facto.
c) Assim, desde logo, a própria impugnante confessa, aquando do pedido da comissão de revisão, que não contabilizou “alguns custos de gasóleo”, acrescentando ou lembrando que a actividade se encontra “sujeita à variação do estado do tempo”, que “não foi tido em linha de conta os dias de produção perdidos pelo tempo de chuva sem se poder laborar uma vez que a produção é a céu aberto, tendo por vezes meses praticamente inteiros sem se produzir na época de Inverno tendo por vezes que se aguardar que os terrenos e os acessos fiquem em condições de circulação”. Factos estes que deverão ser concatenados com a constatação, ou prova, pela fiscalização, que de Julho de 1994 a Junho de 1995 - aqui se incluindo meses de verão, altura em que o consumo de gasóleo é maior como implicitamente confessado pela impugnante e pelas testemunhas trabalhadoras da impugnante - não existem documentos de aquisição de gasóleo, provando ainda que em alguns períodos o consumo do gasóleo é superior às vendas de areia.
d) A constatação da não contabilização ou ocultação de aquisições de gasóleo durante alguns meses do Verão - período em que a produção é maior, como implicitamente confessado pela impugnante é revelador da busca ostensiva de ocultação de custos para mais facilmente ocultar proveitos. Tanto mais que a relação junta aos autos - também não devidamente considerada pelo tribunal “a quo” e que também deve ser conjugada com a prova carreada em sede de comissão de revisão -, que compara as vendas mensais de areia com as aquisições mensais de gasóleo, dá conta do facto das vendas mensais de areia ocorrerem ao longo de todo o ano, não havendo nenhum mês sem venda de areia, ultrapassando inclusivamente as vendas dos meses de Março e Abril as vendas dos meses de Agosto e Setembro.
e) Foi desconsiderado pelo tribunal “a quo” o teste realizado pela inspecção à capacidade de produção da impugnante, prova que deve ser conjugada com a prova carreada em sede de comissão de revisão e com a ocultação de aquisição de gasóleo durante os meses de Verão, meses de maior produção, e com o facto de nunca ter deixado de ser vendida areia durante todo o ano.
f) Foi desconsiderada pelo tribunal “a quo” a prova testemunhal. Note-se que é referido por algumas testemunhas que “a produção mais regular era nos meses de Verão”, que havia mais gastos de gasóleo no Verão “porque produzia mais e menos no Inverno porque produzia menos”. Esta prova revela-se também relevante no sentido de corroborar a omissão ou ocultação ostensiva de custos, desde logo com a aquisição de gasóleo, no sentido de mais facilmente ocultar os proveitos.
g) Verificou-se, pois, a desconsideração desta matéria de facto que vem corroborar, explicitar e aprofundar os vícios da contabilidade apontados pela inspecção como fundamentadores da necessidade inelutável do recurso a métodos indirectos, bem como os anexos ao relatório de inspecção.
h) Assim, deverá ser revogada a douta sentença.
a) No que se refere aos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, eles constam dos autos, tendo sido juntos quer pela impugnante/recorrida, quer pela fazenda. O tribunal “a quo” na matéria de facto desconsiderou a prova carreada aos autos em sede de comissão de revisão, o teste realizado pela inspecção à capacidade de produção da impugnante, a prova testemunhal, a explicitar e a aprofundar os vícios da contabilidade apontados pela inspecção como fundamentadores da necessidade inelutável do recurso a métodos indirectos, bem como os anexos ao relatório de inspecção, sendo de importância relevante no sentido de determinar a revogação da douta sentença, como supra evidenciado.”

Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto Parecer no qual refere que:
“Analisando os autos, entendemos que o recurso deverá proceder.
Desde já se acompanha, na íntegra, o alegado pela recorrente, que se nos afigura suficientemente fundamentado e correctamente formulado, sendo susceptível de pôr em causa os argumentos utilizados pela douta sentença para julgar procedente a reclamação.
Também se acompanha o parecer do M°P° constante de fls. 157 e seg.
De facto, como bem se documenta nos autos, a escrita dos impugnantes contém várias omissões e irregularidades manifestamente indiciadoras de omissão dos proveitos declarados, em especial, a não emissão de facturas, a subfacturação das vendas e falta de emissão de documentos de transporte.
Dada a carência de elementos sérios que permitam apurar claramente os rendimentos dos impugnantes, justifica-se aplicação dos métodos indiciários para apuramento da tributação.
Nestes termos, somos do parecer que o presente recurso deve proceder, devendo a douta decisão sob recurso ser substituída por outra que julgue a impugnação improcedente.”
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Com dispensa dos vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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Na decisão recorrida foi a decisão sobre a matéria de facto a seguinte:

A) A ora impugnante V..... vem exercendo, desde Abril de 1993, como empresária em nome individual a actividade de extracção de areias - CAE 14210 [cf. relatório de inspecção tributária a fls. 76 a80-vevso dos autos, em especial fls. 76],
B) Em cumprimento da Ordem de Serviço n° ..... de 9-5-1996, foi efectuada uma acção de inspecção à ora impugnante em sede de IRS e IVA dos exercícios de 1993, 1994 e 1995 [cf. relatório de inspecção tributária a fls. 76 a 80-verso dos autos, em especial fls. 76].
C) Em 31-07-1996 foi elaborado o relatório final da inspecção tributária, constante de fls. 76 a 80-verso dos autos e Anexos I a IX de fls. 81 a 84 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual se destaca o seguinte teor:
«(-)
3.1.3 Omissão de proveitos (Art.° 38° CIRS)
Da análise à facturação emitida verifica-se que os montantes das vendas mensais são muito irregulares e as quantidades facturadas são diminutas em relação à capacidade de transporte dos veículos dos industriais de construção civil e da fabricação de artigos de cimento. Verifica-se na maior parte dos documentos serem debitados apenas 1 a 3 m3 de areia, quando regra geral os meios de transporte têm capacidade superior a 6 m3.
Os preços praticados nos anos de 93 e 94 foram de 1.00$00/ m3 de areia ou areão, no entanto inexplicavelmente os fornecimentos a autarquias e associações o preço era de 1.500$00/m3. A partir de 2 de Janeiro de 1995 os preços praticados passaram para 1.300$00/m3para industriais de construção civil e 1.700$00 para autarquias e outras entidades.
Dada a irregularidade das vendas mensais, com indícios de subfacturação, procurou-se estabelecer um paralelismo com o consumo de gasóleo que indiciasse da credibilidade das vendas, porquanto o s.p. adquirira gasóleo em grandes quantidades, já que possui um depósito com capacidade para 9.000 litros e no de 1994 e 1995 o seu equipamento se encontrar estabilizado. Em anexo VI demonstram-se as vendas mensais e as aquisições de gasóleo.
Da sua análise verifica-se que em alguns períodos o consumo de gasóleo é superior às vendas de areia e que inclusivamente de Julho de 94 a Junho de 95 (quase um ano), não existem documentos de aquisição de gasóleo. Este comportamento só poderá ser interpretado como objectivo de sonegação de custos para ocultar omissão de vendas e não permitir o apuramento de um índice de produção, sendo claro e inequívoco que as vendas declaradas não tem qualquer credibilidade. Aliás através do processo individual do s.p. pode-se verificar ser prática corrente a não emissão de factura e subfacturação das vendas, como por exemplo o auto de apreensão de 12/09/95 levantado contra Jorge Manuel Rodrigues Tenreira como transportador e contra o s.p como remetente pela falta de emissão e documento de transporte referente a 1,5 m3 de areia e ainda dos autos de apreensão, ambos de 9/2/96, levantados pela Brigada Fiscal da GNR, sediada em Vilar Formoso, um às 11h e 20m, o segundo às 13h 45 m. O primeiro por as quantidades transportadas não corresponderem com o documento de transporte que acompanhou as mercadorias e o dia de emissão do documento de transporte que acompanha as mercadorias e o dia de emissão do documento de transporte. O segundo por as mercadorias não serem acompanhadas por qualquer documento de transporte (junto em Anexos VII, VIII, IX, cópias dos autos de apreensão nos termos do DL. 45/89).
A falta de emissão e inexactidões dos documentos de transporte, bem como as irregularidades praticadas na escrituração das aquisições de gasóleo constituem indícios seguros de que os elementos de escrita não reflectem a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, pelo que se propõe a determinação do lucro tributável por métodos indirectos nos termos da alínea d), do n° 1 do artigo 38° do CIRS, de harmonia com as regras do art.º 52°do CIRC.
Para cálculo das vendas presumidas por métodos indiciários, na falta de credibilidade do consumo de gasóleo que permita o apuramento de um coeficiente técnico que determine as matérias primas produzidas e vendidas, proponho a sua quantificação através da capacidade de produção diária e que em teste realizado durante a visita era de 12 m3/hora, ou seja, 96 m3 num dia normal de trabalho de 8 horas.
São considerados no ano 250 dias úteis e deduzidos 40% no período normal de trabalho para manutenção e reparações de equipamentos, que se reflecte em média na produção de 57,6 m3 de areias, média esta aproximada à facturação no período da visita e que forma de 98 m3, em 23/07796, da do início da visita e 69 m3 a 24 de Julho de 1996.
Os preços utilizados são de 1.000800 em 1994 e 1.300$00 em 1995, por serem os normalmente praticados (.. .)»•
D) Conforme consta do Anexo VI do relatório de inspecção, no exercício de 1994, a impugnante declarou compras de gasóleo no montante 2.936.251 $00 (29.805 litros) tendo declarado vendas de 8.034.325$00 [cf. fls. 87 dos autos].
E) Com base nas conclusões do relatório de inspecção foi efectuada correcção à matéria tributável da impugnante, em sede de IRS, do ano de 1994, com recurso a métodos indiciários, no montante de 5.947.409$00 [cf. relatório de inspecção tributária, a fls. 76 a 80-verso dos autos, em especial fls. 80 e informação de fls. 95 dos autos].
F) Notificada da fixação da matéria tributável com base em métodos indiciários referentes ao exercício de 1994, através do ofício n° ..... da Direcção de Finanças da Guarda datado de 18-06-1997, a impugnante apresentou, em 10-07-1997, reclamação nos termos do artigo 84° do CPT, dirigida ao Presidente da Comissão Distrital de Revisão [cf. documento de fls. 2 a 3 do processo de reclamação apenso aos autos].
G) Em 24-03-1998 reuniu a Comissão de Revisão e não tendo sido possível o acordo entre os vogais foram anexados à acta os respectivos laudos [cf. acta e laudos a fls. 10 a 13 do processo de reclamação apenso].
H) O Presidente da Comissão de Revisão, por despacho proferido em 24-03- 1998, manteve a fixação da matéria colectável [cf. despacho, a fls. 14-verso do processo de reclamação apenso].
I) Na mesma data de 24-03-1998 o Director Distrital de Finanças proferiu despacho de confirmação da decisão do Presidente da Comissão de Revisão [cf. despacho, a fls. 14-verso do processo de reclamação apenso].
J) Em 23-04-1998 foi emitida, em nome dos impugnantes, a liquidação de IRS n° ....., referente ao exercício de 1994, no montante a pagar de 752.094$00, correspondendo o valor de 630.082$00 a imposto e o valor de 122.012$00 a juros compensatórios, com data limite de pagamento em 15-06-1998 [cf. documento de fls. 23 dos autos].
K) A presente impugnação deu entrada na Repartição de Finanças de Aguiar da Beira em 13-08-1998 [cf. carimbo a fls. 2 dos autos].”

Quanto a factos não provados, refere a decisão recorrida que: “Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.”

Em matéria de motivação, consta da decisão recorrida o seguinte:
“A decisão da matéria de facto efectuou-se com base nos documentos juntos aos autos e no processo de reclamação da matéria colectável apenso, conforme discriminado em cada alínea do probatório.”

[Fundamentação de direito 1.ª instância]
“Nos presentes autos vem peticionada a anulação da liquidação de IRS n° ....., referente ao exercício de 1994, emitida pela AT na sequência de uma inspecção tributária à impugnante.
Conforme referido supra, a questão essencial a decidir consiste em saber se no caso dos autos se encontram devidamente fundamentados os pressupostos para a Administração Tributária proceder à fixação da matéria colectável com recurso a métodos indiciários, não sendo de conhecer de quaisquer outras questões, por prejudicadas, em caso de resposta negativa.
Vejamos.
No âmbito do CPT, vigente à data dos factos, o legislador estabeleceu um especial dever de fundamentação sobre a AT sempre que esta lance mão dos métodos indiciários, prevendo no artigo 81° do referido código que “ A decisão da tributação por métodos indiciários ou por presunções, nos casos e com os fundamentos expressamente previstos em leis tributárias, especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável e indicará os critérios utilizados na sua determinação”.
Deste modo, o recurso a métodos indiciários constitui um meio excepcional e subsidiário de determinação da matéria colectável através de presunções ou outros elementos de que a AT disponha.
Excepcional porque apenas admitido nos casos previstos na lei.
Subsidiário porque na determinação da matéria tributária a regra geral é de aquela deve fazer-se pelo lucro real e efectivo, com base nas declarações de rendimentos e na contabilidade dos sujeitos passivos que beneficiam de uma presunção de veracidade [cf. artigo 78° do CPT].
Conforme resulta patenteado do relatório de inspecção, a aplicação dos métodos indiciários para o apuramento da matéria tributável do ano de 1994 teve como pressuposto normativo o artigo 38° do CIRS, o qual dispunha nos seguintes termos:
“1 - A determinação do lucro tributável por métodos indiciários verificar-se-á sempre que ocorra qualquer dos seguintes factos:
a) Inexistência de contabilidade ou dos livros e registo exigidos nos artigos 111º e 112°, bem como a falta, atraso ou irregularidade na sua execução, escrituração ou organização;
b) Recusa de exibição da contabilidade, dos livros de registo e demais documentos de suporte legalmente exigidos e, bem assim, a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação;
c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com propósito de dissimular a realidade perante a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos;
d) Erros ou inexactidões no registo das operações ou indícios seguros de que a contabilidade ou os livros de registo não reflectem a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido.
2 - A aplicação dos métodos indiciários em consequência de anomalias e incorrecções da contabilidade ou dos livros de registo só poderá verificar-se quando não seja possível a comprovação e a quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação do lucro tributável. (...)”
Trata-se, assim, de casos em que o contribuinte falha no seu dever de colaboração com a AT.
De facto, sobre os contribuintes impende o dever de colaborar com a AT, donde caso cumpram os seus deveres de declarativos e de organização contabilística, conforme dispõe o artigo 78° do CPT, “presume-se a veracidade dos dados e apuramento decorrentes, salvo se se verificarem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte”.
Assim, para afastar a presunção de veracidade da escrita do sujeito passivo, caberá à AT, em harmonia com os princípios da legalidade e da juridicidade, fundamentar o acto de aplicação de métodos indiciários, através da subsunção de determinados dados de facto em qualquer das previsões normativas do artigo 38° do CIRS, fazendo a prova efectiva dos factos que invoca no caso dos vícios formais, ou, no caso dos vícios materiais, a demonstração de indícios objectivos e suficientemente sólidos, que permitam concluir pela violação dos deveres de colaboração por parte do sujeito passivo.
Em qualquer caso, a AT deve justificar a relação existente entre a violação dos deveres de colaboração e a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável.
Ora, no caso vertente, conforme se extrai do relatório de inspecção tributária, a AT aponta os seguintes motivos para determinar o lucro tributável do impugnante com base em métodos indiciários:
- (i) vendas mensais irregulares;
- (ii) quantidades facturadas diminutas em relação à capacidade dos meios de transporte;
- (iii) consumo de gasóleo, em alguns períodos, superior às vendas de areia;
- (iv) ausência de documentos de aquisição de gasóleo, em alguns períodos;
- (v) falta de emissão de factura e do documento de transporte;
- (vi) inexactidão do documento de transporte.
Ora, em face dos motivos indicados no relatório de inspecção, isoladamente considerados ou conjugados entre si, julgamos que não se verificam os pressupostos justificativos da tributação por métodos indirectos, senão vejamos.
Quanto ao motivo referido em (i) - vendas mensais irregulares - tal asserção não revela qualquer irregularidade ou inexactidão da contabilidade, nem constitui circunstância adequada a inferir a omissão de vendas por parte do sujeito passivo, não podendo servir de pressuposto justificativo para a tributação de métodos indirectos.
Em relação ao motivo referido em (ii) - quantidades facturadas diminutas em relação à capacidade dos meios de transporte - tal circunstância desacompanhada de quaisquer outros elementos de facto adequados a indiciar uma situação de subfacturação, não permite inferir omissão de vendas, sendo certo que, os factos relatados no relatório de inspecção referentes aos autos de apreensão levantados pela Brigada Fiscal da GNR, ocorreram em 12/09/1995 e em 9/02/1996, pelo que tal factualidade, face ao seu espectro temporal, nunca poderá servir de pressuposto justificativo para a tributação de métodos indirectos quanto ao exercício de 1994, em causa nos autos.
No que concerne ao motivo referido em (iii) - constatação de que em alguns períodos o consumo de gasóleo é superior às vendas - importa salientar que, conforme referido no relatório de inspecção, a impugnante adquire gasóleo em grandes quantidades e possui um depósito com capacidade de 9.000 litros, constatação que permite explicar e justificar que, naturalmente, em alguns meses as compras de gasóleo sejam superiores às vendas de areias, sem que daí seja minimamente razoável extrair qualquer indício de omissão de proveitos, até porque a inspecção tributária não demonstra que, em termos globais, as compras de gasóleo excedam as vendas de areia, pelo contrário, o que os autos revelam é que, no exercício de 1994, a impugnante adquiriu gasóleo no montante de 2.936.251$00 e realizou vendas de areia no montante 8.034.325$00.
Quanto ao motivo referido em (iv) - ausência de documentos de aquisição de gasóleo em alguns períodos - tal factualidade não indicia omissão de proveitos. Na verdade, a não contabilização de custos com a aquisição de gasóleo em alguns meses de 1994 e de 1995 encontra igualmente explicação na circunstância da impugnante adquirir gasóleo em grandes quantidades face à sua capacidade de armazenamento, não se compreendo a relevância de tal facto para presumir omissão de vendas.
Por fim, em relação aos pressupostos referidos em (v) - falta de emissão de factura e do documento de transporte - e em (vi) - inexactidão do documento de transporte - não podem os mesmos assumir relevância como causa justificativa da tributação de métodos indiciários, porquanto, conforme anteriormente salientado, tais factos - extraídos dos autos de apreensão levantados pela Brigada Fiscal da GNR - ocorreram em 12/09/1995 e em 9/02/1996, pelo que tal factualidade, ainda que fosse demonstrada nos autos, face ao seu espectro temporal, nunca poderia servir de pressuposto justificativo para a tributação de métodos indirectos quanto ao exercício de 1994.
Decorre de todo o exposto que, no caso dos autos, a AT não fundamentou adequadamente os pressupostos de que depende a tributação por métodos indirectos, o que constitui vício de violação de lei, por erro nos pressupostos, e determina a procedência da presente impugnação com a consequente anulação do acto de liquidação impugnado.
Com a procedência deste vício ficam prejudicados todos os demais [cf. artigo 608°, n° 2, do CPC, ex vi artigo 2o, alínea e), do CPPT].
Em relação ao pedido de condenação em juros indemnizatórios, os impugnantes não alegam, nem os autos demonstram que tenham sido pagas quaisquer quantias referentes à liquidação impugnada, pelo que não se mostram devidos juros indemnizatórios.”

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Começando por analisar a falta de pronúncia sobre a matéria alegada relativa ao debate instrutório em sede de comissão de revisão da matéria tributável e da prova testemunhal realizada nos autos, por falta de indicação no probatório , do resultado da decisão proferida pelo D.D.F. competente para a decisão do pedido de revisão da fixação do rendimento tributável da categoria “C”, de IRS do ano de 1994, com base nos motivos que determinaram a quantificação do rendimento líquido por métodos indirectos, conforme sustentada na manutenção inalterada do rendimento global líquido de 3.395.786$ do ano de 1992,enquanto efectuada ao abrigo do disposto no artº 89º do CPT, importa desde já afirmar que tais factos relativos à Comissão de Revisão da fixação do rendimento liquido por métodos indiciários foram levados ao probatório conforme resulta das alíneas F) a I), do mesmo, e mereceram a apreciação das motivações que levaram á dita fixação do rendimento colectável. Ora,
Do laudo da F.P vem-se exactamente invocar as ditas disparidades relatadas pela I.T. no seu relatório, entre o facturado pela venda de areia e a capacidade de transporte de tais inertes por veículo transportador; na não contabilização entre Julho de 1994 e Junho de 1995, de aquisição de gasóleo para o transporte da mercadoria; da falta de documentos de acompanhamento das mercadorias vendidas face aos autos de apreensão de veículos de transporte de areia; dos motivos de aplicação de métodos indiciários e de correcta quantificação ao abrigo do disposto no artº 38º, do CIRS, pelo que a decisão proferida pelo Presidente da Comissão de revisão , de 24.03., e correspondente despacho da mesma data do D.D.F. competente , de concordância com as anteriores decisões e laudo da ATA, não decorre qualquer omissão de pronuncia quanto às questões postas nos autos na respectiva causa de pedir formulada pelo recorrido, sendo que quanto ao referido debate contraditório vertido no referido procedimento de revisão da matéria tributável , o mesmo se encontra incluído nos factos levados ao probatório e objecto de concreta avaliação desse meio de prova através da análise critica das provas, indicando quais os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção .
Quanto à alegada prova testemunhal que não teria sido levado ao probatório, tendo o recorrente impugnado correctamente, ao abrigo do disposto no artº 640º, nº 1, indicando a prova testemunhal que imporia decisão especifica sobre tais factos que deveriam ser dados como provados nos autos, no sentido de considerar o seu conteúdo quanto às quantias habituais de venda de areia nos períodos de Verão, importa sublinhar que , da sua leitura não resultam quaisquer factos relevantes aos autos, por os mesmos serem de carácter genérico e não dotados de razões de ciência sobre o volume em concreto das vendas efectuadas pelo recorrido naquele ano em causa nos autos, sendo que , na avaliação critica da prova realizada nos autos o Mº Juiz da causa refere que, em matéria de motivação sobre os fundamentos que foram decisivos para sua convicção acerca de cada facto, resultou o seguinte :
“A decisão da matéria de facto efectuou-se com base nos documentos juntos aos autos e no processo de reclamação da matéria colectável apenso, conforme discriminado em cada alínea do probatório.”.
Ora, tal constitui fundamentação suficiente para aferir das razões porque o Tribunal decidiu de uma maneira e não de outra, face ao pedido e a causa de pedir formulado nos autos, sendo para mais certo que os depoimentos das testemunhas arroladas nos autos resultam em meros juízos conclusivos e carecem de qualquer suporte factual quanto às condições concretas de exercício de actividade por banda do recorrido naquele ano de 1994.
Improcede assim a alegada omissão de pronúncia sobre as questões suscitadas nos autos.- cfr 1ª parte da alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC.
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Quanto ao erro de julgamento da matéria de facto, é evidente que o Tribunal A Quo não tinha o dever de levar ao probatório toda a matéria alegada, tendo e bem , seleccionado apenas as que relevam para a decisão, levando em consideração as causas de pedir que fundamentam o pedido formulado pelo autor, segundo as várias soluções plausíveis de direito ( cfr Ac. do TCAS, de 15.05.2014, proferido no proc. nº 07508).
Encontra-se assim correctamente selecionada a matéria de facto nos autos de acordo com os elementos probatórios a serem considerados e que se mostrassem como pertinentes e/ ou necessários a uma justa composição do litigio, pelo que entende-se que improcede tal erro de julgamento com esse fundamento. Também assim relativamente ao afirmado pelo recorrido no seu requerimento de reclamação para a Comissão de Revisão, que alegadamente reconheceria a falta de registo das compras de gasóleo em certos períodos, tal encontra-se justificado naquele pedido de revisão em razão dos motivos que dela constam e que não relevaram na fundamentação material das correcções efectuadas pela ATA, pelo que tal argumento utilizado pela Recorrente não sustenta qualquer obrigatoriedade de dela conhecer nesta sede.
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Estabilizada a matéria de facto , vejamos então se se verifica qualquer erro de julgamento de direito na fixação dos efeitos da norma que prevê aquele determinação indirecta do rendimento colectável a que se refere o artº 38º do CIRS.
Sustenta a recorrente tal inviabilidade de apuramento do lucro tributável da recorrida pelos facto de alegados erros e inexactidões no registo das operações e na sua contabilização , dado que os mesmos não refletem a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido pela recorrida, pelos seguintes factos, conforme se retira da sentença:
“… a AT aponta os seguintes motivos para determinar o lucro tributável do impugnante com base em métodos indiciários:
- (i) vendas mensais irregulares;
- (ii) quantidades facturadas diminutas em relação à capacidade dos meios de transporte;
- (iii) consumo de gasóleo, em alguns períodos, superior às vendas de areia;
- (iv) ausência de documentos de aquisição de gasóleo, em alguns períodos;
- (v) falta de emissão de factura e do documento de transporte;
- (vi) inexactidão do documento de transporte.
Ora, como bem se assinala na sentença sub Júdice , não constituem tais motivos fundamento suficiente da falta de elementos indispensáveis à correcta determinação do lucro tributável do s.p., enquanto baseada na existência de quaisquer anomalias ou incorrecções no registo das operações que inviabilizassem a comprovação e a quantificação directa e exacta do respectivo rendimento do contribuinte, porquanto, como aí se diz e se dá por reproduzido:
“… Quanto ao motivo referido em (i) - vendas mensais irregulares - tal asserção não revela qualquer irregularidade ou inexactidão da contabilidade, nem constitui circunstância adequada a inferir a omissão de vendas por parte do sujeito passivo, não podendo servir de pressuposto justificativo para a tributação de métodos indirectos.
Em relação ao motivo referido em (ii) - quantidades facturadas diminutas em relação à capacidade dos meios de transporte - tal circunstância desacompanhada de quaisquer outros elementos de facto adequados a indiciar uma situação de subfacturação, não permite inferir omissão de vendas, sendo certo que, os factos relatados no relatório de inspecção referentes aos autos de apreensão levantados pela Brigada Fiscal da GNR, ocorreram em 12/09/1995 e em 9/02/1996, pelo que tal factualidade, face ao seu espectro temporal, nunca poderá servir de pressuposto justificativo para a tributação de métodos indirectos quanto ao exercício de 1994, em causa nos autos.
No que concerne ao motivo referido em (iii) - constatação de que em alguns períodos o consumo de gasóleo é superior às vendas - importa salientar que, conforme referido no relatório de inspecção, a impugnante adquire gasóleo em grandes quantidades e possui um depósito com capacidade de 9.000 litros, constatação que permite explicar e justificar que, naturalmente, em alguns meses as compras de gasóleo sejam superiores às vendas de areias, sem que daí seja minimamente razoável extrair qualquer indício de omissão de proveitos, até porque a inspecção tributária não demonstra que, em termos globais, as compras de gasóleo excedam as vendas de areia, pelo contrário, o que os autos revelam é que, no exercício de 1994, a impugnante adquiriu gasóleo no montante de 2.936.251$00 e realizou vendas de areia no montante 8.034.325$00.
Quanto ao motivo referido em (iv) - ausência de documentos de aquisição de gasóleo em alguns períodos - tal factualidade não indicia omissão de proveitos. Na verdade, a não contabilização de custos com a aquisição de gasóleo em alguns meses de 1994 e de 1995 encontra igualmente explicação na circunstância da impugnante adquirir gasóleo em grandes quantidades face à sua capacidade de armazenamento, não se compreendo a relevância de tal facto para presumir omissão de vendas…”. Nesta matéria importa precisar um aspecto da maior relevância à economia do preceito, a saber: o que a I.T. pretende com tal afirmação é o de concluir que , havendo vendas de tais bens durante todo o ano, tornar-se-ia incongruente a falta de aquisição de gasóleo durante certos períodos do ano e que, portanto, tal indiciaria a omissão de compras, ou da necessária documentação de suporte, o que é suficientemente infirmado pelo Tribunal A Quo, em razão do stock de combustível acumulado pelo recorrido e não se demonstrando tal falta de contabilização de custos, carecia de necessária causalidade adequada à diminuição dos proveitos.
Por fim, em relação aos pressupostos referidos em (v) - falta de emissão de factura e do documento de transporte - e em (vi) - inexactidão do documento de transporte , entendeu o tribunal recorrido, e bem que “…não podem os mesmos assumir relevância como causa justificativa da tributação de métodos indiciários, porquanto, conforme anteriormente salientado, tais factos - extraídos dos autos de apreensão levantados pela Brigada Fiscal da GNR - ocorreram em 12/09/1995 e em 9/02/1996, pelo que tal factualidade, ainda que fosse demonstrada nos autos, face ao seu espectro temporal, nunca poderia servir de pressuposto justificativo para a tributação de métodos indirectos quanto ao exercício de 1994.”. Assim,
Não provando a ATA que se verificaram erros e inexactidões no registo das operações , máxime de que houve compras de gasóleo em determinado período sem documento de suporte das mesmas e/ ou omissão do registo de compras, ou de que a contabilidade não reflectia o resultado efectivamente obtido, ou da constatação de qualquer desvio entre o consumo de gasóleo (adquirido) e as quantidades de inertes facturado ( vendido), assim como da comparabilidade do resultado obtido com as vendas face á capacidade de produção apurada pela I.T., a qual, no caso de esta última relevaria apenas em sede de quantificação do lucro tributável por métodos indirectos, enquanto baseada nos ditos pressupostos da sua determinação indirecta , cuja demonstração sobre si recaía quanto aos pressupostos da aplicação de tais métodos indiciários , assim como da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação do lucro tributável ( cfr nº1, alínea d) e nº 2, todos do artº 38º, do CIRS.-vd regras gerais sobre o ónus da prova, o disposto no artº 342º, do C.Civil.
Assim subsumidos os factos apurados á norma correcta , ínsita no artº 38º, do CIRS, pode-se concluir, como discorre a sentença ora controvertida , no sentido de que a AT “…não fundamentou adequadamente os pressupostos de que depende a tributação por métodos indirectos, o que constitui vício de violação de lei, por erro nos pressupostos”, e que assim legitimariam a aplicação de métodos indiciários, pelo que entende este Tribunal que improcede o recurso deduzido pela F.P. , decisão que se concretiza na parte dispositiva do presente acórdão.

Dispositivo
Nos termos expostos vai negado provimento ao recurso, sendo mantida a decisão proferida pelo Tribunal a Quo, e considerada procedente a impugnação deduzida do acto tributário controvertido.
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Custas pela F.P., que beneficia de isenção de custas ao abrigo do regulamento de custas à data da interposição da presente petição de impugnação.

Notifique.

[O relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores Mário Rebelo e Patrícia Manuel Pires ].