Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02887/09
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:11/28/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO.
PRAZO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. CÔMPUTO.
IMPUGNAÇÃO DE ACTOS DE FIXAÇÃO DE VALORES PATRIMONIAIS. ARTº.155, DO C.P.T.
CONTRIBUIÇÃO AUTÁRQUICA. SISTEMA DE AVALIAÇÃO DE IMÓVEIS.
FUNDAMENTAÇÃO FORMAL E SUBSTANCIAL DO ACTO ADMINISTRATIVO.
FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE.
TERRENOS PARA CONSTRUÇÃO. 2ª. AVALIAÇÃO.
Sumário:1. O prazo da impugnação judicial é peremptório, de caducidade e de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, dado versar sobre direitos indisponíveis no que diz respeito à Fazenda Pública. É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.576, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido.

2. A contagem do prazo para interposição de recurso contencioso de impugnação deve fazer-se nos termos do artº.279, do C. Civil, isto é, de forma contínua e sem qualquer desconto dos dias não úteis (cfr.artº.20, nº.1, do C.P.P.Tributário). No cômputo do prazo em questão, quando o seu termo final ocorra em domingo, dia feriado ou férias judiciais, faz com que o mesmo termo se transfira para o primeiro dia útil seguinte (cfr.artº.279, al.e), do C.Civil).

3. No que diz respeito à impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais, como é o caso que constitui objecto do presente processo, deve referir-se que o artº.284, § único, do Código da Contribuição Predial (CCPISIA) foi revogado pelo artº.155, do C.P.T., atento o disposto no artº.11, do dec.lei 154/91, de 23/4, que aprovou tal compêndio adjectivo. Assim, o prazo para a impugnação judicial de 2ª. avaliação destinada a fixar o valor patrimonial de um lote de terreno para efeitos de contribuição autárquica é de noventa dias contados da notificação do resultado da mesma avaliação.

4. A Contribuição Autárquica foi um tributo criado de novo (cfr.dec.lei 442-C/88, de 30/11), porque veio sujeitar a imposto uma realidade nova, que até aí não era sujeita a tributação - o valor de riqueza imobiliária estática que é detida pelos titulares de prédios. Sendo um imposto novo, que incidia sobre um substrato económico que até aí não era tributado (o valor de riqueza dos prédios), a Contribuição Autárquica não podia incidir sobre os valores que então eram conhecidos, dos rendimentos anuais dos prédios, porque não era esse o seu objecto. Na verdade, se o sistema anterior a 1989 sujeitava a imposto o rendimento anual dos prédios, era para a determinação desse rendimento (potencial) que estava concebido e ajustado o sistema de avaliações prediais, vigente em sede de Contribuição Predial. Com a entrada em vigor de um imposto (a Contribuição Autárquica) que já não sujeita a tributação o rendimento periódico gerado pelo prédio, mas o valor desse mesmo prédio, ou seja, o seu valor de riqueza, o sistema até então vigente de avaliações ficou desajustado da nova realidade, pois que não estava concebido para a determinação deste valor.

5. Para apurar se um acto administrativo-tributário está, ou não, fundamentado impõe-se, antes de mais, que se faça, desde logo, a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa.

6. Se a fundamentação substancial não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº.125, nº.2, do C.P.Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Por outras palavras, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final.

7. A falta de fundamentação do acto de avaliação já se encontrava consagrado como espécie de preterição de formalidade legal prevista no artº.97, § único, do C.I.M.S.I.S.S.D., susceptível de basear a sua impugnação contenciosa.

8. No caso dos autos estamos face a acto de avaliação de terreno para construção, sendo que os resultados do mesmo se devem basear no valor venal de cada metro quadrado do terreno (cfr.artºs.49, § 3 e 94, § 4, do C.I.M.S.I.S.S.D.). Os vectores de avaliação de terrenos para construção constantes do C.I.M.S.I.S.S.D., os quais se deviam basear no rendimento real ou imputado do imóvel não se fundamentavam em critérios objectivos, antes estavam dependentes da apreciação subjectiva das comissões de avaliação, facto que originava uma grande falta de homogeneidade dos valores atribuídos pelas mesmas.

9. A fundamentação do acto de avaliação objecto dos autos tinha de conter um esclarecimento concreto suficientemente apto para sustentar a decisão, não podendo assentar em meros juízos conclusivos, sob pena de ficar prejudicada a compreensão da sua motivação. É que a fundamentação é suficiente quando proporcione aos destinatários do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que o praticou, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.91 a 98 do presente processo, através da qual julgou totalmente procedente a impugnação pelos recorridos, António …………….. e Nazaré ………………………….., intentada visando o resultado da segunda avaliação que fixou em Esc.21.000.000$00, o valor patrimonial de uma parcela de terreno com a área de 4200 m2, sita em ………………, São Domingos ……………, concelho de ………… a que se refere o processo nº…………./90, do 1º. Serviço de Finanças de ……………..
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.117 a 121 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-O presente recurso visa reagir contra a douta sentença declaratória da total procedência da impugnação deduzida contra o resultado da segunda avaliação do valor patrimonial de um terreno para construção com a área de 4200 m2 sito em ………, S. Domingos …………, concelho de ……….., a que se refere o Processo n°………../90 do 1º. Serviço de Finanças de ………….;
2-Afirma a douta sentença recorrida que a fundamentação da segunda avaliação é manifestamente insuficiente, o que integra ilegalidade por preterição de formalidade legal, com a consequente anulação do acto;
3-Resulta inequivocamente demonstrado nos autos que a presente impugnação é intempestiva, sem que tal excepção, invocada pelo SF tenha sido apreciada na douta sentença ora recorrida;
4-A manter-se na ordem jurídica, a sentença ora recorrida revela uma inadequada aplicação da norma vertida no artº.284, do C.C.P.;
5-Por força do disposto no nº.2, do artº.8, do DL 442-C/88, de 30/11, o valor tributável dos terrenos para construção continuava a determinar-se pelas regras contidas no Código da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações, as mesmas que haviam sido aplicadas na avaliação realizada em 4/01/1989, contra a qual o S.P. não reagiu, como que aceitando o valor aí fixado;
6-Tanto que no requerimento apresentado em 3/12/1990, o ora impugnante em vez de um valor tributável para o seu terreno, necessário à respectiva inscrição na matriz, pugnou pela dispensa de avaliação do mesmo;
7-À semelhança do que aconteceu na avaliação de 13/04/1988, também na avaliação impugnada a Comissão de Avaliação era composta por três peritos, um dos quais nomeado pela parte, neste caso o impugnante, em cumprimento do disposto no artº.279, do C.C.P.;
8-Só pela efectiva participação do S.P. na Comissão de Avaliação, deveria ficar afastado a procedência do vício de falta de fundamentação, pois ao participar no processo de avaliação, foi-lhe permitido controlar o acto, ficando na posse de todos os elementos de facto - porque houve deslocação da Comissão ao terreno - e de direito que conduziram à decisão;
9-Contrariamente ao afirmado na douta sentença da qual se recorre, a Comissão não decidiu por unanimidade manter o valor fixado na 1ª. avaliação, pois nesse caso, teríamos que em determinado momento do processo de avaliação o S.P. já tinha concordado com a valor que posteriormente veio a impugnar; decidiu sim por maioria;
10-Deste modo, a douta sentença ora recorrida, a manter-se na ordem jurídica, revela uma inadequada interpretação do disposto no artº.286, da C.R.P., artº.94, do C.I.M.S.I.S.S.D., artºs.124 e 125, do C.P.A., e artº.77, da L.G.T.;
11-Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada, com as devidas consequências legais. PORÉM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se negar provimento ao recurso e se manter a sentença recorrida (cfr.fls.127 dos autos).
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.127 e128 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
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Notificados para o efeito, os impugnantes e ora recorridos vieram pugnar pela improcedência da excepção de intempestividade da p.i. de impugnação suscitada pelo apelante nas conclusões de recurso (cfr.requerimento junto a fls.135 dos presentes autos).
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.93 a 95 dos autos - numeração nossa):
1-Por escritura pública outorgada em 6 de Abril de 1988, no Décimo Cartório Notarial de Lisboa os impugnantes, compraram pelo preço de um milhão de escudos "... um lote de terreno para construção, situado no lugar de …….…….., freguesia de São …………….., concelho de ……… inscrito na respectiva matriz sob parte do artigo DUZENTOS E CINQUENTA, Secção trinta, do qual vai ser destacado, e descrito na primeira secção, da Conservatória do Registo Predial de Cascais, sob o número ………………………., do livro B-QUARENTA E UM, com a sua aquisição ali registada, a seu favor, pela inscrição número …………………………, DO LIVRO G-CINQUENTA E SETE." (cfr.documento junto a fls.76 a 79 dos presentes autos);
2-Em 24/03/1988 foi lavrado o "Termo de Declaração" relativo à aquisição referida no nº.1 do probatório nele ficando a constar designadamente o seguinte:
"...e declarou que pretende pagar a sisa que for devida com referência a compra que vão fazer por 1.000.000$00 a (...) do lote de terreno para construção(...)." (cfr.documento junto a fls.72 dos presentes autos);
3-Em face desta declaração, foi liquidada a sisa à taxa de 10%, no montante de Esc.100.000$00, com base no valor declarado de Esc.1.000.000$00, que pagou (cfr.documento junto a fIs.72 dos presentes autos);
4-A Repartição de Finanças de Cascais instaurou o processo de avaliação nos termos do artº.109, do Código de Imposto Municipal da Sisa e Imposto sobre as Sucessões e Doações (CIMSISD) - Proc.200/88 - no âmbito do qual a comissão permanente de avaliação lhe atribuiu o valor de Esc.2.200$00 por m.2 (cfr.documento junto a fls.16 dos presentes autos);
5-Em 11/05/1988, os impugnantes foram notificados do resultado da avaliação efectuada, no âmbito do processo nº.200/88 (cfr.documento junto a fls.7 dos presentes autos);
6-Na sequência de nova avaliação efectuada em face da entrada em vigor do C.C.Autárquica foi fixado o valor de Esc.5.000$00 por m.2, os impugnantes requereram 2ª. avaliação nos termos exarados a fls.16 dos presentes autos;
7-Em 24/02/1992 foi elaborado o “termo de avaliação” do qual se destaca (cfr. documento junto a fls.22 dos presentes autos):
"...compareceram os louvados (...) e declararam que, tendo visto e examinado, por inspecção directa o prédio descrito na relação que lhes foi entregue com o mandado de fls.…o avaliaram, com inteira observância de todas as formalidades legais, pela forma seguinte:
Lote de Terreno para construção com a área de 4.200 m2 sito em Trajouce-S. Domingos de Rana.
A comissão, por maioria, deliberou manter o valor fixado na 1a avaliação por o achar com (...) à localização, ao destino do lote e ao valor de mercado na zona para bens da mesma natureza (...) deliberou manter o valor fixado na 1a avaliação…”;
8-Em 2/02/1994 o Director do Departamento Jurídico e Fiscalização da Câmara Municipal em ofício dirigido ao RFP informou o seguinte:
“1. O terreno referenciado na planta a cor amarela, a que corresponde o artº. matricial 250, não está abrangido por qualquer Plano Municipal de Ordenamento do Território, eficaz;
2. Decorre, nesta data, a elaboração do projecto do Plano Director Municipal que engloba toda a área do município.” (cfr.documento junto a fls.40 dos presentes autos);
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Inexistem outros factos sobre que o Tribunal deva pronunciar-se já que as demais asserções da douta petição integram antes conclusões de facto ou direito…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados na análise dos documentos que se encontram identificados em cada uma das alíneas da matéria assente, bem como no teor dos depoimentos das testemunhas inquiridas a fls.48/49, cuja credibilidade não foi posta em causa…”.
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Considera-se um lapso material manifesto a expressão “por unanimidade” constante da matéria de facto da al.G) da douta sentença recorrida, a qual já foi substituída pela expressão “por maioria”, no nº.7 do probatório supra, dado ser esta a expressão correcta exarada no documento junto a fls.22 dos presentes autos (cfr.artº.614, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.249, do C.Civil).
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Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e levando em consideração que o recorrente impugna, parcialmente, a decisão da matéria de facto constante da sentença objecto do presente recurso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
9-Em 1/9/1992, os impugnantes, António …………… e Nazaré ………………………., com os n.i.f. 124 406 424 e 124 406 416, respectivamente, foram notificados pessoalmente dos resultados da 2ª. avaliação identificada no nº.7 do probatório supra, tal como do valor patrimonial fixado ao imóvel em Esc.21.000.000$00 (cfr.documentos juntos a fls.24 e 24-verso dos presentes autos);
10-Em 12/11/1992, deu entrada no 1º. Serviço de Finanças de ……….. a p.i. que originou o presente processo (cfr.data de entrada aposta a fls.2 dos presentes autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada um dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida, em síntese, julgou totalmente procedente a impugnação deduzida e, em consequência, anular o acto de 2ª. avaliação objecto do presente processo, tudo em virtude de vício de forma por falta de fundamentação.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O Tribunal começa por examinar a excepção de caducidade do direito de acção suscitada pelo recorrente nas conclusões do recurso (cfr.conclusão nº.3 do recurso).
O prazo da impugnação judicial é peremptório, de caducidade e de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, dado versar sobre direitos indisponíveis no que diz respeito à Fazenda Pública (cfr.artº.333, nº.1, do C.Civil; artº.123, do anterior C.P.Tributário; artº.102, do C.P.P.Tributário; Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código de Procedimento e de Processo Tributário comentado e anotado, Almedina, 2000, pág.241; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 5ª. edição, I Volume, Áreas Editora, 2006, pág.267; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/6/95, rec.19056, Ap. D.R., 14/8/97, pág.1725 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2013, proc.6125/12).
Por outras palavras, o prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de uma certa pretensão, é um prazo de caducidade. E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do acto tributário) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr.artº.333, do C.Civil). É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.576, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/1/2013, proc. 6038/12).
A contagem do prazo para interposição de recurso contencioso de impugnação deve fazer-se nos termos do artº.279, do C. Civil, isto é, de forma contínua e sem qualquer desconto dos dias não úteis (cfr.artº.49, nº.2, do C.P.Tributário; artº.20, nº.1, do C.P.P. Tributário; Jorge Lopes de Sousa, ob.cit., pág.730).
Especificamente, no que diz respeito à impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais, como é o caso que constitui objecto do presente processo, deve referir-se que o artº.284, § único, do Código da Contribuição Predial (CCPISIA) foi revogado pelo artº.155, do C.P.T., atento o disposto no artº.11, do dec.lei 154/91, de 23/4, que aprovou tal compêndio adjectivo. Assim, o prazo para a impugnação judicial de 2ª. avaliação destinada a fixar o valor patrimonial de um lote de terreno para efeitos de contribuição autárquica é de noventa dias contados da notificação do resultado da mesma avaliação (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 20/3/1996, rec.19768; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/4/1999, rec. 22167, Antologia de Acórdãos, Ano II, nº.3, pág.187 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, examinando a factualidade provada (cfr.nºs.9 e 10 do probatório), deve concluir-se que o articulado inicial que originou o presente processo é tempestivo, dado que os impugnantes foram notificados do resultado da 2ª. avaliação em 1/9/1992, tendo intentado a presente impugnação em 12/11/1992, portanto, manifestamente, dentro do prazo de noventa dias computados da data de notificação do citado acto de avaliação.
Sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente esteio do recurso.
O recorrente discorda do julgado alegando, igualmente e como supra se alude, que contrariamente ao afirmado na douta sentença da qual se recorre, a Comissão não decidiu por unanimidade manter o valor fixado na 1ª. avaliação, pois nesse caso, teríamos que em determinado momento do processo de avaliação o S.P. já tinha concordado com a valor que posteriormente veio a impugnar; decidiu sim por maioria (cfr.conclusão 9 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Quanto a esta matéria, remete-se o recorrente para o lapso material manifesto constante da factualidade inserta na al.G) da douta sentença recorrida, o qual já foi emendado por este Tribunal no nº.7 do probatório supra, ao abrigo dos artºs.614, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, e 249, do C.Civil.
O recorrente dissente do julgado alegando, por último e como supra se alude, que afirma a sentença recorrida que a fundamentação da segunda avaliação é manifestamente insuficiente, o que integra ilegalidade por preterição de formalidade legal, com a consequente anulação do acto. Que a manter-se na ordem jurídica, a sentença ora recorrida revela uma inadequada aplicação da norma vertida no artº.284, do C.C.P. Que só pela efectiva participação do S.P. na Comissão de Avaliação, deveria ficar afastado a procedência do vício de falta de fundamentação, pois ao participar no processo de avaliação, foi-lhe permitido controlar o acto, ficando na posse de todos os elementos de facto - porque houve deslocação da Comissão ao terreno - e de direito que conduziram à decisão. Que a decisão ora recorrida, a manter-se na ordem jurídica, revela uma inadequada interpretação do disposto no artº.286, da C.R.P., artº.94, do C.I.M.S.I.S.S.D., artºs.124 e 125, do C.P.A., e artº.77, da L.G.T. (cfr.conclusões 2, 4 a 8 e 10 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Antes de mais, deve este Tribunal situar no tempo o acto de avaliação objecto do presente processo.
A Contribuição Autárquica foi um tributo criado de novo (cfr.dec.lei 442-C/88, de 30/11), porque veio sujeitar a imposto uma realidade nova, que até aí não era sujeita a tributação - o valor de riqueza imobiliária estática que é detida pelos titulares de prédios. Sendo um imposto novo, que incidia sobre um substrato económico que até aí não era tributado (o valor de riqueza dos prédios), a Contribuição Autárquica não podia incidir sobre os valores que então eram conhecidos, dos rendimentos anuais dos prédios, porque não era esse o seu objecto.
Na verdade, se o sistema anterior a 1989 sujeitava a imposto o rendimento anual dos prédios, era para a determinação desse rendimento (potencial) que estava concebido e ajustado o sistema de avaliações prediais, vigente em sede de Contribuição Predial. Com a entrada em vigor de um imposto (a Contribuição Autárquica) que já não sujeita a tributação o rendimento periódico gerado pelo prédio, mas o valor desse mesmo prédio, ou seja, o seu valor de riqueza, o sistema até então vigente de avaliações ficou desajustado da nova realidade, pois que não estava concebido para a determinação deste valor.
Assim, como não eram conhecidos nem existiam registos dos valores de riqueza ou valores de mercado dos imóveis, para que a Contribuição Autárquica pudesse ser aplicada, era necessário implementar um sistema que permitisse determiná-lo. E esse valor é diferente do valor dos rendimentos (reais ou potenciais) por eles gerados. O valor de riqueza dos prédios reflecte o poder económico de quem os detém, do seu proprietário ou titular.
A forma mais justa e equilibrada de determinar o valor de riqueza de um prédio, como de qualquer outro bem, é o valor de mercado, ou seja, o valor porque esse prédio pode ser convertido em dinheiro. Ora, para se determinar o valor de mercado dos prédios era necessário instituir na Lei um regime legal de avaliação, que até aí não existia, dado que o do C.C.P.I.I.A. só servia para determinar o valor do rendimento anual (cfr.José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2011, pág.18 e seg.).
E esta dicotomia entre o sistema de avaliações anterior a 1989 e a regra de incidência da Contribuição Autárquica foi, segundo pensamos, geradora de grande ineficácia na avaliação de imóveis.
Revertendo ao caso dos autos, defende o recorrente, em síntese, que o acto de avaliação objecto do presente processo não padece do vício formal de falta de fundamentação que lhe é imputado pela decisão recorrida.
A fundamentação dos actos tributários ou “praticados em matéria tributária” que “afectem os direitos ou interesses legalmente protegidos dos contribuintes” estava consagrada nos artºs.19, al.b), 21, 81 e 82, do C. P. Tributário (cfr.actualmente o artº.77, da L.G.Tributária).
Tal necessidade de fundamentação decorria já, quer do artº.1, nº.1, als.a) e c), do dec.lei 256-A/77, de 17 de Junho, quer do próprio artº.268, nº.3, da C. R. Portuguesa, na redacção introduzida pela Lei Constitucional nº.1/89 (cfr.Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, pág.936 e seg.; Vieira de Andrade, O Dever de Fundamentação Expressa dos Actos Administrativos, 1990, pág.53 e seg.).
A fundamentação é um conceito relativo que pode variar em função do tipo legal de acto administrativo que estamos a examinar.
Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final (cfr.ac.S.T.J.26/4/95, C.J.-S.T.J., 1995, II, pág.57 e seg.; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª. edição, 1985, pág.687 e seg.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, V, pág.139 e seg.). Quer dizer. Utilizando a linguagem de diversos acórdãos do S.T.A. (cfr.por todos, ac.S.T.A-1ª.Secção, 6/2/90, A.D., nº.351, pág.339 e seg.) o acto administrativo só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto. Mais se dirá que a fundamentação pode ser expressa ou consistir em mera declaração de concordância de anterior parecer, informação ou proposta, o qual, neste caso, constitui parte integrante do respectivo acto (é a chamada fundamentação “per relationem” - cfr.artº.125, do C.P.Administrativo).
Para apurar se um acto administrativo-tributário está, ou não, fundamentado impõe-se, antes de mais, que se faça a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/7/2011, rec.656/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/6/2012, proc.3096/09).
Se a fundamentação formal não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº.125, nº.2, do C.P.Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Por outras palavras, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final (cfr.Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol.I, Almedina, 1991, pág.477 e seg.; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol.II, Almedina, 2001, pág.352 e seg.; Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, pág.381 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/12/2008, proc.2606/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/11/2009, proc.3510/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/6/2012, proc.3096/09).
No caso dos autos, haverá que analisar o acto de 2ª. avaliação do imóvel propriedade dos recorridos, levado a efeito pela A. Fiscal em 24/02/1992 (cfr.nº.7 da matéria de facto provada), ao qual é aplicável o regime previsto nos artºs.49, § 3 e 94, § 4, do C.I.M.S.I.S.S.D. (cfr.artº.12, do C.Civil).
A falta de fundamentação do acto de avaliação já se encontrava consagrado como espécie de preterição de formalidade legal prevista no artº.97, § único, do C.I.M.S.I.S.S.D., susceptível de basear a sua impugnação contenciosa (cfr.F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, C.I.M.S.I.S.S.D. anotado e comentado, 4ª. edição, Rei dos Livros, 1997, pág.657).
Antes de se passar à análise do conteúdo concreto do termo de avaliação do imóvel, deve referir-se que nos encontramos perante acto de avaliação de terreno para construção, sendo que os resultados do acto de avaliação se devem basear no valor venal de cada metro quadrado do terreno (cfr.artºs.49, § 3 e 94, § 4, do C.I.M.S.I.S.S.D.).
Os vectores de avaliação de terrenos para construção constantes do C.I.M.S.I.S.S.D., os quais se deviam basear no rendimento real ou imputado do imóvel não se fundamentavam em critérios objectivos, antes estavam dependentes da apreciação subjectiva das comissões de avaliação, facto que originava uma grande falta de homogeneidade dos valores atribuídos pelas mesmas (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/12/2011, proc.3504/09).
Passemos à análise do conteúdo concreto do termo de avaliação do imóvel (cfr.nº.7 da matéria de facto provada).
Do termo de avaliação do lote de terreno para construção concretamente louvado consta que: “A comissão, por maioria, deliberou manter o valor fixado na 1a avaliação por o achar com (...) à localização, ao destino do lote e ao valor de mercado na zona para bens da mesma natureza (...) deliberou manter o valor fixado na 1a avaliação”.
A fundamentação de tal acto de avaliação tinha de conter um esclarecimento concreto suficientemente apto para sustentar a decisão, não podendo assentar em meros juízos conclusivos, sob pena de ficar prejudicada a compreensão da sua motivação.
É que a fundamentação é suficiente quando proporcione aos destinatários do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que o praticou, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 15/4/2009, rec.65/09; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 27/5/2008, proc.2111/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/12/2011, proc. 3504/09).
Voltando ao caso “sub judice”, os juízos conclusivos constantes do termo de avaliação identificado na matéria de facto provada tanto podiam fundamentar o valor por metro efectivamente fixado para o imóvel, tal como o dobro de tal valor ou até metade do mesmo.
Ou seja, do termo da 2a avaliação não constam quaisquer factos concretos, nem as razões, por que se chegou ao valor de Esc.5.000$00 por m2.
Há, pois, total omissão de pronúncia quanto a questões essenciais para se poder efectuar o controle do acto de avaliação, como a indicação de dados relativos ao local em que se insere o prédio, existência, ou não, de arruamentos, saneamento, preços praticados na zona, tipo de construção permitida e/ou possível, elementos comparativos com prédios confinantes, etc.
A fundamentação descrita supra é, por isso, claramente insuficiente para quem queira saber ao certo quais os motivos (o itinerário cognoscitivo e valorativo do autor do acto) que levaram os louvados a calcular, por maioria, o concreto quantitativo apurado para o metro quadrado do imóvel e o consequente valor patrimonial.
Pelo que, se deve concluir que a fundamentação do acto de 2ª. avaliação objecto dos presentes autos é manifestamente insuficiente em termos substantivos e conforme mencionado supra, assim violando o disposto no artº.268, nº.3, da C.R.Portuguesa, no artº.77, da L.G.Tributária, e no artº.125, do C.P.Administrativo.
Por último, refira-se que a decisão recorrida não violou as disposições constantes dos artºs.286, da C.R.P., 94, do C.I.M.S.I.S.S.D., 124 e 125, do C.P.A., 77, da L.G.T., e 284, do C.C.P.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Sem custas, dado que a Fazenda Pública das mesmas está isenta.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 28 de Novembro de 2013


(Joaquim Condesso - Relator)


(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)


(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)