Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:9601/16.4BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:06/25/2019
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA
SANEADOR TABELAR
CONHECIMENTO DAS EXCEÇÕES SUSCITADAS
Sumário:I. Tendo sido suscitada matéria de exceção na resposta da AT, a mesma tem de ser objeto de apreciação e decisão, porquanto a respetiva procedência obsta a que seja conhecido o mérito do pedido de pronúncia arbitral.

II. A inclusão na decisão do chamado “saneador tabelar” não se traduz na apreciação da matéria de exceção invocada, dado tratar-se de mera afirmação genérica da validade e regularidade da lide.

III. Há nulidade da decisão arbitral, por omissão de pronúncia, quando tal decisão, contendo apenas “saneador tabelar”, não aprecia e decide a matéria de exceção suscitada pela AT.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acórdão

I. RELATÓRIO

A Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante Impugnante ou AT) veio apresentar impugnação da decisão arbitral proferida a 18.04.2016, pelo tribunal arbitral singular constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no processo a que aí foi atribuído o n.º 351/2015-T, ao abrigo dos art.ºs 26.º e 27.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT - DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro).

Nesse seguimento, a Impugnante apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“1. A sentença proferida pelo Tribunal Arbitral Singular constituído no Centro de Arbitragem Administrativa que julgou totalmente procedente o pedido de anulação das liquidações de Imposto do Selo, verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo (doravante TGIS), no montante de € 36 592,09, efectuadas em 2012, 2013 e 2014, respeitante ao prédio urbano sito em Lisboa, na Rua ........., n° 129, descrito na Conservatória do registo Predial de Lisboa sob o n° ..... e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Avenidas Novas, sob o artigo n° ......... padece de nulidade pelo facto de não ter conhecido de questão essencial sobre a qual se deveria ter pronunciado [artigo 28.°/1-c) do RJAT];

2. Por via do pedido de pronúncia arbitral visou a Impugnada colocar em crise as referidas liquidações referentes ao período de 2012, 2013 e 2014;

3. A Impugnante deduziu Resposta ao pedido de pronúncia arbitral no qual sustentou: (i) Defendeu por excepção a intempestividade parcial do pedido de pronúncia arbitral, face ao artigo n° 10°, n° 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributável (doravante RJAT) relativamente aos anos de 2012 e 2013, porquanto inexistindo qualquer procedimento administrativo de iniciativa da impugnada, os correspondentes prazos de pagamento voluntário tinham já terminado em 20/12/2012, 30/04/2013, 01/08/2013 e 30/11/2013 para as liquidações e prestações do ano de 2012 e em 30/04/2014, 31/07/2014 e 30/11/2014 para as liquidações e prestações do ano de 2013 (cfr. artigos 3.° a 7.° da Resposta), (ii) defendeu por excepção a incompetência material do Tribunal Arbitral, face ao disposto no artigo 2° do RJAT, para apreciar a legalidade de uma prestação do acto de liquidação, dado que a requerente impugna, exclusivamente, as notas de cobrança que constituem as primeiras prestações do Imposto do Selo, verba 28 TGIS do ano de 2014. (cfr. artigos 8° a 10.° da Resposta) e (iii) pugnou pela legalidade dos actos de liquidação em crise (cfr. artigos 11.° a 54.° da Resposta).

4. Cada uma destas questões foi devidamente desenvolvida pela Impugnante ao longo do seu articulado, encontrava-se inequivocamente inserida em capitulos autonomizados e, por conseguinte, era perfeitamente identificável por parte de qualquer leitor,

5. O Tribunal Arbitral Singular entendeu que as questões a decidir se limitavam a:

“A questão a decidir é perfeitamente clara estando bem delimitada e tem a ver com o vpt relevante que, em nosso entender, é o que tiver sido fixado para cada andar ou divisão de utilização independente”

Questões de conhecimento prejudicados."

6. Contudo, nem em despacho saneador, nem ao longo de toda a fundamentação da sentença, foi dedicada uma palavra sequer à apreciação das excepções invocadas.

7. As excepções suscitadas pela Impugnante não eram (nem são) simples argumentos ou opiniões.

8. As excepções suscitadas são verdadeiras questões, que devem ser analisadas e saneadas.

9. A sentença arbitral não padece de uma "mera” fundamentação lacónica ou deficiente, antes configura uma “decisão surpresa”;

10. Motivos pelos quais não deve ser mantida na ordem jurídica a sentença arbitral ora colocada em crise, devendo antes ser aquela declarada nula”.

Foi ordenada a notificação de Ana ......... (doravante Impugnada) para alegar, nos termos consignados no art.º 144.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi art.º 27.º, n.º 2, do RJAT, não tendo sido apresentadas contra-alegações.

O Ilustre Magistrado do Ministério Público (IMMP) foi notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146.º, n.º 1, do CPTA.

É a seguinte a questão a decidir:

a) É nula a decisão arbitral, por omissão de pronúncia, não qual não é feita, nem em sede de saneamento tabelar nem em sede de conhecimento de mérito, qualquer apreciação de questões de caducidade do direito de ação e de (in)competência material do tribunal arbitral suscitadas pela AT na sua resposta?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. Na decisão impugnada foi considerada provada a seguinte matéria de facto:

“a) As heranças indivisas compreendem um prédio sito em Lisboa, composto de caves, r/chão e 1.º, 2.º, 3.º e 4.º andar com utilização independente, prédio que apesar, da sua constituição, não está constituído em propriedade horizontal;

b) O valor patrimonial tributário foi determinado separadamente, como determina o art.º 7.º n.º 2, alínea b do Código do IMI;

c) Cada um dos andares independentes ou divisões, tem um valor patrimonial tributado (VPT) atribuído na avaliação, mas nenhuma das partes ou andares que o compõem, com utilização independente e com afetação habitacional tem VPT igual ou superior a € 1.000.000,00”.

II.B. Refere-se ainda na decisão impugnada:

“d) Não se provaram outros factos com relevância para decisão arbitral.”.

II.C. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 140.º, n.º 3, do CPTA, ex vi art.º 29.º, n.º 1, al. c), do RJAT, acorda-se aditar a seguinte matéria de facto provada:

e) A 01.06.2015 foi apresentado junto do CAAD pedido de constituição de tribunal arbitral (cfr. fls. 1 a 101 da certidão do processo em formato PDF, constante de CD apenso, a que correspondem futuras referências sem menção de origem).

f) Na sequência do referido em e), foi constituído tribunal arbitral singular, tendo dado origem ao processo n.º 351/2015-T (cfr. fls. 156).

g) À impugnante, nos autos referidos em f), foi remetida comunicação pelo CAAD, no sentido de a mesma apresentar resposta, solicitar a produção de prova adicional e juntar o processo administrativo (cfr. fls. 166 e 167).

h) Na sequência do referido em g), foi apresentada resposta pela impugnante, da qual consta designadamente o seguinte:

“… POR EXEPÇÃO:

A - Da intempestividade parcial do pedido de pronúncia arbitral


3°.

O pedido de pronúncia arbitral é manifestamente extemporâneo relativamente ao pedido de apreciação da legalidade das liquidações e prestações do imposto de selo dos anos de 2012 e de 2013.

4°.

Na verdade, e não tendo sido instaurado, quanto a estas liquidações e prestações de imposto de selo, qualquer procedimento administrativo de iniciativa da requerente, os correspondentes prazos de pagamento voluntário terminaram há muito, respectivamente em 20.12.2012, 30 Abril de 2013, 1 de Agosto de 2013 e 30 de Novembro de 2013, para as liquidações do ano de 2012, e 30 de Abril de 2014, 31 de Julho de 2014 e 30 de Novembro de 2014, para as liquidações e prestações do ano de 2013.

5°.

Ou seja, o pedido de constituição do Tribunal arbitral, datado de 01.06.2015, apenas foi apresentado no prazo previsto no art.° 10.°, n.° 1, alínea a) do RJAT, aprovado pelo Decreto-lei n.° 10/2011, de 20 de Janeiro, relativamente à contestação da 1.ª prestação do imposto de selo do ano de 2014, cujo prazo de cobrança voluntária terminou em Abril de 2015.

6°.

Termos em que se conclui pela intempestividade parcial do pedido de constituição do Tribunal Arbitral no que concerne à apreciação da legalidade das liquidações e prestações do imposto de selo dos anos de 2012 e de 2013, devendo consequentemente ser valor do pedido objecto da devida correcção.

7°.

Conclusão aliás reforçada pelo referido no processo administrativo, de que à excepção das notas de cobrança pagas - 3.ªs prestações de 2013 e 1-ªs prestações de 2014 - todas se encontram já em fase de cobrança coerciva em sede de processos de execução fiscal.

B - Da incompetência do Tribunal Arbitral


8°.

O Tribunal Arbitral é materialmente incompetente, face ao disposto no art.° 2.° do RJAT, para apreciar a legalidade de uma prestação do acto de liquidação, que não é em si nenhum acto tributário, não havendo qualquer dúvida, até pelo valor do processo e por todos os documentos a ele juntos, que a Requerente impugna, exclusivamente, as notas de cobrança que constituem as 1.ªs prestações do imposto de selo do ano de 2014.

9°.

Veja-se, neste sentido, a clareza da decisão arbitral, transitada em julgado, e proferida no processo n.° 726/2014-T CAAD, com objecto rigorosamente idêntico, e que passamos a citar:

"Outra das exceções invocadas pela AT é a da incompetência do tribunal arbitral para a decisão do litígio, com o fundamento de que “a Requerente não impugna um ato tributário, mas impugna, antes, o pagamento de uma prestação de um ato tributário constante de uma nota de cobrança", ou seja, que “o objeto do processo é a anulação não de um ato tributário, mas sim de uma nota de cobrança para o pagamento da 2.a prestação de um imposto, matéria esta que não consta, em absoluto, do conjunto da norma que delimita a competência dos tribunais arbitrais tributários, constante do art.° 2.° do RJAT”.

“A competência dos tribunais arbitrais tributários que funcionam junto do CAAD é fixada pelos artigos 2.°, n.° 1, e 10.°, n.° 1, do RJAT."

“Concretamente, refere o artigo 2.°, n.° 1, a alínea a), do RJAT, que tal competência compreende a apreciação de pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, enquanto a alínea a) do n.° 1 do seu artigo 10.°, estabelece o prazo de 90 dias para apresentação do pedido de constituição do tribunal, “contado a partir dos factos previstos nos n.°s 1 e 2 do artigo 102.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, quanto aos atos suscetíveis de impugnação autónoma e, bem assim, da notificação da decisão ou do termo do prazo legal de decisão do recurso hierárquico".

“Determinar da competência do tribunal arbitral para a decidir da pretensão objeto dos presentes autos, passará, necessariamente, por averiguar se o pedido de declaração e ilegalidade e consequente anulação de uma das prestações de uma liquidação de Imposto do Selo, efetuada ao abrigo da verba 28, da TGIS, equivale a um pedido de anulação total ou parcial da mesma liquidação ou, não equivalendo, se uma daquelas prestações poderá configurar um ato suscetível de impugnação autónoma.”

“Quanto à primeira questão, poderá afirmar-se que uma prestação não equivale a uma liquidação de imposto, porquanto, nos termos do n.° 7, do artigo 23.°, do Código do Imposto do Selo, na redação que lhe foi dada pelo artigo 3.°, da Lei n.° 55-A/2012, de 29 de outubro, “7 - Tratando-se do imposto devido pelas situações previstas na verba n.° 28 da Tabela Geral, o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada prédio urbano, pelos serviços centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira, aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI” (sublinhado nosso).”

“Ora, a expressão “o imposto é liquidado anualmente” indicia que é efetuada uma única liquidação anual, embora a mesma possa ser dividida, para efeitos de pagamento, em prestações, e não tantas liquidações quantas as prestações em que o débito deva ser satisfeito - a divisão de uma liquidação em prestações não passará, assim, de uma mera técnica de arrecadação de receitas.”

“Por outro lado, a questão de saber se uma prestação pode ser havida como parte autonomamente impugnável da liquidação, remete-nos para a da divisibilidade do ato tributário de liquidação e consequente possibilidade da sua anulação parcial.”

“A este respeito, tem a jurisprudência entendido que a liquidação é um ato divisível, quer por natureza, por respeitar a uma obrigação de natureza pecuniária, quer por definição legal, uma vez que o artigo 100.°, da Lei Geral Tributária (LGT) admite a “procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo”, situação em que a administração fiscal, fica obrigada “à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei".

“No entanto, para que haja anulação parcial do ato tributário, necessário se torna que a ilegalidade o afete apenas em parte (cfr., neste sentido, o Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, proferido em 10 de abril de 2013, no recurso n.° 0298/12, disponível em http://www.dgsi.pt, em cujo sumário se lê:"

“ Sumário: I - O ato tributário, enquanto ato divisível, tanto por natureza como pordefinição legal, é suscetível de anulação parcial. II - O critério para determinar se o ato deve ser total ou parcialmente anulado passa por determinar se a ilegalidade afeta o ato tributário no seu todo, caso em que o ato deve ser integralmente anulado ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial." (Sublinhado nosso)."

“Assim, nos casos em que o ato tributário é divisível, “se for pedida a anulação parcial de um ato tributário, o tribunal não poderá, em princípio, anulá-lo totalmente" SOUSA, Jorge Lopes de, “Código de Procedimento e de Processo Tributário - anotado e comentado" I Volume, Áreas Editora, 2006, pág. 875); se for pedida a sua anulação integral e o ato for apenas parcialmente anulável, o pedido será parcialmente improcedente."

“Sobre a questão da indivisibilidade de uma liquidação de Imposto do Selo a que se refere a verba 28 da TGIS, já se pronunciou o CAAD, no processo n.° 205/2013-T (disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/), conforme o extrato que se transcreve:"

“11. Vem ainda a Requerida impugnar o valor da causa considerando que o mesmo é de 8.940,94€ e não de 28.822,80€, conforme indicado pela requerente.

Sustenta a requerente que “o ato impugnado nestes autos é o ato de liquidação com o n° ...de 22/02/2013, referente à primeira prestação de imposto de selo, do ano de 2012, no montante de € 8.940,94, junta pelo requerente ao pedido de pronuncia arbitral como Doc. 1”.

“Acontece, porém, que o valor da liquidação n° ... de 22/02/2013, como consta do referido documento é, na realidade, de 26.822,00 € e não de € 8.940,94.

Note-se que, não existe qualquer liquidação de € 8.940,94. Este valor é apenas a primeira prestação duma liquidação que foi desde logo efetuada e no valor indicado pela Requerente. Da circunstância do valor da liquidação poder ser pago em várias prestações, não decorre que existam três liquidações. Trata-se, diferentemente, duma liquidação que pode ser paga em várias prestações (sublinhado nosso), não estando o sujeito passivo impedido de impugnar a mesma devido ao facto de ainda só ter decorrido o prazo de pagamento de uma delas.

O sujeito passivo impugnou o ato de liquidação com o n° ... de 22/02/2013, no valor de 26.822,00€, que lhe havia sido notificada e é esse o valor correto da causa.”.

“Também o processo arbitral n.° 120/2012-T, que correu termos no CAAD (disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/) e do qual se extraem os fragmentos que seguem, se havia já pronunciado sobre a indivisibilidade de uma liquidação de IM I, matéria de aplicação subsidiária às liquidações de Imposto do Selo da verba 28, da TGIS, por remissão do n.° 2, do artigo 67.°, do Código do Imposto do Selo:

“De acordo com o disposto no artigo 113.°, n.° 2 do Código do IMI, a liquidação deste imposto é efetuada nos meses de fevereiro e março do ano seguinte àquele a que o imposto diz respeito. Nos termos do n.° 1 do artigo120.° do mesmo diploma, o imposto deve ser pago em duas prestações, nos meses de abril e setembro, desde que o seu montante seja superior a Euros 250, devendo o pagamento, no caso de esse montante ser igual ou inferior àquele limite, ser efetuado de uma só vez, durante o mês de Abril.” (..) “Conforme resulta, assim, do disposto nos referidos artigos, embora o ato autonomamente sindicável seja o ato de liquidação de IMI (sublinhado nosso), o prazo para contestar a sua legalidade apenas deverá ser contado a partir do termo do prazo de pagamento do imposto nele apurado. Devendo este ser pago, nos termos da lei, em mais do que uma prestação, apenas com o termo da última daquelas (pressupondo, naturalmente, a não verificação de situações de vencimento antecipado) é que se poderá assim iniciar a contagem do prazo referido no artigo 102.°, n.° 1, alínea a) do CPPT, aplicável, no âmbito do processo arbitral, ex vi o disposto no artigo 10.°, n.° 1, alínea a) do Decreto-Lei n°. 10/2011, de 20 de Janeiro (“RJAT’).” (..) “Tal conclusão resulta, aliás, clara da natureza indivisível do ato de liquidação, bem como da necessidade - de resto, enfatizada pela própria Requerida - de, relativamente à mesma liquidação de IMI - que, nos termos da lei deva ser paga em duas prestações - não serem proferidas decisões administrativas ou judiciais contraditórias.” (sublinhado nosso) (..) “É que - reiteremos -, não sendo qualquer das prestações de pagamento de IMI autonomamente sindicável - mas apenas o ato de liquidação a que aquelas se refiram”. (sublinhado nosso).”

“As prestações de pagamento de uma liquidação de IMI ou, na situação em análise, de uma liquidação de Imposto do Selo, nos termos da Verba 28, da TGIS, não são autonomamente sindicáveis, por terem origem numa única obrigação anual, de acordo com a lição de Braz Teixeira: “É necessário não confundir as prestações periódicas, que, embora realizando-se por atos sucessivos, em momentos diversos, têm origem numa mesma obrigação e constituem as várias parcelas de uma mesma prestação que se cindiu, com as prestações que devem efetuar-se periodicamente, não devido a uma divisão da prestação global, mas sim ao nascimento, também periódico, de novas obrigações, pela permanência dos pressupostos de facto da tributação. "(TEIXEIRA, António Braz, “Princípios de Direito Fiscal”, Vol. I, 3.a Edição, Almedina, Coimbra,1995, págs. 243 e 244).”

“Concluindo-se que as prestações de uma liquidação de imposto não são autonomamente impugnáveis, por consubstanciarem parcelas de uma prestação global, com origem numa mesma obrigação, cumpre averiguar se uma daquelas prestações pode ser considerada como um “ato de impugnação autónoma”, a que se refere o artigo 10.°, n.° 1, alínea a), do RJAT, com remissão para os n.°s 1 e 2 do artigo 102.°, do CPPT.”

“Em anotação ao artigo 102.°, do CPPT, e relativamente à alínea e) do seu n.° 1, em que se prevê o termo inicial do prazo de impugnação judicial na data da “notificação dos restantes atos que possam ser objeto de impugnação autónoma nos termos deste Código”, escreve Jorge Lopes de Sousa: “(…) aplica-se esta regra não só aos casos de impugnação autónoma previstos neste Código [decisões de recurso hierárquico que comportem a apreciação da legalidade de atos de liquidação (art. 76.°, n.° 2), atos de autoliquidação (art. 131.°), atos de retenção na fonte (art. 132.°) e atos de fixação de valores patrimoniais (art. 134.°), mas também aos outros casos de impugnação de atos de avaliação direta (artigo 86.°, n.° 1, da LGT)” (SOUSA, Jorge Lopes de, “Código de Procedimento e de Processo Tributário - anotado e comentado” I Volume, Áreas Editora, 2006, pág. 734).”

“O facto de a declaração de ilegalidade dos atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, os atos de determinação da matéria coletável e de fixação de valores patrimoniais, integrarem a competência dos tribunais arbitrais, nos termos do artigo 2.°, n.° 1, alínea b), do RJAT, devendo o pedido de constituição do tribunal arbitral, quanto a eles, ser apresentado no prazo de 30 dias a contar da data da respetiva notificação, nos termos do artigo 10.°, n.° 1, alínea b), do RJAT, leva à conclusão necessária de que os atos de impugnação autónoma a que se refere o artigo 10.°, n.° 1, alínea a), do RJAT, são os atos de liquidação, de autoliquidação e de pagamentos por conta, ainda que, relativamente a estes, tenha sido apresentada reclamação graciosa ou recurso hierárquico, expressa ou tacitamente indeferidos.”

“Tendo-se excluído a possibilidade de uma prestação configurar um ato tributário de liquidação, muito menos se lhe poderá atribuir a natureza de autoliquidação ou de pagamento por conta.”

“Não sendo cada uma das prestações das liquidações de Imposto do Selo identificadas nos autos autonomamente impugnáveis, pelos motivos antes expostos, estar-se-á perante um caso de incompetência do tribunal arbitral para apreciação e declaração da sua ilegalidade e consequente anulação.”


10°.

Termos em que conclui pela manifesta incompetência material do Tribunal Arbitral e pela procedência da excepção aduzida.” (cfr. fls. 174 a 194).

i) Foi apresentado, na sequência do referido em g), requerimento de resposta à matéria de exceção (cfr. fls. 211 a 223).

j) No âmbito do processo referido em f), foi proferida decisão arbitral, a 18.04.2016, da qual consta designadamente o seguinte:

“Ana ........., com os sinais dos autos, na qualidade de cabeça de casal da herança de José ........., doravante apenas designados por Requerente, apresentou em 02.06.2015 um pedido de Constituição de Tribunal Arbitral, com árbitro singular, nos termos dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ) doravante designado apenas por (RJAT) em conjugação com a alínea a) do artigo 99.º do CPPT, em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por Requerida) em que pede a declaração de ilegalidade e inconstituciona- lidade e a consequente anulação das liquidações do Imposto de Selo, referentes à verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (doravante TGIS), no montante de € 36 592,09 , efetuadas em 2012, 2013 e 2014, respeitantes ao prédio urbano sito em Lisboa, na Rua ........., nº 129, descrito na respectiva Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º ....., e inscrito na matriz predial urbana da freguesia das Avenidas Novas, no artigo ......... e que originaram os seguintes documentos de cobrança.

(…)

OS FACTOS

1.º As heranças de António ........., Maria ......... e António J........., estão indivisas, com inventário a decorrer no 2.º Juízo Cível da Lisboa.

2.º O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmº Presidente do CAAD, tendo o mesmo sido notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por REQUERIDA ou ATA), em 02 de junho de 2015.

3.º A Requerente prescindiu de designar arbitro requerendo a respectiva nomeação nos termos do n.º 1 do art.º 6.º e da alínea a) do n.º 1 do art.º 11.º do RJAT, pelo que o Conselho Deontológico do CAAD designou o signatário, arbitro singular do tribunal arbitral, que comunicou a aceitação do cargo, tendo o tribunal arbitral sido constituído em 2015-09-07.

4.°-O tribunal encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para apreciar e decidir o objeto do processo, que não enferma de quaisquer nulidades, gozando as partes de legitimidade, personalidade e capacidade judiciária.

5.º O prédio sobre o qual foi feita a liquidação sob censura, faz parte das heranças não partilhadas de Maria ........., António J......... e José ........., situa-se na Rua ........., nº 129, concelho de Lisboa, está inscrito no artigo matricial ......... da freguesia de Avenidas Novas, e é composto por 2 caves, r/c, 1.º, 2.º, 3. e 4.º andares, com utilização independente, sendo que:
- as duas caves e os 1º a 4.º andar são destinados à habitação

- o r/c está afeto a serviços

6º Apesar da autonomia física e económica de 6 das 7 partes que compõem o edifício, o permitisse, certo é que, até ao presente, o prédio não foi constituído em propriedade horizontal nem o prédio foi avaliado como um todo, sendo objeto de avaliação tributária apenas as unidades físicas e económicas que o compõem

7 .º A AT entendeu que o mesmo está sobre a incidência da Verba 28 da TGIS, uma vez que a soma do valor patrimonial de cada uma das suas unidades física e economicamente independentes afetas à habitação, ascende a 1.056.062,21€ i.e. ultrapassa a quantia de € 1.000.000,00(um milhão de euros)

Pelo que,

8.º Em 27.11.2012, a AT emitiu 6 notas de liquidação da verba 28.1 da TGIS, nos termos da Lei 55- A/ 2012, art.6.º nº 1, f) ii) correspondente as 2 caves, 1º,2º,3º e 4º andar do prédio dos autos

9º Em 27.03.2013 voltou a liquidar imposto de selo da verba 28.1 com referência ao ano de 2013, correspondendo as 2 caves e 1º, 2º, 3º e 4º andar do prédio dos autos, pagáveis em 3 prestações, com exceção da cave A pagável em 2 prestações que correspondem às 17 liquidações supra descritas.

10º. Em 22.03.2014 e com referência ao ano de 2013, a AT voltou a proceder à liquidação da verba 28.1, pagáveis em 3 prestações, com exceção da cave A, pagável em 2 prestações, tal como afere das 17 liquidações descritas nas alíneas do introito

11.º Em 1 de Dezembro de 2014, as terceiras prestações da cave e 1º a 4º andar e a 2.º prestação da cave A do ano de imposto de 2013, foram liquidadas, no valor total de 3.579,93€

12º No passado dia 20.03.2015, com referência ao ano de imposto de 2014, a AT voltou a emitir 6 liquidações de Imposto de selo

13º E no dia 14 de Abril de 2015, as primeiras prestações do imposto liquidado com referência às 6 unidades independentes da cave e 1º a 4º andar e a 2ª prestação da cave A, do ano de imposto de 2014, foram liquidadas, no valor total de 3.578,98€.

14º A verdade é que, como resulta das liquidações ora impugnadas para efeitos de imposto de selo, todas foram efetuadas, tendo em consideração não o valor do prédio como um todo, mas a o valor patrimonial unitário de cada um dos fogos que o compõem.

15.º Porém como decorrerá do Direito infra, todas as liquidações identificadas no introito da presente PI violam a lei e determinam a nulidade ou, pelo menos, anulabilidade, dos indicados atos de liquidação, nos termos abaixo explicitados.

MATERIA DE FACTO

Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, destacam-se os seguintes elementos factuais:

a) As heranças indivisas compreendem um prédio sito em Lisboa, composto de caves, r/chão e 1º,2º,3º, e 4º andar com utilização independente, prédio que apesar, da sua constituição, não está constituído em propriedade horizontal;

b) O valor patrimonial tributário foi determinado separadamente, como determina o art.º 7º n.º 2, alínea b do Código do IMI;

c) Cada um dos andares independentes ou divisões, tem um valor patrimonial tributado (VPT) atribuído na avaliação, mas nenhuma das partes ou andares que o compõem, com utilização independente e com afetação habitacional tem VPT igual ou superior a €1.000.000,00;

d) Não se provaram outros factos com relevância para decisão arbitral.

B DO DIREITO

a) Estão em causa as liquidações de imposto de selo, efetuadas, pela AT, ao abrigo da verba 28.1 da TGIS, que estatui a sujeição a Imposto de Selo da

28 Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário conste da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a €1.000.000,00 - sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI

28.1Por prédio com afetação habitacional - 1%"

b) A sujeição a imposto de Selo, do património imobiliário, resulta da verificação e conjugação simultânea de dois fatores:

1.º - a afetação habitacional;

e,

2.º - que o valor patrimonial tributário, constante da matriz, seja igual ou superior a um milhão de euros;

c) O legislador, não fixou o conceito legal de "prédio com afetação habitacional", e veio colmatar outras lacunas no regime legal da Verba 28 do TGIS, estabelecendo, no art.º 67º n.2, do Código Imposto de Selo, que, às matérias não reguladas no Código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral, aplica-se, subsidiariamente, o disposto no Código do CIM.

d) A definição legal de prédio consta no art.º 2º do CIMI, que no seu nº 4 estatui que "Para efeitos deste imposto, cada fração autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.

e) Porém, uma unidade suscetível de utilização independente de um prédio em propriedade vertical, está sujeita às mesmas regras, com exceção das inerentes à propriedade que só se aplicam em imóveis constituídos em propriedade horizontal, por só estes terem autonomia jurídica

f) De facto, materialmente, a lei não estabelece qualquer outra diferença nos procedimentos de avaliação, inscrição na matriz, e, havendo partes suscetíveis de utilização independente nos prédios em propriedade total, cada parte é avaliada por aplicação das respetivas regras, sendo consideradas em separado na inscrição matricial, que descriminará o respetivo valor patrimonial tributário (art.º 12, nº3 do Código do IMI)

g) Assim, os andares e divisões suscetíveis de utilização independente, como é a situação do prédio em apreciação, têm inscrição própria e separada na matriz, com informação, necessária e suficiente, entre a qual os valores patrimoniais tributários, que permitem proceder à tributação, em sede de Verba 28 da TGIS.

h) Há que procurar, no caso dos prédios em propriedade total com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, qual o valor patrimonial tributário (vpt) a considerar para efeitos de incidência de imposto de selo à luz da verba 28 da TGIS: deve corresponder ao vpt de cada andar ou divisão com afetação habitacional ou, diversamente, ao vpt total do prédio, ou ainda conforme procedimento adotado pela ATA, à soma dos vpt correspondentes a cada andar ou divisão de utilização independente, com afetação habitacional

i) Porém a AT calculou o VPT dos prédios considerando-os de per si, nos termos dos preceitos legais acima expostos, mas, sem que nada o determinasse, ou permitisse, atendeu ao valor resultante da soma dos 6 fogos, tendo apenas deduzido 217 735,46 do valor patrimonial tributário dos fogos afetos a serviços, de que resultou um valor de 1.056.062,21€.

A questão a decidir é perfeitamente clara estando bem delimitada e tem a ver com o vpt relevante que, em nosso entender, é o que tiver sido fixado para cada andar ou divisão de utilização independente.

Questões de conhecimento prejudicados.

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que for alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importem para a decisão, a matéria provada da não provada (art.º 123.º, n.º 2 do CPPT e art.º 607, nº 3 do Código Processo Civil, aplicável "ex vi" art.º 29, nº 1 alínea a) e e) do RJAT. Deste modo. os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção as varias soluções plausíveis das questões de direito ( cfr. anterior art.º511.º do CPC correspondente ao atual 596.º, aplicável "ex vi" do a art.º 29 n.º 2 e) do JAT

Na verdade, o art.º 124º do º do CPPT, subsidiáriamente aplicável por força do art.º 29 n.º 1 do RJAT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupor que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, não é necessário conhecer os restantes, pois, se fosse sempre necessário apreciar todos os vícios imputados aos atos impugnados, seria indiferente a ordem do seu conhecimento.

j) Limitada a questão a decidir, nenhum dos andares ou divisões suscetíveis de utilização independente tem, na matriz, valor patrimonial tributário igual ou superior a 1.000.000,00 €, pelo que não estão reunidos os pressupostos de facto e de direito que legitimem a tributação efetuada, pelo que as liquidações enfermam do vício de violação de lei.

Em face do supra exposto, conclui-se assistir razão à Requerida e, consequência decide-se:

a) Julgar procedente o pedido de pronuncia arbitral, com a consequente anulação, com todos os efeitos legais, dos atos de liquidação de imposto de selo melhor identificados nos autos.

b) Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios peticionados pela requerente” (cfr. fls. 285 a 290).

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Da nulidade por omissão de pronúncia

Entende a Impugnante que ocorreu omissão de pronúncia do tribunal arbitral, uma vez que, na sua perspetiva, este não se pronunciou sobre questões que devia apreciar, concretamente a intempestividade parcial do pedido de pronúncia arbitral e a incompetência material do tribunal arbitral, por si suscitadas em sede de resposta.

Vejamos.

Nos termos do art.º 27.º, n.º 1, do RJAT, a decisão arbitral pode ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo, sendo que a impugnação pode ser apresentada considerando um dos fundamentos taxativamente elencados no n.º 1 do art.º 28.º do mesmo diploma.

Assim, nos termos desta última disposição legal, a decisão arbitral é impugnável com fundamento em:

“a) Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

b) Oposição dos fundamentos com a decisão;

c) Pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia;

d) Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artigo 16.º”.

Atento o disposto no art.º 29.º, n.º 1, do RJAT, é de considerar a disciplina subsidiariamente aplicável, de onde se destacam as normas constantes do CPPT, do CPTA e do CPC [cfr. art.º 29.º, n.º 1, als. a), c) e e), do RJAT].

In casu, como já referido, está em causa a omissão de pronúncia por parte do tribunal arbitral.

Vejamos.

Nos termos do art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, há omissão de pronúncia, que consubstancia nulidade da sentença, quando haja falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar (cfr. igualmente o art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC).

As questões que o juiz deve conhecer são ou as alegadas pelas partes ou as que sejam de conhecimento oficioso.

São do conhecimento oficioso a generalidade das exceções, sejam elas dilatórias ou perentórias, como decorre do disposto no art.º 89.º do CPTA, aplicável ex vi a al. c) do n.º 1 do art.º 29.º do RJAT, onde se refere, em termos similares aos constantes dos art.ºs 576.º, 578.º e 579.º, todos do CPC:

“1 - As exceções são dilatórias ou perentórias.

2 - As exceções dilatórias são de conhecimento oficioso e obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância ou à remessa do processo para outro tribunal.

3 - As exceções perentórias consistem na invocação de factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor, são de conhecimento oficioso quando a lei não faz depender a sua invocação da vontade do interessado e importam a absolvição total ou parcial do pedido”.

Nos termos do n.º 4 do mencionado art.º 89.º do CPTA são, designadamente, exceções dilatórias a incompetência do tribunal [n.º 4, al. a)] e a intempestividade da prática do ato processual [n.º 4, al. k)].

Por outro lado, e não obstante o facto de a generalidade da matéria de exceção ser de conhecimento oficioso, no âmbito dos processos arbitrais, a AT, na sua resposta, pode defender-se por exceção.

Com efeito, atento o disposto no art.º 83.º, n.º 1, do CPTA, ex vi al. c) do art.º 29.º, n.º 1, do RJAT, a defesa da AT, em sede de resposta, poderá ser feita por impugnação e/ou por exceção.

Feito este enquadramento, apliquemos os conceitos ao caso dos autos.

In casu, como resulta provado, a Impugnante defendeu-se por exceção na sua resposta, invocando concretamente a intempestividade parcial do pedido de pronúncia arbitral e incompetência material do Tribunal Arbitral, matéria em relação à qual, aliás, a impugnada se pronunciou.

Assim, competiria ao decisor, antes de mais, apreciar a matéria de exceção invocada, porquanto a respetiva procedência obsta a que seja conhecido o mérito do pedido de pronúncia arbitral.

Ora, compulsada a decisão impugnada verifica-se que tal matéria de exceção não foi apreciada. Com efeito, desde logo, em sede de relatório, nada é mencionado quanto à matéria de exceção suscitada. Em sede de delimitação da própria questão a apreciar, a mesma é feita contemplando exclusivamente os aspetos atinentes à relação material controvertida, nada sendo mencionado quanto às exceções em causa. Finalmente, na motivação não é feita qualquer referência às exceções suscitadas pela AT, não sendo, pois, as mesmas conhecidas.

É certo que se constata que, sob a epígrafe “Factos” (anterior à fixação da matéria de facto relevante para a decisão), foi inserido um ponto 4.º com o seguinte teor: “O tribunal encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para apreciar e decidir o objeto do processo, que não enferma de quaisquer nulidades, gozando as partes de legitimidade, personalidade e capacidade judiciária”. Assim, apesar de não constar da decisão arbitral qualquer menção expressa ao saneamento, decorre deste ponto 4.º a inclusão do chamado “saneador tabelar”. Tal inclusão, não obstante, não altera a conclusão extraída em termos de verificação da nulidade. Com efeito, tendo sido invocada matéria de exceção, a mesma tem de ser apreciada e decidida específica e concretamente, sendo que a afirmação genérica da validade e regularidade da lide não traduz a apreciação das exceções(1).

Nada tendo dito o tribunal arbitral sobre a matéria de exceção, incorreu em omissão de pronúncia, nos termos previstos na al. c) do n.º 1 do art.º 28.º do RJAT, assistindo, pois, razão à Impugnante. Tal omissão fere de nulidade a decisão impugnada, o que será declarado, devendo, nessa sequência, os autos ser remetidos ao CAAD para, se a tal nada obstar, ser proferida nova decisão.



IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Julgar procedente a presente impugnação e, em consequência, declarar a nulidade de decisão arbitral proferida no âmbito do processo 351/2015-T e determinar a baixa dos autos ao CAAD;

b) Sem custas;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 25 de junho de 2019

(Tânia Meireles da Cunha)

(Anabela Russo)

(Vital Lopes)






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(1) Cfr. neste sentido, a título ilustrativo, os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 07.10.2016 (Processo: 00127/12.6BEPRT) e do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.05.2013 (Processo: 1089/11.2TBFUN.L1-1).