Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1481/14.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/16/2021
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:OPOSIÇÃO
INTEMPESTIVIDADE
SEGUNDA CITAÇÃO
Sumário:I - Se for efetuada mais que uma citação pessoal relativamente à mesma execução e ao mesmo executado, o prazo para deduzir oposição conta-se da primeira citação, pois, por um lado, trata-se de uma situação anómala, uma vez que a lei apenas prevê um acto de chamamento à execução e, por outro lado, com o decurso do prazo de dedução de oposição, na sequência da primeira citação pessoal, fica extinto o respetivo direito.

II - Ainda que o erro consistente na segunda citação não permita o uso da oposição à execução fiscal, deve, contudo, levar a não imputar a responsabilidade dos encargos pelo seu uso indevido ao executado e, nessa medida, deve a responsabilidade pelas custas do processo ser imputada à AT que, com a sua actuação anómala, induziu o executado em erro, justamente por na segunda citação lhe ter comunicado a possibilidade de, no prazo de 30 dias, além do mais, deduzir oposição judicial.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul,

I- RELATÓRIO

A ………………., inconformado com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que, julgando verificada a excepção de caducidade do direito de acção, absolveu a Fazenda Pública do pedido, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões:

1.ª - O ora Oponente/Recorrente intentou a presente Oposição à Execução Fiscal na convicção de que a 2.ª citação pessoal que lhe foi remetida pelo S.F. de ................... visava sanar irregularidades cometidas.

2.ª - Já que aquela 1.ª citação pessoal respeitava a uma quantia exequenda e acrescido que não era devida além de englobar sete processos executivos que foram arquivados, por as suas dívidas estarem prescritas.

3.ª - Ou seja, resulta claramente evidente que as duas citações não são exactamente iguais, já que a 2.ª citação pessoal visava suprir deficiências de que a 1.ª citação pessoal padecia.

4.ª - Por isso e ao contrário do decidido o processo judicial tributário de Oposição à Execução intentado pelo Oponente/Recorrente e manifestamente tempestivo e atempado.

5.ª - Além disso e caso o não seja, o que só se admite por mera hipótese, então, também o Recorrente não pode ser condenado nas custas do processo, porquanto tal meio de reacção foi-lhe erradamente indicado e aconselhado por entidade pública, estranho à sua vontade e à sua iniciativa.

6.ª - Por tudo quanto fica referido é óbvio que a Sentença Recorrida julgou mal e deve, por isso, ser revogada.

Assim, nestes termos, e nos demais de direito que V.ªs Ex.ªs doutamente suprirão, deve o presente Recurso ser considerado procedente e provado e por via dele ser revogada a douta Sentença Recorrida, ordenando o prosseguimento dos autos para conhecer do mérito da acção.

Como é de Justiça.


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A Recorrida não apresentou contra-alegações.

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O recurso jurisdicional foi primeiramente dirigido ao Supremo Tribunal Administrativo, o qual se julgou incompetente em razão da hierarquia.

Já neste Tribunal Central Administrativo, o Exmo. Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos, atenta a simplicidade da questão a apreciar, vêm os autos à conferência para decidir.


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II - FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A decisão recorrida considerou o seguinte circunstancialismo fáctico, agora renumerado por ser manifesto o lapso inicialmente cometido:

1. No Serviço de Finanças de ..................., foi instaurado, contra a sociedade “O ……………………., S.A., o processo de execução fiscal n.º ……………., ao qual foi apenso, entre outros, o processo n.º ……………….., instaurado para cobrança de dívida de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), do exercício de 2002 – cfr. documento n.º1 do processo instrutor apenso aos autos e fls. 35 dos autos;

2. Em 07.05.2012, no âmbito do PEF mencionado no ponto que antecede, foi proferido despacho de reversão contra o ora Oponente – cfr. documento n.º 5 do processo instrutor apenso aos autos;

3. No âmbito do PEF n.º 1………….. e apensos, foi emitido o oficio n.º 4……., com data de 07.05.2012, designado “citação em reversão”, remetido ao Oponente, via correio postal registado com aviso de receção – cfr. documento n.º 6 do processo instrutor apenso aos autos;

4. O aviso de receção referente ao oficio mencionado no ponto 3, foi assinado pelo Oponente, tendo no mesmo sido aposta a data de 12.05.2012 - cfr. documento n.º7 do processo instrutor apenso aos autos;

5. O Oponente apresentou reclamação no Serviço de Finanças de ..................., alegando a prescrição das dívidas do PEF …………… e a compensação de dívidas com o reembolso do IRS relativo ao ano de 2011 – cfr. documento n.º8 do processo instrutor apenso aos autos;

6. Na sequência da reclamação mencionada em 5, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças, que reconheceu a prescrição das dívidas em cobrança nos processos de execução fiscal n.ºs ……….., ………………., ………….., ……………….., ……….., ………….. e ………………– cfr. documento n.º 8 do processo instrutor apenso aos autos;

7. Em 2014, em data concreta que se desconhece, no âmbito do PEF n.º ……………. e apensos, foi remetido ao Oponente, oficio designado “citação em reversão”, constando do mesmo o valor de quantia exequenda de € 87.786,09 – cfr. documento n.º 1, junto aos autos com a petição inicial;

8. Em 29.05.2014, a petição de oposição, que deu origem aos presentes autos, foi recebida no Serviço de Finanças de ................... - cfr. fls. 4 dos autos.


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Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.

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A decisão da matéria de facto provada fundou-se na análise crítica e conjugada do teor dos documentos não impugnados, juntos aos autos e ao processo instrutor, conforme indicado em cada um dos pontos supra.

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- De direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim sendo, a questão a apreciar e decidir é a de saber se o Tribunal a quo errou ao considerar procedente a excepção da caducidade do direito de acção, absolvendo, em consequência, a Fazenda Pública do pedido, tudo isto por referência à oposição deduzida contra a execução fiscal nº …………… e aps, instaurada pelo Serviço de Finanças de ..................., contra a sociedade devedora originária “O ……………….”.

Com efeito, escreveu-se na sentença o seguinte:

“Nos termos do artigo 203.º, n.º 1 alínea a), do CPPT, a oposição deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal.

Resulta provado nos autos que, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ……………… e apensos, instaurado pelo Serviço de Finanças de ..................., contra a sociedade O ……………. S.A. foi determinada a reversão dos processos contra o ora Oponente (cfr. pontos 1 e 2).

Do probatório resulta também que, na sequência do despacho de reversão, o Oponente foi citado pessoalmente na qualidade de revertido, no âmbito do referido processo, em 12.05.2012 (cfr. supra ponto 2).

Por outro lado, a presente oposição foi apresentada, no Serviço de Finanças de ..................., em 29.05.2014 (cfr. ponto 9).

Ou seja, à data da apresentação da presente oposição, há muito se esgotara o prazo de 30 dias previsto no artigo 203.º, n.º 1, do CPPT, que, contado nos termos do disposto no artigo 139.º do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT terminaria em 12.06.2012.

O facto de, após ter sido reconhecida a prescrição de parte das dívidas em execução, o órgão de execução fiscal ter emitido nova citação no âmbito do processo de execução fiscal n.º ………………. e apensos, não implicou a renovação do prazo de reação, previsto no artigo 203.º, n.º 1, alínea a) do CPPT.

Neste sentido cfr., entre outros, o Acórdão do TCA Norte de 16.04.2015, processo n.º ………/14.1BEVIS, disponível em www.dgsi.pt, onde se escreveu, designadamente, o seguinte: “(…) I-Sendo efetuada mais que uma citação pessoal relativamente à mesma execução e ao mesmo executado, o prazo para deduzir oposição conta-se da primeira citação, pois, por um lado, trata-se de uma situação anómala, uma vez que a lei apenas prevê um ato de chamamento à execução e, por outro lado, com o decurso do prazo de dedução de oposição, na sequência da primeira citação pessoal, fica extinto o respetivo direito (art. 145.º, n.º 3 do CPC)”.

Subscrevendo o sentido do referido acórdão e considerando o supra exposto, conclui-se que a presente oposição é intempestiva.

A caducidade do direito de ação, em oposição à execução fiscal, é exceção perentória, que conduz à absolvição da Fazenda Pública do pedido (cfr. artigo 576.º, n.º 3, do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT; cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 22.05.2013, processo n.º 0340/13)”.

O Recorrente discorda do assim decidido e, no essencial, considera que “a 2.ª citação pessoal que lhe foi remetida pelo S.F. de ................... visava sanar irregularidades cometidas”, já que aquela “1.ª citação pessoal respeitava a uma quantia exequenda e acrescido que não era devida além de englobar sete processos executivos que foram arquivados, por as suas dívidas estarem prescritas”. Como sublinha o Recorrente, “as duas citações não são exactamente iguais, já que a 2.ª citação pessoal visava suprir deficiências de que a 1.ª citação pessoal padecia”. Assim, conclui, ao contrário do decidido, “o processo judicial tributário de Oposição à Execução intentado pelo Oponente/Recorrente é manifestamente tempestivo e atempado”.

Valendo para efeitos de enquadramento geral da questão a decidir, tenha-se presente que, como se escreveu no acórdão deste TCA, de 27/11/12, proferido no recurso nº. 06011/12, o seguinte: “O prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de um certo direito, é um prazo de caducidade. E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade de actos praticados no âmbito de processo judicial) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr.artº.333, do C.Civil) e determina o indeferimento liminar da petição. É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.493, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido.

Concretamente, o prazo para deduzir oposição a execução fiscal é um prazo judicial, atento o disposto no artº.20, nº.2, do C.P.P.Tributário. Com efeito, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na sua globalidade, apesar de haver uma parte do mesmo que é processada perante órgãos da Administração Tributária (artº.103, nº.1, da L.G.T.). Tratando-se de prazo de natureza judicial, aplica-se-lhe o regime do C.P.Civil (cfr.art.20, nº.2, do C.P.P.Tributário), pelo que ele corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, mais se transferindo o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os Tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto (cfr.artº.144, nºs.1, 2 e 3, do C.P.C.).

Mais se dirá que o prazo para dedução de oposição é de trinta dias computado da data da citação pessoal (cfr.artº.203, nº.1, al.a), do C.P.P.T.).

A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr.artº.228, do C.P.Civil; artºs.35, nº.2, e 189, do C.P.P.Tributário; ac.T.C.A.Sul, 24/5/2011, proc.4478/11; ac.T.C.A.Sul, 12/8/2011, proc.4880/11).

Presentemente, a regulamentação nuclear da matéria relativa à citação, e respectivas formalidades a respeitar, no âmbito dos processos de execução fiscal, acha-se vertida nos artºs.188 a 194, do C.P.P.T. (cfr.artºs.272 a 278, do anterior C.P.Tributário). Fora dos casos de “citação por via postal” consagrados no artº.191, do C.P.P.T., a citação deve ser pessoal, fazendo-se, em regra, por carta registada com aviso de recepção. Entre os casos de citação pessoal (em que se abrange a citação por transmissão electrónica de dados, a partir da entrada em vigor da Lei 67-A/2007, de 31/12 - cfr.artºs.191, nºs.4 e 5, e 192, nº.1, ambos do C.P.P.T.), incluiu-se o chamamento dos responsáveis subsidiários, como expressamente se refere no artº.191, nº.3, do C.P.P.T. Por sua vez, as citações pessoais devem ser realizadas de acordo com o preceituado no C.P.C. (cfr.artº.192, nº.1, do C.P.P.T.).

As citações em processo civil estão reguladas nos artºs.233 a 252-A, do C.P.C.

A citação por via postal por meio de carta registada com aviso de recepção é feita com base em modelos oficialmente aprovados, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho (a portaria 953/2003, de 9/9, aprovou os modelos oficiais de carta registada e de aviso de recepção para citação pessoal, a efectuar por via postal).

No caso de citação de pessoa singular, a carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de recepção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando (cfr.artº.236, nº.2, do C.P.C.). Em qualquer dos casos, antes da assinatura do aviso de recepção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do citando ou do terceiro a quem a carta seja entregue, anotando os elementos constantes do bilhete de identidade ou de outro documento oficial que permita a identificação (cfr.artº.236, nº.3, do C.P.C.). Quando a carta seja entregue a terceiro, cabe ao distribuidor do serviço postal adverti-lo expressamente do dever de pronta entrega ao citando (cfr.nº.4, do artº.236).

Nestes casos, de entrega da carta a terceiro, será ainda enviada carta registada ao citado, comunicando-lhe a data e o modo por que o acto se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada (cfr.artº.241, do C.P.C.).

Tanto nos casos em que a carta é entregue ao citando como naqueles em que a entrega é feita a terceiro, a citação por via postal considera-se feita no dia em que se mostrar assinado o aviso de recepção e tem-se por efectuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário (cfr.artº.238, nº.1, do C.P.C.) e só ocorrendo falta de citação se o destinatário alegar e demonstrar que não chegou a ter conhecimento da citação, por motivo que não lhe seja imputável, conforme resulta do artº.190, nº.6, do C.P.P.T. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/1/2004, proc.1053/03; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, 6ª. edição, 2011, pág.378 e seg.).

Por último, refira-se que ao prazo para o citado exercer os seus direitos de oposição à execução fiscal, pagamento em prestações e dação em pagamento, acresce uma dilação de cinco dias quando a citação tenha sido efectuada em pessoa diversa do executado (cfr.artº.236, nº.2, do C.P.C.), ou quando a citação tenha tido lugar fora da área da comarca em que se situa o serviço da administração tributária onde corre o processo (cfr.artº.252-A, nº.1, do C.P.C.). Quando, a citação foi feita em terceiro e fora da área da comarca em que se situa o serviço da administração tributária em que pende o processo, cumulam-se as duas dilações (cfr.artº.252-A, nº.4, do C.P.C.).

A dilação (prazo dilatório é o que difere para certo momento a possibilidade de realização dum acto) visa garantir a possibilidade de defesa efectiva e plena em tempo útil, nos casos em que a distância geográfica entre o Tribunal da acção e o local da citação, ou modalidade desta, tornam (ou podem tornar) insuficiente o prazo peremptório que se inicia com a mesma citação. Por outras palavras, a dilação visa colocar em igualdade de circunstâncias o citado que reside na área do Tribunal e o que vive fora dessa área, tendo por fim garantir ao citado a integridade do dito prazo peremptório (cfr.Prof.José Alberto dos Reis, Comentário ao C.P.Civil, II, 1945, Coimbra Editora, pág.265 e 266; José Lebre de Freitas e Outros, C.P.Civil Anotado, I, 1999, Coimbra Editora, pág.439)”.

Vejamos, então, o caso concreto, tendo presente a matéria de facto fixada e não impugnada.

É incontornável, vistos os autos, que o Recorrente foi pessoalmente citado para a execução fiscal nº …………….. e aps em 12/05/12 (cfr. ponto 4 dos factos provados), contando-se a partir daí o prazo de 30 dias para a dedução de oposição, nos termos do disposto no artigo 203º, nº1, alínea a) do CPPT.

Na sequência de tal citação, o executado, ora Recorrente, em Setembro de 2012 (cfr. informação oficial prestada com a remessa dos autos de oposição ao TT de Lisboa, a fls. 34 e ss), apresentou reclamação judicial, alegando a prescrição de parte das dívidas e, bem assim, a ilegalidade de uma compensação efectuada na execução, sem que tenha sido apresentada oposição à execução fiscal.

Reconhecendo-se, em parte, razão ao alegado, no que toca à prescrição dos processos n.ºs …………, …………………., ………………, ………………, ………………, …………….. e ……………, manteve-se a execução fiscal no mais, em concreto quanto ao processo executivo n.º ……………, instaurado para cobrança de dívida de IRC, do exercício de 2002, no montante de € 87.786,09 – lê-se no doc. 8 do processo instrutor apenso, a que o probatório se refere, que “a reversão segue os trâmites pelos restantes processos”.

Portanto, e para que não surjam hesitações, repete-se: o processo n.º …………………., relativo ao IRC de 2002, no montante de € 87.786,09, a que respeita a oposição que deu origem à sentença ora recorrida, já estava incluído no conjunto dos processos a que respeitava a citação efectuada em Maio de 2012.

Em face de tal extinção parcial, em virtude da prescrição, a AT emitiu e comunicou ao executado, em 2014, em data concreta que se desconhece, no âmbito do PEF n.º …………………… e apensos, oficio designado “citação em reversão”, constando do mesmo o valor de quantia exequenda de € 87.786,09 (cfr. ponto 7 dos factos provados).

Ora, em nosso entendimento, e em linha com o decidido, este segundo ofício, intitulado “citação em reversão”, não tem a virtualidade de abrir um novo prazo de dedução de oposição à execução, uma vez que o executado já fora citado pessoalmente em Maio de 2012 (e, repete-se, já havia sido citado – também - para o processo n.º ………………..).

Em rigor, não estamos perante uma segunda citação pessoal, uma vez que o Recorrente efectivamente foi regularmente citado em 12/05/12, pelo que tal notificação apenas traduz a regularização/actualização do valor da dívida exequenda, em resultado do reconhecimento parcial da prescrição.

Como afirma Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª Edição, 2011, Vol. III, anotação 4b) ao artigo 203.º, pág. 431, segundo o qual “se, eventualmente, for efetuada mais que uma citação pessoal relativamente à mesma execução e ao mesmo executado, o prazo para deduzir oposição conta-se da primeira citação, pois, por um lado, trata-se de uma situação anómala, uma vez que a lei apenas prevê um ato de chamamento à execução e, por outro lado, com o decurso do prazo de dedução de oposição, na sequência da primeira citação pessoal, fica extinto o respetivo direito (art. 145.º, n.º 3 do CPC)”. Este é, também, o entendimento que tem vindo a seguido pela jurisprudência dos tribunais superiores, o que a sentença bem assinalou.

Assim, tendo o Recorrente sido pessoalmente citado no dia 12/05/12, no âmbito do processo de execução fiscal em causa e tendo o prazo de 30 dias (prazo judicial) para deduzir a presente oposição, há muito que em 29/05/14 (cfr. ponto 8 dos factos provados) se esgotara o prazo para deduzir oposição, pelo que impunha-se, como aconteceu, considerar a oposição intempestiva.

Nessa medida, e quanto à questão que aqui começámos por analisar (a que correspondem as conclusões 1 a 4) há que concluir que falece a razão ao Recorrente e, como tal, confirmar o decidido.

Não se desconsidera, porém, que o sucedido nos autos de execução fiscal configura uma situação anormal, uma vez que a lei apenas prevê um acto de chamamento à execução e que tal segunda comunicação, designada de “citação em reversão”, nem sequer deveria ter ocorrido. De resto, a própria AT reconhece isso mesmo, ao afirmar na informação de fls. 34 e ss dos autos, além do mais, que:

“Por constrangimentos informáticos, a fim de possibilitar tramitar a prescrição de parte dos processos e visto que os mesmos se encontravam apensos, foi alterada a fase processual dos processos (…), muito embora e como refere a informação e despacho (Doc. 8) a reversão prossegue nos processos onde não ocorreu a prescrição.

Em 2013 foi implementada a reversão automática, com base em cruzamento de dados, na sequência do que, o sistema informático não reconheceu que já havia sido tramitada e concretizada nos autos uma reversão.

Assim, de novo foi efectuada a reversão automática nº ………………., a que se refere a presente oposição. A mesma correu os seus trâmites até à citação pessoal na sequência da qual é deduzida a presente oposição.

De referir que esta última reversão, se verifica um acto inútil, por já se encontrar anteriormente concretizado, não fazendo por isso renascer um novo prazo para deduzir a oposição”.

Relevam estas palavras transcritas para nos introduzirem na segunda questão que nos cumpre apreciar e a que corresponde a conclusão 5 da alegação de recurso, a saber: não poder, o Recorrente, ser condenado nas custas do processo, porquanto tal meio de reacção foi-lhe erradamente indicado e aconselhado por entidade pública, estranho à sua vontade e à sua iniciativa.

E, quanto a este aspecto, sem prejuízo de – repete-se – entendermos que a segunda citação não abre um novo prazo de oposição à execução, julgamos que a razão está com o Recorrente que, em resultado de uma actuação incontornavelmente anómala e inútil, resultante de constrangimentos informáticos com origem na Administração Tributária, claramente induziu o executado em erro, justamente por na referida segunda citação lhe ter comunicado a possibilidade de, no prazo de 30 dias, além do mais, deduzir oposição judicial, referindo-se concretamente aos artigos 201º e 204º do CPPT.

Perante o teor erróneo de tal comunicação, admite-se como razoável a actuação do executado, de seguir a orientação que a AT lhe transmitiu sobre prazos e meios de defesa.

Ora, como não oferece dúvidas, os erros e omissões dos actos praticados pela secretaria judicial (o que, no caso, equivale ao Serviço de Finanças) não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes. Na dúvida deve entender-se que a parte não pode ser prejudicada por actos praticados pela secretaria judicial, como estatui o artigo 157º, n.º 6, do CPC vigente e preceituava antes o n.º 6 do artigo 161.º do CPC, numa clara emanação do princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança e do princípio da transparência e da lealdade processuais, indissociáveis de um processo justo e equitativo.

Nesta conformidade, e ainda que este erro não permita o uso de um concreto meio de defesa (no caso, a oposição), deve, contudo, levar-nos a não imputar a responsabilidade dos encargos pelo seu uso indevido e, nessa medida, deve a responsabilidade pelas custas do processo ser imputada à AT que, pelas razões expostas, deu causa ao processo.

Nesta parte, ou seja, cingindo-nos à condenação em custas do Oponente, dá-se provimento ao recurso, devendo, nesta medida, ser revogada a sentença, condenando-se em custas a Fazenda Pública, em 1ª instância.


*

III - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder parcial provimento ao recurso interposto, determinando-se, em consequência, o seguinte:

- a revogação da sentença recorrida na parte em que condenou em custas o Oponente, ora Recorrente, julgando-se a Fazenda Pública responsável pelas custas no processo de Oposição.

- manter a sentença no mais.

Custas por ambas as partes na proporção do decaimento, no TCAS.

Registe e notifique.

Lisboa, 16/09/21

[A Relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, Isabel Fernandes e Jorge Cortês]


Catarina Almeida e Sousa