Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05953/12
Secção:CT- 2.º JUÍZO
Data do Acordão:01/30/2014
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE ACTO ADMINISTRATIVO EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA.
CADUCIDADE DA ACÇÃO.
EFEITO SUSPENSIVO DO PRAZO DE CADUCIDADE PREVISTO NO ARTIGO 59.º, N.º 4, DO CPTA. ACTO CONFIRMATIVO.
Sumário:1) Estando em causa acção de impugnação do despacho que qualifica certas quantias pagas a título de ajudas de custo como remuneração, para efeitos da incidência das contribuições para a Segurança Social, o regime aplicável à caducidade da acção é o que decorre do CPA e do CPTA, dado que se trata de impugnação de acto administrativo em matéria tributária.
2) Tendo havido impugnação administrativa e não tendo sido notificada ao requerente a remessa do processo ao órgão competente para dela conhecer (artigo 172.º/1, do CPA), o efeito suspensivo do prazo de caducidade da acção, associado à interposição da impugnação administrativa, previsto no artigo 59.º/4, do CPTA, apenas se esgota com a notificação ao requerente da decisão proferida na mencionada impugnação administrativa, ainda que o respectivo prazo legal de decisão tenha sido consumido em momento anterior.
3) O acto confirmativo é aquele que, emanado da mesma entidade, e dirigindo-se ao mesmo destinatário, repete o conteúdo de um acto anterior, perante pressupostos de facto e de direito idênticos, e sem que o reexame desses pressupostos decorra de revisão imposta por lei.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I- Relatório
“..., ...Unipessoal, Lda.”, m.i. nos autos, vem interpor recurso jurisdicional contra o despacho-saneador, proferido a fls. 83/103, que, julgando procedentes as excepções da inimpugnabilidade do acto impugnado e da caducidade do direito de acção, absolveu o réu da instância relativa à acção administrativa especial de impugnação dos despachos de 20.01.2010 e de 30.06.2009, respectivamente, da Vice-Presidente do Conselho Directivo do Instituto de Solidariedade e Segurança Social e da Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector Lisboa II.
Nas alegações de recurso de fls. 279/293, formula as conclusões seguintes:
I. O douto despacho saneador recorrido absolveu da instância o réu Instituto de Solidariedade e Segurança Social, IP (ISS, IP), ao ter julgado, por um lado, (i) procedente a excepção de inimpugnabilidade do acto (despacho) proferido em 20.01.2010, pela Vice-Presidente do Conselho Directivo do ISS, IP, com o fundamento consistente em que, ao ser proferido em decisão de recurso hierárquico, foi um acto meramente confirmativo de acto (despacho) anterior, este proferido em 30.06.2009, pela Directora do Núcleo de Fiscalização do ISS, IP e, por outro lado, (ii) caducou o direito de acção em relação a este ato/despacho, proferido em 30.06.2009.
II. Pretende a recorrente que o Tribunal Central Administrativo Sul, sindicando a aplicação do direito aos factos, revogue o douto despacho saneador, por discordar, quer dos seus fundamentos, que das suas decisões, sendo que as questões objecto do presente recurso são (i) a inimpugnabilidade da decisão de recurso hierárquico, proferida em 20.01.2010 pela Vice-Presidente do Conselho Directivo do ISS. IP, (ii) a caducidade do direito de acção em relação à decisão objecto de recurso hierárquico, proferida em 30.06.2009, pela Directora do Núcleo de Fiscalização do ISS, IP.
III. Em relação à primeira questão (inimpugnabilidade do acto), tem de se atentar que o que verdadeiramente a autora/recorrente pretendeu com o recurso hierárquico, e pretende com a presente acção, a coberto da peticionada revogação dos despachos do ISS, IP, é colocar em crise a legalidade dos actos que qualificaram como remunerações as prestações pagas pela autora aos seus trabalhadores, ou seja, o que a autora verdadeiramente pretendia, e pretende, é colocar em causa a legalidade da liquidação efectuada pela Segurança Social;
IV. É certo que, induzida em erro pela própria administração, ao ser notificada de que as suas decisões eram passíveis “de recurso contencioso”, a autora optou por lançar mão da acção administrativa especial em vez da impugnação judicial, como também invocou as normas do CPA para o recurso hierárquico, quando as normas aplicáveis deveriam ser a de procedimento administrativo tributário.
V. Porém, por um lado, o Tribunal, por erro na forma do processo, e como está na sua disponibilidade, pode convolar a presente acção administrativa especial em impugnação judicial, nos termos do disposto nos artigos 98.º, n.º 4 do CPPT e 97º, n.º 3 da LGT (cf. Acórdão do STA de 09.12.2009, proferido no âmbito do recurso 739/09), ou seja, o Tribunal pode convolar a presente acção administrativa especial prevista no artigo 97º, n.º 1, alínea p) em impugnação de actos administrativos em matéria tributária que comportem a legalidade do acto de liquidação prevista no artigo 97º, n.º 1, alínea p), ambos do CPPT.
VI. E por outro lado, dúvidas não podem subsistir de que o prévio procedimento administrativo á presente acção, tem de ser qualificado como procedimento administrativo tributário, disciplinado pela LGT e pelo CPPT, uma vez que o procedimento visou a declaração da liquidação de contribuições à Segurança Social (artigo 54º, n.º 1, alínea b) da LGT e 44º, n.º 1, alínea b) do CPPT).
VII. Devendo ser qualificado o procedimento prévio à presente acção como procedimento administrativo tributário, disciplinado pela LGT e pelo CPPT, a decisão de recurso hierárquico proferida em 20.01.2010 pela Vice-presidente do Conselho Directivo do ISS,IP., é impugnável, nos termos do artigo 76º, n.º 2, do CPPT, tal como decidiu o douto acórdão do STA de 22.03.2006, 2ª Secção, Senhor Juiz Conselheiro Lúcio Barbosa, in www.dgsi.pt: "l - Interposto recurso hierárquico, visando a apreciação da legalidade de um acto de liquidação, é possível deduzir impugnação judicial de decisão de indeferimento de tal recurso. II - Tal hipótese encontra fundamento legal no art.º 76º, n.º 2, do CPPT",
VIII. Por outro lado, e sem prescindir, ainda que se qualificasse o procedimento prévio à presente acção como procedimento administrativo regulado pelo CPA, a decisão de recurso hierárquico proferida em 20.01.2010 pela Vice Presidente do Conselho Directivo do ISS,IP não é confirmativa da decisão proferida em 30.06.2009 pela Directora do Núcleo de Fiscalização do ISS.IP., uma vez que, confrontando os dois despachos, deles não resulta identidade de fundamentação.
IX. Por outro lado, a questão da caducidade do despacho da Directora do ISS,IP, só se coloca, se a primeira questão, a da impugnabilidade da decisão proferida em 20.01.2010 pela Vice-presidente do Conselho Directivo do ISS.IP. improceder, já que a ser considerada procedente, fica prejudicado o conhecimento da questão da caducidade.
X. Na questão da caducidade do direito de acção, a recorrente está em desacordo com o douto despacho saneador recorrido na contagem do prazo de suspensão por força da impugnação administrativa, uma vez que a recorrente entende que a interpretação que deve ser dada ao do disposto no artigo 59º, n.º 4 do CPTA é a seguinte: no caso de não ter sido emitida uma decisão expressa dentro do respectivo prazo legal pelo órgão administrativo ad quem, o particular pode, ainda assim, beneficiar da suspensão do prazo de impugnação contenciosa, desde que venha a ser proferida uma decisão e ocorra a respectiva notificação. Com efeito,
XI. O que a autora/recorrente pretendeu quando lançou mão do meio de impugnação administrativa, não foi simplesmente dilatar o prazo de impugnação judicial, mas antes foi o de obter uma reponderação da sua situação jurídica pela Administração, por isso, na leitura do n.º 4 do artigo 59.º do CPTA, deve ser dada relevância à decisão da impugnação administrativa mesmo que esta não seja proferida dentro do respectivo prazo legal.
XII. A interpretação do n.º 4 do artigo 59.º do CPTA, passa por considerar que a suspensão do prazo de impugnação contenciosa cessa, ou com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou, em alternativa, com o decurso do prazo legal de decisão da impugnação administrativa apenas naqueles casos em que a Administração não se pronunciou sobre a pretensão do particular.
XIII. Ora, no caso sub judice, à data da propositura da acção, já havia sido proferida decisão expressa sobre a impugnação administrativa, pelo que a contagem do prazo tem de ser feita, tendo em conta o período de suspensão ocorrido entre a data da utilização do meio de impugnação administrativa (apresentação do recurso hierárquico) e a notificação da respectiva decisão, mesmo que esta tenha ocorrido após o prazo legal estabelecido para o efeito.
XIV. Só esta interpretação do disposto no artigo 59º, n.º 4 do CPTA permite cumprir a sua ratio legis: o não congestionamento dos tribunais com acções que poderiam tornar-se desnecessárias se, na pendência do processo, a Administração viesse a proferir uma decisão favorável ao particular, como também evitar que os particulares e, em certos casos, a Administração, tenham que despender elevados montantes no pagamento de custas processuais.
XV. Por outro lado, e sem prescindir, durante o decurso da impugnação administrativa, a autora/recorrente não recebeu do órgão competente para decidir do recurso hierárquico, uma única notificação sobre os obrigatórios despachos e notificações, nomeadamente, as dos artigos 171º e 172, n.º 1 do CPA, como não recebeu qualquer notificação sobre outros eventuais despachos interlocutórios, nomeadamente sobre, se iria ou não determinar novas ou complementares diligências probatórias, ou seja, desde a data em que propôs o recurso hierárquico, 29 de Setembro de 2009, até á data em que foi notificada da decisão do recurso hierárquico, 4 de Fevereiro de 2010, a recorrente não tomou conhecimento de qualquer diligência ou acto praticado no respectivo processo.
XVI. Ora, a administração violou os seus deveres jurídicos de notificação, nomeadamente o dever de notificar a autora/recorrente quer da remessa do processo ao órgão ad quem, quer da decisão de determinar ou não novas diligências de prova, pelo que, com a sua inércia administrativa, violou as garantias e direitos administrativos da autora/recorrente, nomeadamente os decorrentes dos princípios da legalidade, da colaboração, e da participação, previstos nos artigos 4º. 7º e 8º do CPA.
XVII. E, concretamente, não tendo o recorrente sido notificado da remessa do processo pelo órgão administrativo ad quo ao órgão ad quem, tal remessa não pode ter produzido efeitos em relação á autora/recorrente para o inicio da contagem do prazo de 30 ou 90 dias, tal como sustenta Mário Esteves de Oliveira, in Código do Procedimento Administrativo comentado, 2a edição, pág. 788. "A lei impõe, hoje, também, que seja notificado o recorrente (pelo órgão a quo) de o processo ter sido remetido em determinada data, para decisão do órgão competente, a fim de o fazer ciente de ter começado a correr o prazo para decidir o recurso (e para formação do indeferimento tácito ou silente) ", sublinhado da recorrente.
XVIII. Não tendo o recorrente sido notificado da decisão de determinar ou não novas ou complementares diligências de prova, o prazo que deve relevar para a decisão do recurso hierárquico é o do n.º 2 do artigo 175º, 90 dias, e não o do n.º 1 do mesmo artigo, 30 dias.
XIX. Face às formalidades do procedimento administrativo do recurso hierárquico, (com as baixas e remessas sucessivas do processo emergentes da dinâmica processual prevista nos artigos 171º e 172º do CPA) existe um prazo para as contra-alegações dos interessados e da pronúncia do órgão ad quo, mas não existe um prazo legal para a conclusão de todas as formalidades e trâmites procedimentais (por ex. o órgão recorrido, depois de notificado, pode revogar, modificar ou substituir o acto, o que só pode fazer, depois de conhecer, quer o teor das alegações recurso do recorrente, quer o teor das alegações dos contra interessados), pelo que, tem aplicação o disposto na alínea c) do número 3, do artigo 109º do CPA, e não o disposto na alínea b) do número 3, do artigo 109º do CPA.
XX. Consequentemente, nos termos do disposto nessa alínea c) do número 3, do artigo 109º do CPA, o início do prazo de 30 ou 90 dias para formação do acto de indeferimento tácito do recurso hierárquico (artigo 175º, n.º 3 do CPA) não ocorreu antes da notificação expressa da decisão do recurso hierárquico.
XXI. Pelo que, atentos os pressupostos supra expostos, a contagem do prazo de caducidade da acção tem de se fazer da seguinte forma: desde 2 de Julho de 2009, data em que a autora foi notificada do despacho, até 1 de Agosto de 2009, data do início das férias judiciais, (data em que o prazo se suspende - n.º 3, artº 58º do CPTA), decorreram 29 dias; desde 1 de Setembro de 2009, data em que começa a correr novamente o prazo por terem terminado as férias judiciais, até 29 de Setembro de 2009, data da interposição do recurso hierárquico, decorreram 28 dias; desde 29 de Setembro de 2009, data da interposição do recurso hierárquico, até 4 de Fevereiro de 2010, data da decisão do recurso hierárquico o prazo esteve suspenso; desde 4 de Fevereiro de 2010 até ao dia 8 de Fevereiro de 2010, data da propositura da presente acção decorreram mais 4 dias; ou seja, desde a data da notificação do despacho da Directora do Núcleo de Fiscalização do ISS,IP até à data da propositura da presente acção, decorreu um total de 61 dias (57 + 4), e portanto o direito de acção não caducou;
XXII. O douto despacho saneador fez uma errada interpretação e violou o disposto nos artigos 54º, n.º 1, alínea b) e 97º, n.º 3 da Lei Geral Tributária, e nos artigos 44º, nº 1, alínea b), 76º, n.º 2 e 98º, n.º 4 do CPPT, nos artigos 172º, n.º 1, 175º, n.º 1 e n.º 3, do Código de Procedimento Administrativo, e no artigo 59º, n.º 4 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos.
X
A fls. 129/135, a entidade demandada proferiu contra-alegações, pugnando pela manutenção do julgado.
X
Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência para decisão.
X
II- Fundamentação.
1. De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
1. O Autor é uma sociedade unipessoal por quotas que tem como objecto a actividade de "trabalho temporário " (cfr. certidão da Conservatória do Registo Comercial a fls. 31 a 37 II volume do processo administrativo tributário, de ora em diante designado PAT).
2. O Autor foi submetido a acção inspectiva realizada pelos serviços de fiscalização de Lisboa e Vale do Tejo, núcleo de fiscalização de beneficiários e contribuintes sector de Lisboa II que visou a verificação da existência de irregularidades perante a Segurança Social relativamente aos anos de 2005 a 2007 (cf. cópia do relatório dos serviços de 29.6.2009, fls. 20 a fls.3, l vol. do PAT).
3. Concluída a acção inspectiva referida no ponto anterior, foi realizado um relatório final, expresso na informação de 29.6.2009 constante de fls. 20 a fls. 3 do Vol., do PAT cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido e na qual consta o seguinte:
«1. Âmbito e Objectivo da Acção Inspectiva
(...)
4. Factos apurados
Através da análise efectuada aos balancetes gerais junto aos autos, e visando aferir acerca da política salarial praticada pela empresa, constatou-se que os pagamentos efectuados aos trabalhadores englobam rubricas variadas.
De facto além do vencimento base (subsídios de férias e Natal), merecem destaque no contexto da mesma o prémio de assiduidade de 90% dos pagamentos efectuados aos trabalhadores. Através da realização de testes de controlo, validados pelos processamentos de vencimentos, concluiu-se contudo que apenas não foram pelo contribuinte sujeitos a incidência de taxa social única as ajudas de custo.
Neste contexto, e pela análise da documentação junta aos autos, designadamente pela análise dos balancetes gerais analíticos verificou-se a existência de valores processados e pagos aos trabalhadores a título de "ajudas de custo t. Internacional", facto que resultou do estudo conjunto dos registos efectuados nas subcontas 26.2.2 e 64.2.17, processamento de vencimentos e recibos de vencimento.
Neste contexto, verificou-se a existência dos seguintes registos:
Ano Conta 64. 2. 16* Ajudas de Custo - T. Internacional
2005 €2.772.414,71
2006 €3.112.778,57
2007 (em31.08) €1.765.439,89
Constatou-se igualmente que não se encontra a sua atribuição fundamentada por boletim de itinerário, ou qualquer outro suporte que permita aferir acerca das deslocações eventualmente realizadas.
Não obstante o facto de se ter apurado que os trabalhadores a quem são pagos tais "ajudas de custo - T. Internacional" se encontrarem efectivamente a prestar trabalho no estrangeiro, verificou-se contudo estar esse mesmo local indicado nos respectivos contratos de trabalho temporário, conforme análise realizada aos contratos de trabalho temporário realizada por amostragem.
Dito doutro modo, foram processadas e pagas "ajudas de custo - T internacional" aos trabalhadores apenas pelo facto do domicilio profissional se localizar no estrangeiro, e não pelo facto de existir qualquer deslocação em serviço por parte destes.
5. Da Análise
O contribuinte, .... - ..., Unipessoal Lda., é uma sociedade unipessoal por quotas que tem como objecto a actividade de trabalho temporário.
A actividade do contribuinte em análise encontra-se actualmente regulada pela Lei n. º 19/2007 de 22 de Maio ( que revogou e substitui a partir de 21 de Junho de 2007 o Decreto-Lei n.º 358/89 de 17 de Outubro , na redacção dada pela Lei n. º 39/96, de 31 de Agosto e pela Lei n.º 146/99, de 1 de Setembro) centrando-se a mesma na contratação, remuneração e cedência temporária de trabalhadores a terceiros, normalmente designados por utilizadoras.
Não obstante o facto de ser o trabalhador contratado pela empresa de trabalho temporário, no que concerne à sua prestação de trabalho, fica este sujeito ao regime de actividade aplicável à entidade utilizadora no que respeita designadamente ao modo, lugar, duração e suspensão da prestação de trabalho, já no que respeita ao cumprimento das obrigações declarativas e contributivas para com a Segurança Social, tal é no entanto da responsabilidade da empresa de trabalho temporário, conforme o disposto no art. 41.º da Lei n.º 19/2007 de 22 de Maio (preceito já constante do regime de trabalho temporário aprovado pelo Decreto-Lei n.º 358/89 de 17 de Outubro, na redacção dada pela Lei n.º 39/96, de 31 de Agosto e pela Lei n.º 146/99, de 1 de Setembro).
Em conformidade com o estipulado no contrato de utilização de trabalho temporário, o contrato de trabalho deve incluir, entre outras menções obrigatórias, o local e o período normal de trabalho, conforme dispõe a alínea d) do n.º 1 do artigo 26.º da Lei n.º 19/2007 de 22 de Maio (norma aliás constante do regime revogado e já referido).
Estando em causa a análise da verdadeira natureza das ajudas de custo internacionais atribuídas pelo contribuinte aos seus trabalhadores temporário, importa enquadrar que a característica essencial das ajudas de custo é o seu carácter compensatório, visando reembolsar o trabalhador pelas despesas que foi obrigado a suportar em favor da sua entidade patronal, por motivo de deslocações ou novas instalações ao serviço desta, e a inexistência de qualquer correspectividade entre a sua percepção e a prestação de trabalho. Por tal facto são as mesmas afastadas do conceito de retribuição, conforme o preceito constante do art. 260.º do Código do Trabalho.
O carácter compensatório das ajudas de custo tem assim subjacente a existência, por parte do trabalhador, de "deslocações do seu domicílio necessário por motivos de serviço" (vd. n.º 1 do art. 1.º do Decreto-Lei n.º 106/98 de 24 de Abril, diploma que estabelece as normas relativas ao abono de ajudas de custo).
Neste contexto, dispõe também o artigo 2º do mesmo diploma, que "considera-se domicílio necessário, para efeitos de abono de ajudas de custo:
a) A localidade onde o funcionário aceitou o lugar ou cargo, se aí ficar a prestar serviço;
b) A localidade onde exerce funções, se for colocado em localidade diversa da referida na alínea anterior;
c) A localidade onde se situa o centro da sua actividade funcional, quando não haja local certo para o exercício de funções."
Ora, no âmbito da situação em análise o local de trabalho encontra-se devidamente definido no contrato de trabalho temporário, pelo que as verbas pagas a título de ajudas de custo não podem ser consideradas verdadeiras ajudas de custo.
Com efeito, tais valores não visam compensar o trabalhador por despesas por si realizadas ao serviço da entidade patronal por motivo de deslocação do local habitual de trabalho, sendo antes atribuídos tendo por base o facto do local de trabalho se situar no estrangeiro. Desta forma não podem revestir tais montantes qualquer outra natureza que não a de verdadeiras remunerações.
De facto, tendo sido os trabalhadores contratados para desempenhar as suas funções no estrangeiro, não pode considerar-se que o trabalho por eles ali prestado tenha implicado mudança alguma de local de trabalho nem, consequentemente, tenha implicado a realização de deslocações por força da prestação ocasional do trabalho fora do local habitual ou por força da transferência das instalações da sua entidade patronal.
Ou seja, não é pelo facto da prestação de trabalho ocorrer no estrangeiro que, sem mais, a entidade patronal pode suportar justificadamente a título de ajudas de custo, as despesas de alojamento e alimentação do trabalhador.
Isto, mesmo que o trabalhador tenha residência no território nacional e a entidade patronal também aqui tenha a sua sede pois, para este efeito não releva o local da sede da entidade patronal ou o local de residência habitual do trabalhador.
Relevante, para efeitos da atribuição de ajudas de custo, é apenas que o trabalhador esteja deslocado relativamente ao seu local de trabalho e que, por força dessa deslocação, incorra em despesas que devem ser suportadas pela entidade patronal porque efectuadas ao serviço e a favor desta, o que não sucede no caso em apreço.
6. Conclusões
Por tudo o que referiu nos pontos anteriores e se considera dado como provado, é convicção dos signatários sem as verbas pagas a título de ajudas de custo internacionais aos trabalhadores temporários, porque não visam compensar o trabalhador por despesas por si realizadas ao serviço da entidade patronal por motivo de uma deslocação (inexistente) do local habitual de trabalho, verdadeiros complementos de remuneração, e como tal sujeitos a incidência de taxa social única nos termos dos artigos 1.º e 2.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro.
Desta forma, devem ser tais valores sujeitos a incidência de taxa social única e incluídos nas declarações de remunerações e pagas as respectivas contribuições, conforme a alínea a), art. 2º do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, conjugado com o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 103/80 e art. 10.º do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de Junho, conforme mapas de apuramento junto aos autos (fls. 1724 a 1747), cujo resumo se apresenta no quadro seguinte:
COMPLEMENTOS DE REMUNERAÇÕES PAGOS A TÍTULO DE "AJUDAS DE CUSTO -T INTERNACIONAL" E NÃO DECLARADOS
    ANO
Remunerações (€)Contribuições (34,75%)
    2005
2 795 889.54971 571,62
20063096110,541 075898,41
2007*2 178633,38757,075,09
    Total
8 070 633,462804545.12
* a partir de Junho de 2007, os montantes apurados levaram em consideração a excepção disposta no n.º 4 do artigo 37.º da Lei n.º 19/2007 de 22 de Maio.
7. Propostas
Nestes termos, e nada mais havendo a diligenciar, propõe-se que, nos termos do artigo 100.º e seguintes do Código de Procedimento Administrativo, se notifique o contribuinte para efeitos de audiência prévia final.
8. Direito do Contraditório
Notificado o contribuinte, em sede de audiência dos interessados, de que seriam registadas as correspondentes Declarações com os elementos em falta se não fossem apresentados elementos susceptíveis de obstar ou alterar o sentido provável da decisão, vem este alegar, através da resposta escrita remetida a este Serviço, o que, resumidamente, adiante se transcreverá. (...)
9. Conclusões após o direito do Contraditório
Por tudo quanto antes se disse e fundamentou, nada mais nos resta do que reafirmar de que se mantém todos os pressupostos que estiveram na origem da elaboração dos mapas de apuramentos remetidos ao contribuinte, em devido tempo, não tendo o mesmo apresentado fundamentação de facto ou de direito que fizesse perigar a nossa decisão, sendo, portanto, forçados a concluir que a resposta do contribuinte em nada vem alterar a decisão inicial, propondo-se o registo oficial das Declarações de Remunerações, ao abrigo da alínea c) do n.º2 do artigo 10.º da Portaria n. º 638/2007, de 30 de Maio e do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 8-B/2002, de 15 de Janeiro, relativas ao período compreendido entre Janeiro de 2005 e Dezembro de 2007, totalizando no mesmo um montante total de contribuições de 2.804.545,12 Euros.
5. Em 30 de Junho de 2009 foi proferida decisão pela directora do núcleo de Fiscalização de Beneficiários e contribuintes aposta na primeira folha da informação melhor descrita no ponto anterior, na qual consta o seguinte: "Concordo, proceda-se em conformidade", (cf. Informação constante a fls. 20 do vol. l do PAT).
6. Em 1 de Julho de 2009, foi enviado ao Autor o oficio n.º 200900003555, com o assunto: "Regularização de Contribuições à Segurança Social EE: ...- ..., Unipessoal, Lda., NISS (...)", constante a fls. 4 do l Vol. do PAT, no qual consta o seguinte: // «Na sequência da nossa notificação, oficio n.º 34969 de 1 de Fevereiro de 2009, no âmbito do processo de averiguações n.º 200900003555 e no exercício do direito de audiência prévia prevista no artigo 100.º do CPA, foi recebida, em 26.02.2009, a contestação de V.as Ex.as, que originou da parte deste Serviço de Fiscalização reavaliação da matéria em causa. // Dessa reanálise à resposta apresentada por V. Exa., confirma-se que de facto os trabalhadores temporários em causa foram contratados para desempenhar as suas funções no estrangeiro, sendo-lhes pagas ajudas de custo apenas por esse facto, e não pela existência de qualquer deslocação em serviço. // Os factos apurados, e confirmados através da V/resposta, não podem ter outro enquadramento e entendimento senão o comunicado. Ou seja, tais valores não visam compensar o trabalhador por despesas por si realizadas ao serviço da entidade patronal por motivo de deslocação do lugar habitual de trabalho, sendo antes atribuídos pelo facto do local de trabalho se situar no estrangeiro. Desta forma não podem revestir tais montantes qualquer outra natureza que não a de verdadeiras remunerações.
Assim, mantém-se por regularizar todos os montantes que, em devido tempo vos foram comunicados, nos termos e com os fundamentos constantes do relatório, cuja cópia se anexa e que aqui se dá integralmente por reproduzido para todos os efeitos legais. // Deste modo foi considerado não colherem, quer os fundamentos de facto, quer de direito vertidos na resposta apresentada, em sede de audiência prévia, pelo que, com base nos elementos em poder deste Serviço, mantém-se, na integra os mapas de apuramento referentes aos montantes em causa, os quais totalizam €8.070.633,46 de remunerações a que equivalem €2.804.545,12 de contribuições devidas à Segurança Social, para o período de Janeiro de 2005 a Dezembro de 2007.
Os referidos montantes abrangem os trabalhadores identificados nos respectivos mapas de apuramento, elucidativos dos montantes apurados e que aqui também se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
Sendo tais valores considerados como verdadeiras remunerações, estão por isso sujeitos à incidência de taxa social única, pelo que devem ser incluídos nas declarações de remunerações e pagas as respectivas contribuições, conforme a alínea a), artigo 2.º do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, conjugado com o artigo 4.º do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, conjugado com o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 103/80 e artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de Junho.
Assim, e ao abrigo do disposto no artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 8-B/2002, 15 de Janeiro, e na alínea c) do artigo 10.º da Portaria n.º 638/2007, de 30 de Maio, serão elaboradas oficiosamente as referidas declarações de remunerações, caso não procedam, voluntariamente, às regularizações devidas.
Mais se notifica que a presente decisão é, desde já, passível de recurso contencioso, nos termos gerais, aplicáveis. // (...) // Anexa: cópia do relatório final // A Directora de Núcleo»
7. Em 2 de Julho de 2009, o autor recebeu o ofício descrito no ponto anterior (facto admitido por acordo no artigo 2.º da P.L).
8. Em 29.9.2009, o Autor deu entrada nos serviços da ré de uma petição de recurso hierárquico do acto administrativo melhor descrito nos pontos n.º 5 e 6, dirigido ao Director Geral da Segurança Social, a qual consta de fls. 83 a 75 do l vol. do PAT, e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, no qual peticiona "...ser revogada a decisão da Exma. Senhora Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e contribuintes, Sector Lisboa II" e na qual formula as seguintes conclusões: // «(...)
Conclusões:
I- O Núcleo de Fiscalização não provou nos presentes autos que os montantes pagos aos trabalhadores tiveram por fim, ou não, compensá-los das despesas por eles efectuados ao serviço da entidade empregadora/recorrente, ou seja, não provou quem efectivamente suportou tais despesas e, consequentemente, não se pode concluir que as referidas prestações pecuniárias sejam remunerações do trabalho.
II- Ao sustentar que um trabalhador temporário, só pelo facto de ser contratado para trabalhar no estrangeiro não possa receber ajudas de custo, o Núcleo de Fiscalização viola o disposto na Lei, nomeadamente o artigo 37.º, n.º 4, da Lei n.º 19/2007 de 19 de Maio, e o n.º8 do artigo 185.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei 7/2009 de 12 de Fevereiro, bem como o artigo 266.º da Constituição da Republica Portuguesa.
III- O Núcleo de Fiscalização não fez prova de que, as ajudas de custo pagas aos trabalhadores temporários da Recorrente contratados por período superior a 8 meses, não tivessem destinado a compensá-los de despesas de alojamento e deslocação ao serviço da sua entidade empregadora.
IV- A recorrente ... Lda., está integrada num Procedimento Extra Judicial de Conciliação, o processo n.º1131, a fim de permitir a sua viabilidade económica e financeira, e em consequência do qual o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social e a ... acordaram a 31 de Agosto de 2007 uma amortização da divida em 150 prestações mensais e sucessivas, com inicio no mês seguinte, e com a s devidas garantias, amortização que Recorrente cumpriu até à presente data religiosamente, pelo que, uma decisão no presente processo que considerasse a "existência de remunerações não declaradas" no valor mencionado no supracitado oficio, significaria efectivamente, a impossibilidade de cumprimento do PEC, o encerramento e a insolvência.
9. Em 20 de Janeiro de 2010, foi proferido o despacho pela Vice-Presidente do Conselho Directivo do ISS, que consta de fls. 124 a 122 do Vol. l do PAT e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, no qual consta o seguinte:
«Assunto: Recurso Hierárquico interposto por ... - Empresas de Trabalho Temporário, Lda. RH -457/2009
Analisados os factos e os argumentos de direito expendidos no recurso hierárquico interposto pela recorrente acima identificada, e de harmonia com as disposições legais aplicáveis à situação em apreço, no uso dos poderes que me foram delegados pela Deliberação n.º 1984/2008, de 5 de Março, do Conselho Directivo do ISS, l.P., publicada no Diário da Republica, 2a série, n.º 142, de 24 de Julho de 2008, decido negar provimento ao recurso com os fundamentos seguintes:
1. O presente recurso vem interposto do despacho de 30/6/2009, da Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector de Lisboa II, que, na sequência de acção inspectiva realizada à entidade acima identificada, determinou o correcto enquadramento dos montantes pagos aos trabalhadores ao seu serviço a título de "Ajudas de Custo Território Internacional" , no período de Janeiro de 2005 a Dezembro de 2007, e a correspondente sujeição dos mesmos a taxa social única;
2. O regime jurídico aplicável à situação em apreço está consagrado no Decreto-Lei n.º 359/89, de 17 de Outubro, com as alterações que lhe foram introduzidas pelas Leis n.º s 39/96 e 146/99, de 31 de Agosto e de 1 de Setembro, respectivamente, na Lei n.º 19/2007 de 22 de Maio, assim como nos Decretos-lei n.º 8-B/2002 e n.º 12/83, respectivamente de 15 de Janeiro e de 12 de Fevereiro e, ainda, nos Decretos-Lei n.º 106/98 e n.º 192/95, de 24 de Abril e de 28 de Julho, respectivamente, bem como no Código do Trabalho;
3. Relativamente ao alegado pela recorrente, é de referir que os trabalhadores a quem foram pagas as mencionadas "Ajudas de Custo Território Internacional foram contratados para exercerem funções no local determinado no contrato de trabalho, sendo que este, nos termos legais, é o seu domicílio necessário, pelo que não se verificou qualquer deslocação em serviço que implicasse o pagamento de ajudas de custo, devendo, por isso, esses valores ser considerados como retribuição;
4. Tendo o local de trabalho dos trabalhadores em causa sido, desde o início, fixado nos respectivos contratos, e fazendo o legislador depender o pagamento de ajudas de custo, da deslocação em serviço, a partir do domicílio necessário do trabalhador, não releva para o efeito o facto de os contratos terem sido " celebrados em território português, nos escritórios da ...";
5. Improcedendo a argumentação da recorrente quando refere que " por tal motivo, esses trabalhadores, que tinham domicílio em território português foram obrigados a deslocar o seu domicílio para o estrangeiro";
6. Pelo simples cotejo dos contratos juntos ao processo administrativo, efectivamente podemos verificar em todos sem excepção que as despesas que poderiam dar origem ao pagamento de verdadeiras e próprias ajudas de custo foram custeadas pelo recorrente;
7. Acresce que, nos termos dos contratos juntos ao processo administrativo, os trabalhadores se comprometem a aceitar os trabalhos para os quais foram contratados no local onde lhe foi determinado;
8. Pelo exposto resulta, assim, que quem suportou as despesas com as deslocações dos trabalhadores em questão foi a própria empresa de trabalho temporário, ora recorrente, pelo que, neste contexto, os montantes pagos a título de "Ajudas de Custo Território Internacional" configuram verdadeiras remunerações, pois não foram atribuídas a título de compensação ao trabalhador por despesas efectivamente realizadas e resultantes de deslocações em trabalho;
9. Conforme dispõe o artigo 260.º do Código do Trabalho, as ajudas de custo caracterizam-se por terem um fim compensatório ou de reembolso das despesas realizadas pelo trabalhador ao serviço, em nome e a expensas do empregador;
10. O conceito de retribuição abrange todos os benefícios concedidos pelo empregador que se destinem a integrar o orçamento normal do trabalhador, conferindo-lhe a expectativa do seu recebimento, dada a sua regularidade e continuidade periódica;
11. Ademais, considerando o estatuído no n.º3 do artigo 249.º do mesmo Código, presumindo-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador, incumbia à recorrente elidir essa presunção, comprovando a natureza das ajudas de custo das prestações em causa, o que não fez;
12. Ao contrário do alegado, sobre o recorrente recaía o ónus de afastar a prova junta ao processo administrativo, apresentando contra prova de que as referidas quantias não integram a remuneração dos seus trabalhadores, sendo certo que, tendo tido oportunidade para tal, quer em sede de audiência prévia, quer com a interposição do presente recurso, não o fez;
13. E face do exposto, considera-se ser de manter a factualidade provada no que ao enquadramento das ajudas de custo respeita, não restando qualquer dúvida de que, no caso em apreço, estas integram prestações retributivas;
14. Assim, obedecendo ao quadro legal em vigor, constante dos artigos 249.º e 260.º do Código do Trabalho e do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83 de 12 de Fevereiro, devem tais prestações constituir base de incidência contributiva para a segurança social, sendo devido o pagamento das respectivas contribuições, no período em causa, no montante apurado de € 2.804.545,12;
15. Improcedendo, deste modo, os motivos de impugnação deduzidos pelo recorrente no caso vertente, pelo que se nega provimento ao recurso mantendo-se, nos seus precisos termos, a decisão recorrida. // O Conselho Directivo // (...)».
10. Em 4 de Fevereiro de 2010, o Autor foi notificado da decisão de indeferimento descrita no ponto anterior, através do ofício GAJC-RH-457/2009/MTF de 25.01.2010, (cfr. facto admitido por acordo a artigos 4.º da P.I, cópia do ofício a fls. 125 do l vol. do PAT).
11. Em 8 de Fevereiro de 2010, a petição inicial da presente acção administrativa especial deu entrada no Tribunal Tributário de Lisboa (cf. carimbo aposto a fls. 2 dos autos).
X
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada.
Inexistem factos não provados com interesse para a decisão das questões prévias suscitadas.
X

Ao abrigo do artigo 6622.º/1) do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:

12. A pronúncia do órgão recorrido e a remessa do processo ao órgão ad quem tiveram lugar em 09.12.2009 – fls. 84/106, do p.a.

X
2. De Direito.
2.1. Nos presentes autos, vem interposto recurso jurisdicional contra o despacho-saneador, proferido a fls. 83/103, que, julgando procedentes as excepções da inimpugnabilidade do acto impugnado e da caducidade do direito de acção, absolveu o réu da instância relativa à acção administrativa especial de impugnação dos despachos de 20.01.2010 e de 30.06.2009, respectivamente, da Vice-Presidente do Conselho Directivo do Instituto de Solidariedade e Segurança Social e da Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector Lisboa II.
2.1.1. Para julgar procedentes as questões prévias referidas, a decisão recorrida considerou, em síntese, que o despacho, de 20.01.2010, da Vice-Presidente do Conselho Directivo do Instituto de Solidariedade e Segurança Social, que negou provimento ao recurso hierárquico interposto do acto primário constitui um acto inimpugnável, por ser meramente confirmativo do acto anterior. Mais se consignou que o direito de impugnar o despacho de 30.06.2009, da Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector Lisboa II, se encontrava caduco, por esgotamento do prazo de caducidade da acção.
2.1.2. Do alegado erro de julgamento no que respeita à decisão de absolvição da instância, por procedência das excepções da inimpugnabilidade do acto impugnado e da caducidade do direito de acção.
Nos presentes autos, são impugnados os despachos seguintes: i) o despacho, datado de 20.01.2010, da Vice-Presidente do Conselho Directivo do Instituto de Solidariedade e Segurança Social; ii) o despacho, datado de 30.06.2009, da Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector Lisboa II.
O despacho recorrido considerou inimpugnável, nos termos do artigo 53.º do CPTA, o despacho referido em i) e absolveu da instância o réu, por extemporaneidade da acção impugnatória no que respeita ao despacho referido em ii).
2.1.3. No que respeita à inimpugnabilidade do despacho, de 20.01.2010, da Vice-Presidente do Conselho Directivo da do Instituto de Solidariedade e Segurança Social.
A este propósito, a recorrente insurge-se contra o decidido em primeira instância, por entender que o referido despacho não é meramente confirmativo do primeiro, dado que não coincidirá na fundamentação do segmento decisório. Vejamos.
O regime da impugnação de acto meramente confirmativo decorre do disposto no artigo 53.º do CPTA. Nos termos do preceito, «[u]ma impugnação só pode ser rejeitada com fundamento no carácter meramente confirmativo do acto impugnado quando o acto anterior: // a) tenha saído impugnado pelo autor; // b) Tenha sido objecto de notificação ao autor; // c) tenha sido objecto de publicação, sem que tivesse de ser notificado ao autor». A este propósito, de referir que: «[a] regra vale, em primeira linha, para os actos que se limitem a reconhecer que sobre determinada questão já anteriormente foi tomada uma decisão e que, portanto, não envolvam o reexercício do poder de decidir. E isto porque não estamos perante decisões e, portanto, perante actos administrativos (artigo 120.º do CPA), mas perante meras declarações enunciativas ou representativas da realidade, mediante as quais a Administração se limita a reconhecer que já anteriormente foi tomada uma decisão sobre a matéria e porventura se recusa a reexercer o poder de decidir»(1).
Assim, podemos afirmar que o acto confirmativo é aquele que, emanado da mesma entidade, e dirigindo-se ao mesmo destinatário, repete o conteúdo de um acto anterior, perante pressupostos de facto e de direito idênticos, e sem que o reexame desses pressupostos decorra de revisão imposta por lei. [Ac. do STA, de 28.10.2010, P. 0390/10]. Do probatório resulta a referida tripla identidade, isto é, em ambos os casos trata-se de actos que, perante o pagamento de certas quantias aos trabalhadores da autora a prestar serviço no estrangeiro, a título de ajudas de custo, no período de Janeiro de 2005 a Dezembro de 2008, determinam o seu enquadramento como retribuição, constituindo base de incidência contributiva para a segurança social. Ou seja, a decisão que nega provimento ao recurso hierárquico e mantém a decisão recorrida é acto meramente confirmativo do acto anterior, não assumindo lesividade própria.
Em face do exposto, impõe-se repristinar o discurso fundamentador da decisão recorrida de que «[n]ão havendo lugar a impugnação administrativa necessária para abrir a via contenciosa, dada a inexistência de exigência legal nesse sentido, questão que é referida aquando da notificação do acto, no qual é expressamente afirmada a sua recorribilidade contenciosa imediata. // Pelo que se verifica que a decisão de indeferimento do recurso hierárquico facultativo e de manutenção do acto anterior, proferida em 20 de Janeiro de 2010 é efectivamente inimpugnável, nos termos do artigo 53.º do CPTA».
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões do recurso.
2.1.4. No que respeita à caducidade do direito de impugnação do despacho datado de 30.06.2009, da Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector Lisboa II.
Nos presentes autos, é deduzida pretensão impugnatória deduzida contra o despacho datado de 30.06.2009, da Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector Lisboa II, notificado em 02.07.2009.
Está em causa acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo em matéria tributária, que não comporta a apreciação da legalidade da liquidação, pelo que o regime aplicável decorre, directamente, do CPA e do CPTA (artigo 97.º/2, do CPPT).
O regime e prazo de caducidade da acção decorre do disposto nos artigos 58.º e 59. º do CPTA.
O prazo em referência é de três meses a contar da notificação do acto impugnado ao seu destinatário (artigos 58.º/2/b) e 59.º/1, do CPTA). A notificação operou em 02.07.2009, pelo que o prazo expiraria em 02.10.2009. Sucede, porém, que importa ter em conta os factos suspensivos do prazo. É que o referido prazo sendo contínuo, suspende-se nas férias judiciais (ex-artigo 144.º/1, do CPC, actual artigo 138.º/1, do CPC, ex vi artigo 58.º/3, do CPTA). As férias judiciais decorriam, à data, de 01.08 a 31.08 (artigo 12.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro - o artigo 12.º da Lei n.º 32/2008, de 28 de Agosto, não tem aplicação ao caso, dado que a Lei n.º 32/2008 apenas entrou em vigor nos termos do artigo 187.º da referida lei). Em 01.09.2009, decorreram 29 dias do prazo. Em 29.08.2009, data da interposição do recurso hierárquico, decorreram 38 dias. Nesta data, o prazo suspendeu-se em virtude da dedução da impugnação administrativa (artigo 59.º/4, do CPTA). Suscita-se, todavia, a questão de saber em que data é que o referido prazo retoma a contagem.
Recordem-se os termos do preceito do artigo 59.º/4, do CPTA: «[a] utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal».
Nos termos do artigo 175.º/1, do CPA, «[q]uando a lei não fixe prazo diferente, o recurso hierárquico deve ser decidido no prazo de 30 dias contado a partir da remessa do processo ao órgão competente para dele conhecer». Nos termos do artigo 172.º/1, do CPA, «[no prazo de 15 dias], deve também o autor do acto recorrido pronunciar-se sobre o recurso e remetê-lo ao órgão competente para dele conhecer, notificando o recorrente da remessa do processo».
Donde decorre que, tendo o processo sido remetido ao órgão ad quem, em 09.12.09, o prazo para emitir decisão, contado nos termos do artigo 72.º do CPA, expirava em 22.01.2010. Sucede, porém, que decisão do recurso hierárquico apenas foi notificada ao seu destinatário em 04.02.2010. Donde decorre que o esgotamento do prazo de decisão do recurso hierárquico, como termo ad quem do efeito suspensivo da sua dedução, nos termos do artigo 59.º/4, do CPTA, não lhe é oponível, dado que não lhe foi notificada a remessa do processo ao órgão ad quem, o que significa que apenas através da notificação da decisão tomada pelo referido órgão, ou seja, em 04.02.2010, foi acessível ao destinatário do acto o decurso do respectivo prazo legal de decisão e o exaurimento do efeito suspensivo previsto no artigo 59.º/4, do CPTA. Donde decorre que, em 08.02.2010, o prazo de caducidade da acção previsto no artigo 58.º/2/b), do CPTA, ainda não se mostrava esgotado.
Ao decidir em sentido contrário, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, pelo que a mesma não se pode manter na ordem jurídica, o que implica a prossecução dos autos se nada mais obstar, o que se determinará no dispositivo.
DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em, concedendo provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido e ordenar a prossecução dos autos se nada mais obstar.
Custas pela recorrida.
Registe. Notifique.
Jorge Cortês - Relator
Pereira Gameiro
Joaquim Condesso


1- Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2010, pp. 217/272.