Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:754/19.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:04/27/2023
Relator:PAULA FERREIRINHA LOUREIRO
Descritores:ART.º 20.º, N.ºS 5 E 6 DO DECRETO-LEI N.º 503/99
DEVER LEGAL
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO DO REQUERIMENTO
Sumário:I- Considerando os factos que constam do probatório- e que não foram impugnados-, não remanesce dúvida absolutamente alguma de que a Recorrente não reúne os requisitos de que depende a operatividade do art.º 20.º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 503/99, dado que, não só não lhe foi reconhecida- nunca- a existência de qualquer incapacidade permanente, como é manifesto que a eventual incapacidade temporária que a Recorrente pudesse sofrer não durava há mais de 36 meses.
II- E, por isso, não tinha o Recorrido qualquer obrigação ou dever de espoletar o procedimento para a fixação de incapacidade permanente junta da Caixa Geral de Aposentações, por forma a que a Recorrente, sob a alçada deste Instituto, fosse submetida a junta médica com esse objetivo.
III- Também não se descortina qualquer motivo que aconselhasse ou determinasse o enquadramento dos pedidos formulados pela Recorrente, de reabertura do processo de acidente em serviço, no âmbito do n.º 6 do art.º 20.º do citado Decreto-Lei n.º 503/99, antes se mostrando perfeitamente razoável o enquadramento dos pedidos da Recorrente no domínio do art.º 21.º do mesmo diploma, pois que os pedidos apresentados pela Recorrente foram enquadrados pela própria como reabertura, ou reavaliação do processo de acidente de trabalho, inculcando a convicção de que a pretensão da Recorrente seria, naturalmente, a de rever a decisão de alta clínica e da insubsistência de incapacidade temporária.
IV- E, por estas razões também, é destituído de sentido pugnar pela existência de algum dever por parte do Recorrido de convidar a Recorrente a aperfeiçoar os seus pedidos, sendo certo que, e de qualquer modo, face ao prescrito nos art.ºs 102.º e 108.º do Código do Procedimento Administrativo, não se identifica justificação para a formulação de tal convite, nem, de resto, a Recorrente o explica.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
*** ***
Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I- RELATÓRIO
BB. (Recorrente) vem interpor recurso jurisdicional do saneador-sentença proferido pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa em 21/03/2022, pelo qual foi julgada improcedente a ação administrativa especial proposta contra o Município de Lisboa (Recorrido).

Nesta ação especial urgente, a Recorrente veio peticionar a condenação do Recorrido a “proceder à fixação de incapacidade permanente derivada do ocorrido acidente de trabalho, em ordem a poder ser instruído o competente processo de acidente em serviço, e ser submetida a junta médica”, nos termos previstos no art.º 20.º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, “para confirmação e atribuição de incapacidade e desvalorização”. Mais pediu a ora Recorrente a condenação do Recorrido a pagar-lhe as “remunerações devidas pelas faltas ao serviço, no período de 16.08/2018 até à presente data e as mais que lhe forem devidas, enquanto perdurar a baixa por conta das lesões com relação causal com o acidente de serviço e, o mais que for legal”.
Em 21/03/2022, foi proferido saneador-sentença, tendo sido julgada improcedente a ação e o Recorrido absolvido dos pedidos.
Inconformada com o julgado, a Recorrente apela a este Tribunal Central Administrativo, imputando erro de julgamento à decisão recorrida e, consequentemente, clamando, pela revogação da mesma e inerente procedência dos pedidos condenatórios.
As alegações do recurso que apresenta culminam com as seguintes conclusões:
«CONCLUSÕES:
A A sentença (despacho-saneador) considera que, dado que a recorrente teve alta do acidente de trabalho sem desvalorização, não podia pedir a junta médica a que alude o artigo 20º, nº 5 do D.L. nº 503/99;
B Ora, a recorrente pediu a reabertura do processo de acidente de trabalho, precisamente por ter tido alta sem desvalorização, impondo-se que o recorrido tivesse dado execução ao previsto no mesmo artigo 20º nº 6 daquele diploma que remete para o seu nº 5;
C Porém, ao invés de ter desencadeado essa junta médica, o recorrido optou por realizar juntas médicas internas que nada decidiram relativamente à pretendida fixação de incapacidade;
D Se o recorrido tinha alguma dúvida sobre a pretensão da recorrente – embora se afigure claro que esta se estava a insurgir contra a decisão da alta sem desvalorização – tinha o dever de a ter convidado a aperfeiçoar o seu pedido, nos termos do artigo 108º do CPA;
E A Administração deve agir de boa-fé e em colaboração com os particulares (artigos 10º e 11º do CPA), na garantia da tutela efetiva dos direitos dos administrados (artigo 268º, nº 4 da CRP);
F Assim não considerando a sentença recorrida viola estes normativos;
G A sentença recorrida não tem razão ao considerar que a recorrente não acionou corretamente o artigo 20º do Decreto-Lei 503/99, e que o recorrido não deve ser condenado a pedir a junta médica do artigo 20º/5;
H Com efeito, o artigo 20º, nº 6 daquele diploma, no qual se enquadra o pedido formulado pela recorrente – com alta e sem incapacidade fixada - para reabertura do processo de acidente de serviço remete, precisamente, para o mencionado nº 5;
I Assim, também estes normativos se mostram violados pela sentença recorrida. Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e assim se fazendo JUSTIÇA!»

O Recorrido Município, notificaoa para tanto, apresentou as respetivas contra-alegações, concluindo o seguinte:
«Conclusões:
1. A questão a decidir nos autos, consistia em aferir se deveria a Recorrida, E.D., ser condenada a submeter a Recorrente a uma junta médica, nos termos do disposto no nº 5 do artigo 20º do Decreto-Lei nº 503/99, de 20.11, para confirmação e atribuição de incapacidade e desvalorização decorrente de acidente de trabalho.
2. Bem esteve a douta Sentença aqui em crise, porquanto não se encontra fundamento para acolher as razões e os fundamentos invocados pela Recorrente.
3. Desde logo, como facto não provado, considerou a douta Sentença aqui em crise, o seguinte: “1) Que desde 16/08/2018, a A. está na situação de incapacidade para o trabalho com baixa médica, certificada pela Segurança Social, alegado pela A., no artigo 10º da PI.”.
4. Por outro lado, não evidenciam os autos que, após a alta concedida pelo médico assistente, a A. não se sentia em condições de retomar a sua atividade habitual, tanto que, como resulta provado, só em 14/08/2018 (cerca de dois meses depois) pediu a reabertura do processo de acidente de trabalho.
5. Acresce, não foi reconhecida à A. uma incapacidade permanente, pelo acompanhamento médico a que foi submetida, nem resulta provado que a sua incapacidade temporária decorrente de acidente de trabalho tenha durado mais de 36 meses (3 anos), os quais, não se haviam completado ainda à data de interposição da presente ação). Resulta provado que durou cerca de um mês.
6. Razões pelas quais, não se verificam no caso concreto, os pressupostos legais prescritos no n.º 5 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, para a condenação da ED a submeter a A. a junta médica da CGA, aí prevista, como peticionado.
7. Acresce que não resulta provada qualquer omissão ou inércia por parte da ED, relativamente aos pedidos de reabertura do processo de acidente de trabalho apresentados.
8. Não concordando com os sucessivos relatórios, poderia a A. ter lançado mão do disposto no artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 503/99, ou seja, através de pedido de junta de recurso, o qual, face ao aqui alegado, se afigura poder conferir uma mais plena tutela dos direitos que a A. configura, que através da presente ação, a qual por não provada, é improcedente.»

*
Notificado para tanto, o Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo não emitiu parecer de mérito.

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Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à Conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.


II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respetivas conclusões, consubstancia-se, primeiramente, em apreciar se a sentença recorrida padece de erro de julgamento, dimanante da violação do preceituado no art.º 20.º, n.ºs 5 e 6 do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, e, em segundo lugar, se a ocorre violação dos princípios da boa-fé e de colaboração com os particulares, previstos nos art.ºs 10.º e 11.º do Código do Procedimento Administrativo, mormente, por o Recorrido não ter convidado a Recorrente ao aperfeiçoamento do seu pedido de submissão a junta médica, de acordo com o disposto no art.º 108.º também deste mesmo diploma.


III- FACTUALIDADE PROVADA
O saneador-sentença recorrido considerou provados os factos que se enumeram de seguida:
«A) A. celebrou com a ED contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado em 16/04/2018, com inicio nessa data, para o desempenho de funções correspondentes à atividade de cantoneiro de limpeza da categoria de assistente operacional, pela remuneração mensal ilíquida de € 580, sujeita aos descontos legais, acrescida dos subsídios de refeição, de férias e de Natal, bem como dos suplementos remuneratórios devidos pelo exercício de funções - cfr. cópia o contrato de trabalho junta como documento 1 da PI;
B) Relativamente ao mês de maio de 2018, a A. auferiu para além do vencimento, trabalho extraordinário e noturno e subsídios, designadamente de alimentação - cfr. recibo de vencimento junto como documento 2 da PI;
C) Em 14/05/2018 a A. foi admitida na urgência polivalente do Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE, por acidente de trabalho, pelas 12.20 h, de onde teve alta no mesmo dia, pelas 12.50h. Na nota de alta emitida constam as seguintes anotações: -
«Imagem em texto no original»
cfr. fls. 7 do PA;
D) Em 15/05/2018, os serviços da ED realizaram à A. entrevista relativa ao acidente de 13/05/2018, n.º 0387/2018, na qual foi descrito o seguinte:

- cfr. documento 3 da PI a fls. 5 do PA;
E) Em 18/05/2018, a A. realizou ecografia osteoarticular (ombro direito e ombro esquerdo) na qual foi redigido o seguinte relatório:

- cfr. documento 4 da PI a fls. 13/v do PA;
F) Em 18/05/2018 a A. realizou Estudo Radiológico das mãos e ombros, nos quais foi elaborado o seguinte relatório:

- cfr. fls. 21/v do PA;
G) Em 28/05/2018 foi emitido o seguinte relatório relativo a ressonância magnética cervical:

- cfr. fls. 28 do PA;
H) Em 05/06/2018 o Diretor do Departamento de Saúde Higiene e Segurança dos serviços da ED, qualificou como acidente em serviço o ocorrido em 13/05/2018 e participado pela A., visando as despesas dele resultantes - cfr. fls. 14 do PA;
I) Em 05/06/2018 o resultado de aptidão da A., após consulta médica, consistia em “apto condicionalmente” “deve evitar o arrastamento, transporte e levantamento de cargas sem ser acompanhada. ITP até 16/06/2018 dia em que é reavaliada em ortopedia” - cfr. ficha de aptidão para o trabalho, junta como documento 5 da PI, a fls. 29 do PA;
J) Em 14/06/2018 o resultado de aptidão da A., após consulta médica, consistia em “apto” - cfr. ficha de aptidão para o trabalho, junta como documento 5 da PI, a fls. 30 do PA;
K) Dá-se por reproduzido o documento a fls. 8 a 12 do PA, relativo ao acompanhamento médico do acidente de trabalho referido em D);
L) Em 14/08/2018 a A. pediu a reabertura do processo de acidente de trabalho ocorrido em 13/05/2018, assinalando queixas: “dores nas duas mãos” - cfr. documento 6 da PI a fls. 33 do PA;
M) Do pedido de reabertura do processo de acidente de trabalho ocorrido em 13/05/2018 apresentado em 16/08/2018, junto como documento 6 da PI, consta a anotação “sem efeito” e o seguinte:
«Imagem texto no original»
- cfr. fls. 34 do PA;
N) Em 04/09/2018 a A. pediu a reabertura do processo de acidente de trabalho ocorrido em 13/05/2018, assinalando queixas: “dores” - cfr. fls. 35 do PA;
O) Em 13/09/2018 foi realizada à A. a entrevista de reavaliação de processo de acidente de trabalho, da qual foi elaborado o documento a fls. 36/v e 37 do PA e emitido o parecer médico “Marcar J.M.M.” em 21/09/2018 - cfr. fls. 37/v do PA;
P) Em 04/10/2018 a A. foi submetida a Junta Médica, cuja avaliação se encontra a fls. 39 e 40 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e se destaca a seguinte decisão: «Mantém situação atual. Voltará a ser reavaliada em 18/10/18 com ecografia.» - cfr. fls. 40 do PA;
Q) Em 18/10/2018 a A. foi submetida a Junta Médica, cuja avaliação se encontra a fls. 42 e 43 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e se destaca o seguinte:


- cfr. fls. 43 do PA;
R) Em 18/10/2018, a Junta Médica Municipal comunicou que o pedido de reabertura de acidente de trabalho não foi aceite por “inexistência de nexo de causalidade” - cfr. documento 7 da PI, a fls. 41 do PA;
S) Em dia e mês que não se apurou, mas do ano de 2018, foi emitida a declaração sobescrita pelo neurocirurgião MM., dos Serviços Sociais da Câmara Municipal de Lisboa, junta como documento 9 da PI e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
T) Em 04/02/2019 a A. pediu a reabertura do processo de acidente de trabalho ocorrido em 13/05/2018, assinalando o seguinte:


- cfr. fls. 44 e 45 do PA;
U) Em 05/02/2019 foi realizada à A. entrevista de reavaliação de processo de acidente de trabalho, da qual foi elaborado o documento a fls. 49 e 50 do PA e emitido o parecer médico “Marcar J.M.M.” em 21/09/2018 - cfr. fls. 37/v do PA;
V) Em 14/03/2019 a A. foi submetida a Junta Médica, cuja avaliação se encontra a fls. 57 e 58 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e se destaca o seguinte:
«Imagem texto no original»



- cfr. fls. 57 e 58 do PA;
W) Em 14/03/2019, a Junta Médica Municipal comunicou que o pedido de reabertura de acidente de trabalho não foi aceite por “inexistência de nexo de causalidade” - cfr. documento 8 da PI;
*
Factos não provados:
1) Que desde 16/08/2018 a A. está na situação de incapacidade para o trabalho com baixa médica, certificada pela Segurança Social, alegado pela A. no artigo 10.º da PI.
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A convicção que permitiu dar como provados os factos acima descritos assentou no teor dos documentos constantes dos autos, do processo administrativo, e na posição das Partes, conforme discriminado em cada uma das alíneas dos factos provados.
Quanto ao facto não provado, porquanto o mesmo carece de prova documental a qual não foi junta aos autos pela A..»



IV- APRECIAÇÃO DO RECURSO
A Recorrente vem impetrar a decisão recorrida, imputando-lhe erros de julgamento, concretamente, a violação do disposto no art.º 20.º, n.º 5 e 6 do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, bem como a violação dos princípios da boa-fé e de colaboração com os particulares, previstos nos art.ºs 10.º e 11.º do Código do Procedimento Administrativo, mormente, por o Recorrido não ter convidado a Recorrente ao aperfeiçoamento do seu pedido de submissão a junta médica, de acordo com o disposto no art.º 108.º também deste mesmo diploma.
Vejamos, pois, se lhe assiste razão.

A Recorrente não se conforma com o julgado pelo Tribunal a quo no que concerne à inexistência do dever de o Recorrido de comunicar a situação da Recorrente à Caixa Geral de Aposentações, a fim desta a submeter à devida junta médica para efeitos de confirmação ou verificação da eventual incapacidade permanente resultante do acidente e de avaliação do respetivo grau de desvalorização, em conformidade com o que está estipulado no n.º 5 do art.º 20.º do decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro.
Com efeito, o Tribunal recorrido fez soçobrar a pretensão da Recorrente por entender que não se encontravam reunidos os requisitos inscritos no aludido art.º 20.º, n.º 5. O Tribunal recorrido fundamentou a sua decisão do seguinte modo:
«Através da presente ação administrativa, pretende a A., a condenação da ED a submete-la a junta médica em cumprimento do disposto no n.º 5 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, para confirmação e atribuição de incapacidade e desvalorização, decorrente de acidente em serviço.
Segundo a A., a omissão ou inércia por parte da ED, consubstanciada na não fixação de incapacidade permanente, na não reabertura do processo de acidente, não efetiva os seus direitos decorrentes de acidente em serviço.
Segundo a ED, a reabertura do processo de acidente de trabalho foi devidamente apreciada, tendo resultado uma decisão de junta médica municipal, constituída para o efeito, baseada na verificação de inexistência de nexo causal, entre o acidente sofrido pela A., e as dores de que se queixa.
A questão controvertida, e que cumpre decidir, consiste, assim, num primeiro momento, em aferir se deve a ED ser condenada a submeter a A. a junta médica prevista no nº 5 do artigo 20º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20/11, para efeitos de verificação de incapacidade permanente.
Apreciando,
Prevê o artigo 20.º do Decreto-lei n.º 503/99, de 20/11, sob a epigrafe “Alta” que:
«1 - Quando o trabalhador for considerado clinicamente curado ou as lesões ou a doença se apresentarem insuscetíveis de modificação com terapêutica adequada, o médico assistente ou a junta médica prevista no artigo 21.º, conforme os casos, dar-lhe-á alta, formalizada no boletim de acompanhamento médico, devendo o trabalhador apresentar-se ao serviço no 1.º dia útil seguinte, exceto se lhe tiver sido reconhecida uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual ou para todo e qualquer trabalho, caso em que se consideram justificadas as faltas dadas até à realização da junta médica da Caixa Geral de Aposentações.
2 - Se após a alta concedida pelo médico assistente o trabalhador não se sentir em condições de retomar a sua atividade habitual, pode requerer à entidade empregadora a sua apresentação à junta médica prevista no artigo 21.º, que deverá realizar-se no prazo máximo de 15 dias úteis, considerando-se justificadas as faltas dadas até à sua realização.
3 - A junta médica prevista no número anterior deve declarar se o sinistrado está em condições de retomar o serviço ou indicar a data de apresentação a nova junta médica, devendo a respetiva decisão ser notificada pessoalmente ao interessado, no próprio dia, e à entidade empregadora, pela via mais expedita, no prazo de dois dias úteis.
4 - Após a alta, caso a ausência ao serviço tiver sido superior a 30 dias consecutivos, o trabalhador deve ser examinado pelo médico do trabalho, para confirmação da sua aptidão relativa ao respetivo posto de trabalho, devendo, no caso de ser declarada inaptidão temporária, ser presente à junta médica prevista no artigo 21.º e, no caso de declaração de incapacidade permanente, ser comunicado o facto à Caixa Geral de Aposentações, sem prejuízo do disposto no artigo 23.º.
5 - Após a alta, se for reconhecido ao acidentado uma incapacidade permanente ou se a incapacidade temporária tiver durado mais de 36 meses, seguidos ou interpolados, a entidade empregadora deve comunicar o facto à Caixa Geral de Aposentações, que o submeterá a exame da respetiva junta médica para efeitos de confirmação ou de verificação de eventual incapacidade permanente resultante do acidente e de avaliação do respetivo grau de desvalorização.
6 - No caso de não ter sido reconhecida ao acidentado uma incapacidade permanente e este não se conformar com tal decisão, pode requerer à Caixa Geral de Aposentações, no prazo de 90 dias consecutivos após a alta, a realização de junta médica, para os fins previstos no número anterior.».
Como resulta da norma citada, designadamente do seu n.º 2, se após a alta concedida pelo médico assistente, o trabalhador não se sentir em condições de retomar a sua atividade habitual, pode requerer à entidade empregadora a sua apresentação à junta médica prevista no artigo 21.º.
E do seu n.º 5, que após a alta, se for reconhecido ao acidentado uma incapacidade permanente ou se a incapacidade temporária tiver durado mais de 36 meses, seguidos ou interpolados, a entidade empregadora deve comunicar o facto à Caixa Geral de Aposentações, que o submeterá a exame da respetiva junta médica para efeitos de confirmação ou de verificação de eventual incapacidade permanente resultante do acidente e de avaliação do respetivo grau de desvalorização.
No caso em apreço, resulta provado que a ocorrência de 13/05/2018, participada pela A. à sua entidade empregadora, foi qualificada por esta como acidente em serviço, em 05/06/2018.
Mais se provou que entre 15/05/2018 (quando em 14/05/2018 foi assistida em urgência hospitalar) e 05/06/2018, a A. realizou vários exames médicos de diagnóstico, e consultas com o médico do trabalho;
Bem como que lhe foi reconhecida ITA [incapacidade temporária absoluta, cfr. artigo 3.º, n.º 1, al. j) do Decreto-lei n.º 503/99] desde 15/05/2018 até 05/06/2018; e ITP [incapacidade temporária parcial, cfr. artigo 3.º, n.º 1, al. i) do Decreto-lei n.º 503/99] desde 05/06/2018 a 14/06/2018.
Em 05/06/2018, a A. foi considerada “apta condicionalmente até 16/06/2018”.
Em resultado de avaliação da sua aptidão foi-lhe reconhecida “ITP até 14/06/2018”.
Em 14/06/2018 a A. foi considerada clinicamente apta, e teve alta do acidente de trabalho sem incapacidade.
Neste caso e nos termos do n.º 1 do artigo 20.º do Decreto-lei n.º 503/99, a A. tinha o dever de se apresentar ao serviço no 1.º dia útil seguinte ao da alta, já que não lhe foi reconhecida nenhuma incapacidade permanente absoluta [cfr. artigo 3.º, n.º 1, al. m) do Decreto-lei n.º 503/99].
Por outro lado, não evidenciam os autos que após a alta concedida pelo médico assistente, a A. não se sentia em condições de retomar a sua atividade habitual, tanto que, como resulta provado, só em 14/08/2018 (cerca de dois meses depois) pediu a reabertura do processo de acidente de trabalho.
Acresce que não foi reconhecida à A. uma incapacidade permanente, pelo acompanhamento médico a que foi submetida, nem resulta provado que a sua incapacidade temporária decorrente de acidente de trabalho tenha durado mais de 36 meses (3 anos, os quais, não se haviam completado ainda à data de interposição da presente ação). Resulta provado que durou cerca de um mês.
Razões pelas quais, não se verificam no caso concreto, os pressupostos legais prescritos no n.º 5 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, para a condenação da ED a submeter a A. a junta médica da CGA, aí prevista, como peticionado.
Acresce que não resulta provada qualquer omissão ou inércia por parte da ED, relativamente aos pedidos de reabertura do processo de acidente de trabalho apresentados.
Todos os pedidos que resulta provado nos autos terem sido apresentados pela A., foram apreciados por competente Junta Médica (cfr. artigo 33.º da Lei n.º 35/2014, de 20/06, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas).
Não concordando com os sucessivos relatórios, poderia a A. ter lançado mão do disposto no artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 503/99, ou seja, através de pedido de junta de recurso, o qual, face ao aqui alegado, se afigura poder conferir uma mais plena tutela dos direitos que a A. configura, que através da presente ação, a qual por não provada, é improcedente.
Da presente decisão, resulta prejudicado o conhecimento dos demais pedidos formulados.
Em conclusão,
Não assistindo razão à A., a presente ação é totalmente improcedente.»
Ora, escrutinada a decisão que agora vem impetrada, e concatenando a mesma com a factualidade elencada no probatório, bem como com o preceituado nos art.ºs 20.º e 21.º do Decreto-Lei n.º 503/99, impõe-se concluir pelo acerto e correção da sentença impetrada.
Com efeito, considerando os factos que constam do probatório- e que não foram impugnados-, não remanesce dúvida absolutamente alguma de que a Recorrente não reúne os requisitos de que depende a operatividade do art.º 20.º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 503/99, dado que, não só não lhe foi reconhecida- nunca- a existência de qualquer incapacidade permanente, como é manifesto que a eventual incapacidade temporária que a Recorrente pudesse sofrer não durava há mais de 36 meses. E, por isso, não tinha o Recorrido qualquer obrigação ou dever de espoletar o procedimento para a fixação de incapacidade permanente junta da Caixa Geral de Aposentações, por forma a que a Recorrente, sob a alçada deste Instituto, fosse submetida a junta médica com esse objetivo.
Em concomitância, saliente-se que os pedidos apresentados pela Recorrente, descritos nos pontos J, L, N e T do probatório, foram enquadrados pela própria Recorrente como reabertura, ou reavaliação do processo de acidente de trabalho, inculcando a convicção de que a pretensão da Recorrente seria, naturalmente, a de rever a decisão de alta clínica e da insubsistência de incapacidade temporária. De resto, a própria Recorrente, quando instada pelos serviços do Recorrido a melhor explicitar a sua pretensão, nada peticionou relativamente à submissão a junta médica por parte da Caixa Geral de Aposentações (cfr. ponto M do probatório).
Por conseguinte, não se descortina qualquer motivo que aconselhasse ou determinasse o enquadramento dos pedidos formulados pela Recorrente, de reabertura do processo de acidente em serviço, no âmbito do n.º 6 do art.º 20.º do citado Decreto-Lei n.º 503/99, antes se mostrando perfeitamente razoável o enquadramento dos pedidos da Recorrente no domínio do art.º 21.º do mesmo diploma.
E, por estas razões também, é destituído de sentido pugnar pela existência de algum dever por parte do Recorrido de convidar a Recorrente a aperfeiçoar os seus pedidos, sendo certo que, e de qualquer modo, face ao prescrito nos art.ºs 102.º e 108.º do Código do Procedimento Administrativo, não se identifica justificação para a formulação de tal convite, nem, de resto, a Recorrente o explica.
Derradeiramente, cumpre dizer, quanto à imputada violação dos princípios da boa-fé e de colaboração com os particulares, previstos nos art.ºs 10.º e 11.º do Código do Procedimento Administrativo, que a mesma não ocorre. E tal assim sucede porque, desde logo, não se identifica qualquer razão que sustente a existência de um dever, por parte do Recorrido, de formulação de convite ao aperfeiçoamento dos pedidos apresentados pela Recorrente. E, ademais, a convocação da afronta daqueles princípios não só é realizada de modo totalmente conclusivo, como, seja como for, tais princípios não se sobrepõem a uma atuação administrativa legal, nem a podem transmutar justificando, porventura, uma atuação ilegal.
Desta feita, atento o enquadramento legal em que se movimenta o caso em análise, apresenta-se inequívoco que a sentença a quo não padece dos erros de julgamento que lhe são assacados, antes revelando um acerto insuscetível de ser abalado pelo vertente recurso jurisdicional.

Pelo que, em conformidade, terá de negar-se provimento ao presente recurso e confirmar-se a decisão recorrida.


V- DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em Conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente, sem prejuízo da isenção de que beneficia.

Registe e Notifique.
Lisboa, 27 de abril de 2023,


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Paula Cristina Oliveira Lopes de Ferreirinha Loureiro- Relatora
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Jorge Pelicano
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Ana Paula Martins