Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1647/10.2BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:03/10/2022
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:IRS
RENDIMENTOS OBTIDOS NO ESTRANGEIRO
JUROS
RETENÇÃO NA FONTE
PROVA
Sumário:I. A demonstração do pagamento de imposto no estrangeiro não está sujeita a nenhum tipo de formalidade, no sentido de ter de ser feita inexoravelmente através de declaração emitida pelas autoridades fiscais, in casu, suíças.

II. Logo, a falta desse tipo de documento não configura violação de uma formalidade ad substanciam, tanto mais que, in casu, a AT suíça comunicou não emitir qualquer declaração, por tal não ser exigível.

III. Tendo sido facultados elementos, pelas entidades pagadoras dos rendimentos em causa, contendo os valores das retenções na fonte efetuadas, os mesmos são de molde a demonstrar a existência de tais retenções.

IV. Na hipótese académica de a entidade pagadora não entregar à AT suíça o valor do imposto que reteve na fonte, tal não altera a posição dos contribuintes, que pagaram o imposto, na medida em que este lhes foi imediatamente retido.

V. As instruções administrativas não vinculam os administrados.

VI. Quer a CDT Portugal/Suíça, quer o Acordo entre a Comunidade Europeia e a Confederação Suíça, que prevê medidas equivalentes às previstas na Diretiva 2003/48/CE do Conselho, relativa à tributação dos rendimentos da poupança sob a forma de juros, consagram mecanismos de troca de informações, a que a AT pode lançar mão, em caso de dúvida.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 22.11.2019, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por H… e J… (doravante Recorridos ou Impugnantes), que teve por objeto o indeferimento da reclamação graciosa que versou sobre a liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), atinente ao ano de 2006.

Apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

a) Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos que julga procedente a impugnação judicial deduzida por H… (e Outros), devidamente identificado nos autos, contra o indeferimento da reclamação graciosa deduzida do acto de liquidação de IRS referente ao exercício de 2006.

b) Tendo o aqui Impugnante auferido rendimentos no estrangeiro e sendo residente em Portugal, os mesmos encontram-se sujeitos a tributação no território nacional em virtude do princípio da universalidade ou da tributação mundial ínsito no n.º 1 do artigo 15.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), princípio este decorrente também do n.º 2 do artigo 13.º da Lei Geral Tributária.

c) Contudo, para obviar à dupla tributação dos rendimentos, no país da origem e no país da residência, prevê o CIRS na alínea i) do n.º 1 do artigo 78.º, em conjugação com o n.º 1 do artigo 81.º do CIRS, mecanismo legal reconduzido à dedução à colecta do crédito de imposto por dupla tributação internacional, dedutível até à concorrência da parte da colecta proporcional a tais rendimentos líquidos, considerados nos termos do disposto na alínea b) do n.º 6 do artigo 22.º, crédito esse que corresponderá à menor das seguintes importâncias: imposto pago no estrangeiro ou fracção da colecta de IRS, calculada antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos das deduções específicas previstas neste Código.

d) Mais, de acordo com o prescrito no n.º 2 do artigo 81.º do CIRS, existindo convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a dedução a efectuar não poderá ultrapassar o imposto pago no estrangeiro nos termos previstos pela Convenção, mais resultando da aplicável no caso sub judice que pode o impugnante deduzir do imposto uma importância igual ao imposto sobre o rendimento pago na Suíça.

e) Resultando da legislação aplicável que a dedução à colecta admitida sempre se reconduzirá ao imposto efectivamente pago pelo Impugnante no estrangeiro em virtude dos rendimentos aí auferidos em 2006, pelo que, essencial seria que o Impugnante tivesse feito prova do imposto efectivamente pago, o que não aconteceu, pois que procede para o efeito à junção de documento de que decorre o imposto retido e não o imposto efectivamente pago na Suíça por efeito da percepção dos rendimentos.

f) Ora, cabendo ao Estado Português, enquanto Estado da residência, eliminar a dupla tributação assim gerada, através da concessão de um crédito de imposto, para que tal mecanismo possa ser accionado é necessária a apresentação de documento comprovativo do montante do rendimento auferido, natureza do mesmo, e do pagamento do imposto, o qual deverá ser emitido ou autenticado pelas autoridades fiscais do respectivo Estado de onde são originários os rendimentos.

g) E a errónea apreciação dos factos levada a cabo pela douta sentença centra-se precisamente na equiparação a que procede entre montantes retidos na fonte pela entidade pagadora suíça e montantes efectivamente devidos e pagos a título de imposto às autoridades fiscais suíças por virtude dos rendimentos aí auferidos.

h) Sendo que, para efeitos de prova do montante de imposto pago no estrangeiro não se configura suficiente um documento, emitido pela entidade que procedeu à retenção na fonte, do qual conste o montante do imposto retido na fonte, uma vez que apenas certifica que tal retenção foi efectuada, não atestando ou provando que o imposto retido foi, efectivamente, entregue nos cofres do Estado estrangeiro.

i) Ainda é afirmado na douta sentença que a AT aceitou os documentos, contudo, aceitar o documento não significa que desse próprio documento resulte, ou se mostre suportado, o facto alegado pelo Impugnante, pelo que, não podia o Tribunal a quo chegar à conclusão de que do documento resulta o quantum de imposto pago no país da fonte do rendimento com referência ao ano de 2006, pois que nos posicionamos perante exigências probatórias situadas ao nível do efectivo pagamento do imposto num outro Estado que não o território português, que se reconduzem, por isso mesmo, à determinação inequívoca do imposto pago e não do imposto retido, - facto que pode apenas ser atestado pela entidade a quem é efectuado o pagamento do imposto – a autoridade fiscal suíça - , e não pela entidade pagadora dos rendimentos a quem está reservada faculdade de emitir declaração que ateste os rendimentos pagos, precisamente por ser quem procede ao pagamento dos mesmos.

j) Assim, constituindo a prova do imposto pago no estrangeiro condição sine qua non do reconhecimento do direito à dedução à colecta do montante reconduzido ao crédito por dupla tributação internacional em causa nos presentes autos, mostra-se incontornável que discordemos do entendimento vertido na douta sentença, conforme entendimento vertido no Acórdão, supra parcialmente transcrito, do TCA Norte de 22/02/2012, proferido no processo n.º 00434/09.5BEMDL, não sendo de admitir ademais a inversão do ónus da prova.

k) Não carreando aos autos o Impugnante documentos capazes demonstrar o montante de imposto pago na Suíça, com referência ao ano de 2006 não logrou fazer a prova que lhe incumbia à luz dos normativos aplicáveis – artigo 81.º do CIRS e artigos 74.º, n.º 1, da LGT e 342.º do Código Civil, não lhe sendo devido o sindicado crédito de imposto.

l) Atento o exposto, incorreu a douta sentença, ao decidir anular a liquidação de IRS nos presentes autos impugnada, em errónea apreciação da matéria de facto e de direito, por essa via violando o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 81.º do CIRS.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue totalmente improcedente a impugnação judicial.

Sendo que Exas. Decidindo farão a Costumada Justiça”.

Os Recorridos apresentaram contra-alegações, nas quais formularam as seguintes conclusões:

“A. Em causa nos presentes autos está a questão de saber se os Recorridos fizeram prova bastante do imposto pago na Suíça relativo ao rendimento de juros e dividendos aí obtido, a fim de poderem beneficiar do direito ao crédito de imposto com vista à atenuação da dupla tributação. A este propósito, e para demonstração de tal imposto pago, os Recorridos apresentaram documentos emitidos pelos agentes pagadores (extratos bancários) evidenciando quer os rendimentos quer a retenção na fonte sofrida, assim como troca de e-mails com as autoridades fiscais suíças que expressamente declararam não emitir qualquer outro documento a este propósito.

B. A AT considerou os mesmos documentos válidos e suficientes para a prova dos rendimentos, mas insistiu na primeira instância e reitera no presente recurso que tais documentos são insuficientes para a demonstração do imposto pago no estrangeiro, o que faz i) pondo em causa a sentença recorrida, que está bem fundamentada e não merece reparo; ii) pondo em causa a jurisprudência superior maioritária sobre este tema; iii) ignorando o direito internacional a que Portugal se vinculou, nos termos do qual, e tratando-se de rendimentos de juros, o Estado português se obrigou a aceitar como documento suficiente para a prova do imposto pago no estrangeiro os documentos emitidos pelo agente pagador.

C. Da factualidade assente na sentença recorrida (cf. ponto R da factualidade assente) resulta que os Recorridos auferiram dividendos na Suíça no valor total de € 7.985,72, relativamente aos quais foi retido imposto no valor total de € 1.197,86 e juros no valor total de € 410.365,96, relativamente aos quais foi retido imposto no valor de € 34.672,76.

D. A AT não põe em causa tal factualidade (nem quanto aos rendimentos nem quanto à retenção na fonte), que resulta dos documentos emitidos pelas entidades bancárias pagadoras de tais rendimentos.

E. Desde logo, lidas detalhadamente as alegações de recurso e as suas conclusões (que delimitam o mesmo recurso), conclui-se que o que a AT impugna é exclusivamente a apreciação da prova e decisão da matéria de facto, ainda que nunca especifique (como se lhe impunha) os concretos meios probatórios ou a diferente apreciação dos meios de prova existentes que levariam a concluir por factos diversos e, menos ainda, que factos diferentes dos provados seriam afinal os que deveriam constar da matéria factual assente F. Ao não atacar concretamente os factos assentes da sentença recorrida, não indicando com precisão qual a valoração que se impunha ou que factos deveriam ser retirados ou aditados do probatório e com base em que elementos de prova constantes do autos assim deveria acontecer, deve o recurso em apreço interposto pela AT ser rejeitado quanto ao alegado erro de julgamento de facto por incumprimento do seu ónus de impugnação nos termos do artigo 640.º do CPC, ex vi art.º 2.º e) do CPPT.

G. Em qualquer caso, por contribuírem para a análise da questão decidenda e clarificar a factualidade a partir da qual o Tribunal a quo efetivamente partiu para a análise que efetuou na sentença recorrida, requer-se, nos termos conjugados dos art.ºs 636º, n.º 2, e 640º, n.º 2 b), ambos do CPC, ex vi art.º 2º, e) do CPPT, se dignem aditar à matéria de facto provada (apenas no caso, repita-se, de ser apreciado o recurso) os seguintes factos

R. Os Impugnantes solicitaram às autoridades fiscais suíças a emissão de um certificado indicando o montante total dos dividendos pagos nos anos de 2005 e 2006, bem como o montante do imposto suportado e do reembolso recebido (cf. e-mail de S… de 10/02/2010, acompanhado da sua tradução em inglês, cf. doc. n.º 14 junto à petição inicial (P.I.).

S. Em resposta a tal pedido, esclareceram as autoridades fiscais suíças (J…), por e-mail da mesma data (10/02/2010), que o acordo de dupla tributação não prevê a emissão de quaisquer certificados como aqueles que a AT exige, afirmando ainda que toda a informação requerida consta dos documentos emitidos pelas entidades bancárias que efetuam o pagamento dos mesmos rendimentos (cf. e-mail de J… e tradução em inglês junto como doc. n.º 14).

H. Ainda que assim não fosse (que não houvesse de ser rejeitado o recurso apresentado), e que se pudessem identificar vícios (que não vêm adequadamente invocados) que determinassem a apreciação do Recurso – o que não é o caso –, ainda nesta circunstância o mesmo estaria votado ao insucesso, devendo ser julgado totalmente improcedente, por desrazão da AT nas afirmações que faz e por total acerto da sentença recorrida, que não pode deixar de manter-se integralmente, o que se requer

I. Na verdade, a posição da AT decorre em exclusivo das instruções administrativas da AT a este propósito (referidas no ponto 35. acima), segundo as quais apenas documentos originais emitidos ou certificados pelas autoridades fiscais do Estado da fonte do rendimento são idóneos a provar o imposto pago no estrangeiro.

J. A este propósito, importa lembrar que:

a. A lei não estabelece a este propósito qualquer regime de prova vinculada, antes apontando o art.º 128º do CIRS pela admissibilidade de qualquer meio de prova em direito admitido;

b. Os documentos apresentados consistem em documentos emitidos pelas entidades bancárias, cuja autenticidade a AT não questiona (nem poderia);

c. Além dos documentos em causa, os Recorridos apresentaram ainda documentos certificados pela própria AT portuguesa, no que respeita aos dividendos, e informação emitida pelas autoridades fiscais suíças em que esta se recusa a emitir quaisquer declarações ou certificados adicionais;

d. No que respeita aos juros, o Estado português vinculou-se por instrumento de direito internacional (o Acordo) a aceitar como prova suficiente do imposto pago no estrangeiro documentos emitidos pelos agentes apagadores.

K. Ora, verifica-se que os Recorridos se viram colocados numa impossibilidade: por um lado, as autoridades suíças não emitem um certificado original atestando o montante do imposto efetivamente pago naquele país por entenderem que tal não é necessário nem devido e, por outro lado, a AT entende que os Recorridos só poderão deduzir o imposto pago no estrangeiro em Portugal mediante a apresentação de um certificado original emitido pelas autoridades suíças (que, reitere-se, se negaram a emiti-lo).

L. Não se vê pois que elementos adicionais poderiam ser trazidos aos autos para prova do imposto pago no estrangeiro, sendo talvez por isso que a própria Recorrente não aduza quaisquer elementos nem diga de que modo a prova junta aos autos imporia uma decisão diversa da proferida, o que bem demonstra a improcedência do presente recurso, se este houvesse de ser apreciado.

M. Acresce que uma vez demonstrada (e não questionada) a retenção na fonte efetuada, e tratando-se os extratos bancários de documentos particulares (cf. art.º 346.º do CC e art.º 128.º do CIRS), a acrescer à presunção de verdade de que gozam as declarações dos Recorridos na parte em que declararam o imposto pago no estrangeiro (cf. art.º 75.º da LGT), sempre caberia à AT carrear aos autos elementos dos quais decorresse, ao menos indiciariamente, a contraprova ou factos que abalassem a prova efetuado, o que manifestamente não fez.

N. Aliás, se tinha dúvidas quanto aos factos que resultam provados dos extratos bancários e que são atestados pelos documentos certificados pela AT portuguesa e pela informação transmitida pelas autoridades fiscais suíças, a AT podia e devia ter recorrido ao mecanismo de troca de informações e recolhido informação junto das autoridades fiscais suíças, para dissipar eventuais dúvidas a propósito da documentação apresentada pelos Recorridos, nos termos do art.º 25º, n.º 3, da Convenção, o que naturalmente não fez.

O. A AT limita-se a afirmar que os Recorridos não cumpriram o seu ónus probatório, mas não faz qualquer esforço (por mínimo que seja) para abalar a prova produzida (o que se compreende porque não se vê como poderia fazê-lo), o que deixa muito claro o acerto da sentença recorrida, que deve manter-se.

P. Acresce que, e no que respeita aos juros, cuja retenção na fonte aqui em causa ascende a € 34.672,76, a suficiência dos documentos emitidos pelos agentes pagadores para prova do imposto pago no estrangeiro decorre de exigência legal, sendo prevista no art.º 9º do Acordo com a Suíça, sendo pois o direito internacional que vincula o Estado português que lhe impõe a aceitação de tal prova.

Q. No sentido que aqui se defende (e como bem decidiu a sentença recorrida), vejam-se os acórdãos proferidos pelo STA de 20/04/2005 no proc. 01254; do TCA Norte em 14/04/2005 no proc. 00285/02 ou TCA Sul em 23/02/2017 no proc. 3/15.5BELRS, todos disponíveis em www.dgsi.pt; ou a decisão arbitral proferida em 13/04/2017 no proc. 552/2016, disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/.

R. Não merece pois reparo a sentença recorrida ao decidir que “Resultando provado nos presentes autos que os rendimentos auferidos pelo impugnante, quer os juros quer os dividendos, foram obtidos no estrangeiro onde lhes foram aplicadas retenções na fonte, suportando desta forma imposto no país de origem dos rendimentos, tem de relevar o crédito de imposto por dupla tributação internacional, nos termos do disposto no artigo 23.º da CTD, 8.º da CRP e 80.º do CIRS”; devendo manter-se na íntegra”.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT) vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir:

Questões suscitadas pelos Recorridos:

a) O recurso deve ser rejeitado, por não terem sido cumpridos os requisitos exigidos pelo art.º 640.º do CPC?

b) Deve ser ampliada a decisão proferida quanto à matéria de facto?

Questão suscitada pela Recorrente:

c) Verifica-se erro de julgamento, porquanto não resultou provado o pagamento do imposto na Suíça?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

A. No exercício de 2006, pela sociedade R… foram pagos juros ao impugnante no montante de €103.474,25, não sujeitos a retenção na fonte [cf. cópia do extrato do portfolio do impugnante a fls. 129 a 133 dos autos].

B. A 22.02.2006 pelo D… S.A. foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de €43.328,17, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de €6.499,22, referente ao período 24.02.2006 a 24.05.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 107 dos autos].

C. A 28.02.2006 pelo D… foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de 978,45 francos suíços, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de 146,75 francos suíços, referente ao período 13.02.2006 a 28.02.2006 [cf. Cópia do extrato bancário a fls. 109 dos autos].

D. A 31.03.2006 pelo D… foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de 1.646,05 francos suíços, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de 246,90 francos suíços, referente ao período 28.02.2006 a 31.03.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 115 dos autos].

E. A 26.04.2006 pelo D… S.A. foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de €16.770,00, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de €2.515,50, referente ao período 28.04.2006 a 24.05.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 116 dos autos].

F. A 27.04.2006 pelo D… foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de 5.478,70 francos suíços, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de 821,80 francos suíços, referente ao período 31.03.2006 a 28.04.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 117 dos autos].

G. A 23.05.2006 pelo D… S.A., foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de €66.185,00, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de €9.927,75, referente ao período 24.05.2006 a 24.07.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 118 dos autos].

H. A 31.07.2006 pelo D…, foram colocados à disposição na conta do impugnante juros pela quantia de €7.145,83, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de €1.071,87, referente ao período 24.07.2006 a 31.07.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 119 dos autos].

I. A 07.08.2006 pelo D…, foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de €9.169,13, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de €1.375,36, referente ao período 31.07.2006 a 09.08.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 120 dos autos].

J. A 07.08.2006 pelo D… S.A., foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de €34.484,57, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de €5.172,68, referente ao período 09.08.2006 a 08.09.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 121 dos autos].

K. A 08.09.2006 pelo D… S.A., foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de €13.545,18, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de €2.031,77, referente ao período 08.09.2006 a 20.09.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 122 dos autos].

L. A 20.09.2006 pelo D… S.A., foram colocados à disposição na conta do impugnante, juros pela quantia de €35.371,00, sujeita a retenção na fonte à taxa de 15% no montante de €5.305,65, referente ao período 20.09.2006 a 20.10.2006 [cf. cópia do extrato bancário a fls. 123 dos autos].

M. No exercício de 2006 pela sociedade G… AG, foram pagos dividendos ao impugnante no montante de 12.528,00 francos suíços, sujeitos a retenção na fonte à taxa de 35% no montante de 4.384,80 fracos suíços [cf. cópia do extrato bancário a fls. 135 dos autos].

N. A 14.05.2007 foi pelo impugnante solicitado o reembolso de 20% do montante referente a retenção na fonte identificada no ponto anterior, no montante de 2.505,60 francos suíços junto da autoridade tributária Suíça, ao abrigo da convenção de dupla tributação entre Portugal e a Suíça [cf. cópia do pedido de reembolso a fls. 137 dos autos].

O. O montante identificado no ponto anterior foi pago ao impugnante em 18.12.2008 [cf. cópia da transferência bancária a fls. 137 dos autos].

P. Em 25.05.2007 os impugnantes apresentaram a declaração de rendimentos relativa ao exercício de 2006, juntando um anexo H e um anexo J, no qual no qual o sujeito passivo A declarou ter auferido: a) juros pagos pelo D… Bank da Suíça e da Alemanha no valor de €413.702,63, sobre o qual caíram retenções na fonte no montante de €34.672,76; e b) dividendos provenientes da Suíça no montante de €7.985,72 sujeitos a retenção na fonte no montante de €2.795,00 [cf. cópia da declaração de rendimentos a fls. 312 a 316 do PAT em apenso].

Q. Em 18.06.2007 os impugnantes apresentaram a declaração de substituição de rendimentos de IRS, relativa ao exercício de 2006 [cf. cópia da declaração de rendimentos a fls. 94 a 98 dos autos, e fls. 278 a 282 do PAT em apenso].

R. Na declaração identificada no ponto anterior foi pelos impugnantes declarado terem auferido:

i) Dividendos no montante de €7.985,72, relativamente aos quais foram retidos €1.197,86 de imposto, auferidos na Suíça [cf. cópia da declaração de rendimento – anexo J, quadro 4, linha 420 e quadro 6, linha 603, a fls. 97 e 98 dos autos];

ii) Juros no montante de €410.365,96, relativamente aos quais foram retidos €34.672,76 de imposto, auferidos na Suíça [cf. cópia da declaração de rendimento – anexo J, quadro 4, linha 408 e quadro 6, linha 602, a fls. 97 e 98 dos autos];

iii) Juros no montante de €4.153,34, auferidos na Alemanha [cf. cópia da declaração de rendimento – anexo J, quadro 4, linha 408 e quadro 6, linha 601, a fls. 97 e 98 dos autos];

S. A 06.09.2007 foi emitida em nome dos impugnantes a liquidação de IRS identificada com o n.º …………, referente ao exercício de 2006, onde foi apurado imposto a pagar no montante de €128.007,82 [cf. cópia da liquidação a fls. 99 dos autos].

T. O montante identificado no ponto anterior foi pago em 26.10.2007 [cf. vinheta aposta sobre a liquidação a fls. 99 dos autos].

U. Através do ofício n.º ……., de 26.02.2009, do Serviço de Finanças de Cascais 1, foram os impugnantes notificados para apresentar os documentos comprovativos do imposto suportado no estrangeiro nos anos de 2005 e 2006 [cf. cópia da notificação a fls. 100 dos autos, e fls. 339 e 340 do PAT em apenso].

V. A 19.05.2009 pelos impugnantes foi apresentada resposta ao solicitado no ponto anterior, juntando cinco anexos com documentação [cf. cópia do requerimento a fls. 101 a 139 dos autos].

W. Através do ofício n.º ……., de 18.06.2009 da Direcção de Finanças de Lisboa foram os impugnantes notificados do projecto de alteração dos seus rendimentos declarados, constando do mesmo, nomeadamente, “[f]oi V.Exª notificado, ao abrigo do artigo 128° do CIRS (obrigação de comprovar os elementos das declarações) para a apresentação dos documentos originais válidos, emitidos ou autenticados pelas respectivas autoridades fiscais do estado da fonte dos rendimentos, que descriminem a natureza e montante do rendimento auferido, bem como o correspondente montante de imposto pago, a titulo final e total, para os anos de 2005 e 2006. Não tendo apresentado os mesmos, propõem-se as alterações constantes do quadro abaixo (…)” [cf. cópia do ofício a fls. 140 e 141 dos autos].

X. Através do ofício n.º ……., de 17.07.2009, da Direcção de Finanças de Lisboa foram os impugnantes notificados que o projecto de decisão identificado no ponto anterior havia sido convertido em decisão final, pelo que se iria proceder à liquidação adicional de imposto [cf.cópia do ofício a fls. 142 dos autos, e fls. 342 do PAT em apenso].

Y. A 14.09.2009 a AT emite uma declaração oficiosa em sede de IRS em nome dos impugnantes, desconsiderando todo o imposto que havia sido declarado como suportado no estrangeiro [cf. cópia da declaração de rendimentos a fls. 327 a 332 do PAT em apenso].

Z. A 30.09.2009 foi emitida em nome dos impugnantes a liquidação de IRS identificada com o n.º ………, referente ao exercício de 2006, onde foi apurado imposto a pagar no montante de €166.846,36 [cf. cópia da liquidação a fls. 93 dos autos e fls. 334 do PAT em apenso].

AA. O montante identificado no ponto anterior engloba a liquidação de juros compensatórios n.º ……., no montante de €3.303,70 [cf. cópia da liquidação a fls. 143 dos autos e fls. 336 do PAT em apenso].

BB. As liquidações identificadas nos pontos anteriores deram origem à emissão da nota de compensação n.º ……….., resultando em imposto a pagar no montante de €38.838,54, que teve data limite de pagamento a 11.11.2009 [cf. cópia da demonstração de acerto de contas a fls. 144 dos autos e fls. 333 do PAT em apenso].

CC. Em nome dos impugnantes foi instaurado o processo de execução fiscal n.º ……….., pela quantia exequenda de €38.838,54, identificado no ponto anterior [cf. cópia da nota de citação a fls. 145 dos autos].

DD. A 21.01.2010, pelos impugnantes foi apresentada reclamação graciosa contra o acto de liquidação identificado no ponto anterior [cf. carimbo aposto a fls. 2 do processo de reclamação em apenso e fls. 147 dos autos].

EE. Por ofício n.º …….., de 03.03.2010, da Direcção de Finanças de Lisboa, foi o impugnante notificado para apresentar “documento ou documentos emitidos e autenticados pelas Administrações Fiscais dos países em que o imposto foi suportado, no valor de €37.467,76, bem como dos rendimentos auferidos, no valor de €422.505,02 e a sua natureza (…) devidamente traduzidos (…)”[cf. cópia do ofício a fls. 188 dos autos].

FF. A 17.03.2010 pelo impugnante foi apresentada resposta ao solicitado no ponto anterior, juntando 19 folhas [cf. requerimentos a fls. 189 a 208 dos autos].

GG. A 30.03.2010 foi extinto por pagamento voluntário o processo de execução fiscal n.º …………., identificado em CC) supra [cf. print da certidão de dívida a fls. 424 dos autos].

HH. Através do ofício n.º …….., de 12.08.2010, da Direcção de Finanças de Lisboa, foi o impugnante notificado do teor do projecto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada [cf. ofício e informação e despacho conexos a fls. 105 a 109 do processo de reclamação em apenso e fls. 209 a 212 dos autos].

II. A 01.09.2010 foi pelo impugnante exercido o direito de audição prévia [cf. cópia do requerimento a fls. 213 a 303 dos autos].

JJ. Por despacho de 30.09.2010 da Directora de Finanças Adjunta da Direcção de Finanças de Lisboa, foi indeferida a reclamação graciosa identificada no ponto anterior [cf. despacho e informação conexa a fls. 238 a 241 do processo de reclamação em apenso e fls. 89 a 92 dos autos].

KK. Através do ofício n.º ……, de 07.10.2010, da Direcção de Finanças de Lisboa, foi o impugnante notificado em 08.10.10 do teor da decisão identificada no ponto anterior [cf. ofício e aviso de recepção assinado a fls. 242 e 243 do processo de reclamação em apenso e fls. 88 dos autos].

LL. A 25.10.2010 foi apresentada a petição inicial que deu origem aos presentes autos [cf. registo dos CTT a fls. 331 dos autos e registo fax a fls. 31 dos autos]”.

II.B. Refere-se ainda na sentença recorrida:

“Nada mais se provou com interesse para a decisão a proferir”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“Assenta a convicção deste Tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e no processo instrutor, não impugnados, referidos a propósito de cada alínea do probatório”.

II.D. Da ampliação da matéria de facto requerida pelos Recorridos

Nas suas contra-alegações, os Recorridos pugnam pelo aditamento dos seguintes factos provados:

a) Os Impugnantes solicitaram às autoridades fiscais suíças a emissão de um certificado indicando o montante total dos dividendos pagos nos anos de 2005 e 2006, bem como o montante do imposto suportado e do reembolso recebido (cf. e-mail de S… de 10/02/2010, acompanhado da sua tradução em inglês, cf. doc. n.º 14 junto à petição inicial (P.I.);

b) Em resposta a tal pedido, esclareceram as autoridades fiscais suíças (J…), por e-mail da mesma data (10/02/2010), que o acordo de dupla tributação não prevê a emissão de quaisquer certificados como aqueles que a AT exige, afirmando ainda que toda a informação requerida consta dos documentos emitidos pelas entidades bancárias que efetuam o pagamento dos mesmos rendimentos (cf. e-mail de J… e tradução em inglês junto como doc. n.º 14).

Nos termos do art.º 636.º, n.º 2, do CPC, o Recorrido, na respetiva alegação e a título subsidiário, pode arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo Recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas.

Nesse contexto, atento o disposto no n.º 3 do art.º 640.º do CPC, é aplicável a disciplina constante dos seus n.ºs 1 e 2.

Assim, considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão(1).

O regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe o ónus de especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Como tal, não basta haver uma manifestação de forma não concretizada quanto à discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo­-se-lhe os ónus já mencionados(2).

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que tais ónus foram cumpridos pelos Recorridos e que sempre tal poderia ser aditado oficiosamente por este Tribunal, ao abrigo do art.º 662.º, n.º 1, do CPC, pelo que se irá proceder à apreciação do requerido.

Refira-se ainda que nem todos os factos alegados pelas partes, ainda que provados, carecem de integrar a decisão atinente à matéria de facto, porquanto apenas são de considerar os factos cuja prova (ou não prova) seja relevante face às várias soluções plausíveis de direito.

Feito este introito, cumpre apreciar, considerando-se que é de deferir o requerido, atentos os meios de prova para os quais remetem os Impugnantes, que em momento algum foram postos em causa.

Como tal, aditam-se à decisão proferida sobre a matéria de facto os seguintes factos provados:

MM. Os Impugnantes solicitaram às autoridades fiscais suíças a emissão de um certificado indicando o montante total dos dividendos pagos nos anos de 2005 e 2006, bem como o montante do imposto suportado e do reembolso recebido (cfr. e-mail de S… de 10.02.2010, acompanhado da sua tradução em inglês – doc. n.º 14 junto à petição inicial).

NN. Em resposta a tal pedido, esclareceram as autoridades fiscais suíças (J…), por e-mail da mesma data (10.02.2010), que o acordo de dupla tributação não prevê a emissão de quaisquer certificados como aqueles que a AT exige, afirmando ainda que toda a informação requerida consta dos documentos emitidos pelas entidades bancárias que efetuam o pagamento dos mesmos rendimentos (cfr. e-mail de J… e tradução em inglês junto – doc. n.º 14 junto à petição inicial).

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Da rejeição do recurso

Consideram, antes de mais, os Recorridos que o recurso deve ser rejeitado, por não ter sido dado cumprimento aos requisitos impostos pelo art.º 640.º do CPC.

Vejamos.

Como já referimos, considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão.

Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente os pressupostos a que já fizemos referência supra (cfr. ponto II.D.).

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos e atenta a leitura das alegações de recurso apresentadas, resulta que nestas a Recorrente não se insurgiu contra a matéria de facto fixada, não a tendo impugnado.

Apesar de a Recorrente invocar o erro de julgamento de facto, o que na verdade defende é que a factualidade provada não é de molde a sustentar a decisão proferida, nunca tendo posto em causa qualquer dos factos julgados provados pelo Tribunal a quo.

Logo, e uma vez que os ónus mencionados supra são de atentar apenas quando haja impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, carece de materialidade o alegado pelos Recorridos a este propósito.

Passando à apreciação da questão suscitada pela Recorrente.

III.B. Do erro de julgamento

Considera a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, porquanto, na sua perspetiva, da factualidade assente não se pode extrair a conclusão extraída pelo Tribunal a quo, no que respeita à prova do pagamento do imposto retido.

In casu, estamos perante rendimentos de juros e dividendos auferidos pelos Recorridos na Suíça, no ano de 2006.

Nessa sequência, em 2007, os Recorridos apresentaram a sua declaração de rendimentos junto da administração tributária (AT) portuguesa, tendo esta, em 2009, solicitado a apresentação dos documentos comprovativos do imposto suportado no estrangeiro.

Os Impugnantes apresentaram documentação nesse seguimento, que não foi considerada idónea pela AT, dando origem à emissão da liquidação adicional ora sob apreciação.

Vejamos então.

O nosso ordenamento, designadamente ao nível do IRS, consagra o princípio da tributação pelo rendimento mundial.

Assim, nos termos do n.º 2 do art.º 13.º da Lei Geral Tributária:

“A tributação pessoal abrange ainda todos os rendimentos obtidos pelo sujeito passivo com domicílio, sede ou direção efetiva em território português, independentemente do local onde sejam obtidos”.

Tal decorre, igualmente, do disposto no art.º 1.º do Código do IRS (CIRS), em cujo n.º 2 se prevê que “[o]s rendimentos, quer em dinheiro quer em espécie, ficam sujeitos a tributação, seja qual for o local onde se obtenham, a moeda e a forma por que sejam auferidos” (sublinhado nosso).

Da mesma forma o então n.º 1 do art.º 15.º do mesmo código previa que, “[s]endo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território”.

Ou seja, para efeitos de IRS, no caso de sujeitos passivos residentes, é irrelevante o estado fonte do rendimento.

Naturalmente que, havendo rendimentos obtidos no estrangeiro, existem mecanismos para evitar ou atenuar situações de dupla tributação, mecanismos esses quer existentes na legislação interna, quer em instrumentos de direito internacional.

A este respeito, dispunha o art.º 22.º, n.º 6, do CIRS:

“Quando o sujeito passivo aufira rendimentos que deem direito a crédito de imposto por dupla tributação internacional previsto no artigo 81.º, os correspondentes rendimentos devem ser considerados pelas respetivas importâncias ilíquidas dos impostos sobre o rendimento pagos no estrangeiro”.

Por seu turno, o então art.º 81.º do CIRS previa que:

“1 - Os titulares de rendimentos das diferentes categorias obtidos no estrangeiro têm direito a um crédito de imposto por dupla tributação internacional, dedutível até à concorrência da parte da coleta proporcional a esses rendimentos líquidos, considerados nos termos da alínea b) do n.º 6 do artigo 22.º, que corresponderá à menor das seguintes importâncias:

a) Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro;

b) Fração da coleta do IRS, calculada antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos das deduções específicas previstas neste Código.

2 - Quando existir convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a dedução a efetuar nos termos do número anterior não pode ultrapassar o imposto pago no estrangeiro nos termos previstos pela convenção”.

É ainda de atentar no disposto no art.º 128.º do CIRS, que prevê a obrigação de as pessoas sujeitas a IRS apresentarem, no prazo fixado, os documentos comprovativos dos rendimentos auferidos, das deduções e abatimentos e de outros factos ou situações mencionadas na respetiva declaração.

In casu, uma vez que estamos perante rendimentos pagos na Suíça, há também que considerar os instrumentos de direito internacional pertinentes, que prevalecem sobre o direito interno (cfr. art.º 8.º da Constituição da República Portuguesa).

A Convenção entre Portugal e a Suíça para evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre o rendimento e o capital (doravante CDT Portugal/Suíça) foi aprovada para ratificação pelo Decreto do Presidente da República n.º 716/74, de 12 de dezembro, sendo este o texto a considerar, uma vez que as alterações que houve a esta CDT foram ulteriores ao momento temporal ora pertinente.

Quer os rendimentos de juros, quer os rendimentos relativos a dividendos, estão abrangidos pela CDT Portugal/Suíça, conforme decorre dos seus art.ºs 10.º e 11.º.

Por outro lado, nos termos do seu art.º 23.º:

“1. Quando um residente de Portugal obtiver rendimentos que, de acordo com o disposto nesta Convenção, possam ser tributados na Suíça, Portugal deduzirá do imposto sobre os rendimentos desse residente uma importância igual ao imposto sobre o rendimento pago na Suíça. A importância deduzida não poderá, contudo, exceder a fração do imposto português, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos tributados na Suíça”.

Cumpre ainda ter em conta o disposto no seu art.º 25.º, cuja amplitude abarca a possibilidade de troca de informações entre as AT de ambos os estados contratantes [cfr., neste sentido, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 14.04.2005 (Processo: 00107/03 – BRAGA)].

Em matéria de juros é ainda de atentar no Acordo entre a Comunidade Europeia e a Confederação Suíça, que prevê medidas equivalentes às previstas na Diretiva 2003/48/CE do Conselho, relativa à tributação dos rendimentos da poupança sob a forma de juros (vulgo, Diretiva Poupança), acordo esse publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 29.12.2004.

Assim, é aqui definida a tributação de pagamento de juros (cujo conceito consta do seu art.º 7.º).

Este acordo centra-se nos conceitos de agente pagador (definido no seu art.º 6.º) e de beneficiário efetivo (definido no seu art.º 4.º).

Nos termos do seu art.º 1.º, sob a epígrafe Retenção na fonte pelos agentes pagadores suíços, “[o]s juros pagos a beneficiários efetivos (…) que sejam residentes num Estado-Membro da União Europeia (…) por um agente pagador estabelecido no território da Suíça, estão, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º, sujeitos a uma retenção em relação ao montante de juros pago. A taxa da retenção é de 15 % durante os primeiros três anos a contar da data da aplicação do presente acordo, 20 % nos três anos subsequentes e, a partir de então, 35 %”.

Em termos de eliminação da dupla tributação, há que atentar no seu art.º 9.º, nos termos do qual:

“1. Se os juros recebidos pelo beneficiário efetivo tiverem sido retidos na fonte pelo agente pagador na Suíça, o Estado-Membro da residência fiscal do beneficiário efetivo deve conceder-lhe um crédito de imposto igual ao montante da retenção na fonte. Se o montante desta exceder o montante do imposto devido pelo montante total dos juros sujeitos a retenção, segundo o seu direito interno, o Estado-Membro de residência fiscal deve reembolsar o beneficiário efetivo do montante da retenção na fonte pago em excesso.

2. Se os juros recebidos por um beneficiário efetivo tiverem sido sujeitos a qualquer tipo de imposto ou retenção na fonte, para além da prevista no presente acordo, e o Estado-Membro da residência fiscal conceder um crédito fiscal em relação a esses impostos ou retenções na fonte, segundo o seu direito interno ou convenções destinadas a prevenir a dupla tributação, esses outros impostos e retenções na fonte devem ser creditados antes da aplicação do procedimento referido no n.º 1. O Estado-Membro da residência fiscal aceita os certificados emitidos pelos agentes pagadores suíços, como prova bastante do imposto ou da retenção na fonte, desde que a autoridade competente no Estado-Membro de residência fiscal possa obter da autoridade competente suíça a verificação das informações contidas nesses certificados emitidos pelos agentes pagadores suíços.

3. O Estado-Membro da residência fiscal do beneficiário efetivo pode substituir o mecanismo de crédito fiscal referido nos n.ºs 1 e 2 pelo reembolso da retenção na fonte a que se refere o artigo 1.º”.

Finalmente, é ainda de referir que o art.º 10.º deste acordo prevê um mecanismo de troca de informações, entre as autoridades competentes da Suíça e as dos Estados-membros.

Feito este enquadramento, cumpre apreciar.

Não é controvertido que os Recorridos auferiram os rendimentos em causa, sendo que a FP considera, no entanto, que não resultou provado o pagamento do imposto respetivo.

Adiantemos, desde já, que não acompanhamos a posição da Recorrente.

Explicitemos.

Antes de mais, refira-se que, ao contrário do que parece resultar das alegações de recurso, a demonstração do pagamento de imposto no estrangeiro não está sujeita a nenhum tipo de formalidade, no sentido de ter de ser feita inexoravelmente através de declaração emitida pelas autoridades fiscais suíças. Por maioria de razão, a falta desse tipo de documento não configura violação de uma formalidade ad substanciam.

A circunstância de existirem orientações administrativas nesse sentido, como referem os Recorridos nas suas contra-alegações, em nada altera a conclusão extraída.

Com efeito, o objetivo subjacente à emissão destas orientações genéricas é dotar os contribuintes de um instrumento que os esclareça sobre a interpretação que a AT faz num determinado caso, conferindo segurança adicional em termos de previsibilidade da atuação administrativa.

No entanto, estas orientações genéricas, vinculando a AT na sua atuação, não vinculam os sujeitos passivos e, pretendendo-se interpretar uma norma, não podem ir além disso mesmo, da interpretação. Como referido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 14.03.2013 (Processo: 00997/12.8BEPRT): “Atento o primado da lei sobre as orientações administrativas (princípio da legalidade), as regras estatuídas nas circulares da Administração Tributária, têm que respeitar o quadro normativo legislativo de referência – normas jurídicas primárias –, que lhe é prevalente. E quando aquelas estabelecem um sentido normativo que não tem acolhimento na norma legislativa que pretensamente é interpretada, estão afinal a derrogá-la e a criar norma jurídica inovatória inválida”.

Assim, a circunstância de haver instruções administrativas que determinam que determinado facto tem de ser provado através de declaração emitida por administração tributária de estado estrangeiro não implica que o administrado não possa fazer a prova em causa por outras vias, dado que não está prevista na lei qualquer restrição em termos probatórios.

Ou seja, em situações como a dos autos, não há qualquer obrigação de entregar uma declaração emitida pelas autoridades fiscais do estado fonte, podendo a prova ser feita por outros meios.

E entende-se que, de facto, tal prova foi efetuada, através dos elementos facultados pelas entidades pagadoras dos rendimentos em causa, elementos esses, aliás, considerados em termos de cômputo do valor dos rendimentos auferidos.

Com efeito, ficou provado que as entidades pagadoras dos rendimentos o fizeram, o que nunca é posto em causa, e que nesse momento do pagamento efetuaram retenção na fonte do imposto correspondente.

Como mencionam os Recorridos nas suas contra-alegações, trata-se de prova bastante de que o pagamento de imposto pela sua parte foi feito, na medida em que receberam o rendimento líquido de impostos.

Aliás, acrescente-se, que, como ficou provado, a própria AT suíça comunicou não emitir qualquer declaração, por tal não ser exigível.

Refira-se ainda que, na hipótese académica de a entidade pagadora não entregar à AT suíça o valor do imposto que reteve na fonte, tal não altera a posição dos contribuintes, que pagaram o imposto, na medida em que este lhes foi imediatamente retido. Tratar-se-ia, sim, de uma questão a solucionar entre o substituto, que não cumpra a sua obrigação de entrega do imposto pago, e a autoridade tributária, questão que ultrapassa e extravasa a responsabilidade da pessoa que recebe os rendimentos. Mas o imposto não deixa de ter sido pago pelo contribuinte, na medida em que lhe foi retido.

Ademais, como referido também pelo Tribunal a quo, face à prova produzida pelos Recorridos em sede administrativa, sempre poderia ter a AT recorrido aos mecanismos de troca de informações ao seu alcance, caso considerasse, como considerou, ter dúvidas.

O que não fez.

Neste sentido, vejam-se os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 23.02.2017 (Processo: 3/13.5BELRS) e do Tribunal Central Administrativo Norte, de 11.02.2021 (Processo: 00430/05.1BEVIS) e de 25.05.2018 (Processo: 01079/06.7BEVIS).

Como tal, entende-se que foi cabalmente demonstrada pelos Recorridos a reunião dos requisitos tendentes à aplicação do regime visando a atenuação da dupla tributação, nada tendo sido demonstrado pela AT que afaste a prova efetuada.

Logo, não assiste razão à Recorrente.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Negar provimento ao recurso;

b) Custas pela Recorrente;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 10 de março de 2022

(Tânia Meireles da Cunha)

(Susana Barreto)

(Patrícia Manuel Pires)


________________________
(1) Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 169.
(2) V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada.