Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:947/09.9BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:10/17/2019
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:TAXA DE PUBLICIDADE;
EXIGIBILIDADE;
CONSTITUCIONALIDADE.
Sumário:1 - Toda a publicidade de natureza comercial é sempre informativa já que leva ao conhecimento do público uma mensagem quanto mais não seja sobre a identificação de determinada entidade ou produto.

2 - Quando essa mensagem ou publicidade respeita a uma entidade que prossegue uma actividade lucrativa específica - como é o caso da recorrente, que actua num mercado livre em concorrência com outras entidades - todo o modo que publicamente a dá a conhecer não deixa de comungar desta natureza apelativa indissociável do objecto social da entidade que apregoa, ainda que indirectamente.

3 – A exposição de um logotipo no estabelecimento comercial em que empresa pretende comercializar os seus bens ou serviços constitui publicidade e, enquanto tal, a mesma encontra-se sujeita a licenciamento camarário.

4 - A distinção entre taxa e imposto assenta no carácter unilateral do imposto e no carácter bilateral ou sinalagmático da taxa, aqui correspondendo à prestação do particular, uma contraprestação específica, consubstanciada numa actividade do Estado ou de outros entes públicos especialmente dirigida ao respectivo obrigado, que se concretizará na prestação de um serviço público, no acesso à utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares.

5 – As mensagens publicitárias colocadas em propriedade privada, mas visíveis do espaço público, evidenciam uma prestação pública, traduzida na remoção de um obstáculo jurídico à actividade publicitária, que é relativamente proibida, ficando, pois, sujeita a um licenciamento prévio pelas Câmaras Municipais para «salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental».

6 - A existência de um nexo sinalagmático não implica forçosamente que exista um absoluto equilíbrio entre o valor económico das prestações.

7 – A liberdade de iniciativa privada tem um duplo sentido. Consiste, por um lado, na liberdade de iniciar uma actividade económica e, por outro lado, na liberdade de organização, gestão e actividade da empresa.

8 – A exigência fiscal pela via das taxas em causa resulta do dever legal de verificação dos pressupostos do licenciamento da actividade, de fiscalização e de salvaguarda de interesses públicos, não se vislumbrando qualquer restrição protegida pelo artigo 61º, nº1 da CRP.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

P.........., S.A. veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra o acto de indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada relativamente à liquidação da taxa de publicidade colocada na área de serviço de B....., referente ao ano de 2009.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

A. O presente recurso é interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra em 30/11/2017, retificada por despacho de 11/12/2017, que veio julgar improcedente a impugnação intentada pela ora Recorrente, mantendo, por conseguinte, os atos de liquidação de taxas emitidos pela Câmara Municipal de Cascais, referentes a taxas de publicidade na Área de Serviço sita na Estrada Municipal de B....., B....., Cascais, referentes ao ano de 2009.

B. No entender da ora Recorrente, a Sentença Recorrida claudicou na interpretação e aplicação do direito, tendo errado no julgamento das questões de direito quanto ao que se deve entender por conceito legal de publicidade, conforme se explicitou supra.

C. Neste sentido, a douta sentença proferida merece censura, requerendo-se desde já a V. Exas. a respetiva revogação e substituição por outra, que anule os atos de liquidação em causa.

D. Dão-se como provados os factos assentes na Sentença Recorrida e que, aqui, expusemos.

E. Os elementos afixados pela Recorrente no posto de abastecimento de combustíveis supra identificado, não integram, quer pela sua natureza, quer pela finalidade desses elementos, o conceito legal de publicidade definido no artigo 3.º, nem o conceito de atividade publicitária definida no artigo 4.º, ambos do Decreto-Lei n.º 330/90, de 23/10 (Código da Publicidade).

F. De facto, no caso concreto não estamos perante uma promoção de bens ou serviços da Recorrente, mas em face de uma mera identificação do seu nome e da sua marca, enquanto elementos distintivos e informativos do comerciante, cujo uso na prática comercial é absolutamente pacífico e disseminado.

G. O layout meramente identificativo da G..... não constitui publicidade, mas tão-somente um elemento informativo e distintivo do comerciante.

H. Pelo que não se poderão interpretar estes elementos como elementos publicitários por não se subsumirem ao conceito legal de publicidade, para efeitos de aplicação da taxa em apreço e a Sentença Recorrida incorreu em erro de julgamento, devendo, por conseguinte, ser a mesma revogada.

I. Do mesmo modo, a afixação dos preços nos postos de abastecimento é uma obrigação legal das empresas petrolíferas que operam no mercado nacional, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 170/2005, de 10 de outubro (alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 120/2008, de 10 de julho) – diploma que disciplina especialmente estas obrigações na atividade de comércio de combustíveis, em obediência às regras e princípios decorrentes do direito da concorrência, como se refere na sua nota preambular.

J. Do seu art. 3º, referente às menções obrigatórias dos painéis existentes nos postos de abastecimento fora das autoestradas:

“A informação sobre o preço de venda a retalho dos combustíveis vendidos nos postos de abastecimento ao público existentes fora das auto-estradas deve constar de um painel contendo, em caracteres legíveis e bem visíveis da via pública, uma relação de todos os combustíveis comercializados no posto de abastecimento em causa bem como o respectivo preço de venda ao público por litro, expresso em euros” (sombreado e sublinhado nossos).

K. Finalizando, quanto a este aspeto, o art. 4º: “Os painéis a que se refere o artigo 2.º do presente diploma não devem conter qualquer menção publicitária além da identificação do posto de abastecimento e das marcas dos combustíveis comercializados.” (sombreado e sublinhado nossos)

L. Da análise deste diploma e dos artigos citados, resulta que para o legislador as menções obrigatórias a constar dos painéis colocados à entrada dos postos de abastecimento, como sendo a indicação do nome da empresa comercializadora ou o seu logótipo, o nome/marca dos combustíveis e o respetivo preço não constituem publicidade!

M. A sua aposição pela Recorrente nestes termos assenta, assim, nesta lógica das obrigações legais que vinculam a Recorrente neste âmbito – assim como as demais empresas distribuidoras e revendedoras que operam no mercado nacional de combustíveis.

N. Desde logo, quer a natureza, quer a finalidade destes elementos, que compõem a estrutura das áreas de serviço, não se integram, como se disse, no conceito legal de publicidade, definido no artigo 3.º, nem no conceito de atividade publicitária definida no artigo 4.º, ambos do Decreto-Lei n.º 330/90, de 23/10 (Código da Publicidade), na medida em que não estamos perante uma promoção de bens ou serviços da entidade, mas de uma mera identificação do seu nome e dos preços praticados, seguindo obrigação legal.

O. Face ao exposto, verificou-se um erro sobre os pressupostos de direito em que assentou a liquidação das referidas taxas relativas a publicidade.

P. É vasta a doutrina que se pronuncia sobre “taxas” com este alcance e a jurisprudência respalda o nosso entendimento sobre o conceito de “publicidade”

Q. E nem se alegue, que este tributo se justifica pela geração de impacto ambiental negativo com a atividade – supostamente – publicitária, porque não se afigura como justificação possível à luz que já tivemos oportunidade de referir.

R. Acresce que a liquidação da “taxa” em causa à A. sempre seria ilegal e também inconstitucional.

S. Estamos perante uma nova categoria de “taxa” criada pelo Impugnado (v. arts. 8.º e 23.º do Regulamento Municipal de Publicidade no Município de Cascais), que permite a taxação de indicações apostas em postos de abastecimento de combustíveis implantados em propriedade privada.

T. Os “suportes publicitários” apesar de poderem ser utilizados no exercício de uma atividade, não são, em si mesmo, uma atividade, pelo que o art. 6.º/2 do RGTAL nunca poderia constituir a base legal para a norma Regulamentar em questão.

U. Ora, no caso em apreço, manifestamente não existem “investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local”, pelo que a tudo isto acresce que esta “taxa” não corresponde a uma verdadeira taxa, mas antes constitui um imposto ilegal.

V. Desde logo porque não se verifica a bilateralidade necessária para a qualificação de um tributo como taxa, nos termos do disposto no art. 4.º/2 da LGT, que as caracteriza pela sua bilateralidade e caráter sinalagmático, assente na equivalência entre o serviço concreto prestado ao sujeito passivo da taxa e o custo suportado pela entidade pública que prestou tal serviço e, ao não estar verificada a existência de um sinalagma, de uma contrapartida específica e individualizada a favor da Recorrente, não estamos perante uma taxa, mas perante um imposto.

W. Nas normas aqui em causa não se possa falar em taxa, mas se deve antes falar em imposto/contribuição, dado que as finalidades que poderiam justificar a existência de uma taxa carecem de um caráter sinalagmático e de uma mínima equivalência, que não se verificam.

X. Tendo isto em consideração, entendemos, justamente, que a atuação levada a cabo pela Impugnada leva a que se frustrem os indispensáveis elementos caracterizadores da taxa, a saber, a sua bilateralidade e o seu carácter sinalagmático, assentes na equivalência entre o serviço concreto prestado ao sujeito passivo da taxa e o custo suportado pela entidade pública que prestou tal serviço.

Y. A circunstância de poder estar no nosso caso presumida uma fiscalização permanente por parte do município deixa sem resposta a existência de um outro conjunto variado de taxas fixadas na Tabela de Taxas e que são impostas à Recorrente enquanto detentora de um posto de abastecimento de combustível.

Z. As taxas municipais cumprem finalidades de gestão pública ou de interesse público em geral, tendo que existir sempre um “carácter sinalagmático do nexo entre a imposição e uma prestação individualizável por parte do ente público” – cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 24/2009, proc. n.º 990/07. E no caso concreto, tal nexo não se vislumbra!

AA. O Acórdão n.º 316/2014 do Tribunal Constitucional veio julgar constitucional uma taxa incidente sobre elementos de um posto de combustível e, apesar disso, fê-lo com 5 (cinco) votos de vencido, de Conselheiros tão ilustres como, entre outros, João Caupers, Maria Lúcia Amaral, José da Cunha Barbosa, Carlos Fernandes Cadilha e Lino Rodrigues Ribeiro (sendo que também a Conselheira Ana Guerra Martins, apesar de votar a decisão, não a acompanhou em toda a sua fundamentação), sendo que a ora Recorrente acompanha na plenitude a douta argumentação dos Votos de Vencido!

BB. Entendendo que se está perante uma violação do estado de Direito, um esbulho do direito de propriedade, não existindo razão suficiente para permitir uma taxação por parte do Município desta atividade, sem qualquer contrapartida, sinalagma ou equivalência!

CC. E mais, o conceito de taxa do Acórdão 316/2014, do Tribunal Constitucional, está já – senão ultrapassado – pelo menos, em contradição com o posterior Acórdão 539/2015 daquele Venerando Tribunal.

DD. O confronto dos acórdãos nº 316/2014 e nº 539/2015 deixaria, só de si, antever que a jurisprudência constitucional relativa ao conceito de taxa e ao âmbito da reserva de lei parlamentar não se encontrava ainda estabilizada.

Estamos aqui perante duas decisões próximas no tempo, ambas tomadas em plenário, sobre tributos que, salvo o pormenor, possuem idêntica estrutura e finalidade — em ambos os casos, tributos que visam financiar a vigilância continuada de actividades geradoras de riscos públicos específicos.

EE. E, se não bastasse, veja-se, aliás, o mais recente Acórdão do Tribunal Constitucional – o Acórdão 33/2018, de 31/01/2018, proferido no Processo n.º 497/17 – que veio julgar inconstitucional uma taxa em tudo, tudo, semelhante à que estava em causa no Acórdão 316/2014, acompanhado, até, de uma declaração de voto da Ilustre Conselheira Maria José Reis Rangel de Mesquita, que subscreveu o mais recente entendimento constitucional de 2018, apesar de ter, também, acompanhado a Decisão do Acórdão 316/2014, considerando que teria de mudar a Sua posição.

FF. Como bem refere este Douto Acórdão, “não há, na verdade, nenhuma prestação administrativa, ainda que meramente hipotética, especificamente associada à componente «depósitos subterrâneos» de uma unidade de abastecimento de combustíveis. Na medida em que pretenda revestir forma comutativa, um tributo com tal incidência objetiva não pode deixar de se ter por arbitrário; a prestação administrativa não chega a ser presumida, sendo simplesmente ficcionada.” (sombreado e sublinhado nossos)

GG. O que aqui é referido, mutatis mutandis, é inteiramente aplicável à taxa aqui em crise, na medida em que não há nenhuma prestação administrativa que se possa presumir, não existindo, por isso, qualquer tipo de sinalagmaticidade.

HH. Da mesma forma que não existe qualquer contra-prestação por parte do Município, com esta taxa sobre publicidade, na medida em que se a lei isenta por um lado, não pode vir o Município criar outra “taxa” sob outra denominação para a mesma realidade fáctico-jurídica, chamando-se a isto fraude à lei, que deverá ser devidamente sancionada por V. Exas.

II. Nestes termos, e uma vez que não há qualquer contrapartida pública e esta tributação radica exclusivamente numa utilização particular dos bens (a afixação de mensagens de publicidade em postos de abastecimento privados), a norma que prevê esta “taxa” deverá ser considerada inconstitucional,

JJ. Na medida em que previu a criação de um imposto (ou, pelo menos de uma contribuição especial, mas que também se encontra submetida às exigências formais dos impostos) o que constitui matéria sob reserva de Lei da Assembleia da República ou de Decreto-Lei emitido pelo Governo a coberto de autorização legislativa da Assembleia da República (v. arts. 103.º/2 e 165.º/1/i) da CRP).

KK. Tal implica também que o acto de liquidação ora impugnado seja declarado nulo por inconstitucional (art. 204.º CRP), uma vez que na sua base se encontra uma norma inconstitucional, uma vez que resulta, deste modo, que estamos no presente caso perante um verdadeiro “imposto” não criado por lei e, como tal, inconstitucional!

LL. É manifesto também que o valor das taxas aqui em causa, todas somadas, é totalmente desproporcional e não equitativo, violando, assim, o artigo 266.º da Constituição e o artigo 4.º da Lei 53-E/2006.

MM. No caso aqui em exame é o que se verifica, sendo desproporcionado e inexistindo a mínima equivalência entre o custo do pretendido “serviço prestado” ou o presumido “benefício” para o particular na remoção da proibição e a atividade, sendo este entendimento sufragado pela Doutrina.

NN. a soma de todas essas taxas corresponde a um valor totalmente desproporcional e desprovido de qualquer equivalência com os custos incorridos pelo Município.

OO. Também perante a Doutrina Constitucional, decorre que o critério encontrado pelo Recorrido para fixar o montante das taxas a pagar, baseando-se única e exclusivamente na mera existência de um equipamento ou bem, já de si constitui uma total desproporção, que compromete a correspondência que deverá sempre existir entre o serviço prestado (o licenciamento) e a utilidade que a entidade que explora os postos retira, desde logo porque se impõe uma taxa sem qualquer tipo critério através do qual se possa medir qual o concreto e efetivo beneficio que se visa alcançar para o interesse público – desde logo as fiscalizações não o são, porque podem nem sequer existir.

PP. Face ao que as normas aqui em causa são inconstitucionais por violação da proporcionalidade e também ilegal por violação do principio da equivalência.

QQ. As normas aqui em causa, estão também a violar a liberdade de iniciativa económica da Recorrente: o Impugnado não permite que a Recorrente goze da liberdade de estabelecimento que lhe é assegurada pela Constituição da República Portuguesa, sem qualquer restrição, uma vez que existem graves prejuízos para a própria eficiência económica da sua atividade.

RR. Existe, deste modo, uma restrição abusiva à iniciativa económica privada proibida pela Constituição, enquanto restrição à liberdade de estabelecimento e de atividade da empresa privada – desde logo porque existe uma interferência por parte de uma entidade pública, no exercício da sua liberdade de iniciativa privada sem que para isso haja qualquer legitimação à luz do princípio da proporcionalidade, único que o poderia fazer.

SS. Esta intromissão dos poderes públicos é excessiva e não tem qualquer razão material suficiente, não sendo igualmente adequada aos fins públicos em vista de prover a um desincentivo da atividade, que só seria alcançado por outra via que não a de uma taxação em simultâneo com a taxação de toda a restante atividade económica aqui em causa.

TT. Face ao exposto, verifica-se que as normas aqui em causa violam também o artigo 61.º da Constituição.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso, e nessa medida, a douta sentença recorrida ser revogada, sendo, por conseguinte, anulado o ato tributário em apreço, como é de Lei e de Justiça!


*

A Recorrida veio apresentar contra-alegações, tendo expendido, a final, o seguinte quadro conclusivo:

1 - O presente recurso é interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra em 2017.11.30, retificada por despacho de 2017/12/11, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida relativa a taxas de renovação de publicidade, na área de serviço sita na Estrada Municipal de B....., referentes ao ano de 2009, no montante total de € 1.305,00 (mil trezentos e cinco euros).

2 - A Recorrente considera que a douta sentença merece censura por ter incorrido em erro sobre os pressupostos de direito em que assentou a liquidação das taxas relativas a publicidade e por não ter julgado ilegal e inconstitucional a sua liquidação em virtude de serem verdadeiros impostos, desproporcionais e restritivos da liberdade da iniciativa económica privada, devendo, por isso, ser revogada.

3 - Nos termos do disposto no artigo 3º, n.º 1, alínea a) do Código da Publicidade, "Considera-se publicidade, para efeitos .do presente diploma, qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de: a) Promover, com vista à sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços".

4 - A colocação do logótipo em diversos locais do posto de abastecimento e, em especial, a colocação de anúncios luminosos, no exterior dos edifícios integra o conceito de legal publicidade, uma vez que permite promover perante o público os produtos e serviços oferecidos com vista à comercialização, retirando o anunciante vantagens especiais da utilização do domínio público.

5 - Foi entendimento do Supremo Tribunal Administrativo (S.T.A.) que "Reclamos luminosos que são uma forma de comunicação feita no âmbito de uma actividade comercia/ com o objectivo de promover o fornecimento de bens ou serviços, constituem publicidade, nos termos do art. 3/1 do Código da Publicidade"(cfr. douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (S.T.A.), de 26 de Maio de 1999, proferido no Processo n°. 02355).

6 - A mensagem publicitária transmite-se aos potenciais clientes pelo facto de estes circularem na via pública, entendendo-se esta como "as estradas ou caminhos integrados no domínio público de circulação e sujeitos ao uso comum da generalidade dos cidadãos com liberdade igualdade e gratuitidade" (cfr. douto Acórdão do S.T.A., de 3 de Junho de 2003, proferido no Processo nº. 047835).

7 - Não obstante a afixação dos preços nos postos de abastecimento resultar da lei, os painéis "não devem conter qualquer menção publicitária além da identificação do posto de abastecimento e das marcas de combustíveis comercializados" conforme disposto no artigo 4º do Decreto-lei n.º 170/2005, de 10 de outubro,

8 - Este diploma considera que a identificação do posto e as marcas dos combustíveis constituem menções publicitárias, sujeitas a licenciamento, uma vez que obrigatoriedade de informação apenas abrange a indicação dos tipos e preços dos combustíveis comercializados.

9 - A atividade publicitária constitui, assim, uma atividade sujeita a limites de ordem pública e o respetivo licenciamento pela entidade competente visa salvaguardar o interesse, público em aspetos relacionados com o ambiente, a segurança das pessoas e coisas, a segurança da circulação rodoviária e a preservação dos edifícios, monumentos ou terrenos de interesse histórico, cultural, arquitetónico, paisagístico e arqueológico bem como o respeito pelos restantes utilizadores do espaço público.

10 - A Jurisprudência tem entendido que a publicidade de natureza comercial "é sempre informativa já que leva ao conhecimento do público uma mensagem quanto mais não seja sobre a identificação de determinada entidade ou produto." Mas quando essa mensagem ou publicidade respeita a uma entidade que prossegue uma atividade lucrativa específica, como é o caso da impugnante que atua num mercado livre em concorrência com outras entidades, todo o modo que publicamente a dá a conhecer não deixa de comungar desta natureza apelativa indissociável do objeto social da entidade que apregoa" (cfr. Sentença TAF Sintra, processo 1152/13.5BESNT).

11 - Veja-se a este propósito o Acórdão do STA de 04.10.2017, processo n.º 1180/16, "A identificação do estabelecimento permite de forma eficaz referenciar a empresa e consequentemente actividade comercial que desenvolve e, por isso, não pode deixar de ser considerada um fator de publicidade (tal como se retira, ainda, da alínea a) do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 105/98, de 24/04). O mesmo silogismo se aplica relativamente à descrição de determinados produtos naqueles estabelecimentos, o que permite a sua promoção para fins comerciais." Assim sendo, a afixação de mensagens publicitárias no exterior de postos de abastecimento de combustíveis permite promover perante o público os serviços e produtos oferecidos pelo anunciante, com vista à sua comercialização, enquadrando-se no conceito de "publicidade comercial" e, dessa forma, sujeita a tributação. "

12 - Bem andou o Tribunal a quo ao considerar que " a simples exposição de um logotipo no estabelecimento comercial em que a empresa pretende comercializar os seus bens ou serviços constitui publicidade e que, enquanto tal, a mesma se encontra sujeita a licenciamento camarário; E não sendo controvertido que o posto de abastecimento em causa tem expostos elementos identificativos da marca (cf. alínea I da factualidade assente), haverá que concluir que a taxa sindicada é exigível"

13 - Não havendo, por isso, violação do disposto no Decreto-lei n.º 170/2005, de 10 de outubro, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-lei n.º 120/2008, de 10 de julho, e do Decreto-lei n.º 330/90, de 23/10.

14 - Por outro lado, a Recorrente alega que estamos perante verdadeiros impostos/contribuições, devendo a cobrança destes tributos ser considerada inconstitucional.

15 - O Professor Sousa Franco define taxa como "uma prestação tributária (ou tributo) que pressupõe ou dá origem a uma contraprestação específica, resultante de uma relação concreta (que pode ser ou não de benefício) entre o contribuinte e um bem ou serviço público" (in Finanças Públicas e Direito Financeiro, Volume II, página 63).

16 - Sobre a distinção entre taxa e imposto dir-se-á, ainda, que o ponto fulcral reside "no carácter bilateral das primeiras e no carácter unilateral dos impostos. As taxas têm como correspectivo uma actividade do Estado dirigida ao respectivo obrigado, uma qualquer vantagem ou utilidade. A relação estabelecida entre as partes compreende obrigações para ambas, e não só para o contribuinte, como no imposto. Estas obrigações estão unidas juridicamente por um vínculo de reciprocidade ou de interdependência, que leva a caracterizar a taxa pelo seu caracter sinalagmático" (cfr. Diogo Leite de Campos e Mónica Horta Neves Leite de Campos in Direito Tributário, página 28, Almedina, 1997).

17 - O traço distintivo fundamental entre taxa e imposto é o da bilateralidade da primeira, encontrando-se cumprido este requisito desde que se verifique uma das situações previstas no artigo 3º da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, que aprovou o Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais: prestação de um serviço, utilização de bens do domínio público e privado municipal ou na remoção de um obstáculo jurídico à atividade dos particulares.

18 - A colocação de publicidade está sujeita a restrições administrativas e a atividade desenvolvida pela Câmara Municipal de Cascais de verificação dos pressupostos de licenciamento e do cumprimento dos limites legalmente impostos implicam uma contraprestação por parte da administração que visa de facto remover um obstáculo jurídico ao exercício de uma atividade.

19 - A posterior verificação da manutenção das condições inicialmente aprovadas (renovação) pressupõe também uma atividade de verificação da continuidade conformidade da mensagem publicitária com os limites legais por parte da Câmara Municipal com vista ao cumprimento da lei e a evitar riscos para as pessoas, bens, ordenamento urbano e ambiente que os elementos publicitários materializam.

20 - Tratando-se efetivamente de taxas cuja liquidação é legal, conforme defendido no Acórdão n.º 177/2010 do Tribunal Constitucional de 05.05.2010, do qual resulta em suma, que o licenciamento da afixação da mensagem publicitária, independentemente do suporte utilizado pelo particular - bem do domínio público ou bem pertencente a particular - implica uma verdadeira remoção de um obstáculo jurídico, quer se trate da licença inicial, quer se trate da renovação da mesma licença, porque se trata de uma atividade relativamente proibida nos termos da lei, sendo que esta prestação da Administração se enquadra no âmbito do nº. 2, do artigo 4°, da L.G.T.

21 - A Recorrente alega que se deve falar antes em imposto/contribuição, dado que não há na verdade "nenhuma prestação administrativa” invocando o recente Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 33/2018 de 31.01.2018.

22 - No referido Acórdão pode ler-se que " As contribuições distinguem-se especialmente das taxas porque não se dirigem à compensação de prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, mas à compensação de prestações que presumivelmente são provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, correspondendo a uma relação de bilateralidade genérica".

23 - Não é o caso dos presentes autos uma vez que não existe uma prestação "ficcionada", existindo uma verdadeira intervenção da Administração na verificação dos pressupostos para renovação do licenciamento, existindo, como ficou amplamente demonstrado uma efetiva contraprestação e não apenas um dever legal genérico.

24 - Na verdade, a licença de publicidade não se esgota num só momento, sendo que a respetiva renovação não é automática, implica a aferição da manutenção do cumprimento das condições que deram lugar ao licenciamento inicial, constituindo, por isso, uma relação jurídica duradoura.

25 - À Câmara compete verificar em concreto a existência das condições que permitem a renovação da licença de afixação de publicidade - mantendo ou não a remoção do obstáculo jurídico - existindo por isso uma efetiva contraprestação por parte da Administração.

26 - Pelo que, demonstrado fica que as taxas objeto dos presentes autos constituem a contrapartida da manutenção da remoção do obstáculo jurídico e da verificação dos pressupostos de ausência de riscos materiais para as pessoas, bens, ordenamento urbano e ambiente que os elementos publicitários materializam bem como assegurar o respeito pelos restantes utilizadores do espaço público.

27 - E não se diga que estas obrigações legais de verificação dos pressupostos do licenciamento se encontram a ser objeto de liquidação através de outras taxas, porque não é o caso do Município de Cascais.

28 - Bem andou o Tribunal a quo ao considerar que " a questão em apreço foi já objeto de amplo debate jurisprudencial (e inclusive de inflexão no entendimento defendido), vindo a fixar­ se jurisprudência no sentido de ter natureza de taxa, e não de imposto, o tributo incidente sobre licenciamento de painéis/anúncios publicitários instalados em propriedade privada e da não inconstitucionalidade orgânica ou formal da sua criação pelas Câmaras Municipais".

29 - E ao considerar que "Findo o prazo para o qual tinha sido concedida a remoção da proibição do exercício da atividade, torna-se necessário proceder à reavaliação da situação, do ponto de vista da permanência das condições legais de licenciamento o que justifica a cobrança de uma nova prestação tributária. Essa reavaliação é pressuposto da continuação da fruição, por um novo período, das utilidades propiciadas por tal atividade, no que o particular se trona interessado."

30 - Assim sendo, não restam dúvidas, que à data dos factos tributários, face ao regime legal de licenciamento da afixação de publicidade, que o tributo em apreço configura uma taxa e não um imposto: existe uma contrapartida da entidade administrativa, traduzida na efetiva remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares, que o enquadra no âmbito do artigo 3º da Lei nº. 53-E/2006, de 29 de dezembro.

31 - Ficando assim provado que o Município de Cascais tem legitimidade para criar normas regulamentares e liquidar taxas, nomeadamente pela concessão e renovação de licenças para afixação de publicidade, ao abrigo do disposto nos artigos 238º n.º 4 e 241º da C.R.P., nos artigos 10º e 15° da Lei nº 7/2007, de 15 de Janeiro, que aprovou a Lei das Finanças Locais, no artigo 8º do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais e nos artigos 1° e 11º da Lei n.º 98/88, de 17 agosto, que regula a afixação e inscrição de mensagens de publicidade e propaganda.

32 - As taxas liquidadas e objeto dos presentes cumprem o disposto no regime legal supra elencado e previsto no Regulamento Municipal de Publicidade do Município (artigos 4º e 23º) e no Regulamento de Cobrança e Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais para o ano de 2009 (artigos 68º, 69º e 76º).

33 - Concluindo-se pela inexistência de obstáculos legais à criação da taxa em apreço pela Assembleia Municipal de Cascais e, como tal, a sua exigência, não é ilegal e não viola qualquer disposição constitucional, nomeadamente o artigo 103º e a alínea i), do nº. 1, do artigo 165º, da C.R.P..

34 - No que concerne à alegada inconstitucionalidade por violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no n.º 2 do artigo 266º da CRP, dir-se-á que este princípio impõe que, na atuação administrativa, exista uma proporção adequada entre os meios empregues e o fim que se pretende atingir ( cfr. José Manuel Santos Botelho e Outros, Código do Procedimento Administrativo anotado e comentado, Almedina, 4ª Edição,2000).

35 - Tanto a doutrina como a jurisprudência têm considerado que a existência de nexo sinalagmático não implica que tenha forçosamente que existir um exato equilíbrio entre o valor económico de ambas as prestações, até porque nem sempre os bens utilizáveis são suscetíveis de ser aferidos segundo um valor económico preciso, como é o caso das taxas devidas pela publicidade.

36 - Não há qualquer indício na norma do Regulamento de Cobrança do Município de Cascais que fundamenta a liquidação das presentes taxas, nem nos factos provados nos presentes autos, de que o valor efetivamente cobrado seja excessivo ou desproporcionado de forma a pôr em causa, de modo evidente, a ideia de correspetividade que deverá estar presente na liquidação da taxa ( cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 365/2003, de 14.07.2003 e n.º 45/2010, de 03.02.2010).

37 - Também se tem entendido que é "necessário demonstrar que essa desproporção é manifesta e compromete de forma definitiva a correspectividade pressuposta na relação sinalagmática" ( cfr. Acórdão TCASUI de 26.06.2014, processo n.º 07700/14).

38 - Os valores das taxas cobradas encontram-se devidamente fundamentados e justificados no artigo 50 do Regulamento de Cobrança e Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais para o ano de 2009, conforme exigido na alínea c) do n.0º1 do artigo 8° da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro, não existindo violação do princípio da proporcionalidade e da equivalência.

39 - Por último, a Recorrente alega que existe violação do direito à livre iniciativa económica privada.

40 - Não estamos perante um direito absoluto mas antes um direito que, quer em termos constitucionais quer em termos legais, se mostra e pode ser objeto de introdução pelo Estado de limites e de restrições decorrentes, mormente, do "interesse geral".

41 - É a própria lei que impõe limites/restrições a este direito quando confere competências às Câmara Municipais para o licenciamento/renovação da atividade publicitária.

42 - O Município limita-se a atuar dentro dos limites previstos na lei com vista a evitar abusos para os particulares e a salvaguardar os interesses do público em geral, não se intrometendo nos poderes de gestão das empresas, nem esvaziando de conteúdo a liberdade de estabelecimento, não existindo, por isso, violação do disposto no artigo 61º da CRP..

43 - Razões pelas quais não restam dúvidas que a douta sentença recorrida deve ser confirmada.

Nestes termos e com o douto suprimento de Vossas Exas., deve ser negado provimento ao recurso sub judice e a sentença recorrida ser confirmada por não se verificarem os fundamentos invocados pela Recorrente.

Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!


*

A Exma. Magistrada do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer onde concluiu no sentido de não ser concedido provimento ao recurso.

*

Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.

*

2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:

“Com relevância para a decisão, tendo em conta a documentação junta aos autos e constante do Processo Administrativo (PA), bem como a posição assumida pelas partes, consideramos provados os seguintes factos:

A) A Impugnante, P.........., SA, com o NIF .........., é proprietária do prédio urbano, situado no "Lugar de B.....", com área coberta de 245 m2 e descoberta de 1.979 m2, descrito como "Posto de abastecimento de combustíveis líquidos e lubrificantes para veículos automóveis, com edifícios de apoio "Loja de conveniência". Área coberta: 160m2 – Lavagem automática – área coberta: 85 m2 – Estacionamento de viaturas, arruamentos de acesso e logradouro com 1 979 m2". – cf. Doc. 7 junto pela Impugnante - Certidão Predial Permanente com o código PP-.........., referente à ficha n.º .........., a fls. 25 e 26

B) Em Abril de 1998, a Impugnante requereu à Câmara Municipal de Cascais o licenciamento de publicidade para o posto localizado na Estrada Municipal …, em – B..... – Cascais. – cf. formulário – requerimento, constante do PAT apenso não numerado

C) Em 28 de Junho de 1999, foi deferido o pedido descrito na alínea anterior e a Câmara Municipal de Cascais emitiu o Alvará de Licença para Publicidade Comercial n.º ........../99, referente a "1 reclame luminoso c/ 11,7m2; 1 placa c/1,16 x 0,80m; 1 reclame luminoso c/ 6m x 0,7m na estação de serviço sita na estrada municipal … em B.....", válido entre 1 de Agosto e 31 de Dezembro de 1999, com renovação automática e validade sujeita à liquidação da taxa devida. – cf. Alvará de Licença para Publicidade Comercial n.º ........../99, constante do PAT apenso não numerado

D) Em 4 de Março de 2009, o Município de Cascais informou a Impugnante, P.........., SA, com o NIF .........., que se encontrava a pagamento, durante o mês de Março, a taxa de publicidade, "relativa ao processo N.º 3031 referente ao ano de 2009", no valor global de € 1.305, com a seguinte descrição:


"Texto integral no original; imagem"


– cf. Doc. 2 junto pela Impugnante – Ofício n.º 0….., da Câmara Municipal de Cascais, de 4 de Março de 2009, a fls. 20

E) Em 13 de Março de 2009, a Impugnante, pagou à CÂMARA MUNICIPAL DE CASCAIS, a quantia de € 982,68, referente aos seguintes encargos:


"Texto integral no original; imagem"


– cf. Doc. 3 junto pela Impugnante - Guia de Recebimento, n.º 2055, a fls. 21

F) Em 13 de Março de 2009, a Impugnante, pagou à CÂMARA MUNICIPAL DE CASCAIS, a quantia de € 71,40, referente aos seguintes encargos:


"Texto integral no original; imagem"


– cf. Doc. 4 junto pela Impugnante - Guia de Recebimento, n.º 2051, a fls. 22

G) Em 13 de Março de 2009, a Impugnante, pagou à CÂMARA MUNICIPAL DE CASCAIS, a quantia de € 166,28, referente aos seguintes encargos:


"Texto integral no original; imagem"


– cf. Doc. 5 junto pela Impugnante - Guia de Recebimento, n.º 2052, a fls. 23

H) Em 13 de Março de 2009, a Impugnante, pagou à CÂMARA MUNICIPAL DE CASCAIS, a quantia de € 84,64, referente aos seguintes encargos:


"Texto integral no original; imagem"


– cf. Doc. 6 junto pela Impugnante - Guia de Recebimento, n.º 2053, a fls. 24

I) A pala da cobertura da ilha de enchimento, a ilha de abastecimento, os edifícios de apoio e de lavagem, a ilha de ar-água e de aspiração, e o expositor de garrafas de gás, têm aposto um símbolo da G..... e dizeres identificativos do posto de combustível. – facto confessado no artigo 23º da petição inicial e fotos constantes do PAT apenso não numerado

J) Em 6 de Abril de 2009, a IMPUGNANTE deduziu reclamação graciosa do acto de liquidação identificado na alínea D) supra. – cf. Doc. 1 junto pela Impugnante – requerimento de reclamação graciosa, a fls. 12 a 19

K) Em 2 de Setembro de 2009, a Impugnante recebeu uma carta remetida pelo Município de Cascais, com a "Ref.ª Dlae/Publicidade …..", que a informava da proposta de indeferimento do requerimento por si apresentado, referente a taxas de publicidade da área de serviço de B...... - cf. Ofício n.º 0….., de 1 de Setembro de 2009, da Câmara Municipal de Cascais, e aviso de recepção, constante do PAT apenso não numerado

*

FACTOS NÃO PROVADOS

Não foram alegados outros factos com relevância para a decisão da causa e que devam ser registados como não provados.

*

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou desde logo da posição das partes assumida nos articulados, complementada com o exame dos documentos e das informações oficiais constantes dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, conforme referido no probatório”.


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2.2. De direito

Há agora que apreciar o recurso que nos vem dirigido.

Tal como mencionado na sentença sob recurso, na impugnação judicial deduzida a Impugnante, ora Recorrente, imputou dois vícios à taxa de publicidade contestada: (i) inexigibilidade e (ii) inconstitucionalidade.

Quanto ao primeiro fundamento, e em síntese, defendia a Petróleos de Portugal que a taxa em causa é inexigível por não incidir sobre qualquer estrutura publicitária, advogando que as estruturas existentes no posto de combustível visam cumprir com as obrigações legais de afixação de preços e de identificação dos serviços ali prestados.

O TAF de Sintra não acolheu tais razões e decidiu pela improcedência de tal fundamento.

Para assim concluir, a Mma. Juíza alinhou, além do mais, o seguinte discurso fundamentador:

“(…) O Regulamento Municipal de Publicidade do Município de Cascais aplica-se a "a qualquer forma de publicidade de natureza comercial e a todos os suportes ou meios de afixação de mensagens publicitárias", como determina o seu artigo 2º, excepcionando na alínea b) do artigo seguinte os "editais, notificações e demais formas de informações que se relacionem directa ou indirectamente, com o cumprimento de prescrições legais ou com a utilização de serviços públicos".

Resulta da alínea I) da factualidade assente que o posto de combustível em análise contém elementos identificativos da marca de combustível ali vendida. Tal facto é, dir-se-á, notório e de conhecimento público, porquanto qualquer cidadão (seja ou não condutor), identificará várias marcas de combustível apenas pelas indicações constantes nos vários postos de abastecimentos espalhados pelas vias públicas.

Vejamos então se tais menções se subsumem ao conceito de publicidade, definido na lei.

A este respeito, determina o artigo 3º do Código da Publicidade, o seguinte:

"1 - Considera-se publicidade, para efeitos do presente diploma, qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de:

a) Promover, com vista à sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços;

b) Promover ideias, princípios, iniciativas ou instituições. (…)".

E, ainda a este respeito, acrescenta o artigo 14º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de Junho, a propósito da simplificação do livre acesso e exercício das actividades de serviços, dispõe que se entente por "«publicidade comercial» qualquer forma de publicidade destinada a promover, directa indirectamente, bens, serviços ou a imagem de uma empresa, organização ou pessoa que exerça uma profissão regulamentada ou uma actividade comercial, industrial ou artesanal".

Podemos, pois, afirmar que a publicidade consiste na acção dirigida ao público com o objectivo de promover, directa ou indirectamente, produtos, serviços ou uma actividade económica.

Deste modo, a exposição no exterior de um edifício da denominação da empresa e respectivo logótipo, enquanto sinal distintivo dos comerciantes, terá de ser entendida como publicidade.

Este tem sido justamente o entendimento do Supremo Tribunal Administrativo (STA), que, e este respeito, afirma que os "anúncios luminosos com a sigla e o logótipo da recorrente A………, SA instalados nos postos de abastecimento sitos nos locais identificados no probatório (als A)/G), enquanto sinais distintivos da empresa devem ser considerados manifestações de publicidade comercial na medida em que constituem formas de comunicação por entidade privada, com o objectivo directo ou indirecto de promover a imagem da empresa e os bens e serviços que disponibiliza ao público no âmbito da sua actividade comercial (art. 3° Código da Publicidade aprovado pelo DL n°330/90, 23 outubro; art.14° n° 2 DL n° 92/2010, 26 junho)". (cf. acórdão proferido em 25 de Fevereiro de 2015, no processo n.º 0702/14)

Sendo certo que a identificação do estabelecimento permite identificar a empresa e, consequentemente, a actividade comercial que desenvolve, haverá que concluir que tal identificação, ainda que consista somente na exposição do logotipo, constitui um factor de publicidade.

Ora, a possibilidade de afixação de mensagens publicitárias resulta de um procedimento de licenciamento previamente desencadeado junto das câmaras municipais, no caso em apreço, Câmara Municipal de Cascais, enquanto entidade competente, nos termos do n° 2 do artigo 1° da Lei n°. 97/88, de 17 de Agosto e do artigo 24º do Regulamento de Cobrança e Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais do Município de Cascais, publicado no Diário da República n.º 250, 2ª Série, de 30 de Dezembro de 2012.

Este procedimento de licenciamento de afixação de publicidade visa salvaguardar o interesse público em aspectos relacionados, designadamente, com a estética ou ambiente dos lugares ou da paisagem, com danos que a afixação de publicidade possa provocar a terceiros, com a protecção do património histórico, cultural, arquitectónico ou paisagístico, a segurança das pessoas e bens que circulam na via pública.

Deste modo, concluindo que a simples exposição de um logotipo no estabelecimento comercial em que empresa pretende comercializar os seus bens ou serviços constitui publicidade e que, enquanto tal, a mesma se encontra sujeita a licenciamento camarário;

E não sendo controvertido que o posto de abastecimento em causa tem expostos elementos identificativos da marca (cf. alínea I da factualidade assente), haverá que concluir que a taxa sindicada é exigível.

Improcede pois, o primeiro vício suscitado”.

Desde já se adianta que o assim decidido deve ser mantido, o que, aliás, resulta de recente jurisprudência deste TCA que, no processo 977/12.3 BESNT, sobre a mesma questão se debruçou e que aqui se recupera (cfr. acórdão de 16/09/19).

Lê-se em tal aresto:

“ A Recorrente continua a sustentar que « (…) os elementos afixados pela Recorrente no posto de abastecimento de combustíveis supra identificados, não integram, quer pela sua natureza, quer pela finalidade desses elementos, o conceito legal de publicidade definido no artigo 3.º, nem o conceito de actividade publicitária definida no artigo 4.º, ambos do Código da Publicidade.» [Conclusão RR] e ao assim entender o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento.

Como se consignou no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 14.04.2016, proferido no processo n.º 452/12.6BEPNF:

«(…) Aqui, voltando ao citado Ac. do S.T.A. de 25-02-2015, Proc. nº 702/14, www.dgsi.pt, cabe ter presente que “… A primeira nota que se nos oferece realçar é a de que toda a publicidade de natureza comercial ou outra é sempre informativa já que leva ao conhecimento do público uma mensagem quanto mais não seja sobre a identificação de determinada entidade ou produto. Mas quando essa mensagem ou publicidade respeita a uma entidade que prossegue uma actividade lucrativa específica como é o caso da recorrente que actua num mercado livre em concorrência com outras entidades todo o modo que publicamente a dá a conhecer não deixa de comungar desta natureza apelativa indissociável do objecto social da entidade que apregoa ainda que indirectamente.

Daí que não se possa deixar de concordar com a sentença recorrida.

Como aliás decorre do artigo 3º do Código da Publicidade quando dispõe:

«1 - Considera-se publicidade, para efeitos do presente diploma, qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial; industrial; artesanal ou liberal; com o objectivo directo ou indirecto de:

a) Promover, com vista à sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços;

b) Promover ideias, princípios, iniciativas ou instituições.

E o artigo 14º, nº 2 do DL n.º 92/2010, de 26 de Junho quando prescreve:

«2 - Entende-se por «publicidade comercial» qualquer forma de publicidade destinada a promover, directa indirectamente, bens, serviços ou a imagem de uma empresa, organização ou pessoa que exerça uma profissão regulamentada ou uma actividade comercial; industrial ou artesanal.»

Donde não se pode deixar de considerar-se com a sentença recorrida estarmos em presença de publicidade de natureza comercial. …”.

Na verdade, os elementos a que alude a Recorrente vão muito para além da mera informação ao público dos sinais que visam identificar os estabelecimentos comerciais - posto de combustível -, nomeadamente pela frequência que são utilizados. Não significa isto, como se disse, que tais elementos não tenham um carácter informativo do público, na medida em que esse carácter de divulgação ou informação é inerente a toda e qualquer mensagem publicitária, seja ela comercial ou não.

Com efeito, a mensagem vinculada pela Recorrente não é neutra na medida em que respeita a uma entidade que prossegue fins lucrativos, no âmbito de uma actividade comercial, exercida em concorrência com outras entidades, sendo tais elementos característicos e diferenciadores dos produtos por si comercializados, perante outras entidades que prosseguem fins idênticos, pelo que não deixam de partilhar esta natureza concorrencial.

Aliás, é sabido que o anunciante utiliza, com muita frequência, formas agressivas de comunicação em termos luminosos, gráficos ou até de dimensão e destaque físicos, sendo que esta visualização tem efeitos intrusivos no ambiente da via comunitária, sendo que o benefício obtido prende-se exactamente com a possibilidade de os elementos em causa poderem ser visíveis e tidos em conta por quem circula nos espaços públicos planificados pelos Municípios e cuja preservação como ecologicamente sadios lhes compete.

Assim, se atentarmos na definição de mensagem publicitária, constante do artigo 3º do Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de Outubro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 6/95, de 17 de Janeiro, que define publicidade como “qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de: a) Promover, com vista a sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços; b) Promover ideias, princípios, iniciativas ou instituições”, facilmente se conclui que os elementos em causa constituem publicidade com carácter comercial.

Acresce que, na transposição da Diretiva nº 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro, efectuada através do Decreto-Lei nº 92/2010, de 26 de Junho, que estabelece os princípios e as regras necessárias para simplificar o livre acesso e exercício das actividades de serviços, foi definida como “publicidade comercial” “qualquer forma de publicidade destinada a promover, directa ou indirectamente, bens, serviços ou a imagem de uma empresa, organização ou pessoa que exerça uma profissão regulamentada ou uma actividade comercial, industrial ou artesanal” - art. 14º -, o que quer dizer que os elementos de publicidade em causa, à luz da unidade do sistema jurídico, configuram publicidade comercial, não podendo conceder-se abrigo ao exposto pela Recorrente também quanto a esta matéria, sendo que não tem qualquer relevo nesta sede o facto de a Recorrente ter visto a sua posição sufragada em decisões de 1ª Instância que identifica nos autos. (…)» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Portanto, ao contrário do pretendido pela recorrente, os elementos de publicidade em causa (identificação do estabelecimento), à luz da unidade do sistema jurídico, configuram publicidade comercial”.

Improcede, pois, e sem necessidade de mais nos alongarmos, esta primeira questão que vínhamos analisando.


*

Avançando.

A Impugnante, aqui Recorrente, sustentou a inconstitucionalidade da taxa impugnada, porquanto os elementos identificativos que constituem o objecto de tributação encontram-se apostos em propriedade privada, concluindo que se está perante um imposto e, como tal, tais taxas são orgânica e materialmente inconstitucionais.

Mais uma vez, o TAF de Sintra não reconheceu razão à P...... Neste recurso, insurge-se a Recorrente contra o decidido, reiterando a argumentação avançada.

Sobre tal questão escreveu-se na sentença o seguinte:

“(…) Desde já se dirá, por não se tratar de uma questão nova, que não assiste razão à Impugnante

A questão em apreço foi já objecto de amplo debate jurisprudencial (e inclusive de inflexão no entendimento defendido), vindo a fixar-se jurisprudência no sentido de ter natureza de taxa, e não de imposto, o tributo incidente sobre o licenciamento de painéis/anúncios publicitários instalados em propriedade privada e da não inconstitucionalidade orgânica ou formal da sua criação pelas Câmaras Municipais.

Com efeito, é incontroverso que a distinção entre taxa e imposto assenta no carácter unilateral do imposto e no carácter bilateral ou sinalagmático da taxa, aqui correspondendo à prestação do particular, uma contraprestação específica, consubstanciada numa actividade do Estado ou de outros entes públicos especialmente dirigida ao respectivo obrigado, que se concretizará na prestação de um serviço público, no acesso à utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares. (neste sentido, José Casalta Nabais, em "Por Um Estado Fiscal Suportável" – Estudos de Direito Fiscal, 2005, pág. 441; Alberto Xavier, em "Manual de Direito Fiscal", I, 1981, págs. 42 e ss., Sousa Franco, em "FINANÇAS PÚBLICAS E DIREITO FINANCEIRO", II, 2008, págs. 58 e ss., ou Saldanha Sanches, "MANUAL DE DIREITO FISCAL", 2002, págs. 9 e ss.)

E, como acima referimos e resulta da exposição das partes, esta questão foi objecto de amplo debate doutrinário e jurisprudencial, tendo inicialmente vingado a tese defendida pela Impugnante.

Porém, o próprio Tribunal Constitucional reviu a sua posição quanto a esta questão, vindo a assentar jurisprudência no sentido expresso no Acórdão n.º 177/2010, de 5 de Maio, decidido em Plenário e por unanimidade (no qual estava em causa a constitucionalidade do artigo 2.º do Regulamento de Taxas e Licenças e do artigo 31.º da Tabela de Taxas do Município de Guimarães, na medida em que prevêem a cobrança da taxa aí referida pela afixação de painéis publicitários em prédio pertencente a particular), que veio a alterar o sentido daquela sua anterior jurisprudência e, consequentemente, a não julgar organicamente inconstitucionais tais normativos.

Assim, e com relevância para o caso em apreço, aqui se transcrevem alguns excertos do citado acórdão, por relevantes para a questão em apreço:

“(…) com a promulgação da Lei Geral Tributária (aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro). Na verdade, o artigo 4,º, n.º 1, desse diploma veio explicitar que «as taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares». De igual modo, a Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro (alterada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, e pela Lei n.º 117/2009, de 29 de Dezembro), que aprova o regime geral das taxas das autarquias locais, consagra, no artigo 3.º, idêntica categorização. (...)

Mas a adopção, pelo legislador ordinário, deste conceito de taxa, posto que não deva ser desconsiderada, não resolve a questão de constitucionalidade.

Trata-se, na verdade, de um conceito vigente na ordem infraconstitucional, sem qualquer garantia “automática” de aplicabilidade no plano da Constituição. (…)

Mas o tratamento da questão, no específico plano jurídico-constitucional, não pode ignorar este dado legislativo, pois o que urge saber, ao fim e ao cabo, é se há fundamento para nos afastarmos do conceito de direito ordinário. Não havendo, nesta matéria, uniformidade de posições doutrinais, “o mais” da consagração legislativa de uma das duas orientações em confronto, sem ser decisivo, deve contar, na apreciação a fazer quanto à noção de taxa presente na disciplina constitucional. E, nesta perspectiva, não é descabido considerar que o ónus da argumentação incide com peso acrescido sobre os que entendem ser aquele conceito imprestável, no plano da normatividade constitucional. Importaria deixar a claro que, com a noção mais extensiva de taxa, ficam libertos das exigências constitucionais respeitantes à imposição de impostos tributos que, de acordo com a teleologia própria dessas exigências, a elas deveriam ficar submetidas.

Ora, não vemos que tenha sido avançado, nem na doutrina, nem na jurisprudência, qualquer argumento no sentido de que a noção de taxa, tal como estabelecida no artigo 4.º, n.º 1, da LGT, e no artigo 3.º da RGTAL, contemplando como modalidade autónoma a prestação exigível pela remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares, “não serve” ao princípio da legalidade no domínio fiscal, por comprometer as valorações que lhe subjazem.

Não só isso não foi feito como, pelo contrário, já se argumentou convincentemente no sentido da adequação do conceito de direito ordinário às razões constitucionais de diferenciação do tratamento das duas espécies de tributos.

Essa ideia já encontra eco na declaração de voto do Conselheiro Benjamim Rodrigues, apensa aos Acórdãos n.º 436/2003 e n.º 34/2004, onde se salienta que, com a qualificação dos tributos em causa como taxas, seguramente que não saem “postergadas as exigências garantísticas que fundamentam a distinção funcional dos conceitos”. (…)

A emissão da licença, o mesmo é dizer, o levantamento do obstáculo jurídico (que já vimos não ser arbitrário) dá origem a uma relação com o obrigado tributário distinta da que intercede com a generalidade dos administrados, no quadro da qual a entidade emitente assume uma particular obrigação – a duradoura obrigação de suportar (pati) uma actividade que, embora respeitando aqueles deveres, interfere permanentemente com a conformação de um bem público. Com o licenciamento, alteram-se as posições jurídicas recíprocas de administração e administrado, ficando aquela onerada, enquanto a situação persistir, com uma obrigação até aí inexistente. Inversamente, o anunciante ganha título para uma activa e particular fruição, em termos comunicacionais, do espaço ambiental, necessária à realização da utilidade individual procurada, a qual não se confunde com o gozo passivo desse espaço, ao alcance da generalidade dos cidadãos (cfr., todavia, o Acórdão n.º 437/2003). Em exclusivo proveito próprio, um sujeito privado – o anunciante – introduz, através da actividade publicitária, mudanças qualitativas na percepção e no gozo do espaço público por parte de todos os que nele se movem, “moldando-o”, em função do seu interesse. A constituição da obrigação passiva de se conformar com essa influência modeladora é justamente a contrapartida específica que dá causa ao pagamento da taxa, estruturando, em termos bilaterais, a relação estabelecida com o obrigado tributário.

Findo o prazo para o qual tinha sido concedida a remoção da proibição do exercício da actividade publicitária, torna-se necessário proceder à reavaliação da situação, do ponto de vista da permanência das condições legais de licenciamento, o que justifica a cobrança de uma nova prestação tributária. Essa reavaliação é um pressuposto da continuidade da fruição, por um novo período, das utilidades propiciadas por tal actividade, no que o particular se mostra interessado. Não faz sentido, atenta essa relação causal, distinguir o licenciamento da sua renovação, ou a contrapartida devida pelo período inicial das que são exigíveis pelos períodos de renovação da licença.

Assim como, noutra dimensão problemática, não há razões para considerar a taxa de publicidade consumida por anteriores quantias devidas para a realização de outros trâmites de que eventualmente depende a utilização de edifícios privados para fins publicitários. Já defendida na doutrina (cfr. P. PITTA e CUNHA/J. XAVIER DE BASTO/A. LOBO XAVIER, “Os conceitos de taxa e imposto a propósito de licenças municipais”, Fisco, ano 5 (1993), 3 s., 6-7), esta tese ignora a especificidade da contrapartida outorgada ao anunciante, inconfundível com qualquer outra e autónoma em relação a causas de prestação com ela eventualmente cumuláveis”. (nosso destaque a negrito).

De sublinhar que, o Tribunal Constitucional tem unanimemente mantido e firmado esta orientação nos acórdãos posteriores, referindo-se a título exemplificativo, as Decisões Sumárias n.º 323/10, de 5 de Julho de 2010, que veio a ser confirmada pelo Acórdão n.º 360/10, de 6 de Outubro de 2010, e n.º 417/10, de 11 de Outubro de 2010.

Por sua vez, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA), após a prolação dos citados acórdãos do Tribunal Constitucional, também inflectiu o sentido até então dominante, acolhendo o entendimento sobre a qualificação como taxa da receita liquidada ao abrigo das normas de teor idêntico às aqui em causa, com o consequente juízo de não inconstitucionalidade orgânica das mesmas. (nomeadamente, entre outros, nos seus recentes Acórdãos de 14 de Dezembro de 2016, proferido no processo n.º 01061/13 ou de 18 de Maio de 2016, proferido no processo n.º 01076/15)

Acompanhando na íntegra a nova jurisprudência do TC e do STA, supra citada, e como acima adiantámos, concluímos pela não inconstitucionalidade orgânica ou material da taxa sindicada e, consequentemente, pela improcedência do vício invocado.”

Contra esta análise aturada, efectuada em 1ª instância (com base no alegado na petição inicial) nada de verdadeiramente inovador vem invocado em sede recursória, pelo que nada nos leva a equacionar uma diferente solução da que foi data pelo TAF de Sintra.

Com efeito, daquilo que se trata é, como se percebe, da tributação de mensagens publicitárias colocadas em propriedade privada, mas visíveis do espaço público, o que evidencia uma prestação pública (inerente ao conceito de taxa), traduzida na remoção de um obstáculo jurídico à actividade publicitária, que é relativamente proibida, ficando, pois, sujeita a um licenciamento prévio pelas Câmaras Municipais para «salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental» - cfr. neste sentido, o acórdão do STA, de 18/05/16, processo nº 1076/15; acórdão deste TCA já citado, de 16 do corrente mês, relativo ao processo nº 977/12.3 BESNT.

Dado que nada mais temos a acrescentar ou modificar ao que foi dito pelo Tribunal de 1ª Instância, conclui-se que, também quanto a esta questão, carece a Recorrente de razão.


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Nas conclusões LL) a PP) veio a Recorrente defender que o valor das taxas aqui em causa é totalmente desproporcional e, como tal, violador dos artigos 266º da CRP e 4º da Lei 53-E/2006, de 29/12 (Regime geral das taxas das autarquias locais). Com efeito, sustenta a Recorrente que, in casu, inexiste qualquer equivalência entre o custo do pretendido serviço prestado ou do presumido benefício para o particular na remoção da proibição e o valor da taxa.

A Recorrida, Câmara Municipal de Cascais, discorda de tal entendimento, defendendo, inversamente, que “os valores das taxas cobradas encontram-se devidamente fundamentados e justificados no artigo 5º do Regulamento de Cobrança e Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais para o ano de 2009”, conforme exigido pela lei, “não existindo violação do princípio da proporcionalidade e da equivalência”.

Vejamos, tendo presente que o artigo 266º, nº2 da CRP e o artigo 4º da Lei 53-E/2006, de 29/12, dispõem nos seguintes termos, respectivamente:

“2. Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé”.

“1 - O valor das taxas das autarquias locais é fixado de acordo com o princípio da proporcionalidade e não deve ultrapassar o custo da actividade pública local ou o benefício auferido pelo particular.

2 - O valor das taxas, respeitando a necessária proporcionalidade, pode ser fixado com base em critérios de desincentivo à prática de certos actos ou operações”.

Temos, portanto, que o princípio da proporcionalidade está consagrado no nº2, do artº.266, da CRP, sendo explicitado como princípio material informador e conformador da actividade administrativa, assim implicando a juridicidade de toda a actividade da Administração (cfr.artº.5, nº.2, do C.P.A.; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.801 e seg.).

O princípio da equivalência jurídica, que norteia o valor das taxas cobradas pelas autarquias locais, e se encontra consagrado no transcrito artigo 4º da Lei 53-E/2006, de 29/12, dita que o montante das taxas locais não deve ultrapassar o custo ou valor das prestações administrativas que se dirigem ao particular, assim operando como limite superior à respectiva quantificação (cfr. Sérgio Vasques, Regime das Taxas Locais, Introdução e Comentário, Cadernos do I.D.E.F.F., nº.8, 2009, pág.93 e seg.).

A fórmula de cálculo da taxa em causa consta do artigo 5º do Regulamento de Cobrança e Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais para o ano de 2009, consagrando o artigo 6º que a fundamentação económico -financeira do valor das taxas, licenças e outras receitas previstas na Tabela constam dos quadros que constituem o Anexo I ao Regulamento.

De acordo com o dito Anexo I, aí são tidos em conta custos comuns aos serviços, custos com a implementação, custos com serviços específicos prestados, ponderado com o número médio de horas de trabalho dispendidas na execução das tarefas ligadas a cada taxa e ao número médio de colaboradores envolvidos na execução das tarefas ligadas a cada taxa, pelas autarquias locais.

No caso, os valores em causa cobrados, de € 1.305,00, constam da alínea d) da matéria de facto.

Ora, não se vislumbra - nem tal vem especificamente alegado, a não ser por meio de juízos conclusivos - neste contexto, qualquer indício, resultante da prova efectuada nos autos, de que o valor efectivamente cobrado, com base nos critérios definidos no artigo 5ºdo Regulamento de Cobrança e Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Cascais para o ano de 2009, seja excessivo ou desproporcionado de forma a pôr em causa, de modo evidente, a ideia de correspectividade que deverá estar presente na determinação da taxa em causa.

Como se sabe, a existência de um nexo sinalagmático não implica forçosamente que exista um absoluto equilíbrio entre o valor económico das prestações, até porque nem sempre os bens utilizáveis são susceptíveis de ser aferidos segundo um valor económico preciso, como, de resto, acontece no caso das taxas de publicidade ora em análise.

Para mais, “para que se possa afirmar que o tributo é inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade, não basta afirmar a existência de uma desproporção entre a quantia a pagar e o benefício auferido, sendo necessário demonstrar que essa desproporção é manifesta e compromete de forma definitiva a correspectividade pressuposta na relação sinalagmática” (cfr. ac. deste TCA, de 26/06/14, proc. Nº 7700/14), o que aqui não vem minimamente comprovado.

Por último, nas conclusões QQ) e ss, defende a Recorrente que as taxas em causa violam a liberdade de iniciativa económica privada, consagrada no artigo 61º da CRP, sendo que em resultado das taxas “existem graves prejuízos para a própria eficiência económica da sua actividade”. Há, pois, nesta perspectiva, uma restrição abusiva à iniciativa económica privada proibida pela Constituição, enquanto restrição à liberdade de estabelecimento e de actividade da empresa privada.

A Recorrida assim não entende, defendendo que o Município não se intromete nos poderes de gestão da Recorrente, nem retira conteúdo à liberdade de estabelecimento, uma vez que a sua actuação se enquadra dentro dos limites previstos na lei com vista a evitar abusos por parte dos particulares e salvaguardar os interesses do público em geral.

Vejamos, então, tendo presente que o artigo 61º, nº1 da CRP dispõe que “A iniciativa económica privada exerce-se livremente nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral”.

Cumpre desde já ter presente que o direito à livre iniciativa económica constitui um direito fundamental (não apenas um mero princípio programático ou um princípio objectivo da organização económica) e, especificamente, configura-se como um direito de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias do título II da parte I da Constituição, pese embora se mostre interligado ou conexionado com alguns dos direitos económicos, sociais e culturais e com os quais pode interferir/interagir.

Tal direito corresponde “… à possibilidade de livre expressão da personalidade em atos com conteúdos e fins económicos, quer sejam materiais quer jurídicos …“, podendo assumir duas formas jurídicas substancialmente diversas como sejam a “… liberdade de atuação material, consistente na livre escolha e prática de atos materiais com natureza económica …” e a “… liberdade jurídica, isto é, o poder de disposição dos próprios bens, pessoais ou patrimoniais, mediante a criação de preceitos concretos em execução de disposições normativas da ordem jurídica, quer por comportamento meramente individual (liberdade negocial), quer em interação com a livre vontade de outros sujeitos (liberdade de contratar …) …”, sendo que quanto ao conteúdo económico de qualquer uma dessas liberdades a livre iniciativa económica “… compreende o direito de escolher e exercer a forma da atividade económica desenvolvida por cada um, designadamente constituindo e gerindo unidades autónomas de produção (direito de empresa em sentido restrito …) ou então exercendo atividade produtiva com mobilidade em espaços económicos (direitos de estabelecimento e livre prestação de serviços nos processos de integração económica …) …” (cfr. António L. Sousa Franco em “Nota sobre o princípio da liberdade económica” in: B.M.J. n.º 355, págs. 12/14).

Tal como é sustentado igualmente por J. Gomes Canotilho e Vital Moreira a “… liberdade de iniciativa privada tem um duplo sentido. Consiste, por um lado, na liberdade de iniciar uma atividade económica (liberdade de criação de empresa, liberdade de investimento, liberdade de estabelecimento) e, por outro lado, na liberdade de organização, gestão e atividade da empresa (liberdade de empresa, liberdade do empresário, liberdade empresarial) …” (in: “Constituição República Portuguesa Anotada”, 4.ª edição, pág. 790; vide ainda Jorge Miranda in: “Manual de Direito Constitucional - Direitos Fundamentais”, 3.ª edição, Tomo IV, págs. 515/516).

Temos, assim, que por apelo ao princípio geral da liberdade, enquanto decorrência da liberdade económica, a regra seria o livre exercício das actividades produtivas pela generalidade dos sujeitos económicos, mormente, dos agentes privados perante o Estado.

Como se diz no acórdão do TCA Norte, de 09/11/12, processo nº 00382/07.3BECBR, “Ocorre, porém, que nos próprios termos constitucionais [cfr., no caso e para a situação em presença, os arts. 61.º, n.º 1 e 64.º, n.º 3, als. b), d) e e) da CRP] o direito fundamental em referência, beneficiando é certo enquanto direito de natureza análoga do competente regime dos direitos, liberdades e garantias (cfr. arts. 17.º e 18.º da CRP), sofre restrições decorrentes dos “quadros definidos pela Constituição e pela lei” e terá de ter “em conta o interesse geral”.

Ora, regressado ao caso dos autos, não se vislumbra em que medida o pagamento da taxa em questão, por si só, restringe a iniciativa empresarial quanto à sua actividade e organização. Continua a empresa a deter, como é manifesto, total espaço de decisão quanto à adopção das medidas de negócio que entender, sujeitando-se, também aqui, ao pagamento dos tributos devidos no quadro do ordenamento jurídico e exigidos em razão da actividade que desenvolve.

Como a Recorrida sublinha, a sua actuação, e as exigências fiscais pela via das taxas em causa, resulta do dever legal de verificação dos pressupostos do licenciamento da actividade, de fiscalização e de salvaguarda de interesses públicos, não se vislumbrando qualquer restrição protegida pelo artigo 61º, nº1 da CRP.

Em suma, nada de concreto vem alegado pela Recorrente que permita sustentar semelhante restrição de direitos, tanto mais que para esta se verificar teríamos que estar perante uma afectação do conteúdo essencial desse direito de iniciativa privada (art. 18.º, n.ºs 2 e 3, da CRP), o que aqui está longe de ocorrer.

Face ao exposto, improcede o recurso na sua totalidade.


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3– DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da 1ª Subsecção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente.

Lisboa, 17 de Outubro de 2019


Catarina Almeida e Sousa

Isabel Fernandes

Jorge Cortês