Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03881/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:02/01/2011
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. IRC. CUSTOS. IMOBILIZADO. FUNDAMENTAÇÃO. DONATIVOS. PRINCÍPIO DA ESPECIALIZAÇÃO DE EXERCÍCIOS. CRIAÇÃO LÍQUIDA DE POSTOS DE TRABALHO.
Sumário:1. A verba inscrita como custo do exercício relativa a abate do activo imobilizado corpóreo não pode ser aceite como custo do exercício quando a contribuinte não prova os factos atinentes a tal abate;
2. Não inquina de ilegalidade por vício formal, a liquidação efectuada que não ouve o contribuinte sobre factos novos trazidos à fundamentação após o mesmo ter sido ouvido uma primeira vez no âmbito do direito de audição, quando o facto sobre que foi ouvido, só por si, sustenta tal liquidação e continua a ser erigido, em primeiro lugar, como pressuposto dessa mesma liquidação;
3. Um custo relativo a um donativo tendo por suporte documental um recibo passado em exercício de data de exercício anterior, não pode ser considerado custo do exercício seguinte, a menos que a contribuinte alegue e prove que o não pode contabilizar no exercício a que respeita, por violar o princípio da especialização dos exercícios;
4. A majoração dos custos por criação líquida de postos de trabalho prevista no art.º 17.º do EBF (redacção do Dec-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho), pressupõe que entre a data do início do exercício e o seu termo tenha aumentado o número de trabalhadores a contrato sem termo, com idade não superior a 30 anos.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:RECURSO JURISDICIONAL N.º 3.881/10.


Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A...Portugal – Serviços de Consultoria Informática, SA, identificada nos autos, dizendo-se inconformado com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, na parte que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


a. Apesar de se afirmar, na sentença recorrida, que "A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam”, verifica-se que não foram dados como provados os factos que a Recorrente provou com os documentos juntos com a petição inicial (Documentos 2, 9 e 10) e, bem assim, com o documento junto por requerimento da Recorrente apresentado no dia 13 de Novembro de 2007, factos e documentos que não foram alvo de impugnação pela Fazenda Pública;
b. Uma vez que os factos que se pretendiam provar com aqueles documentos se revelam fundamentais para a boa decisão da causa, afigura-se estarmos perante uma situação de clara insuficiência da matéria de facto apreciada e dada por provada pelo Mm.º Juiz a quo, devendo a mesma ser aditada pelo Tribunal ad quem, em virtude de constarem do processo todos os elementos necessários para que seja dada outra solução quanto à decisão da matéria de facto, o que se requer - nos termos do artigo do disposto no artigo 684°-A do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 2° do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
c. Ao validar o entendimento redutor e formal de que o abate de imobilizado em discussão apenas seria admissível na medida em que ficasse provada que a desocupação efectiva do espaço operou por um "contrato de rescisão de arrendamento", a sentença recorrida validou um acto administrativo infundado, na medida em que não vigora, nesta sede, qualquer ónus de prova específico que tal documento como Único meio probatório, pelo que a consequência legal deveria ser a anulação do acto tributário nesta parte, nos termos da alínea c) do artigo 99° do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
d. Ao alterar a fundamentação do acto tributário, na parte respeitante ao abate de imobilizado, após o exercício de audição prévia por parte do contribuinte, a Administração Tributária deveria ter dado nova oportunidade de o mesmo se pronunciar sobre tal argumentação, sob pena de violação do princípio da participação do contribuinte na formação da decisão administrativa, nos termos do artigo 267°, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e, em concreto, do artigo 60° da Lei Geral Tributária. Acresce que, no caso concreto, em virtude de tal alteração de fundamentação, a Recorrente teria junto os documentos que anexou à sua Petição inicial (Documentos 9 e 10), susceptíveis de alterar a decisão administrativa, porquanto provavam a efectiva desocupação do espaço no ano de 2003, o que determina a ilegalidade da sentença recorrida que não anulou o acto tributário com este fundamento - alínea d) do artigo 99° do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
e. Ao provar que cumpriu a obrigação prescrita pelo art. 10.º, n.º 3, do Decreto Regulamentar n.º 2/90, na redacção à data dos factos, a Recorrente não violou os requisitos legais exigidos para a verificação do abate - junção dos documentos com a devida comunicação do mesmo e seus avisos de recepção nos prazos da lei -, pelo que a sentença deveria ter anulado a esta parte do acto impugnado, nos termos da alínea a) do artigo 99° do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
f. Ao contrário do que se sufraga na sentença recorrida, uma "desvalorização extraordinária" para efeitos do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, abrange quer as verbas lançadas na conta 696 - Aumentos de amortizações e de provisões, quer na conta 694- Perdas em imobilizações, posto que, para efeitos fiscais, não existe um regime especial para o "abate", mas antes se aplica o mesmo regime daquele artigo. Nessa medida, o abate de imobilizado promovido afigura-se legal, devendo a correcção ser anulada nesta parte, nos termos do artigo 99° do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
g. Ao dar-se provimento, na sentença recorrida, à argumentação utilizada para justificar a ilegalidade da desconsideração e tributação autónoma dos donativos à C...e sendo tal argumentação a mesma utilizada para fundamentar a anulação das correcções respeitantes à B..., também estas deveriam ter sido anuladas pelo Tribunal a quo, sob pena de manutenção na ordem jurídica de um acto ilegal;
h. O donativo à B...apesar de apelidado de “jóia", constituiu uma verdadeira e própria liberalidade, desprovida de qualquer contrapartida para a Recorrente, cujo custo foi material e efectivamente incorrido em 2003 - ano a que dizia respeito a liberalidade - e se encontra documentado, através do Recibo 003 de 2/09/2002, como aliás é reconhecido pela Administração Tributária no Relatório de Inspecção, pelo que a decisão administrativa e a sentença recorrida violam frontalmente o disposto nos artigos 56°-C do EBF (em vigor à data dos factos) e 23° do Código do IRC, devendo ser anulada nos termos do artigo 99°, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
i. Uma vez que o critério económico e financeiro deve prevalecer sobre o critério formal, e dizendo o referido custo respeito ao ano de 2003, ainda que pago antecipadamente em 2002, o mesmo foi bem contabilizado e, porque acompanhado do correspondente "documento justificativo", não poderá ser considerado como despesa não documentada, ficando vedada qualquer pretensão de tributação autónoma, pelo art. 81.º/n.º 1 do CIRC, ou de não ­aceitação como custo, pelo art. 23.º/n.º l/al. g) do CIRC, pelo que, também nesta parte, andou mal a sentença recorrida que deveria ter anulado o acto de liquidação;
j. Quanto às correcções motivadas pela errónea aplicação do benefício constante do artigo 17° do EBF, na pendência da acção, e em resposta a um pedido de informação vinculativa, a Administração Tributária informou que o seu ­entendimento é idêntico àquele aplicado pela Recorrente quanto ao exercício de 2003, posição que contraria frontalmente aquela assumida no Relatório de Inspecção que fundamenta o acto impugnado.
k. Tal posicionamento demonstrar a total incoerência e falibilidade dos fundamentos que presidiram à inerente correcção - e que a Recorrente nem sequer conhece por motivo da falta de fundamentação do acto -, o que não podia ter sido ignorado pelo Mm.º Juiz a quo na sentença, que deveria ter anulado o acto impugnado, nesta parte, por violação de lei (artigo 99º, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário);
l. Ademais, da análise da posição administrativa e dos fundamentos que presidiram à decisão recorrida, afigura-se que surge carente e viola a lei a fundamentação avançada pela Administração Tributária para questionar a recusa de concessão da majoração dos custos fiscais, por parte da ora Recorrente, o que por si só justificaria a anulação do acto tributário por força do disposto na alínea c) do artigo 99º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
m. Em suma, quanto à aplicação do beneficio fiscal previsto no artigo 17° do EBF afigura-se que o acto tributário, nesta parte, está duplamente viciado, o que deveria ter sido declarado pelo Mm.º Juiz a quo, em virtude da manifesta insuficiência e errónea fundamentação do acto e por evidente errónea interpretação do disposto no artigo 17° do EBF - alínea a) e c) do artigo 99° do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Nestes termos, e nos mais de Direito que esse Venerando Tribunal suprirá, deverá o presente Recurso ser dado como procedente, por provado, e em consequência ser revogada integralmente a decisão recorrida, por ilegal, e substituída por outra que determine a anulação integral da liquidação de IRC n.º 2007 8310001711 (na parte recorrida) e os juros compensatórios calculados sobre a mesma, tudo com as legais consequências.


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, ainda que ao probatório da sentença recorrida devam ser aditados os factos que enumera, que a fundamentação da liquidação na parte relativa ao abate do activo imobilizado não padece de qualquer vício, que o donativo também não deverá ser aceite por além do mais a sua contabilização violar o princípio da especialização dos exercícios e quanto à criação líquida de postos de trabalho, também a liquidação se deve manter já que a mesma se não verificou.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se à matéria de facto fixada no probatório da sentença recorrida deve ser acrescida a invocada pela recorrente; Se a recorrente logrou provar o custo relativo à verba relativa ao imobilizado corpóreo por desocupação efectiva da parte do local arrendado; Se a alteração de parte da fundamentação da liquidação após o exercício do direito de audição, sem que de novo seja concedido à contribuinte este direito, inquina de ilegalidade a mesma liquidação; Se a recorrente logrou provar que o donativo desconsiderado como custo do exercício lhe era impossível tê-lo imputado no exercício anterior; E se a verba desconsiderada e respectiva liquidação atinente, por não ter havido criação líquida de postos de trabalho, se encontra fundamentada e se houve errónea interpretação e aplicação dos pressupostos da norma do art.º 17.º do EBF.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade a qual igualmente na íntegra se reproduz:
1- No âmbito de uma acção de fiscalização efectuada à sociedade anónima "A...Portugal- Serviços de Consultadoria e Informática, SA" foram efectuadas correcções aos prejuízos fiscais de IRC do exercício de 2003 e procedeu-se a liquidação adicional de imposto e de juros compensatórios para aquele ano, com o n° 20078310001711, no valor de € 104.403,17.- cfr Documento de Cobrança de imposto e de juros, de fls 499, do P.A apenso
2- A correcção mencionada em 1 resultou do Parecer e Despacho, de 28.02.07, de fls 202, efectuadas com base nos Pareceres do Chefe de Divisão e do Chefe de Equipa, de fls 202 a 205, e nas "conclusões do relatório" de fls 206 e 207, fundamentadas no Relatório elaborado pelos serviços de inspecção, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido e do qual consta, designadamente, que "o s.p. contabilizou.. na conta 69.45 um "abate" de imobilizado... no entanto não remeteu prova da rescisão do "contrato de arrendamento" pelo que não é de aceitar este custo. . . quanto a donativos à "B...", recibo nº 003, de 02.09.02. . . contabilizados no exercício de 2003. . .não respeitou o princípio da especialização dos exercícios", não se trata de um donativo mas sim de jóia de sócio empresarial honorário. . .remeteu recibos. . .emitidos pela Cadim, todos datados de 15.03.04. . . não apresentou documentos comprovativos do registo de custo. . . sujeito a tributação autónoma. . .
Relativamente à criação líquida de postos de trabalho para jovens. . . não pode deduzir no Quadro 07, Campo 234 da Declaração de Rendimentos Modelo 22. . . efectivamente, à data de 01 de Janeiro de 2003, constam das folhas de Segurança Social 194 colaboradores com idade inferior a 30 anos. Na data de 31.12.03, constam nos mesmos mapas somente 163 colaboradores. . . verifica-se uma diminuição de postos de trabalho desempenhado por jovens com menos de 30 anos. . .esta situação.. não se enquadra no conceito de criação líquida de postos de trabalho", tendo sido analisados os elementos novos suscitados na audição do impugnante, conforme fundamentação da decisão daquele procedimento constante do ponto VIII, do Relatório. - cfr Relatório da I.T. de fls 202 a 478, do P.A apenso.
3- Dá-se aqui por reproduzido a declaração periódica de rendimentos Modelo 22 apresentada pelo impugnante e a D.C. efectuada pela Adm. Fiscal, com base no DUC, de fls 492 a 497. - cfr "print informático" de fls 504 a 507 e de fls 508 a 511, do P.A. apenso.
X
Factos Não Provados
Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
X
Motivação da decisão de facto
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.


4. Para julgar improcedente a impugnação judicial, na parte em que o foi, considerou o M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, quanto aos custos relativos às perdas do imobilizado o mesmos ocorreram por falta de prova da rescisão do contrato de arrendamento em causa, quanto aos donativos concedidos à “B...” por violarem o princípio da especialização dos exercícios, quanto à criação líquida de postos de trabalho o mesmo não ter ocorrido e não se verificar o vício de falta de fundamentação desta desconsideração como custo.

Para a recorrente de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, é contra esta fundamentação que se vem a insurgir, pugnando desde logo pela insuficiência da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, outra devendo ser acrescida e que considera relevante para o julgamento das questões a conhecer no presente recurso – matéria das conclusões a. e b. – que quanto aos custos do imobilizado a lei não exige a prova apenas por tal documento e que foi alterada a fundamentação quanto a essa desconsideração sem que a ora recorrente tenha tido oportunidade de se pronunciar – matéria das conclusões c. e d. – que cumpriu os requisitos para a prova do abate dos bens do imobilizado – matéria das conclusões e. e f. – que também os donativos atribuídos à “B...” deveram ter sido aceites já que repousavam sobre os mesmos elementos que os atribuídos à “C...” e que a sentença recorrida aceitou como válidos – matéria das conclusões g. a i. – e quanto ao benefício da criação de postos de trabalho previsto no art.º 17.º do EBF, ter obtido informação prévia vinculativa com o mesmo critério utilizado pela ora recorrente, para além da sua falta de fundamentação, pelo que também nesta parte o acto de liquidação está inquinado e bem assim a sentença recorrida que na sua esteira o secundou – matéria das conclusões j. a l..

Vejamos então.
Comecemos então por apreciar se a sentença recorrida padece do invocado vício de insuficiência da matéria de facto levada ao seu probatório, outra devendo ser ali fixada, que dos autos conste como provada, em ordem à decisão das questões suscitadas no âmbito do conhecimento do presente recurso, questão que logra prioridade de conhecimento face a todas as demais, a fim de se fixar o necessário quadro factual a que depois se possa aplicar o correspondente direito.

Nos termos do disposto nos art.ºs 123.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 511.º e 659.º do Código de Processo Civil (CPC), ao probatório da sentença devem ser levados os factos provados relevantes para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, tendo em conta a fundamentação que foi utilizada pela AT para as verbas desconsideradas como custos no caso, bem como os pressupostos legais que autorizam a sua existência.

No caso, tratam-se dos documentos juntos aos autos pela ora recorrente com a sua petição inicial de impugnação, constantes de fls 72 a 85 (cópia de um contrato de arrendamento), de fls 142 a 188 (cópias de diversos recibos de fornecimento de água e luz dirigidas à ora recorrente), de fls 189 a 196 (cópias de diversas comunicações dirigidas à AT dando-lhe conta do abate do imobilizado e cujos valores e a solicitar a respectiva aceitação como custo) e de fls 315 a 320 (cópia do pedido da ora recorrente a solicitar a informação prévia e vinculativa relativa à aplicação do art.º 17.º do EBF e respectiva resposta da AT).

Quanto à desconsideração da verba de € 435.148,45 por falta de remessa à AT da prova da rescisão do “Contrato de arrendamento” no ano de 2003, motivo pelo qual não foi aceite o custo fiscal atinente, não tendo também apresentado provas da destruição dos bens (auto de abate), não ter feito prova da comunicação de abate dos bens ao Serviço de Finanças e não ter apresentado as facturas por aquisição e obras efectuadas nas partes arrendadas, tendo sido estes os fundamentos invocados pela AT para tal custo não ter sido aceite(1) e que a sentença recorrida manteve, não se vê que tais documentos possam ter qualquer relevo para a decisão quanto a este ponto, desde logo por o de fls 72 a 77, encimado de “Contrato de Arrendamento”, ser da data de 24-3-2004 e ter apenas início em 1-1-2005, como nele consta e o de fls 79 a 85, encimado de “Aditamento”, por se reportar a um contrato de arrendamento em que por esta via foi reduzido o seu objecto, com a libertação de alguns dos espaços arrendados, mas tal aditamento, pelos seus próprios termos, apenas teria efeitos a partir de 15-2-2004 – sua cláusula 2.ª - igualmente não se vendo que interesse poderia ter para decidir esta questão, reportada ao exercício de 2003, pelo que não é de levar ao probatório esta factualidade.

Quanto à factualidade relativa aos vários recibos de água e luz do ano de 2003 (na sua maior parte), prendem-se com a tese da ora recorrente em pretender que fez a prova da desocupação de parte dos pisos que ocupava na “Torre de Monsanto” e ainda no ano de 2003 (cfr. matéria do art.º 40.º da sua petição inicial de impugnação) igualmente não se vendo com a factualidade contida nesses recibos, qual o relevo que a mesma teria para provar tal desocupação, tanto que mais que tais recibos identificam apenas, o local de contador, nuns casos e em outros, nem isso fazem, pelo que a respectiva factualidade também não deve ser acrescida ao respectivo probatório, por nada acrescentar no sentido dessa pretendida prova.

Quanto aos documentos de fls 189 a 196 dos autos, ainda que tenham sido remetidos à AT em data posterior à do respectivo exercício, como neles se pode ver, ainda assim será o respectivo conteúdo de aditar ao probatório, para depois apreciar a respectiva relevância em sede do direito a aplicar, como adiante se acrescerá.

Finalmente, quanto aos documentos de fls 315 a 320, também o seu conteúdo não deve ser levado ao probatório, por tal requerimento jamais poder pretender ser uma informação prévia vinculativa nos termos do disposto no art.º 68.º da LGT e 57.º do CPPT, por a mesma só ter sido peticionada em Abril de 2007, como a ora recorrente afirma no seu requerimento de fls 313, não o podendo ser (prévia) em relação a uma liquidação já efectuada há muitos anos, para além de a resposta nem sequer vir como tal configurada ...dado que não apresenta de forma detalhada os factos relevantes referentes a um caso concreto ..., como nela se pode ler, pelo que nenhum interesse pode ter a decisão das questões em discussão no presente recurso (nem é prévia e nem é vinculativa).

Assim, em atendimento parcial da matéria relativa às citadas conclusões, aditam-se ao probatório fixado na sentença recorrida mais os seguintes pontos:
4 – A ora recorrente dirigiu ao Chefe da 3.ª Repartição de Finanças de Algés, onde foi recebida em 26-1-2004, a comunicação cuja cópia consta de fls 189 dos autos, a dar conhecimento que havia sido levado a efeito no dia 31-12-2003 o abate de imobilizado considerado como inutilizado ou obsoleto pelo facto das rescisões e alterações de contratos de arrendamento dos Edifícios – cfr. docs. de fls 189, 190 e 193 dos autos;
5 - A ora recorrente dirigiu ao Director Geral dos Impostos, onde foi recebida em data imprecisa do ano de 2004, a comunicação cuja cópia consta de fls 191 dos autos, a requerer a aceitação como custo da quota de reintegração equivalente ao valor líquido dos elementos do activo imobilizado corpóreo, referidos no n.º anterior – cfr. docs. de fls 191 a 193 dos autos.


Nestes termos, acolhe-se o aditamento à matéria de facto nos termos supra e desatende-se no restante pretendido.


4.1. Quanto à questão da desconsideração da verba supra referida, relativa ao abate do activo imobilizado, desde logo convém precisar que a mesma não se fundou na falta de prova da desocupação dos espaços em causa, por um contrato de rescisão de arrendamento, como único meio de prova admitido – ao contrário do invocado pela recorrente na matéria da sua conclusão g. – mas sim por falta dessa prova (fosse por tal documento ou por qualquer um outro meio de prova), na linha aliás, da fundamentação da liquidação por banda da AT, como do respectivo relatório se pode ver, encontrando-se tal ponto da sentença recorrida fundamentado até com alguma desenvoltura que a ora recorrente nem contraditou, pelo que ao arrimo desta fundamentação e nesta vertente, não poderia tal questão deixar de improceder.

Sempre se dirá que, nos termos do disposto nos art.ºs 27.º e segs do CIRC e do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, que os abates do imobilizado bem como os demais custos do exercício provenientes de amortizações e reintegrações, para poderem ser aceites, para além de deverem constar da respectiva contabilização relativa ao exercício do ano a que respeitam – art.º 1.º, n.º3 deste Dec-Reg. - esta deve encontrar-se organizada de molde a permitir o controlo dos valores constantes dos respectivos mapas para o efeito elaborados – seu art.º 22.º, n.º4 – bem como devem tais contabilizações encontrar-se apoiadas em documentos justificativos que facilmente dêem a conhecer o seu sentido e alcance, nos termos do disposto no art.º 98.º, n.º3, alínea a) do CIRC, norma que constitui o afloramento de um princípio geral(2), pelo que por sua carência não pode, em princípio, o respectivo custo ser aceite, ainda que possam vir a ser utilizados outros meios de prova para suprir essa falta, sem prejuízo das sanções aplicáveis por tal falta, tendo em vista demonstrar esse custo e o bem fundado desse lançamento na contabilidade, como constitui jurisprudência corrente.

No caso, na falta de tal prova documental como suporte de tal lançamento relativo a tal verba como custo por perda por tal imobilização corpórea e nem a tendo a ora recorrente mais tarde vindo a produzir (quer por documentos quer por prova testemunhal que, aliás, nenhum arrolou), não pode, por este fundamento, deixar de improceder este ponto da matéria do recurso.

Relativamente a esta mesma verba, veio ainda a ora recorrente esgrimir com a alteração pela AT da fundamentação desta desconsideração após o direito de audição – cfr. matéria da sua alínea d.- por violação do art.º 60.º da LGT, que igualmente a sentença recorrida não aceitou, por continuar a existir o primitivo e primeiro fundamento por que tal custo não foi aceite – falta de prova do abandono das instalações em causa por rescisão do contrato de arrendamento existente – ainda que outros lhe tenham sido acrescentados, pelo que sempre a desconsideração de tal verba como custo seria de manter pela primeira parte dessa fundamentação relativa a tal falta de prova e onde o direito de audição foi regularmente exercido, e mantida incólume mesmo após o exercício do direito de audição, bem como fundou (também) a correspondente liquidação, fundamentação que se nos afigura de seguir.

A Lei n.º 16-A/2002, de 31 de Maio, pelo seu art.º 13.º veio, entre outras alterações, dar nova redacção ao n.º3 do art.º 60.º da LGT, expressando dispondo a audição do contribuinte, de novo, quando a AT após a primeira audição do contribuinte venha a invocar factos novos sobre os quais o mesmo ainda se não tenha pronunciado, desta forma visando evitar que o mesmo fosse ouvido sobre um certo projecto de decisão e depois se visse confrontado com um outro final, totalmente diferente, para si desconhecido, caso em que o exercício do direito de audição não passaria de um mero exercício sem conteúdo efectivo, bem se justificando que o contribuinte seja de novo ouvido sobre estes novos factos e sobre os quais irá assentar o posterior acto de liquidação.

Porém, não foi isto que aconteceu no caso, mas sim que perante um fundamento só por si susceptível de levar a tal desconsideração dessa verba como custo do exercício, após o direito de audição, a AT manteve esse mesmo fundamento em primeiro lugar e veio a acrescentar-lhe outros, que no seu entender também se verificavam, mas como não deu cumprimento a novo direito de audição quanto a eles, a sanção só poderá ser a desconsideração destes para estear tal liquidação, mas não de inquinar toda a liquidação desta verba, já que a mesma continua suportada em fundamento em relação ao qual nenhum vício formal ocorreu, no que a tal direito de audição diz respeito, desta forma improcedendo também esta vertente do pretendido vício do acto de liquidação.

Quanto a esta mesma verba veio a ora recorrente ainda esgrimir com a matéria constante das conclusões e. e f., por ter dado cumprimento ao disposto no art.º 10.º, n.º3 do citado Dec-Reg., n.º 2/90 (comunicação à Direcção Geral das Contribuições e Impostos de exposição fundamentada dos motivos que levaram a tais desvalorizações excepcionais), factualidade que não faz parte da fundamentação dos motivos que levaram a tal desconsideração dessa verba, como bem se observa na sentença recorrida, desta forma sendo inócua para poder inquinar de ilegalidade a liquidação que a ela se não arrima, como é bem de ver, pelo que igualmente improcede a matéria destas conclusões recursivas.


4.2. Passamos agora a conhecer da verba desconsiderada pela AT de € 15.000,00 relativo a um donativo à “B...”, fundado num recibo de 2-9-2002, desta forma não tendo respeitado o princípio da especialização dos exercícios contido na norma do art.º 18.º do CIRC, já que tal custo antes seria relativo ao exercício do ano de 2002, fundamentação que a sentença recorrida integralmente aceitou.

Na matéria das suas conclusões g. a i., vem a ora recorrente desde logo pretender arrimar-se à fundamentação utilizada na sentença recorrida para julgar a impugnação procedente quanto ao outro donativo à “C...”, pelo que também quanto àquela outra entidade deveria valer, que se tratou de uma verdadeira liberalidade e cujo custo foi incorrido em 2003, ainda que pago antecipadamente, pelo que o mesmo não deveria ser desconsiderado como um custo do exercício.

Desde logo convém precisar que o fundamento da desconsideração pela AT das verbas como custos por donativos àquelas duas entidades assentaram em fundamentos diversos, como se pode ver do respectivo relatório do exame à escrita, como aliás, a sentença recorrida não deixa de fundamentar, desta forma tendo julgado a impugnação procedente quanto os donativos relativos à “C...” mas não quanto aos relativos à “B...”, bem invocando que a desconsideração em relação a esta assentou unicamente na violação do princípio da especialização dos exercícios contido na norma do art.º 18.º do CIRC, na medida em que o recibo de tal quantia passado por esta entidade era de 2002 e o respectivo custo apenas foi relevado no exercício de 2003.

Nos termos do disposto no art.º 18.º do CIRC, os proveitos e os custos, assim como as outras componentes positiva sou negativas do lucro tributável, são imputadas ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios, princípio que embora não seja absoluto(3), sempre se tem em vista não permitir ao contribuinte manipular o apuramento do lucro tributável de acordo com aquilo que for mais conveniente para a respectiva tributação, devendo as circunstâncias imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas que não permitiram ao contribuinte determinar-se pelo cumprimento da regra da imputação dos custos ou proveitos ao exercício do ano a que diziam respeito previstas no n.º2 do mesmo artigo, serem por este invocadas e provadas(4).

No caso, por remissão que a mesma fez das razões porque tais donativos deveriam ser aceites para a “C...” – cfr. art.º 103 da sua petição de impugnação – os mesmos cingem-se a que embora o donativo tenha sido documentado por recibo de 2002, o mesmo foi efectivamente incorrido no exercício do ano de 2003, o que agora repete na matéria da sua conclusão i., mas nenhuma prova veio fazer de que assim seja, desta forma não podendo ser desconsiderado o documento de suporte de um custo existente na sua escrita quanto ao seu âmbito temporal, pelo que igualmente improcede a matéria das conclusões do recurso relativas a tal questão.


4.4. Na matéria da suas conclusões j. a m. continua a ora recorrente a não aceitar que o custo relativo a € 1.905.761,97 como tal não seja considerado, bem como a insurgir-se com a sentença recorrida por não ter anulado também a liquidação relativa a esta verba, que entende padecer de duplo vício, quer por falta de fundamentação, quer por errónea interpretação do art.º 17.º do EBF.

Como se pode colher da matéria fixada no ponto 2. do probatório da sentença recorrida, extraída do relatório do exame à escrita e não contrariada por qualquer uma outra e nem a ora recorrente a veio colocar validamente em causa ao abrigo do disposto no art.º 690-A do CPC, na redacção então vigente e a aplicável, tal custo não foi aceite porque não houve criação líquida de postos de trabalho para jovens, de acordo com as folhas pela mesma remetidas à Segurança Social, não se vendo como se pode sequer falar de falta ou insuficiência desta fundamentação (formal) de tal não aceitação desse custo, quando a factualidade avançada pela AT e as normas legais aplicáveis, designadamente a do art.º 17.º do EBF, apenas autorizam a aceitação de tal custo do exercício, perante a “criação líquida de postos de trabalho” e não quando ocorra diminuição do número desses postos de trabalho, como no caso aconteceu, pelo que é manifesta a fundamentação formal, não podendo o destinatário do acto, enquanto seu destinatário normal dele não ficar esclarecido por que o mesmo teve lugar e não qualquer um outro, pelo que não pode deixar de improceder a matéria relativa a tal falta de fundamentação.

Tal benefício fiscal com majoração dos custos incorridos no exercício relativo à “criação de postos de trabalho para jovens”, foi aditado ao EBF pela Lei n.º 72/98, de 3 de Novembro, através do seu art.º 48.º-A, sob a epígrafe, Criação de empregos para jovens, a que veio a corresponder o art.º 17.º do mesmo EBF na redacção do Dec-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho, e tinha como pressupostos entre outros, que no exercício em causa houvesse a “criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos”, ou seja, que no final do exercício o número de trabalhadores nestas condições fosse superior ao existente no início do exercício, só desta forma havendo um aumento líquido da criação de postos de trabalho, tendo o número dos admitidos de ser superior ao número dos que deixaram de o ser no final do exercício, interpretação que vem sendo seguida pela jurisprudência do STA(5) e com a qual inteiramente se concorda, face à sua evolução legislativa e aos termos em que tal majoração veio sendo postulada pelo legislador.

No caso, como a ora recorrente não reunia estes requisitos, já que final do exercício apresentava menos trabalhadores que no seu início, como não se encontra em causa, não pode beneficiar do mesmo benefício, bem como não tendo obtido da AT qualquer informação, nem prévia e nem vinculativa, quanto a esta questão, como acima se analisou, no âmbito da apreciação do recurso quanto à matéria de facto, não pode também deixar de improceder a matéria do recurso relativa a esta verba desconsiderada como custo pela AT, desta forma improcedendo na totalidade todas a matéria das conclusões das alegações do recurso.


É assim, de negar provimento ao recurso e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu (ainda que com o acrescento do probatório fixado nos termos supra).


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida.


Custas pela recorrente.


Lisboa, 01/02/2011

EUGÉNIO SEQUEIRA
ANÍBAL FERRAZ
LUCAS MARTINS





1- Ainda que, como adiante se verá, apenas o primeiro deles pode ser apto para a desconsideração deste custo.
2- Cfr. neste sentido o acórdão do STA de 6-10-1999, recurso n.º 23.817.
3- Cfr. neste sentido o acórdão do STA de 25-6-2008, recurso n.º 291/08-30.
4- Cfr. neste sentido os acórdãos do então Tribunal Tributário de 2.ª Instância de 17-3-1992 e de 26-3-1992, recursos n.ºs 60618 e 60867, respectivamente.
5- Cfr. os seus recentes acórdãos de 25-2-2009 e de 23-9-2009, recursos n.ºs 916/08 e 248/09, respectivamente, que no mesmo sentido decidiram.